Acórdão Nº 08104608320208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 09-04-2021

Data de Julgamento09 Abril 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08104608320208200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0810460-83.2020.8.20.0000
Polo ativo
MARIA LILIANE BORGES DA SILVA
Advogado(s): MAGALY DANTAS DE MEDEIROS
Polo passivo
UNIMED NATAL
Advogado(s): ANTONIO EDUARDO GONCALVES DE RUEDA

Agravo de Instrumento com Suspensividade n° 0810460-83.2020.8.20.0000

Origem: 5ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN

Agravante: Maria Liliane Borges da Silva

Advogada: Magaly Dantas de Medeiros (OAB/RN 10.912)

Agravada: Unimed Natal – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico

Advogado: Antonio Eduardo Gonçalves de Rueda (OAB/PE 16.983)

Relatora: Desembargadora JUDITE NUNES

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CLEXANE (ENOXAPARINA SÓDICA 40mg). TRATAMENTO DOMICILIAR. NEGATIVA DA OPERADORA. ALEGAÇÃO DE EXCLUSÃO CONTRATUAL E DO ROL DA RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 387/2015 DA ANS. CATÁLOGO EXEMPLIFICATIVO DOS PROCEDIMENTOS BÁSICOS A SEREM COBERTOS. CONTRATO DE ADESÃO. ATESTADO MÉDICO QUE INDICA NECESSIDADE E URGÊNCIA. HIPOSSUFICIÊNCIA CARACTERIZADA. PRECEDENTES. REFORMA DA DECISÃO QUE SE IMPÕE. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas. Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto da relatora, parte integrante deste.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito ativo, interposto por Maria Liliane Borges da Silva em face da decisão proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN, que nos autos da Ação de Obrigação de Fazer nº 0869589-51.2020.8.20.5001, proposta em desfavor de Unimed Natal – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, indeferiu o pedido de antecipação da tutela, para fornecimento do medicamento pela operadora do plano de saúde.

Em suas razões recursais a recorrente sustenta, em síntese, que sofre detrombofilia gestacional, necessitando fazer uso do medicamento ENOXOPARINA SÓDICA(CLEXANE) 40 mg, “durante a gestação e após o parto”.

Sustenta que a medicação pleiteada é registrada na ANVISA e está incluída no Protocolo de Diretrizes do SUS, sendo recomendado o uso da medicação no caso dos autos, mulheres gestantes portadoras de trombofilia.

Aduz que os laudos médicos constantes dos autos se reportam à necessidade do medicamento.

Afirma que o não uso do medicamento em perfeita conformidade com o descrito na receita médica poderá acarretar mortalidade fetal e materna.

Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso com a concessão da tutela de urgência para determinar que a Agravada custeie o tratamento ora indicado, fornecimento do fármaco CLEXANE 40mg, sob pena de multa diária de R$1.000,00 (mil reais),confirmada ao final.

Por fim, requer a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária.

Colaciona documentos à inicial.

Deferido o pedido de antecipação de tutela para que o recorrido forneça o medicamento nos moldes constantes da prescrição médica. (Id. 8112649)

Contrarrazões constantes do Id. 8528772.

A 7ª Procuradoria de Justiça deixou de opinar no feito por entender ausente interesse ministerial.

É o relatório.

V O T O

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

Cinge-se o mérito recursal em aferir a possibilidade de a Agravada fornecer à Agravante, medicação imprescindível à sua saúde (ENOXOPARINA SÓDICA, 40mg).

Neste sentido, importante frisar que, de acordo com a informação prestada pela médica que acompanha a paciente (Id 8091818), a primeira gravidez evoluiu com abortamento, sem tratamento. Sendo necessário o uso, portanto, a utilização do medicamento.

Nesse prisma, há de se dar primazia ao direito à saúde e à vida do paciente.

In casu, ao menos no atual estágio processual, quando ainda não aprofundada a cognição, a probabilidade do direito autoral se afigura presente, sobretudo frente ao consagrado entendimento, assente em nossa jurisprudência, de que ao profissional médico que acompanha o paciente é dada a independência para prescrever o tratamento mais adequado e que a negativa da operadora de saúde, nestes casos, configura-se, indiscutivelmente, como abusiva.

Como se isso não fosse suficiente, destaque-se o enunciado sumular de nº 608, do Superior Tribunal de Justiça, o qual, nos termos que seguem, dispõe sobre a incidência do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de Plano de Saúde:

Súmula 608: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Nesta linha, o artigo 54, §4º, do Código de Defesa do Consumidor estabelece que, em se tratando de contrato de adesão, as cláusulas que impliquem limitação de direitos deverão se redigidas com destaque, de modo a facilitar a imediata e fácil compreensão do consumidor. Ou seja, eventuais exceções ao amplo atendimento médico e hospitalar devem ser realçadas para permitir a cristalina ciência do usuário.

Desta feita, ainda que haja previsão contratual limitando o procedimento ora requerido, é cediço que é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação entabulada entre as partes, com o fito de restaurar o equilíbrio contratual determinado por lei, notadamente em face da função social dos contratos.

De outra banda, em que pese o Superior Tribunal de Justiça reconhecer a possibilidade do Plano de Saúde prever as doenças para as quais garantirá cobertura, sabe-se que não poderão ocorrer restrições aos tratamentos utilizados para tal mister. Em verdade, considera-se ilícita a negativa de cobertura do plano de saúde de procedimento, tratamento ou material considerado essencial para preservar a integridade do paciente.

De fato, a indicação médica é de responsabilidade do profissional que prescreveu tal procedimento, sendo desarrazoado ao Judiciário adentrar no mérito da adequação/utilidade do tratamento (STJ - AgRg no Ag: 1325939/DF, Relator: Min. Raul Araújo, Data de Julgamento: 03.04.14, 4ª Turma).

Em casos semelhantes aos dos autos, já se manifestaram outros Tribunais:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO ENOXAPARINA - CLEXANE 60 MG, A SER UTILIZADO TODOS OS DIAS DURANTE A GRAVIDEZ DA AUTORA, BEM COMO APÓS O PARTO, EM RAZÃO DE TROMBOFILIA HEREDITÁRIA. DECISÃO QUE DEFERIU A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. MANUTENÇÃO. AINDA QUE HAJA CLÁUSULA LIMITADORA DO FORNECIMENTO DE FÁRMACO DE USO DOMICILIAR, VEM A JURISPRUDÊNCIA MITIGANDO O ENTENDIMENTO NO SENTIDO DE DEVER SER AFASTADA A EXCLUSÃO QUANDO A DOENÇA É COBERTA PELO PLANO DE SAÚDE. PROFISSIONAL DA ÁREA MÉDICA QUE PRESCREVEU O TRATAMENTO, NÃO SENDO VIÁVEL A SUA DESCONSIDERAÇÃO. PRAZO DE QUARENTA E OITO HORAS QUE SE REVELA RAZOÁVEL. DECISÃO QUE NÃO SE MOSTRA TERATOLÓGICA, CONTRÁRIA À LEI OU À PROVA OS AUTOS. SÚMULA 59 DO TJRJ. RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (TJRJ - AI: 0025288-81.2019.8.19.0000, Relator: Des. Eduardo de Azevedo Paiva, Data de Julgamento: 10.07.19, 18ª Câmara Cível). (Grifos acrescidos).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO COMINATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. AUTORA GESTANTE COM DIAGNÓSTICO DE TROMBOFILIA. DEFERIMENTO DA TUTELA DE URGÊNCIA PARA COMPELIR A OPERADORA A FORNECER O MEDICAMENTO "CLEXANE", NA FORMA PRESCRITA PELO MÉDICO ESPECIALISTA. RECURSO DA RÉ. ALEGADA EXISTÊNCIA DE EXCLUSÃO DE COBERTURA PARA FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE USO DOMICILIAR. INSUBSISTÊNCIA. CLÁUSULA LIMITATIVA REDIGIDA DE FORMA GENÉRICA. PREVISÃO DE COBERTURA PARA A DOENÇA QUE ACOMETE A AUTORA, BEM COMO ACOMPANHAMENTO OBSTÉTRICO. IMPRESCINDIBILIDADE DO MEDICAMENTO ATESTADO POR MÉDICO ESPECIALISTA. APLICAÇÃO DAS NORMAS CONSUMERISTAS. STJ, SÚMULA 608. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR, A TEOR DO ARTIGO 47 DO CDC. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC PREENCHIDOS. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC - AI: 4019103-18.2019.8.24.0000, Relator: Des. André Luiz Dacol, Data de Julgamento: 20.08.19, 6ª Câmara de Direito Civil). (Grifos acrescidos).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. PEDIDO DE FORNECIMENTO DO FÁRMACO CLEXANE. NEGATIVA COBERTURA. DESCABIMENTO. ABUSIVIDADE RECONHECIDA. Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão proferida pela magistrada a quo, que deferiu o pedido de fornecimento do fármaco Clexane 40mg, em face da gravidade da situação de saúde da autora, ora recorrida, bem como em virtude de não haver previsão contratual de exclusão de cobertura. A relação jurídica em tela está submetida ao Código de Defesa do Consumidor, segundo entendimento da Súmula 469 do colendo Superior Tribunal de Justiça. Os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código Consumerista, nos termos do artigo 35 da Lei nº. 9.656/98, uma vez que envolvem típica relação de consumo. Assim, incide na espécie o artigo 47 do referido Código, o qual determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor. No caso telado, a parte agravada foi diagnosticada com ser portadora da Síndrome de Antifosfolípice, o que leva a complicações na gestação e parto, comprometendo o sistema imunológico. Assim, em face do agravamento da doença, o recorrido afirmou que o médico prescreveu o uso da medicação Clexane 40 mg, para fins de aumentar a sua sobrevida, porém, sustentou que ao. solicitar o custeio de tal fármaco para a parte agravante, o pedido foi negado, sob a alegação de que o medicamento em questão não possui previsão na Resolução Normativa nº. 387/2015 da ANS. Os planos de saúde apenas podem estabelecer para quais moléstias oferecerão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, incumbência essa que pertence ao profissional da medicina que assiste o paciente, razão pela qual é...

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