Acórdão Nº 08044054220208205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 10-05-2022

Data de Julgamento10 Maio 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08044054220208205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0804405-42.2020.8.20.5004
Polo ativo
BANCO BRADESCO S/A e outros
Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
Polo passivo
KLEIBER LOPES MIRANDA BORJA
Advogado(s): RICARDO ALEXANDRE VIEIRA DA COSTA


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA – 2º GABINETE

RECURSO CÍVEL INOMINADO Nº 0804405-42.2020.8.20.5004

1º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

RECORRENTE: BANCO BRADESCO S.A.

ADVOGADO: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

RECORRIDO: KLEIBER LOPES MIRANDA BORJA

ADVOGADO: RICARDO ALEXANDRE VIEIRA DA COSTA

JUiz RELATOR: GUILHERME melO CORTEZ

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. DÉBITO INEXISTENTE. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. INDENIZAÇÃO FIXADA NA SENTENÇA EM R$ 1.000,00 (MIL REAIS). MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Turma Recursal Provisória dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos. Condenada a recorrente em custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Impedida a juíza Valéria Maria Lacerda Rocha.

Natal/RN, data da assinatura eletrônica.

GUILHERME MELO CORTEZ

Juiz Relator


RELATÓRIO

1. Trata-se de Recurso Inominado interposto por BANCO BRADESCO S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido inicial para condená-lo “a) a baixa integral da dívida aqui tratada, no prazo de quinze (15) dias, sob pena de conversão da obrigação em pagamento ao autor do importe não desconstituído; b) pagar ao autor o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais) a título de indenização por danos morais, corrigidos monetariamente segundo tabela da Justiça Federal a partir da publicação desta e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação”.

2. Restou consignado em sentença pelo magistrado a quo que O Banco defendeu que a dívida é exigível, eis que corresponde a obrigações inadimplidas decorrentes de contrato de cartão de crédito - HSBC SUPERCLASS VISA de números finais 9452. O autor negou o vínculo gerador do débito, todavia, e o Banco não trouxe prova satisfatória da adesão do requerente ao contrato relativo ao citado cartão, o que lhe competia (art. 373, II, do CPC). Desta feita, há que se considerar inexistente o débito e ilícita a anotação restritiva, geradora de presumíveis danos morais. Presentes, assim, os requisitos do art. 927 do CC, arbitro em R$ 1.000,00 (um mil reais) o importe indenizatório. Entendo, contudo, que não competia ao Banco a comunicação prévia do registro, diante do que dispõe o art. 43 do CDC, mas ao cadastro”.

3. Em suas razões recursais, BANCO BRADESCO S.A. defende que a conduta do recorrente não foi capaz de gerar dano moral, e que não há comprovação nos autos do efetivo dano suportado pelo autor, bem como não houve falha na prestação do serviço prestado pelo demandado, ou subsidiariamente, a minoração do valor concedido a título extrapatrimonial. Ao final, requereu o provimento do recurso.

4. Foram ofertadas contrarrazões pugnando, em síntese, pela manutenção da sentença.

5. É o relatório.

VOTO

Em razão da ausência de juízo de admissibilidade no primeiro grau de jurisdição, concedo o benefício da gratuidade judiciária requerido pela parte autora.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, necessário o conhecimento do recurso inominado.

Compulsando os autos, verifico que as razões recursais não merecem acolhimento pela argumentação que se segue.

Com relação à impugnação do pedido de justiça gratuita, verifico que tal não merece prosperar, uma vez que o deferimento desse pedido depende de simples afirmação de insuficiência de recursos pela parte, gozando de presunção de veracidade, até que se prove ao contrário. Assim, rejeito a preliminar apontada.

Afirma que a parte autora antes de ajuizar a presente demanda não tentou solucionar o litígio de forma extrajudicial, motivo este que ensejaria, em tese, a falta de interesse de agir pela parte autora. Todavia, tal preliminar não merece ser acolhida, visto que a ausência para a solução na via administrativa não obsta à apreciação jurisdicional, tendo em vista o princípio da universalidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF).

No caso vertente, a natureza jurídica do vínculo entre as partes configura uma clara relação de consumo, sendo indispensável uma análise do feito à luz da Lei 8.078/90.

Tratando o caso de relação de consumo, e, tendo em vista a hipossuficiência da consumidora, entendo que deve ser invertido o ônus da prova, modalidade de facilitação da defesa dos direitos do consumidor prevista no artigo 6º, inciso VIII, da Lei n. 8.078/90 (CDC), senão vejamos:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

Por sua vez, o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabeleceu que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, cabendo ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal disciplinamento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade; caso contrário, atribui-se o ônus da prova aquele que melhor puder suportá-lo, atendendo justamente ao princípio da igualdade material (“teoria da distribuição dinâmica das provas”).

Ademais, em se tratando de fato negativo – ausência de relação jurídica/débito – prova impossível de ser produzida pela parte que a alega, torna-se diabólica, ou seja, não se pode imputar a obrigação de produzi-la ao autor, senão vejamos:

APELAÇÃO - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - FALSÁRIOS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - PROVA DIABÓLICA - DANOS MORAIS EXISTENTES. - Na inscrição indevida em cadastros de restrição ao crédito, o dano moral se configura in re ipsa, ou seja, prescinde de prova. - "Para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil, as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno" (STJ, REsp 1197929, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 12/09/2011). - Prova diabólica é aquela que é impossível, senão muito difícil, de ser produzida. A jurisprudência usa a expressão prova malévola, outrossim, para designar prova de algo que não ocorreu, ou seja, a prova de fato negativo. - Recurso não provido. (TJ-MG - AC: 10439120096185001 MG , Relator: Veiga de Oliveira, Data de Julgamento: 27/08/2013, Câmaras Cíveis / 10ª CÂMARA CÍVEL).

Para contexto dos autos, é incontroversa a inscrição do nome da recorrida no SPC/SERASA, consoante se observa do ID 9378767.

A alegação da parte autora – de inexistência do contrato e, por consequência, do débito objeto do contrato – constitui fato negativo, de sorte que caberia a parte adversa, no caso a requerida, comprovar a existência do débito, por exemplo, por meio da juntada de instrumento contratual subscrito pela autora, entre outros recursos que só a requerida dispõe. Não se pode exigir da parte autora que prove que jamais celebrou contrato.

Logo, cabia ao Banco réu se desincumbir quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, na esteira do inciso II, do art. 373, do CPC. Ausente, portanto, qualquer elemento de prova tendente a subsidiar a conduta da fornecedora, ou afastar a legitimidade das provas carreadas aos autos, tem-se por configurada a falha na prestação do serviço.

Nesse prisma, prevalece a hipótese da responsabilidade civil da empresa, porquanto, em se tratando de relação de consumo, a responsabilização da fornecedora independe da comprovação de culpa, sendo de rigor as disposições disciplinadas no art. 14 do CDC.

Quanto à indenização por danos morais, considerando que houve inscrição indevida, é de rigor aplicar ao caso a jurisprudência do STJ, segundo a qual a inscrição irregular do consumidor, "por si só, enseja indenização, sendo desnecessária a comprovação do prejuízo, por ser presumida a sua ocorrência, configurando, assim, o chamado dano moral in re ipsa." (AgRg no AREsp 607.167/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 18/12/2014, DJe 11/02/2015).

Como é sabido, atribui-se um duplo caráter à compensação financeira por danos morais: (i) caráter punitivo, assumindo a natureza de pena privada, impondo ao ofensor uma sanção para não ficar impune o ato ilícito e para desestimulá-lo à prática de novas agressões; (ii) caráter compensatório, que visa atenuar as consequências advindas da ofensa, conferindo uma compensação ou satisfação ao lesado pela agressão sofrida: dor, vexame, humilhação, aflição, angústia e desequilíbrio ao bem estar do ofendido.

Como asseverou o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino do STJ, em voto proferido no REsp...

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