Acórdão Nº 08076400220208205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 2ª Turma Recursal, 13-12-2022

Data de Julgamento13 Dezembro 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08076400220208205106
Órgão2ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0807640-02.2020.8.20.5106
Polo ativo
ANTONIO FLAVIANO VIEIRA DA SILVA e outros
Advogado(s): PAULO CASTRO DA SILVA, ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
Polo passivo
BANCO BRADESCO S/A e outros
Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO, PAULO CASTRO DA SILVA

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

2ª TURMA RECURSAL

Gabinete do Juiz Fábio Antônio Correia Filgueira

RECURSO INOMINADO CÍVEL N.º 0807640-02.2020.8.20.5106

RECORRENTE: ANTONIO FLAVIANO VIEIRA DA SILVA

ADVOGADO: PAULO CASTRO DA SILVA

RECORRIDO: BANCO BRADESCO S/A

ADVOGADO: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

JUIZ RELATOR: FÁBIO ANTÔNIO CORREIA FILGUEIRA

EMENTA: RECURSOS INOMINADOS. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINARES. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA E FALTA DE INTERESSE DE AGIR PROCESSUAL. AFASTAMENTO. MÉRITO. INSCRIÇÃO NOS CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DOS DÉBITOS. ILICITUDE DAS NEGATIVAÇÕES. SÚMULA 385 DO STJ. AUSÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO ANTERIOR ÀS DECLARADAS ILEGÍTIMAS. NÃO APLICAÇÃO. CONFIGURAÇÃO DOS DANOS MORAIS IN RE IPSA. ARBITRAMENTO. PARTICULARIDADES DO CASO. CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECURSOS CONHECIDOS. DESPROVIMENTO DE UM DELES E PROVIMENTO DO OUTRO.

ACÓRDÃO

DECIDEM os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, rejeitar a impugnação à gratuidade da justiça, formulada pelo Banco nas suas contrarrazões, e conhecer dos Recursos Inominados interpostos por ambas as partes; em relação ao do recorrente/réu, rejeitar as preliminares de anulação da sentença por cerceamento de defesa e da falta de interesse de agir processual e negar-lhe provimento; quanto ao da recorrente/autora, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da condenação, tão só, em desfavor do recorrente/réu.

Natal/RN, data conforme o registro do sistema.

FÁBIO ANTÔNIO CORREIA FILGUEIRA

1º Juiz Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Recursos Inominados interpostos por ANTÔNIO FLAVIANO VIEIRA DA SILVA e BANCO BRADESCO S/A em face da sentença que rejeitou a preliminar da falta de interesse de agir na ação, suscitada na contestação, e julgou procedentes, em parte, os pedidos autorais deduzidos contra a referida instituição financeira, quando declarou a inexistência das dívidas descritas na vestibular e determinou a exclusão da negativação delas, porém, denegou o pedido de danos morais, sob o fundamento de incidência da Súmula 385 do STJ.

Em suas razões, o recorrente/réu defendeu, em preliminar, a nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, em virtude de não terem sido consideradas faturas juntadas no processo, o reconhecimento da falta de interesse de agir na ação e a legitimidade da negativação realizada, diante da relação jurídica entre as partes, dada a regular constituição do débito objeto da anotação.

O recorrente/autor defendeu a condenação do recorrido/réu nos danos morais.

Apresentadas as contrarrazões pelo recorrido/réu, este impugnou a concessão de justiça gratuita ao recorrente/autor e pugnou pelo desprovimento do recurso.

Sem contrarrazões pelo recorrido/autor.

VOTO

De antemão, defiro o pedido de justiça gratuita em favor do recorrente/autor, nos termos dos arts. 98 e 99, §3º, ambos do CPC, e afasto a impugnação deduzida nas contrarrazões do recorrido/réu, pois este não apresentou nenhum elemento capaz de desfazer a presunção de veracidade da alegação de hipossuficiência, conforme ônus que lhe competia.

Assim, dispenso o recorrente/autor do recolhimento do preparo, a teor do art. 99, §7º, do CPC.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

O recurso do recorrente/réu desmerece provimento, ao passo que o do recorrente/autor há de ser provido.

Examina-se, de início, o recurso interposto pelo Banco/recorrente.

As preliminares suscitadas desmerecem prosperar.

A de cerceamento de defesa, porque não houve a apresentação de faturas nos autos. Aliás, os fundamentos adotados na sentença estão amparados no livre convencimento motivado, estampado no art. 371 do CPC, de modo que, ainda que tivesse sido apresentada a referida documentação, o fato dela não ter sido considerada, na forma pretendida pelo Banco, por si só, não configura cerceamento de defesa.

A de falta de interesse de agir, em virtude de estar caracterizada a pretensão resistida pelo simples fato de o recorrente ter contestado a demanda e, depois, formulado recurso contra a sentença que acolheu, em parte, o pedido da inicial. Além disso, à luz da garantia do acesso à Justiça, a recorrida estava desobrigada a questionar, antes, a negativação do débito perante o recorrente para só então ajuizar a demanda correspondente.

Assim, rejeito-as e submeto-as ao Colegiado.

De mais a mais, o recorrente não apresentou documento nos autos, para a comprovação do fato extintivo ou impeditivo do direito invocado, segundo o art. 373, II, do CPC, a exemplo da juntada de contrato, faturas, gravações telefônicas, ou quaisquer outros documentos com aptidão a comprovar a pactuação e regular constituição do débito negativado, e, vale destacar, tinha todas as possibilidades técnicas e econômicas de fazê-lo.

Por outro lado, em face da distribuição dinâmica do ônus probatório, não cabia exigir do recorrido a prova negativa de que não firmou o contrato com o prestador do serviço, pois representaria uma prova diabólica, vedada pela ordem jurídica processual, art.373, §2º.

Dessa forma, não merece retoque o convencimento pela inexistência dos débitos descritos na inicial e ilegitimidade das negativações levadas a efeito pelo Banco.

Análise, agora, o recurso do recorrente/autor.

Com efeito, observa-se do extrato de ID. 11101113 que o recorrente possuía em seu desfavor, tão só, as negativações questionadas destes autos, já declaradas ilegítimas. Nesse sentido, não é o caso de aplicar a Súmula 385 do STJ, que diz:

Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”.

Ou seja, aqui, os danos morais in re ipsa estão configurados, conforme o entendimento do STJ: AgInt no AREsp 1941278/MS, 4ª T. Rel. Min. MARCO BUZZI, j. 22/02/2022, DJe 09/03/2022.

Sobre o valor dos danos morais, em que pese inexistir padrão de todo objetivo para a fixação do valor da indenização, cabe levar em conta que será arbitrada de forma moderada, sem proporcionar o enriquecimento súbito do lesado ou a ruína do agente causador do dano. Há de imperar o bom senso. Para tanto, alguns elementos são considerados: a condição socioeconômica do ofendido; a condição socioeconômica do ofensor, a natureza e a intensidade da lesão provocada; ainda, pondere-se sobre o caráter repressivo da conduta lesiva, sempre utilizando-se dos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.

No caso dos autos, conforme antes dito, o recorrente possuía em seu desfavor, tão só, as negativações questionadas no presente feito, que, repita-se, eram indevidas. Ou seja, contra o recorrente/autor não consta outra inscrição além da impugnada, nem mesmo posterior, o que influencia na quantificação da indenização, pois não se verificar elemento probante que o enquadre como devedor contumaz, por ostentar diversos apontamentos negativos. De resto, considere-se o poderio econômico do recorrido, em particular em contraste a condição do recorrente, e o efeito pedagógico ou punitivo da indenização moral, como forma de inibir novas ofensas, seja em relação ao ofendida, seja no tocante a terceiro, por isso, um valor muito baixo pode implicar estímulo a manter a deficiência na prestação do serviço.

Em tal cenário fático, do qual se extraem as peculiaridades do caso para definir a quantificação indenizatória extrapatrimonial, tem-se que a fixação dos danos morais no valor de R$ 5.000,00 atende aos parâmetros acima mencionados, por não ser ínfima a compensação do desgaste emocional suportado, ao mesmo tempo em que observa o caráter preventivo e pedagógico inerente ao instituto da responsabilidade civil moral, de acordo com a jurisprudência do STJ, vide: AgInt no AREsp 1281588/MG, 3ªT, Rel. Mini. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, j. 07/08/2018, DJe 14/08/2018.

Além do mais, esse valor se coaduna com os parâmetros adotados pelo STJ e pela 2ª Turma Recursal deste Estado, como razoável e proporcional, em situação muito semelhante, conforme os precedentes a seguir citados: STJ, AgInt no AREsp 1326109/RJ, 4ª T, Rel. Mini. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, j. 10/12/2018, DJe 14/12/2018; TJ/RN, Recurso Inominado Cível n.º 0814441-11.2019.8.20.5124, 2ª TR, Rel. Juiz Fábio Antônio Correia Filgueira, j. 15/06/2022, p. 23/06/2022.

Ante o exposto, voto por conhecer dos recursos interpostos, mas nego provimento ao do recorrente/réu; por sua vez, dou provimento ao do recorrente/autor para reformar a sentença, da seguinte forma: a) condeno o recorrido ao pagamento, em favor do recorrente, da quantia de R$ 5.000,00 de danos morais, com a incidência de correção monetária pelo INPC, a contar do arbitramento (Súmula 362 do STJ), mais juros de mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso (data da negativação – Súmula 54 do STJ).

Custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da condenação, em desfavor, apenas, do recorrente/réu, dado o desprovimento do recurso interposto.

É como voto.

FÁBIO ANTÔNIO CORREIA FILGUEIRA

1º Juiz Relator



Natal/RN, 22 de Novembro de 2022.

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