Acórdão Nº 08103224720178205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 24-09-2019

Data de Julgamento24 Setembro 2019
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08103224720178205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO - 0810322-47.2017.8.20.5004
Polo ativo
ALEXANDRO DE SENA GOMES
Advogado(s): FELIPPE DE QUEIROZ BESSA BANDEIRA LEITE
Polo passivo
BANCO AGIBANK S.A
Advogado(s): VANESSA INGRID RODRIGUES DA SILVA CAMPOS, SILVIO DO AMARAL VALENCA FILHO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS ATRELADOS Á CARTÃO DE CRÉDITO. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO CLARA PRECONIZADA NO CDC. ONEROSIDADE EXCESSIVA. HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, ENTENDENDO PELA NECESSIDADE DE PERÍCIA. REFORMA QUE SE IMPÕE. DEVER DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTATOS, AUTORIZADA A COMPENSAÇÃO DO VALOR DISPONIBILIZADO AO AUTOR. DANO MORAL ARBITRADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

VISTOS e relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes da Primeira Turma Recursal de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, para determinar a restituição em dobro de todas as parcelas efetivamente descontadas que tenham relação com o cartão de crédito objeto da presente lide, ficando o banco recorrido autorizado a compensar no valor a ser restituído ao recorrente, o saque realizado por este, acrescido de juros e correção a contar da citação, fixando ainda, indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de juros de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação e correção monetária pelo INPC-A a partir desta decisão, nos termos do voto do relator.

Sem condenação em custas e honorários processuais, em virtude do provimento parcial do recurso.

Natal/RN, 19 de setembro de 2019.

VALDIR FLÁVIO LOBO MAIA

JUIZ RELATOR

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Inominado interposto por ALEXANDRO DE SENA GOMES, em face da sentença a quo proferida que, nos autos da AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS movida em face do BANCO AGIBANK S.A, extinguiu o processo sem julgamento de mérito, entendendo pela complexidade da causa ante a necessidade de perícia.

Segue sentença cujo relatório adoto:



Dispensado o relatório, na forma do art. 38, da Lei 9.099/95.

A gratuidade do processo no primeiro grau de jurisdição é a regra no procedimento da Lei nº 9.099/95 (art. 54, caput, da Lei nº 9.099/95). Além disso, o pedido pode ser apreciado em qualquer momento processual e produz efeitos até eventual indeferimento expresso, conforme se infere da jurisprudência do STJ (AgRg nos EAREsp 399852/RJ, DJe 25/11/2015) e da atual norma processual (art. 99, §7º, da Lei nº 13.105/2015), de modo que a apreciação do pedido somente se faz adequada e oportuna quando houver determinação legal para pagamento de custas.

Postula a parte autora “a rescisão do contrato de cartão de crédito em nome da Autora, posto que, pela prova dos Autos, a mesma não autorizou essa modalidade de contratação e nem mesmo tinha conhecimento de que estaria contratado tal modalidade;

b) Condenar a Requerida a ressarcir, na forma dobrada, o indébito, a título de ressarcimento dos Danos Materiais, na quantia de R$ 13.900,92 (treze mil e novecentos Reais e noventa e dois centavos) devendo-se, ainda, computar os juros de mora e a correção monetária;

c) Condenar a Promovida a ressarcir a Autora pelos Danos Morais pela mesma suportados, quantificando-os em 23.579,08 (vinte e três mil quinhentos e setenta e nove Reais e oito centavos), também acrescidos de juros e correção monetária.”

Afirmo a incompetência do juízo, face ao disposto no art. 3º, da Lei 9.099/95, que confere competência ao juizado especial cível apenas processar e julgar causas de menor complexidade.

No caso presente, enunciado da Súmula 21 da TUJ das Turmas Recursais, de 25.01.18, afirma a necessidade de perícia contábil e consequente incompetência do juízo em razão de a apreciação da lide demandar a produção de prova técnica qualificada, o que não se permite em sede de juizado especial.

Se o feito versasse exclusivamente sobre interpretação contratual, o mérito desta lide seria enfrentado, formula a parte autora pedido que para ser apreciado demanda muito mais do que o simples cálculo aritmético, como entende o autor.

Em suas razões recursais, o autor/recorrente alega a nulidade da contratação, asseverando que não obteve informação clara acerca dos termos da avença, incorrendo a instituição financeira recorrida em má-fé. Pugna ao final, pelo conhecimento e provimento do recurso inominado ora interposto, para reformar a sentença, em todos os seus termos, julgando procedente a ação, condenando o recorrido ao pagamento de uma indenização por danos morais, bem como a restituir em dobro os valores pagos a maior, compensando-se a quantia efetivamente utilizada. Sem Contrarrazões pelo desprovimento. É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo, estando o Recorrente litigando sob o pálio da assistência judiciária gratuita, assim, dele conheço e passo a apreciá-lo.

O magistrado de primeiro grau entendeu ser a presente lide causa complexa para tramitação em sede de juizados especiais, por se fazer necessária a realização de perícia para o deslinde da causa.

No entanto, analisando os elementos probatórios acostados pelo Recorrente, vislumbro serem suficientes as provas apresentadas para decidir o caso.

A relação jurídica travada entre o banco recorrido e a parte autora/recorrente é relação de consumo, na forma dos arts. e e 29 da Lei n. 8.078/90 do CDC. Desta forma, evidente se torna a incidência das regras previstas na mencionada lei para o caso dos autos.

Ademais, o STJ sedimentou a discussão no enunciado sumular de sua jurisprudência dominante de n. 297, verbis: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

O caso em análise versa acerca de desconto realizado pela Recorrida no contracheque da parte autora, referente ao contrato de cartão de crédito consignado.

Em relação ao contrato objeto da lide, verifica-se por parte do banco recorrido a clara falha na prestação de serviço, por ferir diretamente normas de proteção ao consumidor e impor a este onerosidade excessiva.

A parte autora, ora recorrente, reconhece que pretendia celebrar contrato de empréstimo consignado, afirmando que não solicitou o cartão de crédito, não sendo esclarecida das reais condições do contrato.

O banco explica que a transação realizada teria ocorrido por meio de um cartão comum onde o titular do cartão autoriza o banco a ser realizado o desconto da fatura diretamente no contracheque ou benefício, respeitado a Reserva de Margem Consignável para obrigações dessa natureza. No caso de cartão de crédito consignado, o art. 1º, §1º da Lei n. 10.820/2003 fixou o percentual de 5% (cinco por cento).

A lei não fixou os critérios de cálculo desses 5%. A Instrução Normativa do INSS n. 28, de 16 de maio de 2008, modificada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015, reiterou a reserva de até 5% (trinta por cento) para as operações de cartão de crédito (art. 3º, §1º, II).

Quanto às exigências para a emissão do cartão de crédito consignado, a matéria está devidamente normatizada nos artigos 15 e seguintes da resolução. No particular, destaco os seguintes dispositivos:

Art. 15. Os titulares dos benefícios previdenciários de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão constituir RMC para utilização de cartão de crédito, de acordo com os seguintes critérios, observado no que couber o disposto no art. 58 desta Instrução Normativa:

I - a constituição de RMC somente poderá ocorrer após a solicitação formal firmada pelo titular do benefício, por escrito ou por meio eletrônico, sendo vedada à instituição financeira: emitir cartão de crédito adicional ou derivado; e cobrar taxa de manutenção ou anuidade;

...

Art. 16. Nas operações de cartão de crédito serão considerados, observado, no que couber, o disposto no art. 58 desta Instrução Normativa...

§ 2º A instituição financeira não poderá aplicar juros sobre o valor das compras pagas com cartão de crédito quando o beneficiário consignar a liquidação do valor total da fatura em uma única parcela na data de vencimento.

§ 3º É PROIBIDA A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PARA SAQUE.

Art. 17. A instituição financeira deverá encaminhar aos titulares dos benefícios com quem tenha celebrado contrato de cartão de crédito, mensalmente, extrato com descrição detalhada das operações realizadas, onde conste o valor de cada operação e local onde foram efetivadas, bem como o número de telefone e o endereço para a solução de dúvidas.

Considerando que o banco recorrido teria autorizado saque no cartão, o que é expressamente vedado, já há razão satisfatória para reconhecer a nulidade da contratação mediante SAQUE.

No entanto, passo a analisar as exigências no que diz respeito ao limite de uso do cartão de crédito consignado bem como à taxa de juros.

Atendendo as disposições dos incisos II e VI do art. 58 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 16 de maio de 2008, o Presidente do INSS expediu a Portaria do INSS n. 1.959, publicada no DOU n. 215, de 9 de novembro de 2017, que fixou a taxa de juros e o limite de reserva de margem consignável no cartão de crédito. Eis a redação:

Art. 1º Ficam regulamentados os incisos II e VI do art. 58 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 2008, reduzindo-se o teto máximo de juros ao mês:

...

II - para as operações realizadas por meio de cartão de crédito para três inteiros por cento (3,00%).

Art. 2º O limite da reserva de margem consignável para o pagamento de amortização de despesas contraídas utilizando cartão de crédito e para uso com a finalidade de saque por meio de cartão de crédito fica reduzido para 1,40 (uma vírgula quarenta...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT