Acórdão Nº 08092442420198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 19-05-2020

Data de Julgamento19 Maio 2020
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08092442420198200000
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0809244-24.2019.8.20.0000
Polo ativo
PORTO SEGURO COMPANHIA DE SEGUROS GERAIS
Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO
Polo passivo
WESLEY DE ARAUJO SANTOS
Advogado(s): REBECA CAMARA ALVES

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA NA ORIGEM PARA QUE A SEGURADORA DISPONIBILIZE VEÍCULO RESERVA AO AGRAVADO. QUESTIONAMENTOS CONSISTENTES ACERCA DE POSSÍVEL CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR PELO DANO NO VEÍCULO. "CALÇO HIDRÁULICO". AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE POSSAM CONFIGURAR, DE PLANO, A RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA AGRAVANTE. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AMPLA DEFESA. PLEITO QUE DEPENDE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA EM PRIMEIRO GRAU. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS APTOS A ENSEJAREM A CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA PRETENDIDA PELO AGRAVADO. INTELIGÊNCIA DO ART. 300 DO CPC. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

- A pretensão formulada em primeiro grau necessita de dilação probatória, porque diz respeito a fatos que devem ser provados e analisados perante o Julgador a quo, sob pena de violação ao devido processo legal (contraditório e ampla defesa), garantia constitucional que não pode ser suprimida diante das particularidades do caso concreto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao recurso para afastar a obrigação imposta a agravante em assegurar veículo fornecido por terceira pessoa em favor do agravado pelos motivos discutidos na demanda principal, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.


RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por PORTO SEGURO COMNPANHIA DE SEGUROS GERAIS, em face de decisão proferida pelo juízo da 13ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN que nos autos da Ação Ordinária nº 0847742-27.2019.8.20.5001, proposta por WESLEY DE ARAUJO SANTOS, deferiu a tutela de urgência pleiteada para determinar que no prazo de 5 (cinco) dias úteis, o réu TOYOLEX AUTOS LTDA: apresente os laudos produzidos que atestam dos defeitos apresentados pelo veículo objeto da lide; custodie o referido automóvel sem custo para a parte autora até ulterior decisão. Além disso, deve a TOYOLEX fornecer outro veículo substitutivo à parte autora, similar ao veículo custodiado, bem como, o réu PORTO SEGURO assegure ao veículo fornecido as mesmas condições contratuais do seguro, tudo isso sob pena de multa DIÁRIA no valor de R$ 1.000,00 (Hum mil reais), em caso de descumprimento da medida, sem prejuízo das demais sanções.”

Em suas razões de ID 4825916, narra o agravante que em Maio de 2019 o agravado recebeu o veículo Corolla, modelo XEI 2.0 Flex Automático, ano 2016, modelo 2017, placa QGK 1997 do Sr. Jackson Miki Pereira Dantas, contudo o veículo veio a apresentar defeito, sendo pleiteado o fornecimento de veículo reserva pelo agravado.

Alega o agravante que o agravado acionou a seguradora comunicando o sinistro como sendo “calço hidráulico", contudo, através de análise técnica detalhada, restou constatado que houve falha no sistema injeção de combustível, dado em razão da falta manutenção do veículo de forma adequada.

Sustenta que não há qualquer relação contratual entre a Agravante e a Toyolex Autos Ltda, de maneira que não haveria respaldo jurídico para que a Seguradora seja compelida a arcar com o seguro do referido veículo a ser disponibilizado.

Por conseguinte, postula pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso; no mérito, requer, o provimento do recurso para que seja reformada a decisão, uma vez que inexiste qualquer relação jurídica entre as demandadas.

Indeferimento do pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso (Id. 4840176).

Agravo Interno pedindo a reconsideração da decisão (Id. 5232205).

Contrarrazões pelo desprovimento do Agravo de Instrumento (Id. 5245581).

A 15ª Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito (Id. 5664470).

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso (NCPC. Art. 1015, IV).

Cinge-se a análise do presente recurso acerca da viabilidade da antecipação dos efeitos da tutela no sentido de determinar que a empresa agravante forneça "assegure ao veículo fornecido as mesmas condições contratuais do seguro, tudo isso sob pena de multa DIÁRIA no valor de R$ 1.000,00 (Hum mil reais)."

Em se tratando de Agravo de Instrumento, a sua análise limitar-se-á, apenas e tão somente, acerca dos requisitos constantes aptos à concessão da medida em Primeira Instância, sem contudo, entrar na questão de fundo da matéria.

Nesse sentido, a doutrina de Wilian Santos Ferreira: "(...)Para melhor ilustrar essa diferença, exemplifica-se: no caso de um pedido de tutela antecipada indeferida na primeira instância, o autor da ação interpõe agravo de instrumento, e o mérito deste recurso justamente versará sobre a admissibilidade ou não deste pedido de tutela antecipada, dando ou não o órgão ad quem provimento ao recurso". (Tutela Antecipada no âmbito recursal. São Paulo: RT, 2000. p.238)

A tutela antecipada, por ser uma antecipação dos resultados finais da demanda, exige que o Magistrado faça um juízo de verossimilhança das alegações detectando, outrossim, se há real receio de lesão de difícil reparação ou abuso de direito de defesa, como menciona o artigo 300: “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

Compulsando os elementos probatórios juntados, numa análise própria à presente via recursal, não se vislumbra a verossimilhança apta a ensejar, em favor do agravado, o deferimento antecipado da tutela em Primeiro Grau no que diz respeito ao veículo substitutivo.

Digo isto porque, conforme já ressaltei na decisão monocrática proferida no Agravo de Instrumento nº 0808498-59.2019.8.20.0000, conexo a este processo, o autor da ação, ora Agravado, revela que, pouco tempo após a realização da 6ª Revisão realizada no seu veículo, ao trafegar normalmente, sentiu um barulho e depois um estouro no motor, fato que o fez levar o veículo novamente à concessionária para verificação.

Ao realizar as análises técnicas, concluiu-se que ocorreu o chamado “calço hidráulico”, que consiste na infiltração de água no compartimento do motor em face do uso do veículo em locais com alagamento.

No aviso de sinistro realizado perante a Porto Seguro, o próprio agravado confirma a informação, ao afirmar que passou “por alguns pequenos alagamentos no trajeto” (Id. 4826836).

Logo, não há como obrigar a seguradora agravante a atender à obrigação imposta pela decisão agravada, porque:

1) não há prova de que o serviço de revisão realizado na concessionária ensejou os problemas no veículo; e,

2) há a possibilidade do defeito apontado, “calço hidráulico”, hipoteticamente, ter sido causado por culpa exclusiva do condutor do veículo.

Ademais, mesmo que se trate de laudo confeccionado de forma unilateral, este terá que ser rebatido pelas demais provas a serem produzidas durante a tramitação do feito. Como já dito, havendo indícios de que possa ter ocorrido culpa exclusiva da vítima, em face da provável ocorrência de “calço hidráulico”, enseja o indeferimento da medida antecipatória.

Quanto ao tema, assim já decidiu esta Egrégia Corte, a saber:

EMENTA: CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO QUE DETERMINOU A SUBSTITUIÇÃO DO VEÍCULO AUTOMOTOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE REFORMA. ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA A AMPARAR A CONCESSÃO DA TUTELA ESPECÍFICA. CALÇO HIDRÁULICO. INDÍCIOS DE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. CAUSA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR, ORA AGRAVANTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. O fornecedor – conceito em que se insere a recorrente – é responsável pelos vícios apresentados pelo produto que o tornam impróprio ou inadequado ao consumo, bem como pelo que lhe diminua o valor (art. 18, CDC).

2. Todavia, através das provas acostadas com a inicial, não é possível verificar a prova inequívoca, necessária à concessão da tutela, de que o vício do produto decorre de fato coberto pela garantia oferecida pela agravante, podendo ser resultado de culpa exclusiva do consumidor, fato apto a excluir a responsabilidade da agravante.

3. Precedentes do TJRN (Ag nº 2014.007893-4, Relª. Juíza Convocada Ana Carolina Maranhão de Melo, 2ª Câmara Cível, j. 25/11/2014; Ag nº 2011.016718-4, Rel. Desembargador Osvaldo Cruz, 2ª Câmara Cível, j. 24/02/2012; Ag nº 2010.005188-8, Rel. Desembargador Amaury Moura Sobrinho, 3ª Câmara Cível, j. 05/08/2010).

4. Agravo conhecido e provido.”

(TJRN. Agravo de Instrumento com Suspensividade n° 2015.005608-9. Relator: Desembargador Virgílio Macêdo Jr. 2ª Câmara Cível. Julgado em 29/09/15). (destaquei)

Assim, a pretensão formulada necessita de dilação probatória, porque diz respeito a fatos que devem ser provados e analisados perante o Julgador a quo, sob pena de violação ao devido processo legal (contraditório + ampla defesa), garantia constitucional que não pode ser suprimida diante das particularidades do caso concreto.

Dessa forma, enquanto não se chega ao fim da contenda, não cabe medida antecipatória sem os elementos necessários para tal, de modo que resta inaceitável a modificação do status quo ante.

Face ao exposto, conheço e dou provimento ao recurso para afastar a obrigação imposta a agravante em assegurar veículo fornecido por terceira pessoa em favor da agravado pelos motivos discutidos na demanda principal.

É como voto.

Natal,

Eduardo Pinheiro

Juiz Convocado - Relator

Natal/RN, 19 de Maio de 2020.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT