Acórdão Nº 08102302920198205124 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 24-06-2021

Data de Julgamento24 Junho 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08102302920198205124
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0810230-29.2019.8.20.5124
Polo ativo
R 2 INCORPORACOES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA
Advogado(s): IRANILDO GERMANO DOS SANTOS JUNIOR
Polo passivo
FGR URBANISMO NATAL SPE LTDA
Advogado(s): FLAVIO CORREA TIBURCIO, NATALIA OLIVENCIA E SOUZA, RENATA BARBOSA MARQUES, RHAYSSA DE ALMEIDA FREITAS

EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATANTE QUE É INCORPORADORA IMOBILIÁRIA, COM FINALIDADE DE AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS PARA LUCRO E ESPECULAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA DESTA PERANTE A PARTE RECORRIDA. AFASTADA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 543, DO STJ. CONTRATO ENTABULADO ENTRE AS PARTES REGIDO PELOS ARTIGOS 481 E 482, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL. DEMANDANTE/RECORRENTE QUE FIGURA COMO INTERMEDIÁRIA DO NEGÓCIO CELEBRADO ENTRE AS PARTES. PODER DE GERÊNCIA SOBRE A OBRA DA CONSTRUTORA. CLÁUSULAS CONTRATUAIS QUE ESTABELECEM A COMPENSAÇÃO DE VALORES EM CASO DE RESCISÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO CONTRATUAL POR CULPA DA PESSOA JURÍDICA AUTORA/RECORRENTE. COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS PELA RECORRIDA COM TAXAS DE ADMINISTRAÇÃO, IPTU E CONDOMÍNIOS INADIMPLIDOS. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.



RELATÓRIO


Trata-se de apelação interposta por R2 INCORPORAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Parnamirim/RN que, nos autos da demanda indenizatória por danos materiais nº 0810230-29.2019.8.20.5124, julgou improcedente o pedido autoral e, em decorrência, extinguiu o processo com resolução do mérito, com fulcro no art. 487, I, do CPC.

Em razão da sucumbência, condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, àquelas segundo a tabela regimental e estes no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Em suas razões recursais, a autora R2 INCORPORAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA aduz, em síntese, que o julgamento de origem afronta os princípios do equilíbrio contratual, boa-fé objetiva e da função social do contrato, uma vez que, supostamente o empreendimento lançado e comercializado pela recorrida teve uma considerável desvalorização e a retenção integral dos valores adimplidos configura enriquecimento sem causa da empresa recorrida e o consequente dano material.

Afirma que o caso em comento trata-se de uma relação contratual consumerista, devendo ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor e a Súmula n. 543 do STJ.

Por fim, pugnou pelo conhecimento e provimento do apelo para que seja julgado procedente o pedido inaugural e, em consequência, condenada a ré/apelada, ao pagamento de danos materiais e verba sucumbenciais.

Intimada, a parte recorrida ofereceu contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do apelo interposto pela parte adversa (ID 8227257).

Instado a se pronunciar, o Ministério Público não opinou (ID 8558742).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.

Depreende-se dos autos que a parte autora, ora apelante, interpôs recurso de Apelação Cível contra a sentença proferida pelo Juiz a quo(ID 61487985), que julgou improcedente o pedido formulado na Ação de Indenização por Danos Materiais e extinguiu o processo, com resolução de mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, condenando a parte autora a arcar com as custas e os honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85, do CPC/2015.

De proêmio, ressalte-se a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao presente caso, eis que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é consolidada no sentido de adotar, como regra, a teoria finalista do conceito de consumidor, segundo a qual se considera destinatário final do bem ou serviço somente aquele que confere destinação fática e econômica ao produto, não o adquirindo para revenda ou uso profissional. E, na espécie, ressai dos autos que a parte autora/apelante é incorporadora imobiliária, com finalidade de aquisição de imóveis para lucro e especulação, tampouco restou comprovada a hipossuficiência desta perante a parte recorrida, pelo que afastada a incidência da Súmula 543, do STJ.

Dito isto, tem-se que o negócio firmado entre as partes foi de livre ajuste, nos termos designados pelos artigos 481 e 482 do Código Civil, onde um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro a pagar-lhe certo preço em dinheiro, sendo que, quando puro, considerar-se-á obrigatório e perfeito, desde que as partes acordem quanto ao objeto e ao preço, afastando-se, portanto, as disposições contidas no CDC, já que a empresa demandante/recorrente é incorporadora imobiliária, atuando no mercado com a única finalidade de aquisição de imóveis para lucro, nos termos do item II.1 do contrato.

Os citados artigos 481 e 482 do CC assim estabelecem, in verbis:

Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço.

Ultrapassada tal questão, constata-se que as partes celebraram dois contratos de compra e venda de imóvel, com financiamento imobiliário e pacto adjeto de alienação fiduciária e outras avenças jurídicas, na modalidade de prazo e preços certos, nos termos da Lei n.º 9.514/97.

Entretanto, ao argumento de que se encontrava em difícil situação financeira, a empresa demandante, ora recorrente, rescindiu o contrato de compra e venda de imóvel, e a empresa demandada, aqui recorrida, atendeu a vontade da Apelante, conforme consta nos dois Termos de Rescisão do Instrumento Particular de Contrato de compra e venda de imóvel, juntados aos autos.

Ocorre que, posteriormente, a apelante ajuizou a presente ação indenizatória sob à alegação de que a pessoa jurídica demandada, ora recorrida, reteve a integralidade dos valores pagos, acusando ser R$ 8.524,04 (oito mil, quinhentos e vinte e quatro reais e quatro centavos) a título de IPTU e condomínio atrasados, e R$ 23.952,02 (vinte e três mil, novecentos e cinquenta e dois reais e dois centavos) sobre taxas administrativas, afirmando que o valor atualizado a ser restituído corresponde ao quantum de R$ 48.644,07 (quarenta e oito mil, seiscentos e quarenta e quatro reais e sete centavos).

Pois bem. ressalto que no dia 11/12/2013, as partes celebraram um Instrumento Particular de Contrato de Compra e Venda de Imóvel, com força de Escritura Pública, com financiamento imobiliário e Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária (Lei n.º 9.514/97), possuindo como objeto a compra dos lotes 3 e 4, localizado na quadra nº 2, no loteamento fechado denominado Jardins Amsterdã.

Com efeito, da detida análise dos autos, constata-se que os litigantes rescindiram a avença em 23 de dezembro de 2014, observados os documentos de ID 48954153 e ID 48954154, bem como que até a citada data, foi pago pela recorrida a quantia de R$ 32.476,06 (trinta e dois mil, quatrocentos e setenta e seis reis e seis centavos) dos dois lotes, ao passo que estava em débito com IPTU e taxas condominiais, no valor de R$8.524,04 (oito mil, quinhentos e vinte e quatro reais e quatro centavos), tendo sido pactuado a retenção para taxas administrativas no importe de R$ 23.952,02 (vinte e três mil, novecentos e cinquenta e dois reais e dois centavos).

Nesse passo, os litigantes pactuaram as cláusulas 3.2.1 e 3.2 no ID 48954153 e ID 48954154 – pág. 03, acerca das quantias que poderiam ser retidas pela pessoa jurídica ré/apelada, sendo válida a autonomia das vontades nos contratos privados, observado o princípio do pacta sunt servanda.

Noutro quadrante, é de bom alvitre ressaltar que, ao contrário do apontado pela recorrente, não há comprovação, no caso em questão, de vício de consentimento por quaisquer das partes, o que enseja a legalidade da anulação do contrato celebrado entre as partes envolvidas na lide em epígrafe, não havendo que se falar, ainda, em coação advinda de negativação cadastral.

Portanto, restou pactuado entre as partes e através de instrumento de rescisão contratual que o desfazimento do negócio jurídico acarretou prejuízos (despesas administrativas, por exemplo, taxa de condomínio e ITU/IPTU) de responsabilidade da empresa Apelante, a qual estava em débito com a pessoa jurídica recorrida, tendo havida a compensação de tais prejuízos com as quantias pagas pela empresa demandante, aqui recorrente.

Neste diapasão, a compensação de valores se deu em observância aos prejuízos suportados pela pessoa jurídica ré com a rescisão contratual por parte da apelante, ressaltando-se que o valor total pago por esta última serviu para amenizar os gastos da apelada com pagamento de funcionários; levantamento do empreendimento e custeio da obra, além do elevado pagamento de carga tributária (taxa de condomínio, IPTU e outros).

Com relação à necessária observância ao princípio do pacta sunt servanda, trago à colação o seguinte julgado desta Corte:

EMENTA: CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MULTA POR DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. APELAÇÕES CÍVEIS. PRETENDIDA REFORMA DA SENTENÇA PARA EXCLUIR A INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. ENTENDIMENTO FIRMADO NESTA CORTE DE QUE O ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL GERA DIREITO À REPARAÇÃO. DANOS MORAIS...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT