Acórdão Nº 08064121820198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 09-01-2020

Data de Julgamento09 Janeiro 2020
Classe processualRECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Número do processo08064121820198200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 0806412-18.2019.8.20.0000
Polo ativo
JACKSON LEONARDO DA SILVA
Advogado(s): WALTER DE LACERDA AGUIAR
Polo passivo
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):

Recurso em Sentido Estrito 0806412-18.2019.8.20.0000

Origem: Juízo da Comarca de Goianinha

Recorrente: Jackson Leonardo da Silva

Advogado: Walter de Lacerda Aguiar

Recorrido: Ministério Público

Relator: Desembargador Saraiva Sobrinho


EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO E CORRUPÇÃO DE MENORES (ART. 121, §2°, I, III E IV DO CP E ART. 244-B DA LEI 8.609/90). PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO QUANTO AO PEDIDO DE DESAFORAMENTO, SUSCITADA PELA 4ª PJ. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO DA PRONÚNCIA. VEDAÇÃO DO ART. 427, §4º DO CP. PREJUDICIAL ACOLHIDA. MÉRITO. NULIDADE POR EXCESSO DE LINGUAGEM. MERA EXPOSIÇÃO DO JUÍZO DE SUSPEITA E DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO. VÍCIO INOCORRENTE. FRAGILIDADE DE PROVAS. FORTES INDÍCIOS DE AUTORIA. SUBSTRATO PROBANTE BASTANTE PARA O JUÍZO PERFUNCTÓRIO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. SENTENÇA DE PRONÚNCIA EM HARMONIA COM O ART. 413 DO CPP. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores integrantes da Câmara Criminal, à unanimidade de votos, acolher a preliminar suscitada pela 4ª Procuradoria de Justiça de não conhecimento do writ no tocante ao pleito de desaforamento. No mérito, em consonância com o Órgão Ministerial e pela mesma votação, desprover o Recurso, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. RESE interposto por Jackson Leonardo da Silva em face da decisão do Juízo da Comarca de Goianinha, o qual na AP 0101217-07.2017.8.20.0116, lhe pronunciou como incurso nos arts. 121, §2º, incisos I, III e IV do CP e art. 244-B do ECA (ID 4209542 – págs. 15/21).

2. Como razões (ID 4833509 – págs. 06 e ss.), sustenta:

i) nulidade da decisão por excesso de linguagem;

ii) ausência de indícios de autoria delitiva;

iii) necessidade de desaforamento.

3. Pugna pela anulação do decisum e, subsidiariamente, a absolvição.

4. Contrarrazões do MP constante do ID 4833510 (págs. 09 e ss.).

5. Parecer Ministerial pelo desprovimento (ID 4883827).

6. É o relatório.

VOTO

DA PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO QUANTO AO PLEITO DE DESAFORAMENTO

7. Acolho a prejudicial suso.

8. Isso porque é descabido pedido de tal natureza na atual fase processual, haja vista a necessidade do trânsito em julgado da pronúncia para tanto, conforme preceituado no art. 427, §4º do CPP.

9. Demais disso, como bem destacou a Douta PJ, “(...) sem embargo de destacar que o desaforamento do julgamento somente é cabível ao réu pronunciado, com trânsito em julgado da sentença de pronúncia, o que ainda não ocorreu, a irresignação da defesa a respeito da suposta imparcialidade do julgamento pode ser apreciada por via de PEDIDO DE DESAFORAMENTO, cuja competência seria do Pleno do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (art. 199, I, “a”, 14, do RITJRN1) (...)” (ID 4883827).

10. Daí, não conheço do mandamus nesta parte.

MÉRITO

11. Conheço parcialmente do Recurso.

12. No mais, sem razão o Recorrente.

13. No tocante à alegativa de nulidade da pronúncia por excesso de linguagem (ponto i), tenho-a também por improcedente.

14. Ora, não se identifica, nem minimamente, na fundamentação adotada por Sua Excelência, qualquer contextualização a denotar julgamento precipitado de mérito e, tampouco, consistência bastante a incutir nos jurados algum sentimento de parcialidade.

15. Na hipótese, embora de forma sucinta, o Juízo a quo trouxe um relato dos depoimentos e declarações, demonstrando circunstâncias fáticas hábeis justificar o pronunciamento (ID 4209542 – págs. 15/21).

16. Na verdade, verifico tão só a existência de mera exposição do juízo de suspeita, com base nos indícios de autoria e materialidade, atendendo à fundamentação exigida pelo art. 93, IX da CF e dentro das balizas do art. 413, §1º do CPP.

17. Sobre o tema, é o STJ:

“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. EXCESSO DE LINGUAGEM NA PRONÚNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. ENUNCIADO N. 211/STJ. NÃO CONHECIMENTO DA IRRESIGNAÇÃO... PRONÚNCIA. CARACTERIZAÇÃO DAS QUALIFICADORAS DO MOTIVO TORPE E RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. COMUNICABILIDADE AO AUTOR INTELECTUAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ILEGALIDADE NÃO CARACTERIZADA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Conquanto o § 1º do artigo 413 do Código de Processo Penal preveja que "a fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena", não há dúvidas de que a decisão que submete o acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri deve ser motivada, inclusive no que se refere às qualificadoras do homicídio, notadamente diante do disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, que impõe a fundamentação de todas as decisões judiciais (...) 3. Agravo improvido.”

(AgRg no AREsp 835.542/PI, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 20/09/2018, DJe 28/09/2018).

18. Quanto à negativa de autoria (ponto ii), é igualmente improsperável a pretensão recursal.

19. Com efeito, malgrado sustente a insuficiência probante a demonstrar o animus necandi, vislumbro, ao revés, a presença de elementos razoáveis para esta fase de prelibação, isto em homenagem ao preceito in dubio pro societatis.

20. Para bem compreender a quaestio, impõe transcrever excerto do julgado requestado, onde o Magistrado proclama a admissibilidade da imputação, segundo o processamento comum aos crimes dolosos contra a vida (ID 4252110 – págs. 05/18):

“(...) a materialidade do crime de homicídio restou demonstrada pelo Laudo de Exame Necroscópico carreado às fls. 31/36, em que se concluiu que a morte da vítima se deu por ferimento de instrumento pérfuro-cortante (arma branca), bem como pelos depoimentos colhidos durante a instrução processual.

Por sua vez, no tocante à autoria, tem-se que, apesar do acusado ter negado o fato de ser mandante do ato criminoso descrito na denúncia, podem ser colhidos dos autos indícios de sua autoria, tendo em mira que as testemunhas Renato Dias da Silva Júnior e Wellington Guedes de Carvalho confirmaram que, no curso das investigações, descobriram que a motivação do crime seria uma suposta dívida de drogas existente entre Jackson Leonardo da Silva e Adaílson Silva de Carvalho.

Além disso, cabe salientar que no depoimento prestado pela mãe da vítima, a Sra. Maria José, pode-se inferir que a vítima já vinha sendo ameaçada, haja vista que, apesar de não ter dado informações claras, por medo de retaliação, a referida testemunha afirmou em juízo que seu filho havia lhe dito que estaria perto de morrer, tendo ela, ainda, afirmado que há poucos dias teria pago uma dívida por ele contraída.

O declarante Alexandre da Costa, companheiro da Sra. Maria José, confirmou a versão por ela contada em juízo, afirmando que dias antes da morte da vítima Adaílson, ela teria pago uma dívida que ele tinha contraído junto a "Léo da Batalha".

Por fim, tem-se que a testemunha de defesa Ana Paula Bernardo disse em juízo que, após a morte de Adaílson, ouviu comentários de que o acusado teria sido o mandante do homicídio narrados nestes autos.

Desse modo, a partir do que restou apurado no presente feito, verifica-se que a existência do fato e os indícios suficientes de autoria/participação estão demonstrados na espécie (...)”.

21. Destarte, não é possível extrair prova induvidosa para afastar a autoria, devendo, por isso, eventuais dúvidas serem resolvidas em favor da sociedade, bastando, nesta fase de cognição não exauriente, a presença de indícios do envolvimento do agente no delito.

22. Nesse sentido, vem entendendo a doutrina, como se vê do escólio de Renato Brasileiro de Lima (in Manual de Processo Penal 2017):

“... a pronúncia encerra um juízo de admissibilidade da acusação de crime doloso contra a vida, permitindo o julgamento pelo Tribunal do Júri quando o juiz sumariante visualizar a possibilidade de haver a condenação do acusado. Sobre ela, o art. 413, caput, do CPP, dispõe que, estando convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve o juiz sumariante pronunciar o acusado fundamentadamente. Apesar de o art. 564, III, “f”, do CPP, referir-se à pronúncia como espécie de sentença, sua verdadeira natureza jurídica é de decisão interlocutória mista não terminativa ...”.

23. Do mesmo modo é a jurisprudência desta Corte:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO. PRONÚNCIA. ALEGADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NEGATIVA DE AUTORIA. NÃO ACOLHIMENTO. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 413 DO CPP. FASE NA QUAL PREVALECE O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE. QUESTÃO A SER SUBMETIDA AO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (RESE 0806645-49.2018.8.20.0000, Rel. Des. Glauber Rêgo, julgado em 04/10/2018).

24. Por derradeiro, penso oportuno trazer a interpretação do órgão ministerial atuante nesta Instância, ao destacar a congruência dos relatos coligidos, respaldando a diretriz do Juiz a quo, para ao fim concluir:

“(...) 19. No caso sob exame, a materialidade do crime está consubstanciada no LAUDO DE EXAME NECROSCÓPICO da vítima ADAILSON SIVA DE CARVALHO (Id. 4209534 - páginas 9-11), além de serem apontados os indícios de autoria (o que já basta para a pronúncia, não se exigindo nessa fase prova plena e conclusiva), verificados nos depoimentos constantes do feito: Depoimentos dos...

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