Acórdão Nº 08101239420208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 04-06-2021

Data de Julgamento04 Junho 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08101239420208200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0810123-94.2020.8.20.0000
Polo ativo
MONTE BELO INCORPORACOES E CONSTRUCOES LTDA e outros
Advogado(s): ANNA CARLA FERREIRA LOPES DE OLIVEIRA, CARLOS EDUARDO DO NASCIMENTO GOMES
Polo passivo
LUCIANA DAS DORES DE PAULA
Advogado(s): LUIZ GOMES, RAFAELA LOURENCO MARQUES, KARINA LETTA REIS

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. VÍCIO DE CONSTRUÇÃO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. VEDAÇÃO PELO CDC E PELA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PLEITO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE. ART. 6º DO CDC. AGRAVO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, a despeito de não ser automática por força de lei (ope legis) encontra permissividade no art. 373, § 1º, do CPC/2015, que prevê a possibilidade de tal providência, pelo juiz, diante de peculiaridades relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário.

2. o STJ firmou entendimento de que a vedação à denunciação à lide prevista no art. 88 do CDC não se limita à responsabilidade por fato do produto (art. 13, CDC), mas se aplica também às demais hipóteses de responsabilidade por acidentes de consumo (arts. 12 e 14 do CDC) e processos que envolvam relações de consumo, por acarretar maior dilação probatória, subvertendo os princípios da celeridade e economia processual, em prejuízo ao hipossuficiente.

3. Precedentes do STJ (AgIntno AREsp n. 208.228/RJ, Relator Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, j1º/9/2016, DJe 6/9/2016; AgRg no AREsp 694.980/MS, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 22/09/2015; AgRg no AREsp 472.875/RJ, Rel. Ministro João Otávio De Noronha, Terceira Turma, j. 03/12/2015; AgRg no AREsp 659.600/RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 02/08/2016; AgInt no REsp 1635254/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 21/03/2017) e do TJRN (Ag n° 2016.019381-6, Rel. Des. João Rebouças, 3ª Câmara Cível, j. 25/05/2017; Ag nº 2017.003516-0, Rel. Des. Virgílio Macedo Jr., 2ª Câmara Cível, j. 01/08/2017)

4. Agravo conhecido e desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível, em turma, deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, conheço e nego provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por MONTE BELO INCORPORAÇÕES E CONSTRUÇÕES LTDA. E FRANCISCO DE ASSIS AQUINO GONDIM FILHO contra decisão interlocutória (Id. 7977392) proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Extremoz/RN, que, nos autos de Ação de Responsabilidade Civil c/c Pedido de Indenização por Danos Materiais e Morais (Proc. nº 0100943-07.2014.8.20.0162), ajuizada por LUCIANA DAS DORES DE PAULA, inverteu o ônus da prova em desfavor da ré/agravante, indeferiu o pedido de denunciação da lide trazido na peça contestatória e determinou a realização de perícia técnica às expensas da ré/recorrente.

2. Aduziu a parte agravante, em suas razões, que deve ser acolhido o pleito de denunciação da lide à Caixa Econômica Federal por se tratar de hipótese na qual se discute a existência de vício do produto, o qual deveria ser fiscalizado pela denunciada.

3. Defendeu que deve ser afastada a inversão do ônus da prova ou a obrigatoriedade de recolhimento dos honorários periciais pois cabe à parte autora/agravada comprovar fato constitutivo de seu direito.

4. Pediu a atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso para sustar a ordem de pagamento dos honorários periciais aos agravantes, enquanto não for julgado o mérito do presente recurso.

5. Quando do julgamento definitivo, requereu o conhecimento e provimento do agravo para denunciar à lide a Caixa Econômica Federal e afastar a determinação da inversão do ônus da prova em desfavor dos Agravantes, ou, subsidiariamente, afastar a obrigatoriedade de antecipação dos honorários periciais.

6. Foi proferida decisão no Id. 7999633, em que indeferiu o pedido de suspensividade.

7. Intimada para apresentar as contrarrazões, a parte agravada quedou-se inerte (Id. 8841136).

8. Instado a se manifestar, Dr. Herbert Pereira Bezerra, Décimo Sétimo Procurador de Justiça, deixou de opinar no feito por entender inexistir interesse ministerial (Id. 8853384).

9. É o relatório.

VOTO

10. Conheço do recurso.

11. Pretende a recorrente a atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso para sustar a ordem de pagamento dos honorários periciais até o julgamento do mérito recursal.

12. Todavia, no caso em tela, entendo não assistir razão à parte agravante.

13. No tocante aos requisitos para a inversão do ônus da prova, resta demonstrada pela autora/agravada a verossimilhança das suas alegações no tocante aos vícios construtivos, além de ser patente sua hipossuficiência frente à construtora, que detém meios para comprovar a eventual a ausência de defeitos de construção no imóvel, afastando a responsabilização civil.

14. Portanto, plenamente aplicável ao caso sob análise é o art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser invertido ope iudicis o ônus da prova para facilitação da defesa dos direitos do consumidor.

15. Frise-se que a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, a despeito de não ser automática por força de lei (ope legis) encontra permissividade no art. 373, § 1º, do CPC/2015, que prevê a possibilidade de tal providência, pelo juiz, diante de peculiaridades relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário.

16. No mesmo sentido, colaciono julgados desta Corte de Justiça:

"EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. DECISÃO QUE DETERMINOU A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO §1º DO ART. 373 DO NCPC. DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA. PECULIARIDADES DO CASO QUE DEMONSTRAM MAIOR FACILIDADE DE OBTENÇÃO DA PROVA DO FATO CONTRÁRIO PELO RÉU. INVERSÃO QUE NÃO TORNOU A PRODUÇÃO DA PROVA IMPOSSÍVEL OU EXCESSIVAMENTE DIFÍCIL PARA O DEMANDADO. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO."

(TJRN, Ag n° 2016.019381-6, Rel. Des. João Rebouças, 3ª Câmara Cível, j. 25/05/2017)

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA 297 DO STJ. HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA DO CONSUMIDOR. ALEGADA DIFICULDADE DE PERCEPÇÃO DE VENCIMENTOS. SUPOSTOS DESCONTOS EM CONTA CORRENTE PARA QUITAÇÃO DE JUROS E PARCELAS DE EMPRÉSTIMOS. INVERSÃO DO ÔNUS QUE NÃO TORNA A PRODUÇÃO DA PROVA IMPOSSÍVEL OU EXCESSIVAMENTE DIFÍCIL. AGRAVANTE QUE DETÉM MEIOS PARA DEBITAR VALORES E COMPROVAR EVENTUAL INEXISTÊNCIA DE DESCONTOS. INCIDÊNCIA DO ART. 6º, VIII, DO CDC. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, § 1º, DO CPC/2015. INVERSÃO OPE IUDICIS DO ÔNUS DA PROVA. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, não é automática por força de lei (ope legis), mas encontra permissividade no art. 373, § 1º, do CPC/2015, que prevê a possibilidade de tal providência, pelo juiz, diante de peculiaridades relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário.

2. No caso concreto, resta demonstrada pelo consumidor a verossimilhança das suas alegações, além de ser patente sua hipossuficiência frente à instituição financeira, que detém meios para debitar, na conta corrente, valores a título de cobrança de juros e parcelas de empréstimo, bem assim comprovar eventual inexistência dos referidos descontos.

3. Portanto, plenamente aplicável ao caso sob análise é o art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, devendo ser invertido ope iudicis o ônus da prova para facilitação da defesa dos direitos do consumidor.

4. Precedente do TJRN (Ag n° 2016.019381-6, Rel. Des. João Rebouças, 3ª Câmara Cível, j. 25/05/2017).

5. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.”

(TJRN, Ag nº 2017.003516-0, Rel. Des. Virgílio Macedo Jr., 2ª Câmara Cível, j. 01/08/2017)

17. A respeito da denunciação da lide, o Código de Processo Civil prevê:

“Art. 125. É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das partes:

I - ao alienante imediato, no processo relativo à coisa cujo domínio foi transferido ao denunciante, a fim de que possa exercer os direitos que da evicção lhe resultam;

II - àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for vencido no processo.

§ 1º O direito regressivo será exercido por ação autônoma quando a denunciação da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida.

§ 2º Admite-se uma única denunciação sucessiva, promovida pelo denunciado, contra seu antecessor imediato na cadeia dominial ou quem seja responsável por indenizá-lo, não podendo o denunciado sucessivo promover nova denunciação, hipótese em que eventual direito de regresso será exercido por ação autônoma.”

18. No caso concreto, verifica-se que o réu/agravante é o denunciante e foi requerida a citação da Caixa Econômica Federal como denunciada, por reputá-la como responsável pela análise de qualidade da obra.

19. Ocorre que o caso concreto versa [W1] sobre responsabilização civil e indenização por danos materiais e morais em virtude de responsabilidade por vício do produto (art. 18, CDC).

20. Sabe-se que o STJ firmou entendimento de que a vedação à denunciação à lide prevista no art. 88 do ...

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