Acórdão Nº 08068972120228205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 24-11-2023

Data de Julgamento24 Novembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08068972120228205106
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0806897-21.2022.8.20.5106
Polo ativo
FRANCISCO JAILTON BENTO
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS registrado(a) civilmente como LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS
Polo passivo
MUNICIPIO DE MOSSORO
Advogado(s):

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE MOSSORÓ/RN. REVISÃO GERAL ANUAL DOS VENCIMENTOS. PRETENSÃO DE OBTER FIXAÇÃO DO VENCIMENTO INICIAL DA CARREIRA NO VALOR DO SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL VIGENTE, NOS TERMOS DO ART. 47, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 03/2003. NECESSIDADE DE EDIÇÃO DE DECRETO MUNICIPAL. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO FIXAR O ÍNDICE OU DETERMINAR QUE O EXECUTIVO O FAÇA. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, INCLUSIVE POR INTERMÉDIO DA SÚMULA VINCULANTE 37. SENTENÇA MANTIDA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto da relatora que integra o presente acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por FRANCISCO JAILTON BENTO contra sentença proferida pela Juíza de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró/RN, que julgou improcedente a pretensão formulada nos autos da ação ordinária promovida em desfavor do MUNICÍPIO DE MOSSORÓ/RN, tendo como escopo obter provimento jurisdicional para determinar ao ente público a fixação do vencimento inicial da carreira (referência I do nível fundamental) no valor do salário mínimo nacional vigente, nos termos do art. 47, parágrafo único, da Lei Complementar Municipal nº 03/2008, além de condená-lo ao pagamento retroativo das diferenças salariais e seus reflexos, acrescido de correção monetária e juros moratórios.

Nas suas razões, alega o apelante, em síntese, que, embora a Súmula Vinculante nº 37 do Supremo Tribunal Federal disponha que não cabe ao Poder Judiciário aumentar vencimentos de servidores públicos, faz jus a revisão geral anual dos seus vencimentos, pois, no âmbito do Município de Mossoró/RN, a Lei Complementar Municipal nº 003/2008, em seu art. 47, estabeleceu como piso remuneratório o valor do salário mínimo previsto no artigo 7º, inciso IV, da Constituição do Brasil, de modo que a referida norma possui eficácia plena e imediata, não cabendo margem para discricionariedade por parte do ente público municipal.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, reformando a sentença para julgar procedente a pretensão autoral.

Contrarrazões apresentadas nos autos.

Com vista dos autos, a Procuradora de Justiça declinou o interesse no feito, por entender que a matéria discutida na lide prescinde de sua intervenção.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

Busca a parte demandante, por meio do presente recurso, obter provimento jurisdicional para determinar ao ente público a fixação do vencimento inicial da carreira (referência I do nível fundamental) no valor do salário mínimo nacional vigente, nos termos do art. 47, parágrafo único, da Lei Complementar Municipal nº 03/2008, além de condená-lo ao pagamento retroativo das diferenças salariais e seus reflexos, acrescido de correção monetária e juros moratórios.

Pois bem.

A Constituição Federal, ao tratar do tema, assim dispõe em seu art. 37, inciso X:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento) [destaquei]

No mesmo diapasão, o art. 26, inciso X, da Constituição Estadual, estatui:

Art. 26. A administração pública direta, indireta ou Fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios, obedece aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, observando-se: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 13, de 2014)

(...)

X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 8º, do art. 28, desta Constituição, somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 13, de 2014) [destaquei]

Não restam dúvidas de que o inciso X, do art. 26, da Constituição Estadual assegura aos servidores públicos a revisão geral da remuneração, sempre na mesma data e sem distinção de índices, a fim de se evitar o achatamento salarial, todavia, estamos diante de uma norma de eficácia limitada, que depende da edição de lei específica destinada a fixar o mencionado reajuste, cuja iniciativa está afeta à atuação privativa do Poder Executivo, isto é, necessita de processo de elaboração de lei com tal fim, como, aliás, se depreende do próprio texto constitucional.

Com efeito, a Súmula Vinculante nº 37 (RE 592.317-RG) fixou o entendimento de que não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia, debate antigo que vem se consolidando desde a edição da Súmula nº 339 do STF.

Adiciono que, no julgamento eletrônico do Recurso Extraordinário com Agravo nº 909.437-RG, em sede de Repercussão Geral, da relatoria do Ministro Roberto Barroso, atinente aos servidores do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral de tema semelhante que, mutatis mutandis, se aplica ao caso sub judice, a saber:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REAJUSTE DE 24% PARA OS SERVIDORES DO JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. LEI Nº 1.206/1987. ISONOMIA. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. 1. Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia. Súmula 339/STF e Súmula Vinculante 37. 2. Reconhecimento da repercussão geral da questão constitucional, com reafirmação da jurisprudência da Corte, para assentar a seguinte tese: “Não é devida a extensão, por via judicial, do reajuste concedido pela Lei nº 1.206/1987 aos servidores do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, dispensando-se a devolução das verbas recebidas até 01º.09.2016 (data da conclusão deste julgamento)”. 3. Recurso conhecido e provido. (STF, ARE 909437 RG, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-217 DIVULG 10-10-2016 PUBLIC 11-10-2016)

Há, inclusive, Repercussão Geral reconhecida no ARE 701.511 RG/SP, Tema 624, entre inúmeras outras decisões da Suprema Corte, no mesmo sentido, que sedimentam a jurisprudência: RE 529.489; RE 942.064 AgR; AI 713.975-AgR; RE 554.604-AgR; RE 505.194 AgR; e RE 327.621-AgR, esta última com a seguinte ementa:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO. INFLAÇÃO. IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. GARANTIA CONSTITUCIONAL DA QUAL NÃO DECORRE O DIREITO À REVISÃO GERAL DE QUE TRATA O INCISO X DO ART. 37 DA CARTA DE OUTUBRO (REDAÇÃO ORIGINÁRIA). NECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO FIXAR O ÍNDICE OU DETERMINAR QUE O EXECUTIVO O FAÇA. JURISPRUDÊNCIA DO STF. A garantia constitucional da irredutibilidade de vencimentos não autoriza o Poder Judiciário a fixar índice de revisão geral, na forma do inciso X do art. 37 da Magna Carta (redação originária), dada a necessidade de lei específica, cujo processo legislativo é de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. Não altera esse entendimento o suposto fato de as leis específicas editadas pelo ente federado terem concedido aumentos inferiores aos índices inflacionários apurados no período. Mesmo que reconheça mora do Chefe do Poder Executivo, o Judiciário não pode obrigá-lo a apresentar projeto de lei que trate da revisão geral anual da remuneração dos servidores, prevista no inciso X do art. 37 da Lei Maior. Ressalva do entendimento pessoal do Relator. Precedentes: ADI 2.061, Relator Ministro Ilmar Galvão; MS 22.439, Relator Ministro Maurício Corrêa; MS 22.663, Relator Ministro Néri da Silveira; AO 192, Relator Ministro Sydney Sanches; e RE 140.768, Relator Ministro Celso de Mello. Agravo regimental desprovido. (STF, RE 327621 AgR, Relator(a): CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 21/02/2006, DJ 27-10-2006 PP-00046 EMENT VOL-02253-04 PP-00677)

A iniciativa de desencadear o procedimento legislativo para a concessão da revisão geral anual aos servidores públicos é ato discricionário privativo, não podendo o Judiciário ser compelido a reajustar os vencimentos dos servidores fora dos padrões orçamentários planejados de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, deliberação que se respalda no juízo da conveniência e oportunidade da Administração.

Sublinhe-se, por fim, que mesmo se houvesse resistência do Poder Executivo em encaminhar o Projeto de Lei, e o autor optasse pelo ajuizamento de Mandado de Injunção, ainda assim não caberia tal medida para proceder à revisão geral anual, conforme entendimento do STF (MI 4.506 AgR-ED).

Dito isso, alega a parte apelante que, embora a Súmula Vinculante nº 37 do Supremo Tribunal Federal...

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