Acórdão Nº 08051218320228205300 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 04-03-2024
Data de Julgamento | 04 Março 2024 |
Classe processual | APELAÇÃO CRIMINAL |
Número do processo | 08051218320228205300 |
Órgão | Câmara Criminal |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL
Processo: | APELAÇÃO CRIMINAL - 0805121-83.2022.8.20.5300 |
Polo ativo |
JOEDYSON DANTAS DA SILVA |
Advogado(s): | |
Polo passivo |
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE |
Advogado(s): |
Apelação Criminal n. 0805121-83.2022.8.20.5300
Apelante: Joedyson Dantas da Silva
Def. Público:Fauzer Carneiro Garrido Palitot
Apelado: Ministério Público
Origem: Vara Única da Comarca de Parelhas
Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco
EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO CAUTELAR INCIDENTAL DE RESTITUIÇÃO DE BENS APREENDIDOS. DECISÃO DE INDEFERIMENTO. APELAÇÃO DEFENSIVA. PLEITO DE LIBERAÇÃO DO BEM APREENDIDO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CERTEZA SOBRE A PROPRIEDADE REAL DO BEM. DECISUM MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, em consonância com o parecer da 5ª Procuradoria de Justiça, conhecer e negar provimento ao recurso, mantendo incólume a sentença recorrida, nos termos do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Criminal interposta por Joedyson Dantas da Silva contra decisão prolatada pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Parelhas/RN, ID 22645259, que, nos autos da presente Ação Penal n. 0805121-83.2022.8.20.5300, negou-lhe a restituição do bem móvel consistente na motocicleta HONDA/CG 125, Chassi: 9C2JC1801KR414315, Ano Fabricação: 1989, número do motor: 2032835, cor: Vermelha.
Nas razões recursais, ID 22645259, o apelante pugnou apenas pela liberação do bem constrito, com fulcro no art. 120 do Código de Processo Penal.
Em contrarrazões, ID 22645263, o Ministério Público refutou os argumentos levantados pela defesa, pugnando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
Instada a se pronunciar, ID 22830103, a 5ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso defensivo.
É o relatório.
VOTO
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, deve ser conhecida a presente apelação.
Cinge-se a pretensão recursal na restituição da motocicleta HONDA/CG 125, Chassi: 9C2JC1801KR414315, Ano Fabricação: 1989, número do motor: 2032835, cor: Vermelha, ao apelante Joedyson Dantas da Silva, sob a alegação de que não há dúvidas sobre a propriedade do bem, e que no ordenamento jurídico pátrio, a transmissão da propriedade de bem móvel se efetiva com a tradição, sendo irrelevante a efetiva transferência de titularidade, nos termos do art. 1.267 do Código Civil[1].
Não assiste razão ao apelante.
Analisando os autos, verifica-se que não restou definida, com juízo de certeza, a propriedade do veículo, de modo que a restituição se mostrou inviável.
Isso porque, muito embora o apelante colacione o certificado de registro de licenciamento de veículo e o certificado de registro de veículo, que lhes foram entregues quando da aquisição a terceiro, não foi realizada a transferência formal de titularidade da propriedade junto ao DETRAN, eis que ambos encontram-se em nome de terceira pessoa, qual seja, Maria Nunes de Medeiros, o que enseja, portanto, dúvidas sobre a legitimidade da propriedade do bem alegada por ele, tendo relevância sim para fins processuais de restituição, ao contrário do que alega o réu.
Sobre a matéria em foco, o art. 120 do Código de Processo Penal dispõe que:
Art. 120. A restituição, quando cabível, poderá ser ordenada pela
autoridade policial ou juiz, mediante termo nos autos, desde que
não exista dúvida quanto ao direito do reclamante.
É dizer, há dúvida sobre a real propriedade do bem, sendo correta a manutenção da restrição do bem.
Com efeito, a restituição de coisa apreendida depende de inequívoca prova do direito do requerente, o que é também entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Se não, veja-se:
AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RESTITUIÇÃO DE VALOR APREENDIDO. INTERESSE À PERSECUÇÃO PENAL. PROPRIEDADE E LICITUDE NÃO DEMONSTRADA. PRESCRIÇÃO PUNITIVA EM RELAÇÃO AOS DEMAIS ACUSADOS. INOVAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "A restituição das coisas apreendidas, mesmo após o trânsito em julgado da ação penal, está condicionada tanto à ausência de dúvida de que o requerente é seu legítimo proprietário, quanto à licitude de sua origem, conforme as exigências postas nos arts. 120 e 121 do Código de Processo Penal, independentemente de ser a sentença extintiva da pretensão punitiva ou mesmo absolutória" (AgRg no AREsp n. 1.772.720/MT, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/3/2021, DJe de 29/3/2021). […] (STJ. AgRg nos EDcl no REsp n. 2.064.062/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe de 28/8/2023.).
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. "OPERAÇÃO PRATO FEITO". RESTITUIÇÃO DE BENS. VIA ELEITA INADEQUADA. DÚVIDA SOBRE A PROPRIEDADE DO BEM. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. É firme o entendimento desta Corte Superior de que "o procedimento adequado para a restituição de bens é o incidente legalmente previsto para este fim, com final apelação, recurso inclusive já interposto pelo recorrente, sendo incabível a utilização de Mandado de Segurança como sucedâneo do recurso legalmente previsto". 2. Merece ser destacada a orientação deste Superior Tribunal de que "a restituição das coisas apreendidas, mesmo após o trânsito em julgado da ação penal, está condicionada tanto à ausência de dúvida de que o requerente é seu legítimo proprietário, quanto à licitude de sua origem e à demonstração de que não foi usado como instrumento do crime, conforme as exigências postas nos arts. 120, 121 e 124 do Código de Processo Penal, c/c o art. 91, II, do Código Penal". (AgRg no RMS n. 69.469/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 18/10/2022, DJe de 21/10/2022.)
Em casos semelhantes, assim vem decidindo esta Câmara Criminal:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. MEDIDAS INVESTIGATÓRIAS SOBRE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS E TRÁFICO DE DROGAS. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DE VEÍCULO APREENDIDO NO CURSO DE DILIGÊNCIA DE BUSCA E APREENSÃO. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUEM DETINHA A REAL POSSE DO BEM. PRECEDENTES DO STJ. DECISÃO MANTIDA IN TOTUM. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (APELAÇÃO CRIMINAL, 0813107-46.2023.8.20.0000, Des. Glauber Rêgo, Câmara Criminal, JULGADO em 04/12/2023, PUBLICADO em 05/12/2023)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO CAUTELAR INCIDENTAL DE RESTITUIÇÃO DE BENS APREENDIDOS. APELAÇÃO DEFENSIVA. PLEITO DE LIBERAÇÃO DO BEM APREENDIDO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CERTEZA SOBRE A PROPRIEDADE REAL DO BEM. PRESENÇA DE INTERESSE DA AÇÃO PENAL. CONSTRIÇÃO NECESSÁRIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (APELAÇÃO CRIMINAL, 0817589-69.2023.8.20.5001, Des. Gilson Barbosa, Câmara Criminal, JULGADO em 28/08/2023, PUBLICADO em 11/09/2023)
PENAL E PROCESSO PENAL. APCRIM. ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT DO CP). ÉDITO PUNITIVO. PLEITO DE RESTITUIÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. BEM UTILIZADO NA PRÁTICA DELITIVA. INCERTEZA QUANTO À PROPRIEDADE. DECISUM MANTIDO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO. (APELAÇÃO CRIMINAL, 0907296-82.2022.8.20.5001, Des. Saraiva Sobrinho, Câmara Criminal, JULGADO em 18/05/2023, PUBLICADO em 18/05/2023)
Portanto, ausente a certeza sobre quem seria o proprietário do veículo, o pleito do recorrente não pode ser acolhido.
Ante o exposto, em consonância com o parecer da 5ª Procuradoria de Justiça, conheço do recurso e nego-lhe provimento, devendo manter-se inalterada a sentença recorrida.
É como voto.
Juiz Convocado RICARDO TINOCO
Relator
[1] Art. 1.267. A propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição.
Parágrafo único. Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição da coisa, que se encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico.
Natal/RN, 4 de Março de 2024.
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO