Acórdão Nº 08104062820158205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 14-02-2020

Data de Julgamento14 Fevereiro 2020
Tipo de documentoAcórdão
Número do processo08104062820158205001
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0810406-28.2015.8.20.5001
Polo ativo
HELIO DOURADO LUSTOSA REPRESENTACOES LTDA - EPP e outros
Advogado(s): RODRIGO RIBEIRO ROMANO, LUIZ DO NASCIMENTO GUEDES NETO, LEONARDO ANTONIO CORREIA LIMA DE CARVALHO, JOSE EDUARDO NOGUEIRA JUNIOR
Polo passivo
CERAMICA ELIZABETH LTDA e outros
Advogado(s): LUIZ DO NASCIMENTO GUEDES NETO, LEONARDO ANTONIO CORREIA LIMA DE CARVALHO, JOSE EDUARDO NOGUEIRA JUNIOR, RODRIGO RIBEIRO ROMANO

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. ALEGAÇÃO DE NÃO PAGAMENTO DAS COMISSÕES DE REPRESENTAÇÃO NO TEMPO DEVIDO POR APLICAÇÃO DA CLÁUSULA DEL CREDERE. CLÁUSULA VEDADA PELO ORDENAMENTO JURÍDICO. DEMONSTRAÇÃO SATISFATÓRIA DOS FATOS. INADIMPLEMENTO COMPROVADO. RESCISÃO CONTRATUAL MOTIVADA PELA IMPONTUALIDADE DAS DEMANDADAS. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL CARACTERIZADO. CORRETA CONDENAÇÃO DA INDENIZAÇÃO PREVISTA NO ART. 27 DA LEI N.º 4.886/65. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. PLEITO DA PARTE AUTORA PARA CONDENAÇÃO DAS DEMANDADAS NA MULTA PRÉ-AVISO. IMPOSSIBILIDADE. RESCISÃO DA AVENÇA POR MOTIVO JUSTO INCOMPATÍVEL COM A DENÚNCIA IMOTIVADA DO ART. 34 DA LEI N° 4.886/65. SENTENÇA CONFIRMADA. APELOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima nominadas:

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Turma da Primeira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e julgar desprovidos ambos os apelos, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por todos os litigantes em face de sentença proferida no ID 4950740, pelo Juízo da 12ª Vara Cível da Comarca de Natal-RN, que julgou parcialmente procedente os pedidos formulados na inicial, desconstituindo, por culpa das demandadas, os contratos firmados entre as partes e fixando a condenação destas ao pagamento do valor de R$ 552.361,23 (quinhentos e cinquenta e dois mil e trezentos e sessenta e um reais e vinte e três centavos), devidamente atualizados.

No mesmo dispositivo, foi reconhecia a sucumbência recíproca na proporção de 90% (noventa por cento) para as demandadas e 10% (dez por cento) para a parte autora, fixando os honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.

Em suas razões recursais de ID 4950743, a parte autora afirma ser devida a indenização de pré-aviso, prevista no art. 34 da Lei n° 4.886/1965, posto que o fato desta ser possível para as situações de rescisão contratual imotivada não exclui seu cabimento para a rescisão culposa.

Ressalta que o contrato possuía mais de seis meses e era por prazo indeterminado, fazendo incidir a referida indenização no valor de R$ 40.102,74 (quarenta mil e cento e dois reais e setenta e quatro centavos).

Por fim, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, para que seja reformada a sentença para julgar procedente o referido pedido indenizatório.

Também irresignada, a parte demandada interpôs apelo no ID 4950747, discorrendo sobre a execução contratual do contrato de representação comercial, salientando que o firmado entre as partes foi por prazo indeterminado e de não exclusividade.

Afirma que inexiste cláusula del credere na avença, bem como que o envio de cheques negativados foi apenas para auxiliar na cobrança dos mesmos, conforme previsão contratual.

Destaca que pode reduzir o valor do pagamento pela falta de pagamento, de acordo com o art. 33, § 1º da Lei nº 4.886/65.

Aduz que, como a rescisão contratual foi imotivada, não cabe indenização.

Termina requerendo o provimento de seu recurso.

Intimada, a parte autora apresentou contrarrazões no ID 4950753, nas quais assegura que a falta de pagamento da comissão para garantir a solvabilidade do comprador é motivo justo para rescisão contratual, na forma do art. 36, alínea ‘d’ da Lei n° 4.886/65.

Finaliza postulando pelo desprovimento do apelo das demandadas.

Apesar de devidamente intimadas, as requeridas não apresentaram contrarrazões ao recurso do autor, conforme certidão de ID 4950756.

Instado a se manifestar, o Ministério Público, através da 07ª Procuradoria de Justiça, no ID 4963337, deixou de oferecer parecer opinativo por entender inexistir interesse público que justifique sua atuação.

É o relatório.

VOTO

Estando presentes os requisitos de admissibilidade, voto pelo conhecimento dos apelos apresentados por ambos os litigantes, passando a sua análise conjunta.

Cinge-se o mérito dos recursos em perquirir acerca do acerto da sentença ao rescindir a avença por culpa das demandadas, condenando estas a indenização devida, bem como sobre o direito da parte autora a indenização pré-aviso.

No caso dos autos, em atenção aos elementos de prova reunidos no feito, percebe-se que as partes, embora somente tenham formalizado por escrito a avença em 2009, possuem contrato de representação comercial desde 1995.

Do mesmo modo, verifica-se da avença firmada em 2009 que há previsão contratual de que a remuneração fica condicionada ao recebimento, pela representada dos valores respectivos, conforme se observa da cláusula 4.1 da avença (fl. 03 do ID 4950626).

Considerando o teor da referida cláusula, a sentença reconheceu que a mesma expressava a cláusula del credere, a qual é vedada pelo ordenamento jurídico.

Como se é por demais consabido, a cláusula del credere institui que o vendedor se responsabiliza pela solvência e pontualidade do cliente. No caso dos contratos de representação comercial, antes do advento da Lei 8.420/92, a cláusula del credere era aceita por ser largamente utilizada no cotidiano dos contratos celebrados e a jurisprudência não criar qualquer obstáculo nesse sentido.

Nada obstante, com a alteração legislativa que introduziu ao art. 43 da Lei nº 4.866/65 a vedação expressa à cláusula del credere, a mesma deve ser entendida como uma proibição a qualquer ajuste no sentido de obrigar o representante a garantir a solvência do cliente, pois a intenção do legislador foi afastar o representante das vicissitudes do negócio intermediado.

No caso concreto, a cláusula 4.1 da avença (fl. 03 do ID 4950626) traz, exatamente, a vinculação do pagamento da comissão ao recebimento pela representada dos valores respectivos, sendo, pois, ilegal, inexistindo motivos para a reforma da sentença quanto a este ponto.

Registre-se, por salutar, que a comunicação das apeladas acostada no ID 4950614 (fl. 01 e 07) evidencia, claramente, que o valor dos cheques de clientes devolvidos por falta de fundos “foi descontado de suas comissões” e “já foram descontados de suas comissões”, de forma que devidamente caraterizada a cláusula del credere.

Consigne-se, ainda, que, ao contrário do alegado pelas demandadas em suas razões recursais, os cheques não foram encaminhados para auxiliar nas cobranças, mas sim informando que a comissão não havia sido paga na integralidade por falta de pagamento de um cliente.

Por via de consequência, possível a rescisão contratual, com fundamento no art. 36, alínea “d”, da Lei n.º 4.886/65, alterada pela Lei n.º 8.420/92, que preceitua constituir motivo justo para a rescisão do contrato de representação comercial o não pagamento da retribuição na época devida.

Com efeito, na medida do que já fora acima explanado, em face do inadimplemento contratual pela parte demandada, promoveu-se a resolução do contrato de representação comercial.

Desta forma, caracterizada a rescisão por inadimplemento contratual da recorrente, impõe-se reconhecer o direito à indenização, em atenção ao prescrito no art. 27, alínea “j”, da Lei 4.886/65, in verbis:

- Do contrato de representação comercial, além dos elementos comuns e outros a juízo dos interessados, constarão, obrigatoriamente:

(...)

j) indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 35, cujo montante não poderá ser inferior a 1/12 (um doze avos) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação”.

Neste sentido, é a jurisprudência desta Corte de Justiça:

EMENTA: COMERCIAL E CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO ORDINÁRIA. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. LEI Nº 4.886/65. RESCISÃO. PAGAMENTO DE COMISSÕES. RETENÇÃO INDEVIDA. ILEGALIDADE DA CLÁUSULA DEL CREDERE. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. APELOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS (AC 2012.014862-0 – 2ª Câm. Cível do TJRN – Relª. Desª. Judite Nunes – J. 11.08.2016).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. ALEGAÇÃO DE NÃO PAGAMENTO DAS COMISSÕES DE REPRESENTAÇÃO NO TEMPO DEVIDO. DEMONSTRAÇÃO SATISFATÓRIA DO DÉBITO. INADIMPLEMENTO COMPROVADO. NECESSIDADE DE PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO. RESCISÃO CONTRATUAL MOTIVADA PELA IMPONTUALIDADE DA EMPRESA RECORRENTE. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL CARACTERIZADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES PREVISTA NA LEI N.º 4.886/65. MULTA RESCISÓRIA DEVIDA. DANO MORAL. ENVIO DE CARTAS QUE MACULAM A IMAGEM DA EMPRESA APELADA. ABALO DEMONSTRADO. VALOR RESSARCITÓRIO FIXADO DE MANEIRA COERENTE. ANÁLISE SATISFATÓRIA DA NATUREZA E EXTENSÃO DO ABALO. VALOR QUE ATENDE AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO (AC 2008.008288-6 – 1ª Câm. Cível do TJRN – Rel. Des. Expedito Ferreira – J. 25.11.2008).

Portanto, é devida a indenização pela rescisão contratual, estando a sentença em acerto também quanto a tal ponto.

De resto, remanesce analisar o pleito da parte autora de que a sentença deve ser reformada para deferir o pedido de indenização pré-aviso, prevista no art. 34 da Lei n° 4.886/196.

Referido dispositivo legal preceitua que:

Art. 34. A denúncia, por qualquer das partes, sem causa justificada, do contrato de representação, ajustado por tempo indeterminado e que haja vigorado por mais de seis meses, obriga o denunciante, salvo outra garantia prevista no contrato, à concessão de pré-aviso, com antecedência mínima de trinta dias, ou ao pagamento de...

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