Acórdão Nº 08043763420218205108 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 30-06-2023

Data de Julgamento30 Junho 2023
Número do processo08043763420218205108
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0804376-34.2021.8.20.5108
Polo ativo
BANCO BMG SA
Advogado(s): FELIPE GAZOLA VIEIRA MARQUES
Polo passivo
ANTONIA SANDRA DE OLIVEIRA SILVA
Advogado(s): WEDNA DE LIMA CAVALCANTE, JOKASTRA MAGHALY NOGUEIRA AQUINO

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE EVIDENCIADA POR PROVA PERICIAL. EXAME GRAFOTÉCNICO QUE ATESTOU QUE A ASSINATURA DO CONTRATO NÃO PERTENCIA AO CONSUMIDOR. FALTA DE DILIGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS. COBRANÇA IRREGULAR. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. MÁ-FÉ CONFIGURADA NOS AUTOS. DANO MORAL CARACTERIZADO. JURISPUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE. LESÃO PRESUMIDA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO (DANO IN RE IPSA). VALOR FIXADO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta pelo BANCO BMG S/A, por seu advogado, em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Pau dos Ferros/RN, que, nos autos da ação ordinária nº 0804376-34.2021.8.20.5108, movida contra si por ANTONIA SANDRA OLIVEIRA, julgou procedente os pleitos autorais, nos seguintes termos:

"Ante o exposto, e considerando tudo o mais que dos autos consta, confirma a antecipação de tutela outrora deferida e JULGO PROCEDENTE os pleitos autorais para o fim de, nos termos do art. 487, I, do CPC:
a) DECLARAR a nulidade do(s) contrato(s) de empréstimo(s) consignado(s) de n(s). 16702120, vinculado ao benefício previdenciário da parte demandante (NB: 179.569.760-9);
b) CONDENAR o BANCO BMG SA (CNPJ N. 61.186.680/0001-74) a restituir em dobro todos os valores que houver indevidamente descontados do benefício da parte autora (NB: 179.569.760-9) relativos ao(s) contrato(s) de empréstimo(s) consignado(s) ora declarado(s) nulo(s) (contratos n(s). 16702120, devidamente corrigido pelo IPCA desde cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados da citação;
c) CONDENAR o BANCO BMG SA (CNPJ N. 61.186.680/0001-74) a pagar à parte autora, a título de indenização por danos morais, o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de correção monetária pelo IPCA e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da prolação da sentença.
Oficie-se a Agência da Previdência Social do INSS desta Comarca DETERMINANDO a exclusão definitiva de cobrança de parcelas consignadas no benefício da parte autora (NB 179.569.760-9) relativa ao(s) contrato(s) ora declarado(s) nulo(s) contrato(s) n.(s) , acaso ainda esteja ativo, nos termos do art. 44, §1º da Instrução Normativa do16702120 INSS n. 28/2008.
Tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora e levando em consideração que no presente processo não ocorreu instrução, fixo os honorários sucumbenciais em favor da parte autora no percentual de 10% sobre o valor da condenação, o que faço com fundamento 85, §2º do CPC."

Nas razões do seu apelo, o apelante alegou, em síntese: a) validade do contrato, que foi regularmente e livremente firmado; c) não caracterização dos danos materiais e morais; e) subsidiariamente, cabimento da redução do quantum indenizatório.


Por fim, requereu o conhecimento e provimento do apelo, reformando-se a sentença, para se julgar improcedente a pretensão exordial.


A parte apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso.

Deixou-se de remeter os autos à Procuradoria de Justiça, tendo em vista que o litígio trata de questão estritamente patrimonial.

É o relatório.

VOTO


Verifico preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual conheço do recurso.

Cinge-se o mérito recursal em aferir a regularidade da contratação de cartão de crédito na modalidade consignada.


É de se esclarecer, inicialmente, que, no caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, haja vista tratar-se de relação jurídico-material em que de um lado os demandados figuram como fornecedores de serviços, e, do outro lado, a demandante se apresenta como sua destinatária.

Ademais, cumpre ressaltar que, mesmo existindo pacto contratual livremente celebrado entre as partes, é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação jurídica, de modo a devolver ao negócio o equilíbrio determinado pela lei e a função social a ele inerente, sem que isso signifique interferência ilegal na autonomia da vontade das partes, ainda mais quando o negócio se encontra regido pelo Código de Defesa do Consumidor.


Ato contínuo, cabível mencionar que o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 14, estabeleceu a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviços, na qual, uma vez ocorrido o dano, será investigado tão somente o nexo de causalidade, inexistindo, portanto, aferição de culpa.

Pois bem. O Código de Processo Civil estabelece, no artigo 373, incisos I e II, o seguinte:

"Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."

Observa-se que ao autor cumpre provar o fato constitutivo do direito alegado, cabendo ao réu demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo de tal direito.

Analisando o caderno processual, verifica-se que a postulante juntou cópia do extrato bancário contendo os efetivos descontos do empréstimo consignado objeto do litígio (páginas 25/26).


Por sua vez, a instituição financeira colacionou instrumento contratual, que aduziu ter firmado com a autora (páginas 67/70).


Porém, em que pese a alegação recursal sobre a regularidade dos descontos, por meio de perícia grafotécnica acostada nas páginas 135/159, concluiu o expert que a assinatura constante do contrato acostado pela instituição financeira não pertence à demandante, conforme destacado a seguir:

"Diante das análises e observações realizadas por Essa Perita e, após confrontar minuciosamente o grafismo das peças Questionadas apresentada pelo Corréu e as Padrões, como também, outros itens que demonstram falsificação, utilizando equipamentos Ópticos, Software de ampliação de imagens digitais que ilustram esse laudo Grafotécnico, com os resultados obtidos ao final dos exames, essa perita conclui que as assinaturas lançadas no contrato de Reserva de Margem Consignável RMC n° 16702120, não partiram do punho escritor da Senhora Antônia Sandra de Oliveira Alves.
Portanto a assinatura constante no contrato apresentado é FALSA."


Desse modo, ao contrário do que aduz o apelante, a sentença não contradisse as provas constantes dos autos, concluindo-se ser descabida as cobranças perpetradas nos proventos da ora apelada, uma vez que o contrato não foi entabulado por esta, conforme se depreende do laudo pericial alhures destacado.

Ora, a instituição financeira, por estar inserida no conceito de prestadora de serviço, também é responsável objetivamente pelos prejuízos e danos causados ao consumidor. Logo, basta que se comprove o nexo causal entre o ato perpetrado pela instituição bancária e o consequente dano oriundo desta conduta para que surja o dever de indenizar o lesado, sem que seja necessária qualquer investigação acerca do elemento culpa.

Sabe-se que o banco tem o dever de aferir a autenticidade dos documentos apresentados por um pretenso cliente, para, além de resguardar seus direitos (garantia do cumprimento da obrigação contraída), prevenir eventual agressão a interesses de terceiros, como se deu no caso em deslinde.

A conduta desidiosa do demandado, decerto, acarretou dano moral à autora, cujos dados pessoais foram indevidamente utilizados para celebrar contrato de empréstimo com o ora apelante, configurando-se o dano imaterial, bem assim o dever de indenizar por parte daquele que o causou.

Com efeito, cumpre ao prestador de serviço ser diligente na execução de seu mister. A instituição financeira não pode contratar sem se certificar sobre a idoneidade das informações prestadas pela pessoa interessada, de modo que é inquestionável a má prestação do serviço e a ocorrência do dano moral infligido à demandante, decorrente deste fato.

Ademais, tratando-se de uma relação consumerista, cumpria ao réu, ora apelante, comprovar que o contrato de empréstimo foi celebrado efetivamente pela autora/apelada, ônus do qual não se desincumbiu, restando, assim, caracterizado o dano moral indenizável.

Certo, portanto, é o direito à indenização decorrente do dano moral infligido à pessoa física.

Impende destacar os seguintes julgados do Superior Tribunal e desta Corte:

"EMENTA: DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. INEXISTÊNCIA. DESCONTOS INDEVIDOS DA CONTA CORRENTE. VALOR FIXADO. MINORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Como a formalização do suposto contrato de empréstimo consignado em folha de pagamento não foi demonstrada, a realização de descontos mensais indevidos, sob o pretexto de que essas quantias seriam referentes às parcelas do valor emprestado, dá ensejo à condenação por dano moral.

2. Esta Corte Superior somente deve intervir para diminuir o valor arbitrado a título de danos morais quando se evidenciar manifesto excesso do quantum, o que não ocorre na espécie. Precedentes.

3. Recurso especial não provido." (STJ REsp 1238935 / RN Relª. Ministra NANCY ANDRIGHI T3 TERCEIRA TURMA, julg. 07/04/2011)

"EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL E CONSUMIDOR....

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