Acórdão Nº 08075233720198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 26-11-2019

Data de Julgamento26 Novembro 2019
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo08075233720198200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: HABEAS CORPUS CRIMINAL - 0807523-37.2019.8.20.0000
Polo ativo
RODRIGO FERNANDES DE PAIVA
Advogado(s): RODRIGO FERNANDES DE PAIVA
Polo passivo
JUIZ DE DIREITO DA 5ª VARA CRIMINAL DE NATAL
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa

Habeas Corpus, com pedido liminar, nº 0807523-37.2019.8.20.0000

Impetrante: Dr. Rodrigo Fernandes de Paiva - OAB/RN 16370B

Paciente: Rodrigo Fernandes de Paiva

Aut. Coatora: Juiz de Direito da 5ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN

Relator: Desembargador Gilson Barbosa

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR. CRIME DE EXPLORAÇÃO DE PRESTÍGIO (ART. 357 DO CPB) E LAVAGEM DE DINHEIRO (ART. 1º, CAPUT, DA LEI Nº 9.613/1998). PRETENSO TRANCAMENTO PARCIAL DA AÇÃO PENAL POR FALTA DE JUSTA CAUSA PARA O DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO. DESCABIMENTO. HIPÓTESE APLICÁVEL SOMENTE NOS CASOS DE ATIPICIDADE DA CONDUTA OU QUANDO NÃO HÁ INDÍCIOS DE AUTORIA E EXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA. EXISTÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO PARA SUPEDANEAR A DENÚNCIA. REQUISITOS DO ART. 41, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ATENDIDOS. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER CAUSA DE REJEIÇÃO DA DENÚNCIA PREVISTA NO ART. 395 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA. CONSONÂNCIA COM PARECER DO 27º PROMOTOR DE JUSTIÇA, EM SUBSTITUIÇÃO NA 9ª PROCURADORIA DE JUSTIÇA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, em consonância com o parecer do 27º Promotor de Justiça, em substituição legal na 9ª Procuradoria de Justiça, conhecer do presente habeas corpus e, no mérito, denegar a ordem, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar impetrado pelo advogado Rodrigo Fernandes de Paiva, em causa própria, sob a alegação de estar sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal de Natal.

Na exordial, requereu o trancamento parcial da Ação Penal de n.º 0105017-29.2019.8.20.0001, na qual foi denunciado pelo suposto cometimento do crime de exploração de prestígio, previsto no art. 357 do Código Penal, em concurso material com o delito de lavagem de dinheiro, tipificado no art. 1º da Lei 9.613/1998.

Para tanto, sustentou a ausência de justa causa em razão do recebimento indevido da denúncia pelo suposto delito de lavagem de dinheiro, visto que em relação ao crime de LAVAGEM DE DINHEIRO, revela a FLAGRANTE ILEGALIDADE que precisa ser afastada, na medida em que o único fato acusatório relevante narrado, qual seja, o efetivo recebimento da indevida importância em dinheiro, não se mostra diverso daquele imputado a título de circunstância constitutiva do tipo penal de EXPLORAÇÃO DE PRESTÍGIO (ID. 4500895- Pág. 13;). Logo, argumentou que a conduta do paciente não se configura no crime inserto no art. 1º da Lei 9.613/1998, o que justificaria a pretensão.

Destacou que a decisão proferida pelo juízo a quo, que confirmou o recebimento da denúncia dos delitos de exploração de prestígio e lavagem de dinheiro, resulta em dupla penalidade, acarretando bis in idem. E que a mesma peça é inepta quanto ao delito de lavagem de dinheiro, por não atender os requisitos previstos no art. 41 do CP.

Por fim, requereu a concessão liminar da ordem impetrada, para determinar a suspensão da audiência de instrução criminal, com data marcada para o dia 11 de novembro de 2019, às 08:30 horas, até o trânsito em julgado do presente writ. No mérito, pugnou pelo trancamento parcial da ação penal nº 0105017-29.2019.8.20.0001, relativo ao crime de lavagem de dinheiro, por absoluta falta de justa causa, ante a inépcia da denúncia.

Acostou aos autos os documentos de ID. 4500894 – 4500894.

Na certidão ID. 4522473, expedida pela Secretaria Judiciária deste Tribunal, consta a inexistência de outra ordem de habeas corpus impetrada em favor do paciente.

Liminar indeferida, (ID. 4575526 Pág. 01-06).

A autoridade apontada como coatora apresentou informações em ID 4660953, destacando a decisão que indeferiu o pedido de inépcia da denúncia formulado pelo ora paciente, apontando que a inicial acusatória preencheu aos requisitos exigidos pelo art. 41 do Código de Processo Penal.

Instado a se pronunciar, ID. 4685738 Pág. 01-06, o 27º Promotor de Justiça, em substituição legal na 9ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

Cinge-se a questão principal deste writ na análise da ocorrência ou não de constrangimento ilegal sofrido pelo paciente, o qual pretende o trancamento parcial da ação penal, alegando que é inepta a denúncia ofertada em seu desfavor, no que se refere ao delito de lavagem de dinheiro, eis que o recebimento integral desta configura dupla penalidade, a ensejar a ausência de justa causa.

Sabe-se que a ação constitucional de habeas corpus pode ser veiculada para o trancamento da ação penal, ainda que ausente o encarceramento provisório, uma vez que a persecução criminal pode gerar restrição à liberdade do indivíduo.

Porém, somente será cabível nos casos em que configurada de plano a ausência de justa causa para o seu prosseguimento, restando patente e induvidosa a improcedência da acusação, já que não é possível, nesta via de exceção, a dilação probatória.

Da mesma forma, será pertinente o trancamento da ação pela via estreita do writ quando o fato descrito na peça acusatória for atípico ou inexistentes indícios suficientes de autoria e materialidade, assim como diante de denúncia que não preencha os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal[1].

Compulsando os autos, entendo que não assiste razão ao impetrante, pois não foi possível visualizar a ocorrência de quaisquer dessas hipóteses.

Depreende-se que os documentos acostados, bem como as alegações do impetrante, não são hábeis a demonstrar o apontado constrangimento ilegal, pois a fundamentação contida na decisão que confirma o recebimento da denúncia, sumariamente, não merece reparos.

Contrariamente ao sustentado na exordial, parece-me que o processo vem tramitando nos termos da legalidade. Isso porque, examinando os documentos juntados aos autos, em especial a peça acusatória, percebe-se que a denúncia preenche os requisitos mínimos legais previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, pois houve a exposição do fato criminoso e todas as suas circunstâncias, tendo o órgão acusador delimitado a conduta do réu de forma clara e apta a ensejar o regular processo e o exercício da ampla defesa não restando portanto, comprovado o fumus boni iuris, requisito imprescindível à concessão da ordem.

Vale destacar por oportuno, que para a configuração do crime de lavagem de dinheiro, é necessário a realização de um dos verbos nucleares do tipo, consistentes em ocultar, esconder, simular, encobrir, dissimular, disfarçar ou alterar a verdade.

Sabe-se que o delito de lavagem de dinheiro está previsto no art. 1.º da Lei de n.º 9.613/1998, com as alterações trazidas pela Lei n.º 12.683/2012, nos seguintes termos:


“Art. 1º - Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.”

Nucci, sobre o referido tipo penal, assim destacou:

“Análise do núcleo do tipo: converter (transformar) em ativos (bens e valores em geral) lícitos (m harmonia com o ordenamento jurídico, logo, visíveis ao Estado) é a conduta, cujo objeto pode ser bem, direito ou valor proveniente de infrações penais antecedentes. Esta é a autêntica figura de lavagem de dinheiro, pois o agente transmuda o bem, valor ou direito ilícito em algo lícito.” (NUCCI, Guilherme de Souza, Leis penais e processuais penais comentadas. 7 ed. ver. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 486)

In casu, extrai-se da denúncia trecho que se refere ao delito de lavagem de dinheiro, descrito conforme o tipo penal:

“(...) Por fim, ao receberem, em espécie, o montante de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), FLÁVIO HUMBERTO DE NORONHA FREIRE E RODRIGO FERNANDES DE PAIVA ocultaram a natureza, a origem e a destinação de valores provenientes diretamente da exploração de prestígio e da anterior corrupção ativa. Sem registros formais dessa movimentação financeira, o denunciado RODRIGO, valendo-se da estratégia criminosa empregada na entrega, negou em interrogatório o recebimento da quantia que lhe coube no ajuste, conforme revelado no interrogatório de FLÁVIO HUMBERTO.(...)”

Diante do exposto, é possível concluir, pelo menos nesta fase inicial, que os elementos informativos apresentados pelo Ministério Público apontam, de forma suficiente, a prática do delito do art. 1.º da Lei de n.º 9.613/1998.

O exaurimento da exploração de prestígio caracteriza-se pelo simples fato do agente tentar influenciar um funcionário ou órgão público, com vantagem ou promessa de vantagem. Conduta distinta é a prática de atos visando ao branqueamento do dinheiro recebido por meio de pagamentos estruturados, sendo essa dissimulação caracterizada como lavagem de dinheiro, que não necessita, por isso, que, para a consumação, o agente cumpra todas a etapas da lavagem, mas simplesmente por meio de qualquer ato de colocação dissimulada, como é o caso dos autos.

Ademais, o julgador a quo, ao confirmar o recebimento da denúncia, evidenciou que a materialidade está demonstrada e há fortes indícios da autoria, consoante às circunstâncias dos fatos e participação de cada acusado na ação delituosa, suficientes para o seu recebimento, estando presentes os requisitos contidos no artigo 41 d...

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