Acórdão Nº 08087026920208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 23-04-2021

Data de Julgamento23 Abril 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08087026920208200000
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0808702-69.2020.8.20.0000
Polo ativo
PONTANEGRA AUTOMOVEIS LTDA
Advogado(s): CLAUDIA FERRAZ CASTIM, GUSTAVO HENRIQUE CARRICO NOGUEIRA FERNANDES
Polo passivo
ALBERONI FILGUEIRA JUNIOR e outros
Advogado(s): GIULLIANA NIEDERAUER FLORES SEVERO

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. DETERMINAÇÃO DE RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO PELO VEÍCULO OU, ALTERNATIVAMENTE, A SUBSTITUIÇÃO DO BEM, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO ZERO. ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE DEFEITOS. INEXISTÊNCIA NOS AUTOS DE ELEMENTOS TÉCNICOS APTOS A CONVENCEREM SOBRE A PROBABILIDADE DE QUE OS PROBLEMAS CONSTATADOS NO VEÍCULO DECORRERAM DE ALGUM VÍCIO OU DEFEITO DE FABRICAÇÃO QUE O TORNE IMPRÓPRIO OU INADEQUADO AO CONSUMO A QUE SE DESTINA. ELEMENTOS NOS AUTOS QUE INDICAM O CONSERTO DO VEÍCULO. NECESSIDADE DE MAIOR DILAÇÃO PROBATÓRIA. PROBABILIDADE DO DIREITO NÃO EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DE TUTELA URGÊNCIA. ART. 300 DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.


ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de atribuição de efeito suspensivo, interposto por PONTANEGRA AUTOMOVEIS LTDA em face de decisão interlocutória acostada, proferida pelo Juiz de Direito da 9ª Vara Cível da Comarca de Natal, que, nos autos da Ação de Reparação de Danos Materiais e Morais nº 0832519-97.2020.8.20.5001, proposta por Alberoni Filgueira Junior e outra, deferiu a tutela de urgência, determinando que a Fiat Automóveis S.A e a Pontanegra Automóveis Ltda restituíssem o valor pago pelo veículo, no montante de R$ 57.790,00, no prazo de quinze dias úteis, sob pena de multa diária de R$ 200,00, limitada ao valor de R$ 30.000,00; e, no mesmo prazo, facultou ao requerente, a título de alternativa à restituição do valor pago, a substituição do bem.

Nas suas razões, a agravante alega que os agravados propuseram a ação alegando a suposta existência de vício oculto no automóvel “Fiat Cronos Drive, 1.3 Flex”, adquirido em novembro de 2019, o qual teria demandado diversas entradas na oficina da concessionária, sem que o defeito tenha sido definitivamente sanado.

Diz que o veículo dos agravados foi levado à concessionária algumas vezes, mas não sob as mesmas alegações, uma vez que em 04/01/2020 o automóvel foi encaminhado à concessionária com “problemas na luz do teto”, em 10/02/20, foi informado “chiado no alto-falante, sova no veículo quando da partida e mensagem no painel que indicaria arrombamento”, e em 06/05/2020 foi alegada a ocorrência de “sova quando da partida”, além de que o protetor de cárter estaria batendo.

Argumenta que substituiu as peças defeituosas, liberando o veículo no dia seguinte, e que quanto ao suposto problema de “sova quando da partida”, após realizados todos os testes e análises necessários, o veículo não apresentou qualquer problema quando dada partida, mas que, a despeito disso, a fim de atender os anseios dos clientes, foi realizada a limpeza preventiva dos bicos injetores, a verificação das velas de ignição e da central de injeção eletrônica, além do reposicionamento do protetor de cárter, liberando o automóvel no próprio dia 06/05/2020.

Afirma que, por mera liberalidade e visando a satisfação dos clientes, promoveu, juntamente com a montadora FIAT, a substituição integral da central de injeção de ignição, sem qualquer custo para agravados, os quais receberam o veículo em perfeitas condições, e não retornaram mais à concessionária ou reclamaram de qualquer falha no bem.

Sustenta que todos os problemas relatados pelos agravados foram prontamente solucionados com eficiência e rapidez pela Concessionária.

Defende que não estão presentes os requisitos necessários ao deferimento da tutela de urgência, sobretudo diante do risco de irreversibilidade da medida voltada à imediata restituição integral da importância paga.

Por tais razões, pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso, sobrestando os efeitos da decisão recorrida. No mérito, requer o provimento do recurso.

Junta documentos.

O pedido de efeito suspensivo foi deferido (Id. 7855448).

Os agravados apresentaram contrarrazões, pugnando, em suma, pelo desprovimento do recurso (Id. 7626998 - Pág. 1).

O Ministério Público, através do 12° Procurador de Justiça, em substituição legal à 11ª Procuradora de Justiça, deixou de opinar quanto ao mérito, ante a inexistência de interesse público no caso vertente (Id. 8401631).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

De início, cumpre mencionar que, em se tratando de Agravo de Instrumento, a sua análise limitar-se-á, apenas e tão somente, acerca dos requisitos aptos à tutela de urgência concedida no primeiro grau, sem, contudo, adentrar à questão de fundo da matéria.

O caput do art. 300 do Código de Processo Civil/1915 dispõe que:

"Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo."

No caso em exame, neste momento processual, entendo que não restou demonstrada a probabilidade do direto necessária à concessão da tutela de urgência requerida pelos autores, ora agravados.

O art. 18, § 1º, I, do Código de Defesa do Consumidor, preceitua que:

"Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III - o abatimento proporcional do preço."

Portanto, o Código de Defesa do Consumidor permite, alternativamente, que o consumidor adquirente de um bem com vício de qualidade, que o torne impróprio ou inadequado ao consumo a que se destina, o tenha substituído por outro em perfeitas condições, seja restituído da quantia paga ou, ainda, receba o abatimento proporcional do preço.

Compulsando os autos, verifico que não consta nos autos elementos técnicos aptos a convencer sobre a probabilidade de que os problemas constatados no veículo decorreram de algum vício ou defeito de fabricação que o torne impróprio ou inadequado ao consumo a que se destina ou lhe diminua o valor.

Ademais, não constam provas de que veículo ainda não foi consertado, uma vez que a agravante afirma que os vícios apontados foram todos corrigidos oportunamente e o veículo foi entregue.

Assim, entendo prematuro, na fase atual do processo, o deferimento da tutela pretendida, mostrando-se prudente maior dilação probatória.

Ademais, não se pode igualmente olvidar que a análise da situação a ser protegida pela tutela do estado, em sua forma antecipada, em virtude de dano iminente, deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, observando-se, ainda, se a proteção do direito de uma das partes não implica em uma circunstância mais gravosa para a outra, ou seja, o chamado "dano inverso".

De fato, além de verificar a ocorrência ou a possibilidade de um dano considerável à parte que pugna pela antecipação dos efeitos da tutela, deve o Magistrado considerar, como imperativo indispensável ao seu deferimento, se o comando judicial não ensejará, para a parte ex adversa, um dano maior que aquele que se está tentando evitar. Isto é, sopesando os bens jurídicos envolvidos, deve mensurar se a proteção de um deles, hipoteticamente agredido, não se reverte em uma circunstância ainda mais gravosa para o outro.

De modo que não há como se imputar, por hora, ao agravante a restituição do valor desembolsado pelos agravados na aquisição do veículo.

Esclareço que a tutela de urgência poderá ser supervenientemente requerida e concedida, ainda que tenha sido inicialmente indeferida, desde que surjam novos elementos/provas a autorizar o deferimento do pleito antecipatório.

Ressalto, inclusive, que tenho me pronunciado, reiteradamente, sobre questões idênticas às discutidas nestes autos, onde tenho sustentado que a aquisição de veículo novo não admite receber ou apresentar defeitos.

Inobstante, no caso concreto, entendo que a determinação de restituição dos valores pagos numa fase processual embrionária, mostra-se uma medida prematura e temerária, requerendo maiores elementos de convicção, para uma Decisão mais acertada, o que somente a instrução processual proporcionará.

Cumpre esclarecer, ainda, que é possível e recomendável a antecipação da perícia judicial no veículo em questão, o que certamente contribuirá para a solução do caso.

Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso para, reformando a decisão recorrida, indeferir o pedido de tutela de urgência pleiteado pelos agravados.

É como voto.

Natal, 24 de março de 2021.

Juiz RICARDO TINOCO DE GÓES (Convocado)

Relator

CT

Natal/RN, 20 de Abril de 2021.

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