Acórdão Nº 08054228520238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 21-12-2023

Data de Julgamento21 Dezembro 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08054228520238200000
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0805422-85.2023.8.20.0000
Polo ativo
NOLEM COMERCIAL IMPORTADORA E EXPORTADORA S.A
Advogado(s): URBANO GREGORIO DE LIMA JUNIOR
Polo passivo
EXPEDITO GOMES FILHO
Advogado(s):

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO DE ORIGEM QUE INDEFERIU A TUTELA ANTECIPATÓRIA DE MÉRITO. DISCUSSÃO SOBRE A PROPRIEDADE DE IMÓVEL OBJETO DE USUCAPIÃO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. TENTATIVA DE LOCALIZAÇÃO NÃO REALIZADA. PRETENSÃO ANTECIPATÓRIA QUE SE LIMITA A AVERBAÇÃO DE LITÍGIO NO REGISTRO DO IMÓVEL E BLOQUEIO COMO MEDIDA DE CAUTELA. TUTELA SEM NATUREZA SATISFATIVA. PERIGO DE DANO EVIDENCIADO. POSSIBILIDADE DE DISPOSIÇÃO SOBRE O REGISTRO CONTROVERTIDO EM PREJUÍZO DA MASSA FALIDA E TERCEIROS SEM O DEVIDO APROFUNDAMENTO INSTRUTÓRIO. REVERSIBILIDADE DA MEDIDA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEFERIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao instrumental, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de atribuição de efeito ativo, intentado pela Massa Falida de Nolem Comercial Importadora e Exportadora S/A em face da decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Baraúna/RN que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Ato Judicial (Querella Nulitatis Insanablis) registrada sob o nº 0800329-81.2023.8.20.5161, ajuizada em face de Expedito Gomes Filho, indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela pelos seguintes fundamentos (Id. 96462268 na origem):

“[...] In casu, merece registrar ausência de probabilidade do direito invocado na inicial, pois, numa primeira análise, não é possível verificar a apontada nulidade no procedimento de usucapião de número 0800012-54.2021.8.20.5161. Afinal, além da citação dos confinantes (Id 77862267), fora realizada citação por edital de terceiros interessados (Id 81720976), sem qualquer manifestação.

Assim, constatado que a questão travada nos autos demanda ampla dilação probatória para averiguação da realidade dos fatos não se revela prudente a concessão de tutela de urgência.

[...]

Ante o exposto, INDEFIRO a tutela provisória requerida, por não preenchimento dos requisitos legais, a teor das regras insertas nos arts. 294 e 300 do Código de Processo Civil. [...]”

Irresignada com o édito a quo, a massa falida dele recorreu, aduzindo, em síntese: a) o preenchimento dos requisitos necessários ao deferimento da antecipação da tutela jurisdicional; b) a probabilidade do direito da massa falida, “legítima proprietária e possuidora do imóvel, que já era devidamente registrado no mesmo ofício imobiliário de Baraúna/RN, sob a Matrícula n.º 533 (ID 95936053 DO PROCESSO DE ORIGEM – ANEXO 9)”; c) a ausência de citação do proprietário e por fazer tramitar usucapião em juízo incompetente, vez que a competência absoluta para tal processo seria do juízo universal da falência; d) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo para prevenir atos de disposição sobre o registro controvertido, de resguardar terceiros de boa-fé e de assegurar o resultado útil da demanda, cuja promovente, por ser massa falida, pressupõe a conglomeração dos interesses coletivos do concurso de credores, dentre os quais se destacam centenas de credores trabalhistas e a Fazenda Nacional.

Sob esses fundamentos requereu a concessão da tutela recursal para que seja determinado o bloqueio da matrícula imobiliária n.º 2.947 daquele Ofício e a averbação, na mesma matrícula, dando publicidade da demanda de origem.

Tutela Recursal deferida (Id. 19526029).

Apesar de intimado, o agravado deixou de apresentar contrarrazões, consoante certidão de Id. 20906341.

Instado a se manifestar, o Órgão Ministerial, por meio de sua 7ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e provimento do instrumental (Id. 21019112).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cinge-se a controvérsia em verificar o acerto da decisão a quo que declarou incompetência da Justiça Comum para processar a ação, determinando, em consequência, a remessa dos autos à competente Justiça do Trabalho.

De início esclareço que a análise do mérito limita-se a formação de probabilidade do direito e a urgência necessária ao deferimento da antecipação dos efeitos da tutela, tratando-se, pois, de análise não exauriente, restrita aos elementos de prova até então constituídos.

Em análise superficial, própria deste momento processual, tenho que evidenciada a probabilidade do direito e a urgência como vetores ao deferimento da tutela antecipada pretendida.

Com efeito, o imóvel objeto da discussão, quando da ação usucapienda, tinha registro de propriedade em nome da agravante, conforme se constata da certidão de Id. 95936053 – processo de origem.

Nada obstante, nos autos da ação de usucapião extraordinário, registrada sob o nº 0800012-54.2021.8.20.5161, a empresa proprietária do imóvel sequer figurou no polo passivo da lide, como era de rigor, ausente qualquer tentativa de localização do proprietário para respectiva citação pessoal, de modo a justificar a utilização de instrumentos editalício.

Inexiste ainda qualquer tentativa de ofício/requisição ao cartório a apurar eventual registro de propriedade, averbação ou outras anotações no bem descrito.

Portanto, verifica-se, a princípio, indícios de nulidade no procedimento de citação adotado na ação de usucapião.

Como leciona Benedito Silvério Ribeiro (Tratado de usucapião, v. 2, p. 1080): "A citação daquele em cujo nome esteja transcrito o imóvel é obrigatória, pois é pessoa certa e presumidamente o proprietário, nos moldes do disposto no art. 859 do Código Civil. Como interessado certo, deve ser citado pessoalmente, nas formas previstas na lei adjetiva civil".

É sabido que a citação válida é requisito indispensável para a regular constituição e desenvolvimento do processo, nos termos do art. 239 do CPC, in verbis:


"Art. 239. Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido "


Todavia, não obstante a literalidade dos referidos dispositivos, não se pode olvidar que a citação por edital tem caráter subsidiário, motivo pelo qual somente é cabível quando frustradas as demais tentativas de citação.

A falta desta providência acarreta nulidade do processo, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Estadual:

"(...) 3. Com relação ao proprietário e seu cônjuge, constantes no registro de imóveis, é indispensável, na ação de usucapião, a citação deles (e demais compossuídores e condôminos) como litisconsortes necessários, sob pena de a sentença ser absolutamente ineficaz, inutiliter data, tratando-se de nulidade insanável (...)." (STJ - REsp 1432579/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 23/11/2017).

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA SUSCITADA PELO APELANTE. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DOS CONFINANTE. APELANTE QUE DEVERIA TER SOLICITADO A DETERMINAÇÃO DA CITAÇÃO POR EDITAL. CONFINANTE INCERTO. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Na ação de usucapião deve ser realizada a citação daquele em cujo nome estiver registrado o imóvel usucapiendo, bem como dos confinantes. 3. Precedentes do TJMG (Apelação Cível 1.0267.11.001432-6/001, Relator (a): Des.(a) José Flávio de Almeida, 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 16/12/0015) e do TJPI (AC: 00028164020078180031 PI 200900010029649, Relator: Des. Francisco Antônio Paes Landim Filho, Data de Julgamento: 18/03/2015, 3ª Câmara Especializada Cível, Data de Publicação: 13/04/2015) 4. Apelo conhecido e desprovido.

(TJ-RN - AC: 20180076853 RN, Relator: Desembargador Virgílio Macêdo Jr., Data de Julgamento: 11/12/2018, 2ª Câmara Cível) – Destaque acrescido.

Ressalto que a citação genérica por edital dos terceiros interessados não supre a necessidade da citação pessoal do proprietário:

“Ação rescisória. Usucapião. Citação por edital. Coproprietária do imóvel falecida, há muito tempo, antes do ajuizamento. Certidões que apontavam para a existência de sucessores. Tentativa de localização destes não realizada. Edital que não fez qualquer referência a eventuais herdeiros. Nulidade da sentença e dos atos decisórios reconhecida. Nítida violação a disposição legal (artigos 214 e 231, do CPC/1973, correspondentes aos artigos 239 e 256, do CPC/2015). Caracterização de afronta ao princípio da ampla defesa e do contraditório (art. 5o, inc. LV, da CF). Art. 966, V, do CPC/2015. Ação procedente.” (TJSP - 1a Câmara de Direito Privado - Ação Rescisória no 2091845-89.2017.8.26.0000 - Rel. Augusto Rezende -j. 03/04/2018).

Nesse diapasão, demonstrada a ausência de citação do proprietário do bem usucapiendo, a priori, dentro dos limites de cognição do momento processual, tenho que evidenciada a probabilidade do direito vindicado, conclusão que não dispensa o respectivo aprofundamento instrutório na origem quanto a propriedade do bem.

Ademais, o periculum in mora está consubstanciado na própria natureza do pedido e na possibilidade de disposição do imóvel controvertido, a fim de resguardar terceiros de boa-fé e de assegurar o resultado útil da demanda, máxime porque, em se tratando de imóvel possivelmente pertencente à massa falida, pressupõe-se a conglomeração dos interesses coletivos do concurso de credores, inclusive há informação de que o bem teria sido arrematado em leilão.

Por fim, a tutela aqui...

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