Acórdão Nº 08057923520218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 17-09-2021

Data de Julgamento17 Setembro 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08057923520218200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0805792-35.2021.8.20.0000
Polo ativo
GABRIELLA BERGLUND e outros
Advogado(s): EMIVAL CRUZ CIRILO DA SILVA
Polo passivo
JESSICA BERGLUND e outros
Advogado(s): PAULO RAFAEL SOARES MESQUITA DE MEDEIROS

Agravo de Instrumento nº 0805792-35.2021.8.20.0000

Origem: 13ª Vara da Cível da Comarca de Natal

Agravante: Gabriella Berglund, rep. p. Øyvind Reidar Berglund

Advogado: André Dantas de Araújo (OAB/RN 8822)

Agravados: Jessica Berglund e outro

Advogada: Manoella Câmara da Silva (OAB/RN 12927)

Agravada: Késsia Cardoso do Vale

Advogado: Paulo Rafael Soares Mesquita de Medeiros (OAB/RN 14262)

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO ANULATÓRIA DE DOAÇÃO INOFICIOSA. DECISÃO QUE INDEFERIU A TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO LEVANTADA PELA AGRAVADA. AUTOS ELETRÔNICOS. PEÇAS OBRIGATÓRIAS. PRESCINDIBILIDADE. REJEIÇÃO. MÉRITO. ALEGADA NULIDADE DE DOAÇÃO DE IMÓVEL QUE EXCEDEU O PATRIMÔNIO DISPONÍVEL DA DOADORA. PRESENTE A VEROSSIMILHANÇA AS ALEGAÇÕES. LIMINAR EM AÇÃO POSSESSÓRIA DESIMPORTANTE PARA A ANÁLISE DA CAUSA. EXISTÊNCIA DE OUTROS BENS INTEGRANTES DO PATRIMÔNIO DA DOADORA NÃO DEMONSTRADA. DECRETAÇÃO DA INDISPONIBILIDADE DO BEM QUE SE IMPÕE. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE.


A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas, ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer ministerial, rejeitar a preliminar de não conhecimento do recurso, levantada pela agravada; e, no mérito, pela mesma votação, conhecer e dar provimento parcial ao agravo de instrumento, nos termos do voto da Relatora, que integra o acórdão.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito ativo interposto por Gabriella Berglund, assistida por seu genitor, Øyvind Reidar Berglund, em face de decisão proferida pelo Juízo da Décima Terceira Vara da Cível da Comarca de Natal, que nos autos da “ação de nulidade da doação inoficiosa c/c tutela de urgência” autuada sob o nº 0822412-57.2021.8.20.5001, ajuizada em desfavor de Jéssica Berglund, Késsia Cardoso do Vale e José Raimundo do Vale, indeferiu a tutela de urgência requerida na inicial.

Em suas razões recursais argumentou que a decisão recorrida não atentou às flagrantes ilegalidades que colocam em risco de perecimento o seu direito sucessório, haja vista a possibilidade de venda do bem com a consequente perda do objeto.

Narrou, em seguida, que a ré Késsia Cardoso do Vale (mãe da agravante) teria passado procuração pública de caráter comercial para o seu genitor, o réu José Raimundo do Vale, gerir seus bens e negócios, sendo que, um mês após o nascimento da agravante, aquele réu teria doado o único bem (um imóvel) de Késsia Cardoso do Vale para a ré Jéssica Berglund (irmã da agravante).

Asseverou que José Raimundo do Vale não possuía poderes para representar agravante, que era absolutamente incapaz, pois tinha apenas dez anos de idade, visto que a procuração que ele possuía tinha caráter exclusivamente comercial e não seria um instrumento válido em substituição do poder familiar ou termo de tutela, não restando comprovado, outrossim, que Késsia Cardoso do Vale era proprietária de outros bens.

Sustentou que a doação objeto desta demanda é nula de pleno direito, pois no momento da doação a demandada Késsia Cardoso do Vale tinha como único bem o imóvel doado, sem prejuízo do vício de representação de Jéssica Berglund na escritura de doação, uma vez que o mandatário não tinha legitimidade para representar a donatária.

Requereu, assim, a concessão de efeito ativo ao recurso para suspender os efeitos da doação, provendo-se o agravo ao final com a reforma da decisão agravada.

Foi deferido parcialmente o efeito ativo postulado, em decisão proferida no Id. 9951976.

A recorrida Jessica Berglund apresentou contrarrazões.

Em petição de Id. 10530645, a agravada Kessia Cardoso do Vale manifestou sua concordância com os pedidos formulados pela agravante.

Instada a se manifestar, a 7ª Procuradoria de Justiça opinou pela rejeição da preliminar arguida pela agravada e, no mérito, pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, a fim de ser “lançado na matrícula do imóvel em comento a existência da presente demanda judicial envolvendo eventual doação inoficiosa do bem litigioso, em observância ao poder geral de cautela”.

É o relatório.

V O T O

Conheço do recurso instrumental, presentes seus pressupostos de admissibilidade.

Rejeito, de antemão, a preliminar de não conhecimento do recurso por falta de peças obrigatórias, levantada nas contrarrazões, pois tal requisito é dispensado em sendo os autos eletrônicos, na forma do artigo 1.015, § 5º, do Código de Processo Civil.

Analisando os elementos constantes dos autos e as alegações objetivamente ofertadas pelas partes, entendo que o agravo comporta provimento parcial.

A questão discutida gravita em torno da nulidade da doação do imóvel descrito na exordial, pois a agravada Késsia Cardoso do Vale, mãe da agravante e então proprietária do bem, teria passado procuração pública de caráter comercial para o agravado José Raimundo do Vale, o qual, por sua vez, a despeito de se tratar do único bem da doadora e da suposta ausência de legitimidade do mandatário para tanto, teria doado aquele imóvel para Jéssica Berglund, irmã da doadora.

Com efeito, a magistrado de primeiro grau, ao indeferir a medida de urgência de suspensão dos efeitos do referido negócio jurídico, tomou por base ausência de verossimilhança das alegações autorais, por subsistir ainda a controvérsia sobre a propriedade do imóvel em discussão, notadamente diante as seguintes circunstâncias: (i) o Juízo da 22ª Vara Cível da Comarca de Natal deferiu a reintegração na posse do bem, em favor de Jéssica Berglund, em decisão confirmada pelo E. TJRN, representando um contrassenso se debruçar sobre o que já foi examinado por aquele Juízo; e (ii) para se reconhecer como inoficiosa a doação seria necessário conhecimento acerca da integralidade do patrimônio da doadora, ao passo que, em processo conexo, consta informação de que ela possuía outros bens à época da doação.

No entanto, a despeito dos argumentos empregados no decisum, cumpre destacar que a concessão de medida liminar destinada a evitar a possível alienação do bem litigioso não tem o condão de resultar na apontada ausência de segurança jurídica, na medida em que a decisão mencionada não se imiscuiu na análise da propriedade do imóvel, limitando-se a entender que a demandada Jéssica Berglund teria sido ofendida em sua posse, assegurando-lhe, portanto, a tutela jurisdicional correspondente.

Quanto à suposta existência de outros bens integrantes do patrimônio da doadora, é certo que a própria agravada Késsia Cardoso do Vale, ao ajuizar ação anulatória da doação do imóvel (processo nº 0822412-57.2021.8.20.5001), afirmou que não era proprietária de qualquer outro bem à época da realização do negócio, sendo relevante ainda que a alegação de propriedade de outros bens, seja nos autos de origem ou nos processos conexos, não veio ratificada por qualquer documentação idônea.

Existe, dessa forma, plausibilidade nas alegações recursais, havendo elementos suficientes para autorizar a decretação, ao menos neste momento de cognição sumária próprio da tutela provisória, de medida menos gravosa, isto é, a indisponibilidade do bem, diante das evidências de que a doação questão não teria observado a reserva da legítima e do patrimônio suficiente para subsistência da doadora. Mostra-se presente, por outro lado, o periculum in mora, tendo em vista o fundado risco de alienação do bem.

Assim, merece reparos o decisum recorrido.

Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial, dou provimento parcial ao agravo de instrumento, confirmando a decisão de Id. 9951976 para determinar a indisponibilidade do imóvel descrito pela agravante.

É como voto.

Natal/RN, 2021.



Desembargadora JUDITE NUNES

Relatora

Natal/RN, 14 de Setembro de 2021.

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