Acórdão Nº 08087787220188205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 25-01-2024

Data de Julgamento25 Janeiro 2024
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08087787220188205106
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0808778-72.2018.8.20.5106
Polo ativo
TIAGO MARTINS DE MEDEIROS e outros
Advogado(s): CELSO GURGEL registrado(a) civilmente como CELSO DE OLIVEIRA GURGEL
Polo passivo
FAN EMPREENDIMENTOS E CONSTRUCOES LTDA
Advogado(s): FERNANDA ROCHELLE SILVEIRA SILVA DA COSTA, CARLOS RODRIGO MOTA DA COSTA


EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA, SUSCITADA PELA PARTE APELANTE. MÉRITO: CONSTATAÇÃO DE VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO (FALHA NO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO DE GÁS) EM IMÓVEL NOVO ADQUIRIDO PARA CONSTITUIÇÃO DE MORADIA. ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DE 5 (CINCO) ANOS ESTABELECIDO NO ART. 27 DO CDC. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO PRAZO DECENAL DE PRESCRIÇÃO, CONSOANTE ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. DEMANDA QUE NÃO SE SUJEITA AO PRAZO DECADENCIAL PREVISTO NO DIPLOMA CIVIL, NEM DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. DEMANDANTE QUE APRESENTOU ELEMENTOS DE CONVICÇÃO SUFICIENTES PARA RESPALDAR AS ARGUMENTAÇÕES. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE O VAZAMENTO NA TUBULAÇÃO DE GÁS TENHA SIDO OCASIONADO POR ATUAÇÃO DE TERCEIRO. PARTE RÉ QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE COMPROVAR FATO EXTINTIVO, MODIFICATIVO OU IMPEDITIVO DO DIREITO DO AUTOR, A TEOR DO QUE DISPÕE O ART. 373, II, DO CPC. ABALO PSICOLÓGICO SUSCETÍVEL DE REPARAÇÃO. DANO MATERIAL E MORAL (IN RE IPSA) CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. PLEITO DE REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO, FORMULADO PELA EMPRESA RÉ, E DE SUA MAJORAÇÃO, PLEITEADO PELA PARTE AUTORA. MONTANTE FIXADO EM SINTONIA COM CASOS ANÁLOGOS APRECIADOS POR ESTA CORTE E EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DOS RECURSOS.



ACÓRDÃO



Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que compõem a 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em transferir para o mérito a preliminar de ilegitimidade passiva, suscitada pela parte apelante. No mérito, pela mesma votação, conhecer e negar provimento aos recursos, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO



Trata-se de Apelações Cíveis que tem como parte Recorrente/Recorrida FAN EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÃO LTDA. e como parte Recorrida/Recorrente TIAGO MARTINS DE MEDEIROS, interpostas contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Mossoró que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Danos Materiais e Morais, promovida em face da construtora Apelante, julgou procedente a pretensão autoral, para determinar que a parte ré proceda com a reparação do vício apresentado no imóvel do autor, consistente na falha do sistema de gás, condenando-a ao pagamento de reparação por danos morais no importe de R$ 3.000,00 (três mil reais).



Nas razões recursais, o demandado arguiu preliminar de ilegitimidade passiva e prejudiciais de prescrição e decadência.



No mérito, destacou que “a RESPONSABILIDADE PELO USO DO GÁS PASSOU A SER DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO a partir do momento da detecção da construção das garagens irregulares pelo corpo de bombeiro em 2013, não havendo a Empresa Ré qualquer responsabilidade acerca do sistema.”



Sustentou que “Não há provas do suposto dano moral sofrido, nem tampouco quais as eventuais repercussões deste, aliás, nem poderia porque não houve dano. Desta forma, não se pode conceber que uma pessoa seja "indenizada", quando em verdade NÃO HOUVE ATO ILÍCITO praticado pela demandada e certamente não se admite que meras dilações tenham o condão de ensejar a pretendida condenação. Resta demonstrada a ausência de nexo bem como inexistência da natureza danosa.”



Pleiteou, por fim, o conhecimento e provimento do recurso, para acolher as prefaciais suscitadas. No mérito, pleiteou o julgamento improcedente da demanda. Subsidiariamente, pugnou pela redução do valor reparatório fixado.



Em sua peça recursal, a parte autora postulou a majoração dos danos morais sofridos, com a procedência dos pedidos formulados na peça de ingresso.



As partes apresentaram as suas respectivas contrarrazões.



Sem manifestação ministerial, por se tratar de matéria de cunho eminentemente patrimonial.



É o Relatório.



VOTO



Verifico preenchidos os requisitos de admissibilidade.



A preliminar de ilegitimidade passiva se confunde com o mérito, razão pela qual passo à sua análise conjunta.



Os Apelos visam a reformar a sentença que julgou procedente a pretensão autoral, para condenar a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de danos morais, e ainda à reparação do sistema de fornecimento de gás da unidade imobiliária do demandante.



Extrai-se dos autos que as partes firmaram contrato de promessa de compra e venda de imóvel em maio/2010, tendo por objeto a aquisição do apartamento nº 208E pertencente ao Residencial Otávio Ferreira – Condomínio I.



Sustenta a parte ré que a pretensão deduzida se encontra fulminada pela prescrição de 5 (cinco) anos, consoante previsão estabelecida no art. 27 do CDC, verbis:



Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.



Ocorre que esta Corte de Justiça já assentou o entendimento de que, nas situações em que se busca reparação por falha em tubulação de gás, a prescrição detém prazo decenal, conforme excertos a seguir ementados;



EMENTA: CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. TESES DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL DE 10 ANOS. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. FALHA NO SISTEMA DE GÁS DO IMÓVEL. VAZAMENTOS. INTERRUPÇÃO DO ABASTECIMENTO. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA. DEVER DE REPARAÇÃO DO VÍCIO. DANO MORAL CONFIGURADO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
(APELAÇÃO CÍVEL, 0804262-38.2020.8.20.5106, Des.
Dilermando Mota, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 20/10/2023, PUBLICADO em 23/10/2023)



EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. JULGAMENTO DE PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. PREJUDICIAIS DE MÉRITO E PRELIMINARES SUSCITADAS PELA PARTE APELANTE: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. DEFEITOS DA CONSTRUÇÃO. PRAZO DE GARANTIA DO ART. 618, DO CÓDIGO CIVIL. INCIDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DECENAL PREVISTA NO ART. 205, DO CC/2002. PRECEDENTES DO STJ. ILEGITIMIDADE PASSIVA. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO. INÉPCIA DA INICIAL. INOCORRÊNCIA. INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA DO PEDIDO. MÉRITO. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. FALHA NO SISTEMA DE GÁS DO IMÓVEL. VAZAMENTOS CONSTANTES. REITERADAS INTERRUPÇÕES DO ABASTECIMENTO. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA. DEVER DE REPARAÇÃO DO VÍCIO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(APELAÇÃO CÍVEL, 0802899-84.2018.8.20.5106, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 04/08/2023, PUBLICADO em 07/08/2023)



No caso epigrafado, infere-se que o imóvel em questão foi entregue ao comprador em 25 de agosto de 2011 (ID 21211411), tendo sido detectada a falha no sistema de distribuição de gás em 11 de janeiro de 2018 (ID 21211403), com ajuizamento da presente demanda em 18 de maio de 2018, restando descabida a alegação de transcurso do prazo prescricional.



No que atine ao instituto jurídico da decadência, melhor sorte não acompanha a empresa demandada.



Isto porque a Corte de Cidadania colima no sentido de que a pretensão indenizatória em razão de vício de construção de imóvel não se submete ao prazo decadencial encartado no Diploma Civil, tampouco o do Estatuto Consumerista, como adiante se vê:



AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. VÍCIO OCULTO. DECADÊNCIA INAPLICABILIDADE. PRESCRIÇÃO DECENAL A PARTIR DO CONHECIMENTO DO VÍCIO. ENTEDIMENTO DO ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.

1. Consoante o entendimento firmado pela e. Terceira Turma, a pretensão do consumidor de ser indenizado pelo prejuízo decorrente da entrega de imóvel com vícios de construção não se sujeita a prazo decadencial, quer previsto no Código Civil, quer previsto no CDC (AgInt no REsp n. 1.918.636/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/9/2021, DJe de 22/9/2021).

2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que é decenal o prazo prescricional da ação para obter, do construtor, a indenização por defeito na obra, na vigência do Código Civil de 2002 (AgInt no AREsp n. 1.909.182/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 13/6/2022, DJe de 17/6/2022).

Agravo improvido.

(AgInt no AREsp n. 1.997.908/RO, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 21/8/2023, DJe de 24/8/2023.)(grifos acrescidos)



Consoante exposição contida na inicial, busca o autor provimento jurisdicional com vistas à reparação de sua unidade habitacional em razão de vazamento em tubulação de gás, bem como indenização de cunho moral pelo infortúnio sofrido.



O Código de Processo Civil estabelece, no artigo 373, incisos I e II, o seguinte:

"Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."

Da leitura da norma...

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