Acórdão Nº 08042801120198205101 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 28-06-2021

Data de Julgamento28 Junho 2021
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08042801120198205101
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0804280-11.2019.8.20.5101
Polo ativo
DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO e outros
Advogado(s):
Polo passivo
FRANCISCA LIDIANE SILVA
Advogado(s): GEORGE REIS ARAUJO DE MELO


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Juiz Mádson Ottoni de Almeida Rodrigues

RECURSO CÍVEL VIRTUAL nº 0804280-11.2019.8.20.5101
PARTE RECORRENTE:DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO
ADVOGADO(A): JOAO FERNANDES SILVA NETO
PARTE RECORRIDA: FRANCISCA LIDIANE SILVA
ADVOGADO(A): GEORGE REIS ARAUJO DE MELO
JUIZ RELATOR: MÁDSON OTTONI DE ALMEIDA RODRIGUES

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE AUTO DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO C/C DECADÊNCIA DE PENALIDADE DE MULTA. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO COM PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA. PROVAS NÃO PRODUZIDAS PELA AUTARQUIA DEMANDADA, CUJO ÔNUS LHE COMPETIA. JUNTADA EXTEMPORÂNEA DE DOCUMENTOS ATINENTES AO PROCESSO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE PAGAMENTO DE MULTA SEM GARANTIA PRÉVIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. PRESUNÇÃO APENAS RELATIVA DE LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. ANULAÇÃO DO AUTO QUE SE IMPÕE. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.

Se a autarquia estadual não apresentou documentos que comprovem a notificação da demandante/recorrida através dos Correios, concedendo-lhe prazo para apresentação de defesa, não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, nos termos do art. 373, inciso II do CPC. Nesse sentido, decidiu com acerto a sentença recorrida ao determinar a anulação do auto de infração vinculado ao veículo da autora, excluindo-o dos respectivos registros de trânsito.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do recurso inominado acima identificado, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso inominado e negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.

A parte recorrente ficará isenta das custas do processo, mas pagará honorários advocatícios de sucumbência, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, sopesados os critérios previstos no § 2º do art. 85 do CPC.

Esta súmula de julgamento servirá de acórdão, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95.

Natal/RN, data conforme o registro do sistema.

MÁDSON OTTONI DE ALMEIDA RODRIGUES

Juiz Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Inominado interposto pelo DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO RIO GRANDE DO NORTE em face de FRANCISCA LIDIANE SILVA, ambas as partes qualificadas.

Segue sentença cujo relatório se adota, verbis (ID nº 7367317):

Dispensado o relatório, a teor do art. 27, caput, da Lei 12.153/2009 c/c art. 38, caput, da Lei 9.099/1995.

Passo a decidir.

Cuida-se de Ação Anulatória de Auto de Infração, alegando a parte autora irregularidades no trâmite do AI A-18/178695, resultando na imposição de infração de trânsito.

O Departamento Estadual de Trânsito apresentou contestação, aduzindo, em suma, a improcedência da demanda em razão de haver enviado a notificação da autuação à demandante.

Passo à apreciação dos autos em razão dos documentos anexados, sendo desnecessário produzir qualquer prova oral (art. 355, I, do CPC); e em virtude do disposto nos arts. 370/371, do CPC.

Cinge-se a presente demanda à discussão acerca da possibilidade de anulação ou não de auto de infração, em razão de está eivado de vícios.

No caso, ora em disceptação, a parte autora alega que o Auto de Infração A-18 178695 não apresentou o dispositivo legal da autuação, este exigido pelo art. 280 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), bem como desrespeitou o que está previsto nos parágrafos 5º e 6º do art. 3º da Resolução 619/2016 do CONTRAN e no art. 281, inciso II do Código de Trânsito Brasileiro, a seguir, descritos:


“Art. 3º – Constatada a infração pela autoridade de trânsito ou por seu agente, ou ainda comprovada sua ocorrência por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnológico disponível, previamente regulamentado pelo Conselho Nacional de Trânsito – Contran, será lavrado o Auto de Infração de Trânsito que deverá conter os dados mínimos definidos pelo art. 280 do CTB e em regulamentação específica. (…)

§ 5º – O Auto de Infração de Trânsito valerá como notificação da autuação quando for assinado pelo condutor e este for o proprietário do veículo.

§ 6º – Para que a notificação da autuação se dê na forma do § 5º, o Auto de Infração de Trânsito deverá conter o prazo para apresentação da defesa da autuação, conforme § 4º do art. 4º desta Resolução”. (Resolução 619/2016 – CONTRAN)


“Art. 281. A autoridade de trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de sua circunscrição, julgará a consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível. Parágrafo único. O auto de infração será arquivado e seu registro julgado insubsistente:

II – se, no prazo máximo de trinta dias, não for expedida a notificação da autuação”. (CTB)

Analisando detidamente o feito, especialmente o Auto de Infração de ID 51080561, constata-se que ele realmente não apresenta a tipificação da infração, exigência esta do inciso I do art. 280/CTB, in verbis, “ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará: I – tipificação da infração”, bem como, não informa sobre o prazo para a apresentar eventual defesa da autuação, requisito este exigido para que o auto de infração possa valer como notificação da autuação quando for assinado pelo condutor e este seja o proprietário do veículo (§§ 5º e 6º do art. 3º da Resolução 619/2016), como é no caso dos autos.

Além do mais, conforme já citado, o Código de Trânsito Brasileiro - Lei nº 9.503/97 no seu artigo 281, parágrafo único, II prevê apenas duas hipóteses em que o auto de infração deverá ser arquivado e seu registro julgado insubsistente: inconsistência ou irregularidade do auto de infração; e decurso de trinta dias que dispõe o ente para expedir a notificação de autuação, sob pena de tornar caduco o ius puniendi estatal.

Assim, em que pese o órgão demandado afirme que expediu a notificação de autuação via Correios para o endereço da autora, não juntou nenhum documento que comprovasse tal alegação.

Pois bem. Uma vez desrespeitado o prazo legal de trinta dias para o ato notificatório de autuação, a simples aplicação do comando legal seria suficiente para conduzir ao entendimento de que o processo administrativo em questão deveria ser arquivado por insubsistência, ante a decadência do direito de punir do Estado pela infração de trânsito supostamente cometida.

Outrossim, ainda que considerássemos válida a notificação feita pelo próprio Auto de Infração e que a autora estava ciente do prazo para a defesa, ainda assim há de ser reconhecida a nulidade, uma vez que a autoridade fazendária não demonstrou que houve a notificação quanto à penalidade aplicada, exigência prevista na Súmula 312 do STJ, que assim preleciona: “No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da autuação e da aplicação da pena decorrente da infração”.

Todavia, a parte autora pugna também pela determinação de arquivamento do auto de infração, possivelmente com o intuito de que impossibilitar a reabertura do prazo de trinta dias para notificação, a contar da decisão que, por ventura, julgar nulo o procedimento administrativo acima mencionado.

Esta pretensão demanda que alguns pontos sejam enfrentados.

Durante certo tempo, a jurisprudência nacional discutiu acerca da possibilidade ou não de renovação do prazo de trinta dias para notificação da autuação de infração de trânsito, diante, sobretudo da própria divergência existente nos julgados do Superior Tribunal de Justiça.

De um lado, procedendo à interpretação analógica e sistêmica do Código de Trânsito Brasileiro e do Código de Processo Civil, sobretudo os antigos artigos 219 e 220 desde último diploma (hoje com o correspondente 240 no CPC/2015), a Primeira Turma do STJ já emitiu julgados entendendo que “a anulação da penalidade de trânsito por inobservância da dupla notificação exigida pelo CTB atinge o procedimento administrativo somente a partir do momento em que ocorreu o cerceamento de defesa, não alcançando o auto de infração lavrado pela autoridade de trânsito”, REsp 845.013/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2006, DJ 16/10/2006, p. 3261.

Dito de outro modo, ainda que anulado o procedimento administrativo de notificação, o auto de infração de trânsito permaneceria hígido, o qual terá sua exigibilidade suspensa até decisão final do novo processo administrativo a ser instaurado. Assim, haveria a possibilidade de renovação da notificação, desde que atendido o prazo de trinta dias (art. 281, parágrafo único, II, do CTB), a contar do trânsito em julgado da decisão que anulou parcialmente o procedimento administrativo.

Este entendimento também foi apoiado pela Segunda Turma da Corte, consoante se observa no REsp 835.282/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2006, DJ 01/08/2006, p. 424, no qual se consigna a possibilidade de renovação do prazo, a contar do trânsito em julgado da decisão anulatória.

De outro lado, iniciou-se, no âmbito da própria Primeira Turma, a prevalência do entendimento de que a decadência do direito de punir do estado pelo decurso do prazo legal de trinta dias também abrangeria o auto de infração, o que determinaria seu arquivamento, e consequente impossibilidade de renovação do prazo.

É nesse sentido o julgado de relatoria da Min. Denise Arruda, que muda o preceito antes adotado em homenagem ao entendimento prevalente no âmbito da Primeira Turma da Corte, a saber AgRg no Ag...

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