Acórdão Nº 08034345120218205124 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 31-10-2023

Data de Julgamento31 Outubro 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08034345120218205124
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0803434-51.2021.8.20.5124
Polo ativo
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCACAO E DA CULTURA e outros
Advogado(s):
Polo passivo
BENEDITO XAVIER DO NASCIMENTO
Advogado(s):

RECURSO INOMINADO Nº: 0803434-51.2021.8.20.5124

ORIGEM: 2º JUIZADO DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PARNAMIRIM/RN

RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

ADVOGADO: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

RECORRIDA: BENEDITO XAVIER DO NASCIMENTO

ADVOGADO: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO

RELATORA: JUÍZA SABRINA SMITH CHAVES

EMENTA: RECURSO INOMINADO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. PESSOA COM DEFICIÊNCIA DECORRENTE DE AMPUTAÇÃO TRANSTIBIAL. NECESSIDADE DE UTILIZAÇÃO DE PRÓTESE. EXISTÊNCIA DE LAUDO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ESTADO E MUNICÍPIO. DIREITO SOCIAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO ESTADO. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PARECER DO NATJUS NÃO ENSEJA VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CARÁTER OPINATIVO/CONSULTIVO/NÃO VINCULANTE DO PARECER. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida, por seus próprios fundamentos, acrescidos da fundamentação exposta no voto da Relatora. Com condenação em honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o atualizado da causa, ante o não provimento do recurso.

Natal/RN, 24 de outubro de 2023

SABRINA SMITH CHAVES

JUÍZA RELATORA

RELATÓRIO


Sentença que se adota:


SENTENÇA

Dispenso o RELATÓRIO na forma do artigo 38, da Lei nº 9.099/95.

Passo a FUNDAMENTAÇÃO para ulterior decisão.

DO MÉRITO

Obedecendo ao comando esculpido no art. 93, IX, da Constituição Federal, e dando início à formação motivada do meu convencimento acerca dos fatos narrados na inicial e contestação, atento a prova produzida no decorrer da instrução processual, podemos chegar a uma conclusão que veremos mais adiante.

Nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, o juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença, quando a questão de mérito foi unicamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência.

O contexto probatório aponta a desnecessidade de produção de outras provas, diante da matéria controversa estar pautada apenas no plano do direito, conforme se observa das peças processuais e documentos produzidos pelas partes nos autos. Tal situação autoriza o magistrado a julgar antecipadamente a lide, nos termos do art. 355, I do Código de Processo Civil.

Compulsando os autos, tem-se que a parte autora é portadora de deficiência decorrente de amputação transtibial (CID – S889) necessitando da utilização de prótese para se locomover, devendo esta, segundo laudo médico, possuir soquete em fibra de carbono, com componentes internos duralumínio polior, pé articulado dedo aberto e liner de silicone orthopauer.

Nesse plano, o acesso aos meios de obtenção e preservação da saúde do indivíduo findou definido pelo legislador constituinte como um direito social, consoante a locução do caput do artigo 6º da Carta Política brasileira, corolário lógico e imediato da garantia fundamental à inviolabilidade do direito à vida, consagrado no artigo 5º, caput, desse diploma, e do cânon concernente à dignidade da pessoa humana, fundamento expresso da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III).

O Texto Constitucional destinou esse Ente, por seu turno, a promover o bem de todos, à luz dos seus objetivos enunciados no artigo 3º, IV, da reportada Carta.

Em seu bojo se detectam diretrizes normativas irradiadas desse núcleo principiológico, plasmadas, à guisa de exemplo, nos mandamentos insculpidos no seu artigo 7º, IV e XXII, artigo 23, II; artigo 30, VII e artigo 34, VII, "e", dentre outros.

O ápice da proteção dada ao direito em questão pela Lei Maior se encontra permeado na redação do seu artigo 196, cuja redação segue transcrita:

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

A respeito desse ponto, eis o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Agravo de Instrumento 817241/RS, de relatoria do Min. JOAQUIM BARBOSA, e julgado em 30/09/2010, assim se pronunciou:

“O Estado não pode furtar-se do dever de propiciar os meios necessários ao gozo do direito à saúde por todos os cidadãos. Se uma pessoa necessita, para garantir o seu direito à vida, de medicamento que não esteja na lista daqueles oferecidos gratuitamente pelas farmácias públicas, é dever solidário da União, do estado e do município fornecê-lo.”

Partilhando da mesma posição adotada pelo STF, alinha-se o Tribunal de Justiça potiguar, senão vejamos:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. NÃO NECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO, ORA PARTE AGRAVANTE. LIMINAR DEFERIDA EM PRIMEIRO GRAU. GARANTIA DO DIREITO À VIDA E À SAÚDE. CIRURGIA NECESSÁRIA. DEVER DO ESTADO. ARTIGO 196 DA CF/88. DECISÃO CONFIRMADA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO DO RECURSO.

- A Constituição Federal estabeleceu a responsabilidade solidária dos entes federativos pela prestação dos serviços de saúde, de modo que todos têm legitimidade para responder às demandas que visam ao fornecimento gratuito de tratamentos médicos.

- Restando suficientemente comprovada a insuficiência financeira alegada pela parte autora, devem o Estado ser compelido a realizar o procedimento cirúrgico postulado, com base no artigo 196, da Constituição Federal.

- A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." (Agravo de Instrumento com Suspensividade: AI 12697 RN 2010.001269-7 - Relator(a): Des. Vivaldo Pinheiro - Julgamento: 20/05/2010 - Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível)

Emerge desse ideário a convicção da obrigatoriedade do Poder Público prestar todos os serviços necessários à mantença da saúde da população, seja quanto ao fornecimento de medicamentos e insumos, seja quanto à realização de procedimentos e exames médicos, uma vez que todos, sem distinção, integram as diligências atribuíveis ao Estado (lato sensu) para a concretização daquele direito da pessoa humana.

Quanto à legitimidade passiva dos demandados, entendo que esta encontra-se presente na hipótese dos autos, seja por força do art. 23 da Constituição Federal, que prevê a solidariedade entre os entes públicos para o cuidado a saúde e assistência pública, seja pela já pacífica jurisprudência do STF sobre a temática. Vejamos:

“CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERADOS. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que é solidária a obrigação dos entes da Federação em promover os atos indispensáveis à concretização do direito à saúde, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente. 2. Ressalva da posição pessoal em sentido contrário, manifestada em voto proferido na 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 888975/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 22/10/2007). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.”(ARE 803274 AgR, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, DJe 28.5.2014)

Destarte, o dever de acolhimento do pedido autoral é medida a ser observada.

DISPOSITIVO

ISSO POSTO, ratifico a liminar deferida e ACOLHO o pedido formulado pelo autor nesta ação, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC) para, confirmando a Decisão Liminar de id. 61762861, CONDENAR, solidariamente, o ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e o MUNICÍPIO DE PARNAMIRIM a FORNECEREM, no prazo máximo de 30 (trinta dias), em favor de BENEDITO XAVIER DO NASCIMENTO, prótese transtibial com as seguintes especificações: soquete em fibra de carbono, com componentes internos duralumínio polior, pé articulado dedo aberto e liner de silicone orthopauer, em consonância com as prescrições médicas de Id. 6706088.

No mesmo sentido, CONFIRMO a Decisão Liminar anteriormente deferida.

Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios (art. 55 da Lei nº. 9.099/95).

Havendo a interposição do Recurso Inominado e a apresentação de contrarrazões, DETERMINO a remessa dos autos à E. Turma Recursal sem a análise do Juízo de Admissibilidade em razão do art. 1.010, §3º do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

PARNAMIRIM/RN, data registrada no sistema.



FLAVIO RICARDO PIRES DE AMORIM

Juiz(a) de Direito

(documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)

Trata-se de Recurso Inominado Cível interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, insurgindo-se contra sentença de procedência, que condenou solidariamente o ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e o MUNICÍPIO DE PARNAMIRIM a FORNECEREM, no prazo máximo de 30 (trinta dias), em favor de BENEDITO XAVIER DO NASCIMENTO, prótese transtibial.

Em suas razões recursais, alega o recorrente que o modelo específico requisitado pelo autor não está dentro dos protocolos do SUS e sequer houve a remessa dos autos da ação para a câmara técnica do NAT-Jus elaborar parecer elucidativo sobre o caso, uma...

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