Acórdão Nº 08088013420238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 16-11-2023

Data de Julgamento16 Novembro 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08088013420238200000
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0808801-34.2023.8.20.0000
Polo ativo
BANCO SAFRA S A
Advogado(s): IAN COUTINHO MAC DOWELL DE FIGUEIREDO
Polo passivo
IMPLASVERDE INDUSTRIA DE PLASTICOS BAIXAVERDE LTDA e outros
Advogado(s): ROBERTO CARLOS KEPPLER

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS PARA DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO. PARTE AGRAVADA QUE EVIDENCIOU A SITUAÇÃO DE CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA PREVISTA NO ARTIGO 47 DA LEI FEDERAL Nº 11.101/2005. EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL QUE NÃO SE ESTENDEM AOS CONTRATOS GRAVADOS COM CESSÃO FIDUCIÁRIA, SALVO QUANDO DEMONSTRADO QUE O BEM ALIENADO FIDUCIARIAMENTE É ESSENCIAL À ATIVIDADE EMPRESARIAL. PRESTÍGIO AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA EMPRESA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao Agravo de Instrumento, bem como julgar prejudicado o Agravo Interno de Id 21145364, tudo nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Banco Safra S/A em face de decisão do Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de João Câmara que, nos autos do Pedido de Recuperação Judicial nº 0800778-16.2023.8.20.5104 ajuizado por Implasverde Indústria de Plásticos Baixaverde Ltda. e CJ Materiais de Construções Ltda - ME, deferiu “o PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL do GRUPO IMPLASVERDE, composto pelas empresas IMPLASVERDE – INDÚSTRIA DE PLÁSTICOS BAIXAVERDE LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob nº 41.004.235/0001-39, com sede na Av. Antônio Câmara, n.º 200 – BR 406 – Km 75, Centro, João Câmara/RN, CEP: 59.550-000 e CJ METAIS E CONSTRUÇÕES LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob nº 18.282.214/0001-63, com sede na Avenida Antônio Severiano da Câmara, nº 180, Centro, João Câmara/RN, CEP: 59.550-000, nos termos do art. 52 da Lei de Recuperação Judicial e Falência”, esclarecendo, no que importa para o presente recurso “que as instituições financeiras as quais as Requerentes tenham relação comercial somente podem executar cláusulas contratuais que discorram sobre retenção de valores existentes em contas bancárias mediante prévia autorização deste Juízo.”

O Agravante afirma não ter a parte Agravada preenchido os requisitos para o deferimento da recuperação judicial, fulminando o artigo 47 da Lei Federal nº 11.101/2005, porquanto ausente prova concreta da crise econômico-financeira das empresas.

Aduz ser a decisão recorrida fruto de precipitação, “pois há graves indícios de que as agravadas não estão em crise econômica e que as supostas razões para tanto não condizem com a realidade.”

Diz, ainda, que, além das agravadas terem demonstrado estado de liquidez satisfatório quando da celebração com o banco recorrente de Cédulas de Crédito Bancário, foram beneficiadas pelo Fundo Garantidor para Investimentos – FGI, programa do governo federal de incentivo à atividade industrial.

Ressalta “que a recuperação judicial não deve ser utilizada como um simples mecanismo de renegociações de dívidas, mas, sim, como uma ferramenta que possibilite que as empresas viáveis superem as crises circunstanciais, permitindo a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores.”

Argumenta não existir respaldo legal para condicionar o ajuizamento de execução de créditos, por parte das instituições financeiras, mediante prévia autorização do Juízo de primeiro grau, pois os créditos representados pela “CCBs nº 1070217, 107515 e 104492, estão todas garantidas por cessão fiduciária de direitos creditórios”, não se sujeitos à recuperação judicial, conforme previsto no artigo 49, §3º, da Lei Federal nº 11.101/2005.

Pede o deferimento do efeito suspensivo, “a fim de sustar a eficácia da decisão agravada, suspendendo-se o prosseguimento do procedimento da recuperação judicial e de qualquer prazo que esteja em curso, até o pronunciamento definitivo da Câmara”. No mérito, postula a reforma da decisão combatida, para revogar o processamento da recuperação judicial ou, subsidiariamente, que seja revogada ao menos a ordem destinada às instituições financeiras para que elas peçam autorização do Juízo recuperacional para executarem suas garantias relacionadas à retenção de valores em conta.

Efeito suspensivo indeferido (Id 20473732).

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (Id 21144410).

Agravo interno manejado pelo Banco Safra S/A (Id 21145364), devidamente contraminutado pela parte recorrida (Id 21705133).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Quando do exame do pedido de concessão do efeito suspensivo, o entendi ausentes os requisitos necessários para o deferimento do pleito, apresentando razões totalmente aplicáveis a este momento.

Assim, mantidas as razões expostas naquele momento e ausente qualquer fato capaz de derrogar os argumentos expostos, submeto ao conhecimento da 3ª Câmara Cível deste Tribunal de Justiça as razões para o desprovimento deste recurso. Transcrevo-as:

...

A permissibilidade de concessão do efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento decorre dos preceitos insculpidos nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, ambos do Código de Processo Civil/2015, sendo condicionado o deferimento da suspensividade à demonstração, pelo recorrente, da possibilidade de ocorrência de grave lesão, de difícil ou impossível reparação, sendo ainda relevante à fundamentação do pedido para fins de provável provimento do recurso.

Ao exame da controvérsia posta neste recurso, vislumbro, em sede de cognição inicial, não haver razão para a alteração do entendimento alcançado pelo magistrado de primeiro grau.

Na instância de origem, as empresas recorridas obtiveram o acolhimento do pedido inicial para processamento de Recuperação Judicial. Por seu turno, neste recurso, o banco agravante defende a ausência dos requisitos para a admissibilidade da própria Recuperação Judicial dispostos no artigo 47 da Lei Federal nº 11.101/2005, cuja redação transcrevo:

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Nesse sentido, o recorrente destaca a falta da situação de crise econômico-financeira das empresas requerentes, ora agravadas, porquanto os documentos contábeis, aos quais teve acesso, evidenciam a existência de lucro.

Porém, neste momento de cognição inicial, tenho como prematuro o acolhimento desta tese. Ainda que o Balanço Patrimonial da parte agravada seja positivo (Id 97916314 – autos na origem), este em muito é ultrapassado pelos débitos das empresas (Id 97916317 – autos na origem). Somente um dos créditos quirografários do Banco Safra S/A supera R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), de modo que a execução apenas deste crédito colocará em total risco de sobrevivência às empresas Agravadas.

Outrossim, sobre o capítulo da decisão que condicionou o ajuizamento de ações executivas por parte das instituições financeiras, em sede de cognição inicial, entendo que apesar de o artigo 49, §3º, da Lei nº 11.101/2005 estabelecer que os créditos com garantia fiduciária não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, a lei ressalva, expressamente, a venda ou retirada de bens de capital do estabelecimento do devedor que são essenciais à sua atividade empresarial, em decorrência do princípio da preservação da empresa, que norteia a aplicabilidade do instituto da recuperação judicial. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.22.133049-1/001, Relator(a): Des.(a) Rinaldo Kennedy Silva, 16ª Câmara Cível Especializada, julgamento em 14/09/2022, publicação da súmula em 14/09/2022)”

Em reforço aos argumentos acima expostos, ressalto que apesar de os créditos garantidos com cessão fiduciária não se submeterem ao plano de recuperação judicial, a parte final do §3º do artigo 49 da Lei Federal nº 11.101/2005 ressalva, expressamente, “a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

Transcrevo o dispositivo:

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

...

§3º. Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o §4º do art. desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial. [grifei]

A limitação, ainda que de caráter temporário, ao exercício da propriedade fiduciária em se tratando de bem essencial ao desenvolvimento da atividade empresarial, busca conciliar a situação privilegiada conferida aos credores fiduciários e o princípio da preservação da empresa.

No sentido do entendimento acima referido, cito julgado do STJ:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. BENS DADOS EM GARANTIA FIDUCIÁRIA. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. BENS ESSENCIAIS. SUJEIÇÃO AOS EFEITOS DA...

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