Acórdão Nº 08072686820208205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal Temporária, 31-05-2022

Data de Julgamento31 Maio 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08072686820208205004
Órgão1ª Turma Recursal Temporária
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0807268-68.2020.8.20.5004
Polo ativo
BANCO DO BRASIL SA
Advogado(s): JOSE ARNALDO JANSSEN NOGUEIRA
Polo passivo
HEITOR PENALVA GOMES
Advogado(s): GRACILIANO DE SOUZA FREITAS BARRETO, CLARA BILRO PEREIRA DE ARAUJO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

PRIMEIRA TURMA RECURSAL PROVISÓRIA

RECURSO CÍVEL INOMINADO VIRTUAL N° 0807268-68.2020.8.20.5004

12º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

RECORRENTE: BANCO DO BRASIL S/A

ADVOGADO: SÉRVIO TÚLIO DE BARCELOS E JOSÉ ARNALDO JANSSEN NOGUEIRA

RECORRIDA: HEITOR PENALVA GOMES

ADVOGADO: JOSÉ LOPES DA S. NETO E GRACILIANO DE SOUZA F. BARRETO

JUIZ RELATOR: JOSÉ MARIA NASCIMENTO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. AUSÊNCIA DE ENVIO DE CARTÃO SOLICITADO. ABERTURA DE NOVA CONTA CARTÃO SEM AUTORIZAÇÃO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INDEPENDE DE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.



ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Primeira Turma Recursal Temporária dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso, para manter a sentença. Com condenação do recorrente em custas e honorários advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.

Natal/RN, 24 de maio de 2022

JOSÉ MARIA NASCIMENTO

Juiz Relator

SENTENÇA

I – RELATÓRIO

Dispensado o relatório na forma do artigo 38 da Lei nº 9.099/95.

II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – Das preliminares

Inicialmente, rejeito a preliminar de falta de interesse de agir suscitada em contestação. Ademais, o interesse processual está presente sempre que a parte tenha a necessidade de exercer o direito de ação para alcançar o resultado que pretende, relativamente à sua pretensão e, ainda mais, sempre que aquilo que se pede no processo seja útil sob o aspecto prático.

Com efeito, a imposição da utilização da via administrativa como condição para prestação jurisdicional configura ofensa à garantia constitucional do livre acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF). Descabido o condicionamento do direito de ação à comprovação, pelo consumidor, de pretensão resistida administrativamente.

Assim, rejeito a preliminar suscitada

II. 2 – DO MÉRITO

Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais, na qual aduz o autor, em síntese, que teve o cartão bloqueado em razão da falha na prestação do banco réu.

Explica o autor que em março/2019, solicitou um novo plástico, haja vista que seu cartão encontrava-se desgastado, com dificuldade para a leitura do Chip. Suscita que aguardou por 04 meses, sem que o cartão fosse entregue ao autor, razão pela qual, externou o desejo de encerramento da conta junto à instituição ré.

Alega que em face da reclamação, lhe foi entregue um novo plástico, tendo o autor começado a utilizar o cartão, sem se preocupar com o pagamento, haja vista que o pagamento era habilitado na função débito.

Suscita que em 01.10.2019, ao tentar realizar uma compra na função débito, a transação não foi autorizada, e ao entrar em contato com o banco réu, foi informado que o cartão foi bloqueado em razão da ausência de pagamento da fatura vencida em setembro/2019.

Explana que posteriormente tomou conhecimento que foi aberta uma segunda conta cartão, sem sua autorização, bem como foi cobrado indevidamente por anuidade.

Requer a restituição em dobro do valor pago pela anuidade, o cancelamento da conta cartão nº 97714212, a entrega do cartão sucesso do Ouro Card Infinite Visa Estilo, e uma indenização por danos morais.

Por sua vez, o réu alega que o autor é correntista do Banco do Brasil, titular do cartão Ourocard Infinite Visa Estilo, desde 28.07.2014. Explana que foi feito uma solicitação de cartão em 29/04/2019, porém, com a ocorrência de extravio, o mesmo não foi entregue, e em novo contato no dia 09/08/2019, foi solicitada uma segunda via do cartão, entretanto para outra conta cartão. Aduz que esta segunda via substituiria o plástico que o demandante vinha utilizando, e a solicitação mais antiga pertence a outra conta cartão. Explica que em 12.08.2019, o autor recebeu e desbloqueou o cartão de outra conta cartão, não sendo este o que substituiria o anterior. Relata que estavam sendo geradas faturas para ambas as contas, sendo os cartões utilizados no período, porém, o autor vinha pagando somente a fatura do cartão anterior. Se insurge em face do pedido de danos morais. Pugna, ao final, pela improcedência dos pedidos.

Inicialmente, cabe frisar que a presente lide deverá ser analisada nos moldes da legislação do consumidor, uma vez que partes autora e ré se qualificam como, respectivamente, consumidor e fornecedora, nos moldes dos artigos e da Lei 8.078/90.

Apesar da inversão do ônus da prova prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não se mostrar obrigatória, verificam-se, no caso em análise, a verossimilhança das alegações autorais e a hipossuficiência do consumidor requerente. Assim, baseada no dispositivo de lei mencionado, inverto o ônus da prova, por entender ser da instituição requerida o ônus de demonstrar a impertinência do direito alegado.

Sobre o tema, o STF já decidiu na ADI STF 2541/DF, bem como pela Súmula 297 do STJ, que as instituições financeiras estão sujeitas as regras e sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos:

STFCÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA [ART. 3º, § 2º, DO CDC]. MOEDA E TAXA DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRASIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. (STF – ADI n°. 2591/DF – Ação Direta de Inconstitucionalidade, rel. Min. CARLOS VELLOSO, rel. p/ Acórdão: Min. EROS GRAU, Julgamento: 07/06/2006, DJ 29/09/2006, Órgão Julgador: Tribunal Pleno) (grifos nossos)

Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. (Súmula STJ n°. 297).

Nessa senda, tem-se que as instituições financeiras se enquadram na condição de prestador serviço, e como tal respondem por eventuais danos causados ao consumidor, resultantes de sua atividade.

A responsabilidade, como fornecedora de serviços, é objetiva nos termos do artigo 14 do CDC, que assim dispõe: O fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a fruição e riscos”. Tal responsabilidade é afastada apenas quando comprovada a existência de uma das excludentes do § 3º, quais sejam, a inexistência do defeito, culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros.

No caso dos autos, o autor se insurge contra a má prestação do serviço concernente na abertura de uma segunda conta cartão, haja vista que a sua solicitação foi de um novo plástico, isto é, uma substituição do anterior, bem como na falha quanto ao dever de informação, pois não lhe foi informado que o novo cartão encontrava-se na função “não optante” do débito automático, o que ocasionou o bloqueio do cartão e a negativa na autorização da compra.

Nessa senda, percebe-se que o banco réu deixou de dar a adequada divulgação quanto aos termos da solicitação do novo cartão em abril de 2019, vez que cabia a este informar que o mesmo tratava-se de uma nova conta, e não uma substituição do plástico anterior, bem como que o pagamento não encontrava-se na função “débito automático”, e que era bloqueado para a função débito, sendo de sua responsabilidade qualquer falha relacionada à prestação de serviços.

Conforme narrativa do autor, em abril de 2019, solicitou a emissão de um novo plástico, haja vista que o degaste do seu cartão em uso, tendo esperado por 04 meses para o recebimento do novo cartão, que de forma equivocada pelo banco réu, foi lançado como uma “nova conta cartão”, sem sua solicitação.

A despeito de tais fatos, o banco réu aduz que foi aberta uma solicitação de novo cartão vinculado a uma nova conta cartão, sem contudo, explicar o motivo da desvinculação da conta já existente, e não substituição do plástico já utilizado.

Desta forma, não comprovou o banco réu que houve informação clara e objetiva no ato da solicitação do novo plástico, restado evidente o prejuízo acarretado diante dos fatos narrados.

Nessa senda, era do réu o dever de informar claramente aos seus clientes as condições dos produtos adquiridos, o que não restou comprovado nos autos, e acabou induzindo a erro, derivado de propaganda enganosa1, violando direito do cliente consumidor à informação clara sobre o negócio que formalizava (Código de Defesa do Consumidor, Lei n° 8.078/90, arts. 6o, III, e art. 46) e, por isso, deve reparar os danos que causou.

Assim, caberia ao demandado acostar aos autos, a explicação clara e objetiva ao consumidor sobre a solicitação dos cartões, não o fazendo, resta omisso em seu ônus probandi, nos termos do artigo 373, inciso II do NCPC, restando acatada a tese da parte autora em sua exordial, de que não foi informado sobre a abertura de nova conta...

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