Acórdão Nº 08062251320178205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 02-09-2020

Data de Julgamento02 Setembro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08062251320178205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0806225-13.2017.8.20.5001
Polo ativo
TELEFONICA BRASIL S.A.
Advogado(s): PAULO EDUARDO PRADO
Polo passivo
EDMILSON BELO DE OLIVEIRA
Advogado(s): ESTHER MARIA FERNANDES DE OLIVEIRA, RASHID DE GOIS PIRESS

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. 1. INSCRIÇÃO INDEVIDA DO AUTOR EM CADASTRO DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. ABALO MORAL. DANO IN RE IPSA. ANTERIOR INSCRIÇÃO LEGÍTIMA. INEXISTÊNCIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 385 DO STJ. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 14 DO CDC. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO DEVER DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL. 2. QUANTUM FIXADO PELO JUÍZO A QUO PARA REPARAÇÃO EM PATAMAR QUE OBSERVA OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. 3. JUROS DE MORA. RELAÇÃO JURÍDICA EXTRACONTRATUAL. INCIDÊNCIA A PARTIR DO EVENTO DANOSO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 54 DO STJ. 4. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA A PARTIR DA DATA DO ARBITRAMENTO. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL CONSAGRADO NA SÚMULA 362 DO STJ. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, sem opinamento do ministério público, em conhecer e negar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pela TELEFÔNICA BRASIL S.A. em face da sentença proferida no Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN, no processo nº 0806225-13.2017.8.20.5001, proposto por EDMILSON BELO DE OLIVEIRA, ora apelado, nos seguintes moldes:

"(...)

Diante do exposto, julgo procedente o pedido inicialmente formulado, para confirmar a medida concedida liminarmente quanto à exclusão do nome da parte autora dos cadastros de proteção ao crédito. Condeno o réu no pagamento de indenização por danos morais que fixo em R$ 6.000,00 (seis mil reais), corrigida a partir desta data, acrescida de juros de mora de um por cento (1%) ao mês desde a inscrição. Condeno-o também no pagamento das despesas do processo e em honorários advocatícios, que fixo em dez por cento (10%) sobre o valor da indenização atualizada.

P. R. I.

NATAL /RN, 2 de junho de 2020.”

Nas razões do apelo, a TELEFÔNICA BRASIL S.A. relata que:

a) o autor ajuizou a presente demanda, alegando inscrição indevida do seu nome nos órgãos de proteção ao crédito inserido por débitos no valor de R$ 306,04 e de R$ 347,37, sem que tenha firmado contrato;

b) a negativação decorre da utilização dos serviços que geraram a emissão de faturas;

c) é legítima a contratação firmada entre as partes;

d) Sem a existência de prejuízo causado por ato ilícito praticado pela requerida, não há falar-se em responsabilidade civil, pois, segundo o art. 927 do Código Civil;

e) a parte apelada possui anotação em seu nome no cadastro de inadimplentes feita por terceiros, incabível, portanto, atribuir ao réu qualquer responsabilidade pelo alegado dano moral, sendo de rigor a incidência do entendimento do REsp 1386424 (julgamento de 27/04/2016 sob o rito dos recursos repetitivos) que entendeu ser estendida às entidades credoras a aplicação da Súmula 385 do STJ;

f) Com relação à pretensão da parte apelada em retirar seu nome do órgão de proteção ao credito, cumpre informar que o prazo estipulado para cumprimento é exíguo. Assim, na remota eventualidade manutenção da determinação necessário que se dilate e determine prazo razoável para cumprimento conforme disposição final do caput do art. 537, do Código de Processo Civil;

g) não há que se falar em incidência de multa, que inclusive pode ser revogada a qualquer momento, segundo a interpretação dada pela melhor doutrina aos incisos do § 1º do artigo 537 do CPC;

h) a parte requerente não demonstrou de maneira inequívoca estar presentes os pressupostos para concessão de liminar, estes elencados no artigo 294 e seguintes do Código de Processo Civil;

i) Em relação a multa, é totalmente desnecessária a aplicação dela no caso, porquanto, eventual ordem judicial sequer precisaria ser direcionada ao réu, nos termos do artigo 817, do Código de Processo Civil, podendo ser diretamente encaminhada à entidade responsável pelo cadastro, para imediata liberação;

j) é temerário o modo que o causídico atua, distribuindo diversas ações idênticas, entretanto, não sendo do juízo a atribuição de apurar tais fatos, é sempre oportuno ressaltar;

k) A liberdade de contratar é decorrente da liberdade individual, estando assegurada entre as garantias constitucionais dos direitos individuais (art. 5º, inciso XXXVI, da CF), sendo certo que o contrato sub judice, livremente pactuado entre as partes, é um ato jurídico perfeito e como tal deve ser fielmente obedecido;

l) o descumprimento dos deveres processuais pela parte apelada, há que responsabilizá-la, nos termos dos artigos , 77, 79, 80 e 81, do CPC;

m) o autor usou do processo com uma finalidade ilícita, postulando pretensão indevida de indenização, devendo ser imputadas as penas por litigância de má-fé;

n) a anotação restritiva em cadastros de crédito é prevista no artigo 43, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor;

o) ao inscrever os dados da parte nos órgãos de proteção ao crédito, não cometeu qualquer ato ilícito, mas, com fundamento no art. 188 do Código Civil, apenas exercitou regularmente seu direito, vez que consta débito de titularidade da parte requerente;

p) havendo débito em aberto, a inscrição dos dados da parte requerente nos órgãos de proteção ao crédito, constitui excludente da responsabilidade da requerida, em virtude da configuração da culpa exclusiva do consumidor (art. 14, § 3.º, II, do Código de Defesa do Consumidor);

q) nos termos do art. 14, §3º, I, do Código de Defesa do Consumidor, a inexistência do defeito na prestação do serviço exclui a responsabilidade objetiva do fornecedor;

r) incumbe à parte apelada provar a ocorrência dos alegados danos morais, nos termos dos artigos 373, I do CPC, contudo esta afirma sem provas que foi cobrado indevidamente;

s) a incidência dos juros deve partir do arbitramento da obrigação e sua correspondente quantificação por sentença judicial, nos termos do artigo 407 do Código Civil;

t) a incidência da correção monetária e dos juros de mora deve ser apenas a partir do arbitramento;

u) não verossimilhança das alegações do autor a autorizar inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º, VIII, do CDC;

v) não aceita eventual pedido de desistência do feito formulado pela parte apelada.

x) “ficam desde já prequestionada a afronta a Lei Federal, uma vez, data vênia, não foi observado o que preconiza o que dispõe os artigos 5º, V, X, XXXV, XXVI e LV, da Constituição Federal.

Requer, ao final, o conhecimento e provimento do apelo também com efeito suspensivo, reformando a sentença vergastada, para afastar o seu dever de indenizar ou que seja reduzido o valor fixado na sentença, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do apelado.

A parte autora, aqui apelada, em sede de contrarrazões, requer o desprovimento do apelo.

Instada a se manifestar, a Procuradoria de Justiça declina da sua intervenção no presente feito.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação cível e, com o seu julgamento, torna-se prejudicado o pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso.

A pretensão da ré se restringe a afastar a condenação para reparação por danos morais alegados pela parte autora ou a redução do valor arbitrado para a sua reparação.

O fato discutido nesta demanda compreende supostos débitos que teriam sido contraídos pelo demandante, nos valores de R$ 306,04 e R$ 347,37, vencidos, respectivamente, em 17.01.2017 e 04.12.2016, que resultou na inscrição do seu nome no banco de dados de restrição ao crédito, conforme documento de id 9355682 - Pág. 1 do processo principal.

De início, registro a falta de interesse recursal pertinente às insurgências quanto à aplicação de multa e concessão de liminar, porquanto estes temas não foram objeto da sentença em vergasta.

Pois bem.

Da análise do quadro probandi colacionado aos autos, depreende-se que a ré, ora apelante, não juntou qualquer instrumento contratual que legitimasse a cobrança do débito que ensejou a negativação do nome da parte autora, ressaltando que as telas de computador, documentos unilaterais, não têm o condão de provar a relação contratual que ensejou a inscrição do nome do autor no banco de danos de restrição ao crédito.

Portanto, os pleitos do demandante de desconstituir a dívida que lhe é cobrada, de retirar o seu nome do SERASA e de ser reparada por danos morais, devem ser acolhidos, tendo em conta que ficou demonstrado, de forma incontroversa, que teve o seu nome inscrito no órgão de proteção ao crédito de forma indevida.

De mais a mais, ausente demonstração nos autos de anterior inscrição legítima em nome da parte autora, não há que se falar em aplicabilidade da Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça.

Ressalte-se que, na situação acima posta, o dano moral independe de prova, uma vez que nesses casos, o mesmo é presumido, ou seja, é IN RE IPSA.

No ensinamento de Sérgio Cavalieri Filho tem-se, igualmente, a compreensão da desnecessidade de prova, quando se trata de dano moral puro (in Programa de Responsabilidade Civil, 5ª ed., 2ª tiragem, 2004, p. 100):

"...por se tratar de algo imaterial ou ideal a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Seria uma demasia, algo até impossível exigir que a vítima comprove a dor, a tristeza ou a humilhação através de depoimentos, documentos ou perícia; não teria ela como demonstrar o descrédito, o repúdio ou o desprestígio através dos meios probatórios tradicionais, o que acabaria por ensejar o retorno à fase da irreparabilidade do dano moral em razão...

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