Acórdão Nº 08089341820198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 14-02-2020

Data de Julgamento14 Fevereiro 2020
Tipo de documentoAcórdão
Número do processo08089341820198200000
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0808934-18.2019.8.20.0000
Polo ativo
FRANCISCO PEREIRA SOBRINHO e outros
Advogado(s): MARCILIO MESQUITA DE GOES
Polo passivo
EUDALIA BEZERRA DE MOURA LIMA e outros
Advogado(s): JOSE FERNANDO DE QUEIROZ

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202):0808934-18.2019.8.20.0000


EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DECISÃO ATACADA QUE EXTINGUIU A RECONVENÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INSURGÊNCIA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO AGRAVANTE PARA ACOSTAR OS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS. ACOLHIMENTO. JUIZ QUE NÃO PODE DECIDIR SEM QUE TENHA DADO A OPORTUNIDADE DAS PARTES SE MANIFESTAREM. VEDAÇÃO À DECISÃO SURPRESA. NECESSIDADE DO JULGADOR CONCEDER A PARTE A OPORTUNIDADE DE CORRIGIR O VÍCIO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. , 10º E 317 DO CPC. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. RECONHECIMENTO DE VÍCIO NO DECISUM. DECISÃO ANULADA. RETORNO DOS AUTOS A ORIGEM PARA O REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO.


ACÓRDÃO



Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso para declarar a nulidade da decisão, determinando a remessa dos autos à Comarca de origem para o regular prosseguimento do feito, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Francisco Pereira Sobrinho e outros, em face de decisão do Juízo da Vara Única da Comarca de Nísia Floresta, que nos autos da Ação de Reintegração de Posse de nº 0000961-13.2010.8.20.0145, extinguiu sem resolução do mérito a reconvenção.

Narra o agravante que o Agravado interpôs ação de reintegração de posse contra os agravantes, alegando serem compradores dos lotes 18/20, da quadra A-15, do Loteamento Balneário Petrópolis, localizado na Lagoa do Bom Fim, onde opuseram reconvenção visando usucapirem o imóvel objeto da lide, sendo esta, extinta sem resolução do mérito.

Argumenta que o pedido de habilitação do sucessor, em razão do falecimento do agravado, fora realizado antes do pronunciamento judicial sobre a extinção do processo, de maneira que não tendo os agravados, a tempo e a modo, apresentado a habilitação do espólio, o processo deveria ter sido extinto sem resolução do mérito.

Alega que a habilitação deveria ter sido do espólio e não de pessoas físicas.

Argumenta que o fato da agravada Eudália ter ingressado aos autos como parte autora por ser esposa do Sr. Israel, não supre a ordem judicial que determinou a habilitação do sucessor.

Defende que os agravantes nos casos dos autos são os proprietários do imóvel, mas nunca foram possuidores, de maneira que caberia o manejo da ação reivindicatória e jamais da ação possessória, como no caso dos autos.

No que se refere à Reconvenção, destaca que há possibilidade haver usucapião para terras que vão além da apontada na inicial, e que o juízo a quo deveria tê-los intimados para acostar aos autos planta georreferenciada e ainda que cabe usucapião tanto nas ações possessórias e quanto nas petitórias.

Por conseguinte, postula pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso; no mérito, requer a reforma da decisão agravada, para que seja extinto o processo sem resolução do mérito.

Junta Documentos.

O agravado apresentou contrarrazões, postulando, em suma, pelo desprovimento do recurso.

O Ministério Público deixou de opinar sobre o feito.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mister ressaltar, por oportuno, que em se tratando de agravo de instrumento, a sua análise limitar-se-á, apenas e tão somente, acerca dos requisitos aptos à concessão da medida, sem contudo, adentrar na questão de fundo da matéria.

Na situação em exame, pretende o agravante a reforma da decisão agravada que extinguiu a reconvenção sem resolução do mérito.

Compulsando os autos, verifico que o juízo da Vara Única da Comarca de Nísia Floresta extinguiu a reconvenção sem resolução do mérito.

Em que pese ser dada a possibilidade ao juízo a quo extinguir de ofício o feito sem resolução do mérito quando presente a hipótese prevista no art. 485, VI do Código do Processo Civil, se faz necessário à observância do art. 10 do referido Código.

Nesta toada, o Código de Processo Civil em seu artigo 10, albergando o princípio da não surpresa, dispõe que o julgador não pode proferir decisão com base em fundamento que não tenha sido objeto de discussão pelas partes, nos seguintes termos:

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.(grifos acrescidos)

Da análise dos autos em epígrafe, não verifiquei que o agravado tenha sido intimado para se pronunciar a respeito da possibilidade ou não do pedido de usucapião atingir outros imóveis, bem como se manifestar sobre a ausência de estudo georreferenciado e certidão dos imóveis atualizadas, nem a respeito da incidência do art. 557 do CPC.

Em caso semelhante Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery ensinam que:

quando o juiz percebe que existe a possibilidade de reconhecer a carência de ação – falta de condição da ação-, com a consequente extinção do processo sem resolução do mérito, mesmo que o réu não tenha arguido a matéria, deverá mencionar essa situação e dar oportunidade que ambas as partes tomem conhecimento dessa possibilidade e, querendo, manifestem-se a respeito. Só depois da intimação da parte para essa providência o juiz poderá, decidir a questão. (JUNIOR, Nelson Nery. Código de Processo Civil comentado. 17. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2018, p. 236).

Veja-se que não se trata de mera faculdade do julgador em dar oportunidade aos recorrentes se manifestarem sobre questões que possam ser decididas de ofício, mas sim, de obrigação do julgador agir desta maneira, sob pena de violar frontalmente o princípio do contraditório.

Desta feita, a proibição da decisão surpresa mostra-se plenamente aplicável a hipótese, uma vez que, antes de proferida decisão que extinguiu a reconvenção sem resolução do mérito, seria necessária a oitiva previa das partes sobre os pontos decididos.

Ademais, o art. 317 do CPC impõe que antes de ser proferida decisão que extinga o processo sem resolução do mérito, é necessário que o juiz conceda à parte a oportunidade de sanar o vício, vejamos:

Art. 317. Antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício.

Neste sentido, o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DAS COISAS. AÇÃO DE USUCAPIÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. A extinção do processo, na forma do artigo 485, inciso I, do CPC/15, sem antes ser procedida a intimação dos autores para cumprirem a determinação de que fosse emendada a petição inicial com a indicação dos confrontantes do imóvel usucapiendo e a qualificação suficiente para fins de citação, e com a devida advertência de que, não o fazendo, isso implicaria indeferimento da petição inicial, configura violação ao princípio da não surpresa (artigos 9º e 317, ambos do CPC/15). Situação que leva à desconstituição da sentença. Apelação provida para desconstituir a sentença. (Apelação Cível Nº 70074860271, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Voltaire de Lima Moraes, Julgado em 19/10/2017)

Sendo assim, verifico que a probabilidade do direito restou evidenciada, uma vez que, aparentemente, houve violação do princípio do contraditório, bem como, o perigo de dano também se encontra presente, tendo em vista que há possibilidade da perda do imóvel por parte dos agravantes sem que possam exercer seu direito de influir no convencimento do magistrado.

Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso para declarar a nulidade da decisão e, em consequência, determinar a remessa dos autos à Comarca de origem a fim de que o agravante possa manifestar-se a respeito das questões que deram ensejo a extinção da reconvenção sem resolução do mérito.

É como voto.

Desembargador DILERMANDO MOTA

Relator

Natal/RN, 11 de February de 2020.

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