Acórdão Nº 08108756120238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 01-11-2023

Data de Julgamento01 Novembro 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08108756120238200000
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0810875-61.2023.8.20.0000
Polo ativo
C. M. S. L. e outros
Advogado(s): RICARDO CESAR GOMES DA SILVA
Polo passivo
UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO
Advogado(s): RODRIGO MENEZES DA COSTA CAMARA

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO PARA QUE A PARTE AGRAVADA CUSTEIE A REALIZAÇÃO DO TRATAMENTO DO AGRAVANTE DE FISIOTERAPIA PELO MÉTODO PEDIASUIT. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. ALEGAÇÃO DA OPERADORA DE NÃO ESTAR O PLEITO INSERIDO NO ROL DA ANS – AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. EXCLUSÃO DE COBERTURA CONTRATUAL ABUSIVA. PRESCRIÇÃO MÉDICA. PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRECEDENTES DESTA CORTE. DECISÃO REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas. Acordam os Desembargadores da 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, em harmonia com o parecer ministerial, em conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de Instrumento por C. M. S. L. representado pelo seu genitor Daniel Penteado Lana contra decisão oriunda do Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da ação ordinária com pedido de obrigação de fazer nº 0845491-94.2023.8.20.5001 ajuizada em desfavor da UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, indeferiu a tutela de urgência pleiteada que objetivava que a agravada custeie o tratamento do agravante de fisioterapia pelo método PediaSuit.

Em suas razões recursais, a agravante aduz trata-se de criança que possui 2 anos e 7 meses de vida e teve diagnóstico clinico de Síndrome Say-Barber-Biesecker-Young-Simpson (CID-10: q87.8), Síndrome Genitopatelar (OMIM:606170) e Atraso Global do Desenvolvimento (CID-10: F84), os quais alteram o desenvolvimento da criança atrasando a aquisição de competências motoras normais.

Afirma que apresenta presença de hipotonia de forma global, frouxidão ligamentar, gerando uma hipermobilidade articular, ocasionando um atraso no desenvolvimento de novas habilidades e padrões motores e em razão do seu quadro clinico, o Dr. Marcelo Amorim Araújo, neuropediatra, CRM/RN n° 6750, prescreveu a terapia: Fisioterapia pelo método PediaSuit – Intensivo e Manutenção.

Acrescenta que seu pedido de tutela antecipada de urgência fora indeferido sob o único fundamento de que não há probabilidade do direito, por não terem as operadoras de planos de saúde a obrigação de fornecerem tratamento que não possui evidência científica e que o referido procedimento não está listado no rol da ANS.

Ressalta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se encontra consolidada no sentido de que deverão prevalecer as diretrizes terapêutica definidas pelo médico assistente, qualificando-se o rol da ANS como meramente exemplificativo.

Cita várias jurisprudências para sustentar a sua tese e, ao final, pede a concessão dos efeitos da tutela recursal ao presente recurso, para determinar à agravada forneça à agravante a terapia motora através do método PediaSuit, indicada pelo médico neuropediatra Dr. Marcelo Amorim Araújo, CRM/RN n° 6750 e pela fisioterapeuta Aisy Azevedo dos Santos CREFITO n° 209.737-F nos termos da prescrição médica e do relatório fisioterápico. No mérito, pede o provimento do recurso, com a confirmação da antecipação da tutela recursal.

Restou deferido o pedido da tutela recursal pleiteada.

Intimada, a parte agravada deixou de apresentar contrarrazões.

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o que importa relatar.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente agravo de instrumento.

O presente recurso visa a reforma da decisão agravada que indeferiu a tutela de urgência pleiteada que objetivava que a agravada custeie o tratamento do agravante de fisioterapia pelo método PediaSuit.

Dos autos da demanda na origem, colhe-se que a agravada trata-se de uma criança usuária da operadora do plano de saúde demandado, que possui 2 anos e 7 meses de vida e teve diagnóstico clinico de Síndrome Say-Barber-Biesecker-Young-Simpson (CID-10: q87.8), Síndrome Genitopatelar (OMIM:606170) e Atraso Global do Desenvolvimento (CID-10: F84), os quais alteram o desenvolvimento da criança atrasando a aquisição de competências motoras normais, necessitando de tratamento através do método PediaSuit, indicada pelo médico neuropediatra Dr. Marcelo Amorim Araújo, CRM/RN n° 6750 e pela fisioterapeuta Aisy Azevedo dos Santos CREFITO n° 209.737-F nos termos da prescrição médica e do relatório fisioterápico.

Contudo, o plano de saúde agravante negou autorização, sob o argumento de que o tratamento da autora não consta no rol da ANS.

Os contratos de plano de saúde se submetem ao Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, § 2º), conforme disposição da Súmula 608 do STJ. Em razão disso, as cláusulas do contrato devem respeitar as formas de elaboração e interpretação contratual previstas na lei consumerista.

Na hipótese, é incontroverso que o(a) usuário(a) necessita do tratamento indicado, vez que solicitado pelo médico assistente, conforme laudo já citado.

Nesse contexto, o Poder Judiciário pode até negar pretensões neste sentido, a depender das peculiaridades do caso concreto, mas não possui elementos para contrariar as conclusões do profissional de saúde.

Nesse rumo, penso que laborou de forma equivocada o juízo de primeiro grau, eis que, a conduta da ré, ora agravada, em recusar o custeio do tratamento prescrito pelo profissional de saúde, sob a alegação da ausência de previsão no rol de procedimentos da ANS ou de cobertura contratual, além de descabida, é abusiva, especialmente porque não é dada a operadora de plano de saúde a escolha do tratamento da patologia, cabendo tal escolha ao profissional de saúde, notadamente por meio de métodos mais eficientes, o que deve se sobrepor as demais questões, pois que o bem envolvido no contrato celebrado entre as partes é a saúde e a vida.

Como sabido, os contratos de planos de saúde, além de serem classificados como contratos de consumo, são também contratos de adesão. Por conseguinte, a interpretação de suas cláusulas contratuais segue as regras especiais de interpretação dos contratos de adesão ou dos negócios jurídicos estandardizados.

Assim sendo, diante da existência de dúvidas, imprecisões ou ambiguidades no conteúdo de um negócio jurídico, deve-se interpretar as suas cláusulas do modo mais favorável ao aderente.

Nesta toada, há vários precedentes desta Corte de Justiça no sentido de obrigar as operadoras de planos de saúde a custear o tratamento multidisciplinar, em especial os métodos Pediasuit e Bobath, consoante ementas abaixo transcritas:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. PLANO DE SAÚDE. CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. CRIANÇA COM DIAGNÓSTICO DE EPILEPSIA FOCAL ESTRUTURAL FARMACORRESISTENTE, PARCIALMENTE CONTROLADA EM USO DE FENOBARBITAL E OXCARBAZEPINA. INDICAÇÃO MÉDICA DE FISIOTERAPIA PELO MÉTODO PEDIASUIT. NEGATIVA. ALEGAÇÃO DA OPERADORA DE NÃO ESTAR O PLEITO ABRANGIDO NO CONTRATO NEM INSERIDO NO ROL DA ANS – AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA NO JUÍZO A QUO. PACIENTE QUE FEZ PROVA QUANTO À NECESSIDADE DO TRATAMENTO. OBRIGATORIEDADE DO PLANO DE SAÚDE DE DISPONIBILIZAR TODOS OS MEIOS QUE IMPLIQUEM O ÊXITO DO PROCEDIMENTO MÉDICO PRESCRITO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. OPÇÃO TERAPÊUTICA QUE NÃO PODE SER DESCONSIDERADA PELA EMPRESA DEMANDADA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO À VIDA. DEMONSTRAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA POSTULADA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0802523-17.2023.8.20.0000, Dra. Martha Danyelle Barbosa substituindo Des. Amilcar Maia, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 12/07/2023, PUBLICADO em 13/07/2023).

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE INDEFERIU A TUTELA DE URGÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. CRIANÇA COM MICROCEFALIA E ENCEFALOPATIA CRÔNICA. TERAPIA PELO PROCEDIMENTO PEDIASUIT, TREINI, INTEGRAÇÃO SENSORIAL. BOBATH, CUEVAS MEDECK, KINESIOTAPING E NEUROMODULAÇÃO. EVIDENCIADA A ABUSIVIDADE DA LIMITAÇÃO AO ATENDIMENTO EM QUESTÃO. PREENCHIMENTOS DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO PARCIAL DA TUTELA DE URGÊNCIA. FORNECIMENTO DE ÓRTESES E EQUIPAMENTOS PELO PLANO DE SAÚDE QUE SE MOSTRA INDEVIDO. OBRIGAÇÃO FORA DA COBERTURA CONTRATUAL. PRECEDENTES DESTA EGRÉGIA CORTE DE JUSTIÇA E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REFORMA DA DECISÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0804113-29.2023.8.20.0000, Des. Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 16/06/2023, PUBLICADO em 25/07/2023).

No respeitante à taxatividade do Rol da ANS, ressalto ser do conhecimento deste magistrado a recente conclusão do julgamento dos EREsp’s nº 1.886.929/SP e 1.889.704/SP pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, nos quais se assentou a taxatividade do Rol de Procedimentos da ANS, “com possibilidades de coberturas de procedimentos não previstos na lista.”

Posteriormente ao julgamento acima referido, a Lei 9.656/1998 foi alterada pela Lei 14.454/2022, para estabelecer critérios que permitam a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estejam incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar.

Com a alteração, o rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar passou a constituir, expressamente, a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados à referida...

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