Acórdão Nº 08050910620238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 21-09-2023

Data de Julgamento21 Setembro 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08050910620238200000
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0805091-06.2023.8.20.0000
Polo ativo
UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO
Advogado(s): RODRIGO MENEZES DA COSTA CAMARA
Polo passivo
A. L. A. D. L.
Advogado(s): ADONAI WILSON FERREIRA BEZERRA

EMENTA: PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO MÉDICO. DECISÃO ATACADA QUE DEFERIU O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA, CONSUBSTANCIADO NO FORNECIMENTO E CUSTEIO DE TRATAMENTO DE REABILITAÇÃO COM KINESIOTAPING. EXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO MÉDICA ESPECÍFICA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS DE EFICÁCIA DA TÉCNICA. REJEIÇÃO. PACIENTE DIAGNOSTICADO COM TRANSTORNO DO DESENVOLVIMENTO. RESOLUÇÃO NORMATIVA 539/2022 DA ANS QUE DETERMINA O ATENDIMENTO POR PRESTADOR APTO A EXECUTAR O MÉTODO OU TÉCNICA INDICADOS PELO MÉDICO ASSISTENTE. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS CAPAZES DE ALTERAR AS CONCLUSÕES DA DECISÃO ATACADA. MANUTENÇÃO DO DECISUM. AGRAVO CONHECIDO E DESPROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância o parecer ministerial, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator que integra este acórdão, restando prejudicado o Agravo Interno.

RELATÓRIO


Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Unimed Natal – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, em face de decisão proferida pelo Juiz de Direito da 16ª Vara Cível da Comarca de Natal, que nos autos da Ação de Obrigação de Fazer nº 0817878-02.2023.8.20.5001, proposta por Augusto Luan Araújo Lira, representado pela genitora Débora Regina Oliveira de Araújo, deferiu pedido de tutela de urgência, determinando que o Plano de Saúde ora agravante, no prazo de 05 (cinco) dias, forneça e custei o tratamento de reabilitação com kinesiotaping, conforme prescrição do médico assistente, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

Nas razões de ID 19330520, sustenta a agravante, em suma, que o agravado é beneficiário do plano de saúde por si administrado e que sob a alegação de recusa imotivada no custeio de tratamento de reabilitação com kinesiotaping, teria o recorrido ingressado com a demanda de origem, a fim de ver judicialmente determinada a concessão do procedimento pretendido.

Destaca que de acordo com a ANS – Agência Nacional de Saúde não seria obrigatório o fornecimento da técnica em referência – kinesiotaping – pelas operadoras de planos de saúde, e que alegadamente não existiriam evidências científicas acerca de sua eficácia, se comparadas às técnicas convencionais de fisioterapia.

Ademais, que o repasse de ônus para as operadoras de saúde suplementar sem a respectiva previsão em contrato, importaria em manifesto desequilíbrio contratual; que sob a ótica da legislação pátria e de fiscalização da ANS – Agência Nacional de Saúde, estaria atuando em estrito atendimento as suas obrigações contratuais.

Por conseguinte, pugna pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso, para afastar o dever de custeio/fornecimento que lhe foi imposto; e no mérito, pelo provimento do agravo, com a consequente reforma da decisão atacada.

Junta documentos.

Em decisão de ID 19342136 restou indeferida a suspensividade requestada.

Contra o referido decisum, foi interposto o Agravo Interno de ID 19823627.

A parte agravada apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento da pretensão recursal.

Instado a se manifestar, o Ministério Público, por intermédio da 15ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e desprovimento do Agravo.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Na situação em exame, pretende a agravante a reforma da decisão que deferiu pedido de tutela de urgência, determinando o fornecimento e custeio pelo Plano de Saúde recorrente, do tratamento com kinesiotaping, a paciente menor diagnosticado com transtorno de desenvolvimento.

Mister ressaltar, por oportuno, que em se tratando de Agravo de Instrumento, a sua análise limitar-se-á, apenas e tão somente, aos requisitos aptos a concessão da medida sem, contudo, adentrar à questão de fundo da matéria.

Desse modo, em uma análise perfunctória, própria desse momento processual, entendo que a irresignação não comporta acolhida, devendo ser mantida a decisão atacada.

Isso porque, embora não se olvide que em julgamento finalizado em 08/06/22, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça entendeu que, em regra, seria taxativo o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrir tratamentos não previstos na lista, necessário pontuar que em 23 de junho de 2022, a diretoria colegiada da ANS aprovou normativa que amplia as regras de cobertura assistencial de planos de saúde para pacientes com transtornos do desenvolvimento.

Referida decisão foi traduzida na Resolução Normativa ANS nº 539, de 23 de junho de 2022, a qual estabeleceu que a partir de 1º de julho de 2022 passaria a ser obrigatória “a cobertura de método ou técnica indicados pelo médico assistente”, para tratar a doença ou agravo do paciente diagnosticado com algum dos transtornos que compõem o CID F84 (transtornos globais do desenvolvimento).

De há muito tem se compreendido que compete ao médico do segurado a escolha do tratamento ou da técnica que entende adequada para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acomete o paciente, competindo ao plano de saúde, tão somente, assegurar a assistência médico-hospitalar, mediante pagamento dos custos despendidos com o tratamento recomendado pelo médico, não lhe sendo autorizado limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do segurado, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor (STJ, REsp nº 1053810/SP 2008/0094908-6, Rela. Ministra NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, julgado em 17/12/2009).

Em verdade, considera-se ilícita a negativa de cobertura do plano de saúde de procedimento, tratamento ou material considerado essencial para preservar a saúde do paciente. De fato, a indicação médica é de responsabilidade do profissional que prescreveu o procedimento, sendo desarrazoado ao Judiciário adentrar no mérito da adequação/utilidade do tratamento (AgRg no Ag 1325939/DF, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, j. 03/04/2014).

No caso em debate, a leitura dos autos revela que o impúbere Augusto Luan Araújo Lira, 06 anos, é beneficiário do Plano de Saúde agravante, e foi diagnosticado com quadro de epilepsia focal estrutural farmacorresistente de difícil controle”, com acentuado atraso neuropsicomotor e hipotonia global por suspeita de Síndrome de Sotos”, necessitando de intervenção precoce de terapias de reabilitação, de forma contínua e por tempo indeterminado, consoante Laudos Médicos de ID 98193302, 305 e 294, lhe sendo prescrita fisioterapia neuromotora, kinesiotaping, dentre outras.

Nesse contexto, observado que o tratamento requerido está amparado por justificativa e requisição médica específica, não há como colocar em dúvida a sua necessidade, não sendo hábil, nessa fase processual, limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do paciente.

Desse modo, entendo caracterizado o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ante um dano maior à saúde do agravado, caso não fornecido o tratamento prescrito pelo médico especializado, enquanto se discute o mérito da demanda.

Outrossim, o bem jurídico que se pretende tutelar é da maior relevância, concernente à própria saúde do usuário, cuja proteção decorre de imperativo constitucional que resguarda, no art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana, e deve sobrepor-se ao direito eminentemente pecuniário, não havendo que falar em irreversibilidade da medida.

Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, conheço e nego provimento ao recurso, restando prejudicado o Agravo Interno.

É como voto.

Des. Dilermando Mota

Relator

K

Natal/RN, 19 de Setembro de 2023.

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