Acórdão Nº 08118454520188205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 24-09-2020

Data de Julgamento24 Setembro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08118454520188205106
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0811845-45.2018.8.20.5106
Polo ativo
NIKELLYNE KEYKE MAIA MONTEIRO e outros
Advogado(s): ANDERSON GUSTAVO LINS DE OLIVEIRA CRUZ, MARINA DANTAS GURGEL VERAS
Polo passivo
GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA
Advogado(s): JULIO CESAR GOULART LANES

APELAÇÃO CÍVEL N° 0811845-45.2018.8.20.5106

APELANTE: Nikellyne Keyke Maia Monteiro, L. M. M. M. e J. D. M. M.

Advogados: Marina Dantas Gurgel Veras (OAB/RN 12.621) e Anderson Gustavo Lins de Oliveira Cruz (OAB/RN 9.306)

APELADO: General Motors do Brasil Ltda

Advogado: Júlio Cesar Goulart Lanes (OAB/RN 712-A)

RELATORA: Desembargadora Maria Zeneide Bezerra

EMENTA: PROCESSO CIVIL. OCORRÊNCIA DE SINISTRO COM FALHA NO ACIONAMENTO DOS AIR BAGS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS PROPOSTA POR GENITORA E FILHOS. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, SUSCITADA PELO PROCURADOR DE JUSTIÇA. DEMANDA COM INTERESSE DE INCAPAZES. AUSÊNCIA DE INTERVENÇÃO MINISTERIAL NO PRIMEIRO GRAU. SENTENÇA QUE NÃO ACOLHEU O PLEITO DOS DEMANDANTES. MANIFESTAÇÃO DO PARQUET EM SEGUNDO GRAU QUE NÃO SUPRE AS PROVIDÊNCIAS QUE PODERIAM TER SIDO ADOTADAS NA INSTÂNCIA DE ORIGEM (PRODUÇÃO DE PROVAS, REQUERIMENTO DAS MEDIDAS PROCESSUAIS PERTINENTES E A INTERPOSIÇÃO DE RECURSO). PREJUÍZO EVIDENTE. ACOLHIMENTO. NULIDADE DO FEITO E RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO, AGORA COM A INTERVENÇÃO MINISTERIAL. EXAME DA APELAÇÃO CÍVEL PREJUDICADA.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, acolher a preliminar de nulidade processual, suscitada pelo Dr. Fernando Batista de Vasconcelos, 12º Procurador de Justiça, e anular todos os atos decisórios praticados no processo desde o momento em que o Ministério Público deveria ter sido intimado para intervir no feito e determinar que os autos retornem ao juízo de origem para que sejam retomadas as fases processuais, agora com a participação do Órgão fiscalizador no interesse dos litigantes menores, restando prejudicada a apelação dos autores, nos termos do voto da relatora.

RELATÓRIO

O MM. Juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Mossoró/RN, ao decidir a Ação Ordinária nº 0811845-45.2018.8.20.5106, ajuizada pelos apelantes em face da General Motors do Brasil Ltda, após concluir que a autora não sofreu nenhuma lesão corporal em função do sinistro e do não acionamento do sistema de segurança, donde se conclui que, ainda que o airbag não tenha funcionado, os demais itens protetivos existentes no veículo foram suficientes para minorar ou evitar as potenciais lesões decorrentes do sinistro, não havendo no ordenamento jurídico pátrio o dever de reparar dano meramente hipotético, haja vista que a reparação advém do dano e não da possibilidade de sua ocorrência.

A seguir, condenou os autores ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os estes últimos arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, todavia suspensos por força do art. 98, § 3º, do NCPC (Id 5476634, págs. 01/04).

Inconformados, os demandantes protocolaram Apelação Cível com base nos seguintes argumentos (Id 5476636, págs. 01/15):

a) preliminar de inobservância do princípio do devido processo legal e do contraditório, diante do julgamento antecipado da lide sem que tenha sido oportunizado aos autores fazer uso de todos os meios de provas requeridos ao longo da instrução processual, bem como realizar o exercício ao direito à ampla defesa dos seus interesses e do contraditório;

b) em decorrência da falha do referido mecanismo, resta comprovada a responsabilidade civil, além da ilicitude do ato, consubstanciado no abuso de direito que leva ao abalo nas relações psíquicas, que seja demonstrado o nexo de causa existente entre a efetiva produção do prejuízo e a conduta dolosa ou culposa do causador;

c) o não acionamento do air bag é capaz de causar transtornos ao consumidor, haja vista que o produto fornecido não correspondeu à legítima expectativa de segurança criada pelo fornecedor, por ocasião da venda do produto, sendo certo que a abertura do air bag, mesmo que não fosse suficiente para evitar os danos sofridos, correspondia exatamente à expectativa criada no consumidor pelo próprio fornecedor

Pediram, então, a anulação da sentença ... e o consequente retorno dos autos a primeira instância para que seja oportunizada a realização de instrução processual para a devida elucidação das circunstâncias fáticas.

No mérito, disseram esperar a reforma da sentença, com o reconhecimento do dever de indenizar.

Em contrarrazões, a apelada argumentou não ter havido cerceamento de defesa eis que não haveria necessidade de produção de prova para apurar danos cuja inexistência se tornou incontroversa, o que autoriza o julgamento antecipado do feito.

Em relação a questão de fundo, aduziu:

(i) os air bags não foram acionados, não por falha/defeito do sistema, mas sim porque a dinâmica do sinistro foi insuficiente à ativação do equipamento, somente observado diante das seguintes condições: ocorrência de impacto frontal de considerável intensidade no ângulo máximo de 30º em relação a frente do veículo, quando os cintos de segurança e os tensionadores forem insuficientes para evitar que os ocupantes dos bancos dianteiros colidam com o volante, painel de instrumentos e para brisas a sua frente;

(ii) é incontroverso que o cinto de segurança conferiu proteção adequada e suficiente para prevenir um choque violento do corpo da ocupante do banco dianteiro, a primeira Apelante, contra o volante e o painel do veículo;

(iii)“eventual reconhecimento da existência de um defeito, sem a realização de perícia técnica, embaraçaria o regular exercício do direito de ação das partes e impediria a realização das garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, já que implica no cerceamento do direito à produção de provas”;

(iv) fotos e documentos médicos acostados evidenciam que a primeira Apelante foi atendida após o acidente (ID 28505688 - Pág. 1), com queixa de dores torácicas e cervicais, tendo o médico constatado apenas a presença de equimose no tórax, ou seja, vermelhidão na pele, sem quaisquer lesões ou fraturas. A vermelhidão na pele, como o próprio médico atestou, decorreu do cinto de segurança, que atuou de forma adequada e suficiente para preservar a integridade física da primeira Apelante”;

(v) de acordo com a inicial, os filhos da Apelante, segundo e terceiro Apelantes, ocupavam o banco traseiro, que não é equipado com airbags, de modo que não teriam recebido proteção adicional caso os airbags dianteiros tivessem deflagrado;

(vi) a primeira Apelante causou o acidente e, ainda assim, não sofreu quaisquer danos físicos, graças à proteção adequada e suficiente conferida pelo cinto de segurança e pela estrutura do veículo. Quanto ao segundo e terceiro Apelantes, filhos da primeira Apelante, sequer há prova de que estavam no veículo e não poderiam sofrer danos por um acidente que, muito provavelmente, não presenciaram. Nada obstante, ainda que estejam os Apelantes abalados ou traumatizados pela ocorrência do acidente, tais efeitos são resultado da própria conduta da primeira Apelante, que causou o acidente, e não de conduta da Apelada”;

(vii) os autores alegaram que o dano sofrido seria frustração da expectativa de que o airbag seria deflagrado, o que, logicamente, não enseja uma reparação.

Com base nesses argumentos, pugnou pelo desprovimento do recurso (Id 5476640, págs. 01/15).

O preparo foi pago, conforme documento de Id 4745037 (pág. 08).

O Dr. Fernando Batista de Vasconcelos, 12º Procurador de Justiça, ao emitir parecer, alegou que, considerada a visível nulidade, com prejuízo notório a parte incapaz, suscita este órgão do Ministério Público a preliminar acima detalhada, com o fim de que seja declarada nula a sentença de primeiro grau, e, bem assim, os atos praticados a partir do momento em que se tornou obrigatória a participação do Ministério Público no feito (Id 6344978, págs. 01/05).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço a apelação e passo a examinar a preliminar de nulidade do processo, arguida pelo Dr. Fernando Batista de Vasconcelos, 12º Procurador de Justiça, em parecer de Id 6344978 (págs. 01/05).

Com razão o suscitante. Explico.

A ação ordinária foi proposta por Nikellyne Keyke Maia Monteiro e seus filhos, L. M. M. M. e J. D. M. M, em face da General Motors do Brasil Ltda, tendo a primeira alegado que comprou automóvel fabricado pela demandada e se envolveu em acidente de trânsito, do qual resultou a perda total do veículo, sem que o sistema de proteção do airbags tenha sido acionado.

A genitora alega, ainda, que essa circunstância agravou a situação de risco a que ela e seus filhos alegam ter sido expostos.

Pediram, então, a condenação da empresa em indenização por danos morais, mas a pretensão foi julgada improcedente na primeira instância.

Ocorre que, conforme observado pelo Ministério Público de segundo grau, a ação ordinária tramitou, durante todo tempo, sem a presença do Órgão fiscalizador, a despeito de sua presença ser imprescindível, haja vista que a lide envolve interesse de incapazes, conforme dispositivos legais que destaco:

Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam:

(...)

II - interesse de incapaz;

(...)

Art. 179. Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público:

I - terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo;

II - poderá produzir provas, requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer.

Logo, a inobservância aos comandos legais transcritos macula, evidentemente, a marcha processual,...

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