Acórdão Nº 08120246220168205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 20-04-2020

Data de Julgamento20 Abril 2020
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08120246220168205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0812024-62.2016.8.20.5004
Polo ativo
MARIA EDITE FIGUEIREDO e outros
Advogado(s): CAMILA ARRUDA DE PAULA, WILSON SALES BELCHIOR
Polo passivo
AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. e outros
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR, CAMILA ARRUDA DE PAULA

PODER JUDICIÁRIO

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

1ª TURMA RECURSAL DE NATAL

RECURSO CÍVEL VIRTUAL Nº 0812024-62.2016.8.20.5004

ORIGEM: 2º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE NATAL

JUIZA MONOCRÁTICO: GUILHERME MELO CORTEZ

RECORRENTE: MARIA EDITE FIGUEIREDO

ADVOGADA: CAMILA ARRUDA DE PAIVA

RECORRIDO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR

JUZ RELATOR: VALDIR FLÁVIO LOBO MAIA

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. INSURGÊNCIA DO CONSUMIDOR CONTRA COBRANÇAS DE TARIFAS INDEVIDAS. CONTRATO FIRMADO EM 2009. AÇÃO AJUIZADA EM 2016. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL. RECURSO POR AMBAS AS PARTES. COBRANÇA DE TARIFA DE CADASTRO PERMITIDA NO INÍCIO DO RELACIONAMENTO ENTRE O CONSUMIDOR E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VALOR COBRADO DE ACORDO COM A MÉDIA ESTIPULADA PELO BANCO CENTRAL. TARIFA DE INCLUSÃO DE GRAVAME. POSSIBILIDADE. CONTRATO CELEBRADO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA RESOLUÇÃO Nº 33.954/2011 DO CMN. COBRANÇA DE CORRESPONDENTE ARRENDADORA E CONTRAPRESTAÇÃO. ILICITUDE. RESTITUIÇÃO SIMPLES DEVIDA. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDO O MANEJADO PELO BANCO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos do recurso cível virtual acima identificado, decidem os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer dos recursos interpostos dando provimento parcial apenas ao manejado pelo banco recorrente, declarando a ilicitude apenas das tarifas denominadas serviço correspondente arrendadora e contraprestação, devendo o banco recorrido restituir ao autor, na forma simples, os valores no importe de R$ 881,07 (oitocentos e oitenta e um reais e sete centavos), acrescido de juros da citação e correção monetária do ajuizamento da ação, nos termos do voto do relator.

Sem condenação em custas processuais e honorários advocatícios, com relação ao recurso do banco.

Quanto ao recurso da autora, condenação em custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, observando-se o disposto no Art. 98, § 3º do Código de Processo Civil.



Natal/RN, 20 de abril de 2020.

VALDIR FLÁVIO LOBO MAIA

Juiz Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Inominado interposto por AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. E MARIA EDITE FIGUEIREDO, em face de sentença que julgou parcialmente procedente a ação, nos seguintes termos:

Isto posto, rejeito as preliminares suscitadas pela parte ré, rejeito a prejudicial de mérito arguida pelo réu, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, DECLARO abusivas e nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que preveem a cobrança de Tarifa de Serviço Prestado pela Correspondente da Arrendadora, da Tarifa de Inserção do Gravame e do Valor Contra Prestação, e CONDENO a parte ré na repetição do indébito, no valor total de R$ 1.837,78 (mil, oitocentos e trinta e sete reais e setenta e oito centavos), valor este atualizado monetariamente através do índice INPC desde a data do efetivo prejuízo (data da celebração do contrato) (Súmula 43, STJ) e acrescido de juros de mora a partir da citação válida (arts. 405 e 406, CC).”

Em suas razões, a autora ora recorrente pugna, em suma, que seja reconhecida a ilegalidade da cobrança de tarifa de cadastro declarada lícita na sentença.

Por sua vez, o banco em seu recurso renova a prejudicial de prescrição, bem como sustenta a legalidade de todas as tarifas cobradas contratualmente, inexistindo ato ilícito em sua pactuação, aduzindo pelo afastamento da restituição determinada em sentença.

Por fim, pugnam pelo conhecimento e provimento dos recursos.

Contrarrazões pelo desprovimento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos e passo a apreciá-los.

De início, cumpre registrar que a presente ação trata de clara relação de consumo, sendo regida, portanto, pelo Código de Defesa do Consumidor.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça pacificou o tema acerca da prescrição relativa a matéria e estabeleceu que a repetição de indébito por ser cobrança indevida de valores decorrente de relação contratual se sujeita ao prazo de dez anos, não se aplicando o lapso de três anos, tendo em vista que a pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica.”(In. Embargos de Divergência em REsp nº 1.523.744 – RS, Rel. Min. OG FERNANDES, j. 20/02/2019, DJe 13/03/2019).

Segundo a Corte Especial, a discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica”.

Por isso, considerando que, no caso ora sob análise, não houve decurso de mais dez anos entre a celebração do contrato (ano de 2009) e a propositura da ação (ano de 2016), incorreu a prescrição da pretensão autoral.

Adentrando ao recurso da autora, este não merece prosperar.

Estabelece o enunciado da Súmula nº 566, do Superior Tribunal de Justiça:

Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira.

No caso da tarifa de cadastro, o Superior Tribunal de Justiça apreciou a possibilidade de sua cobrança em Recurso Especial específico, notadamente o Resp nº 1.251.331, ocasião em que restou firmado o entendimento de validade da cobrança no início do relacionamento, ressalvada a vantagem exagerada e excessiva por parte da instituição financeira.

No que pertine ao controle da abusividade, a Corte Especial fez constar expressamente a necessidade de aferição por meio de critérios objetivos de mercado e peculiaridades do caso concreto. O julgado em referência cuidou ainda de vedar a apreciação de tal abusividade por meio de convicção subjetiva, dispondo o seguinte:

Esse abuso há de ser objetivamente demonstrado por meio da invocação de parâmetros objetivos de mercado e circunstâncias do caso concreto, não bastando a mera remissão a conceitos jurídicos abstratos ou à convicção subjetiva do magistrado”.

I.I - CASO CONCRETO

Vejo que há previsão expressa no contrato acostado aos autos quanto à Tarifa de Cadastro, no importe de R$ 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais), tendo sido prevista exatamente no início do relacionamento entre as partes.

Na tabela anexa ao sítio virtual do Banco Central do Brasil1, (acesso em 07.04.2020) consta o valor médio cobrado por esta tarifa R$ 553.17 (quinhentos e cinquenta e três reais e dezessete centavos), valor razoável para remunerar o serviço prestado pela instituição bancária, sobretudo por se tratar de referência de valores que refletem a realidade de mercado, consolidados pela autoridade monetária competente.

No caso, o banco efetuou a cobrança em valor abaixo do previsto no banco central. Logo, não há que se falar em controle de abusividade.

Desse modo, nego provimento ao recurso da parte autora.

No tocante ao recurso manejado pelo banco, este merece provimento em parte.

Vejamos as tarifas impugnadas:

IV– GRAVAME ELETRÔNICO:

Referida Tarifa de inclusão de gravame foi regularmente cobrada, visto que o contrato celebrado entre as partes é anterior à vigência da resolução nº 33.954/2011 do CMN. Logo, não há que se falar em sua restituição.

V- SERVIÇO PRESTADO POR CORRESPONDENTE:

Ausência de comprovação da efetiva prestação do serviço. Valor devido ao consumidor.

VI- VALOR CONTRAPRESTAÇÃO:

Cobrança genérica sem respaldo legal. Devida a restituição ao consumidor.

VII- DA FORMA DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO:

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 42, parágrafo único dispõe que:

consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que no caso de cobrança indevida, o engano é justificável se não decorrer de dolo ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do fornecedor do serviço. Sendo certo que, a mera ocorrência de cobrança indevida não dá ensejo à devolução em dobro do valor pago” (In. AgRg no AREsp 327606/RJ, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Primeira Turma, j. 28/03/2017, DJe 05/04/2017).

Assim, para que seja determinada a repetição do indébito em dobro não basta a cobrança indevida, mas, também, a configuração de má-fé (dolo) ou culpa do fornecedor do serviço, de modo a afastar a ressalva legal “engano justificável”.

Ademais, a questão já foi pacificada no âmbito das Turmas de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte, sendo editada a súmula 11, in verbis:

A cobrança de tarifas administrativas em contrato de financiamento declarada abusiva com fundamento no RESP Repetitivo 1251331/RS, dá ensejo à restituição simples de valores, como forma de se coibir o enriquecimento ilícito da instituição financeira. Inviável a repetição em dobro do indébito nas hipóteses em que não demonstrada a efetiva má-fé do credor”.

Por isso, a devolução dos valores deve ser feita na...

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