Acórdão Nº 08126940420218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 20-01-2022

Data de Julgamento20 Janeiro 2022
Número do processo08126940420218200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL - 0812694-04.2021.8.20.0000
Polo ativo
14ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE MOSSORÓ e outros
Advogado(s):
Polo passivo
FRANCISCO DE ASSIS ANDRADE
Advogado(s): MACKENZIE OLIVEIRA COSTA

Agravo em Execução Penal nº 0812694-04.2021.8.20.0000

Origem: Vara de Execuções Penais de Mossoró

Agravante: Ministério Público

Agravada: Francisco de Assis Andrade

Advogado: Mackenzie Oliveira Costa

Relator: Desembargador Saraiva Sobrinho

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. AGEX. REMIÇÃO HOMOLOGADA PELO JUÍZO DE ORIGEM. INSURGÊNCIA MINISTERIAL. CURSOS CONCLUÍDOS PELA PLATAFORMA ESCON. PRÁTICAS EDUCATIVAS NÃO CONTEMPLADAS POR CONVÊNIO COM O SISTEMA CARCERÁRIO (ART. 2º, II DA RESOLUÇÃO 391/2021 DO CNJ). MERO FORMALISMO SUPLANTADO PELA EFETIVA FISCALIZAÇÃO DA UNIDADE PRISIONAL. INSTITUIÇÃO DE ENSINO IDÔNEA. EXEGESE À LUZ DOS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. POSSIBILIDADE DE APROVEITAMENTO DO ESTUDO. PRECEDENTES. DECISUM MANTIDO. PRECEDENTES DO STJ. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores integrantes da Câmara Criminal, à unanimidade de votos e em dissonância com a 2ª Procuradoria de Justiça, conhecer e desprover o AgEx, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. AgExPe aforado pelo Ministério Público em face de decisum da Juíza de Execuções Penais de Mossoró, a qual, no PEC 0114431-03.2014.8.20.0106, homologou remição decorrente de êxito em cursos ministrados pela Escola de Cursos Online - ESCON (ID 12067504).

2. Sustenta, resumidamente impossibilidade de redução da pena ante a ausência de convênio da instituição com o sistema carcerário (ID 12067496).

3. Pugnou, ao final, pela reforma do decisum.

4. Contrarrazões no ID 12067502.

5. Parecer pelo provimento (ID 11991836).

6. É o relatório.

VOTO

7. Conheço do Agravo.

8. No mais, malgrado haja encaminhado voto pelo seu provimento, após a divergência inaugurada pelo eminente Des. Glauber Rêgo, reputo imprescindível uma análise mais acurada da matéria, dessa feita, sob o viés humanitário e de estímulo à ressocialização.

9. A bem da verdade, esse Colegiado sempre buscou prestigiar os Reeducandos empenhados no aperfeiçoamento e no labor, com fincas a garantir um retorno ao convívio social mais digno e humano, em alinhamento com a jurisprudência da Corte Cidadã:

“[...] em atenção ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, a política criminal na execução da pena deve ser voltada à sua humanização, de forma a estimular instrumentos sancionatórios mais humanos e que evitem o máximo possível a privação da liberdade. [...]” (HC n. 376.324/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJe 15/5/2017).

10. Destaca-se, ainda, aresto invocando os princípios da individualização da pena e da fraternidade:

“[...] Importante ressaltar que o presente precedente foi firmado mediante a consideração, além do caso concreto, com todos os documentos que o respaldam, da necessidade de esta Corte Superior de Justiça conferir interpretação que preze pelos princípios constitucionais e processuais penais, como in dubio pro reo, individualização da pena e princípio da fraternidade, na sua dimensão de reduzir as desigualdades sociais e proteção dos direitos fundamentais, bem como o fundamento primordial da Constituição da República, que seria a dignidade da pessoa humana. [...]” (HC 376.140/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 16/05/2017, DJe 24/05/2017).

11. Nessa tônica, somente admitir remição por estudo quando as instituições se acham conveniadas com o Poder Público, leia-se, Unidade Prisional (art. 2º, II da Resolução 391/21 do CNJ[1]), representaria, sim, um formalismo dissonante da mens legis (fomento à factual ressocialização).

12. Daí, o aproveitamento reconhecido na origem em favor do Interno pelo curso de “Irrigação e Fruticultura”, “Manutenção de Tratores Agrícolas” e “Desenvolvimento Urbano” (ID 12067497 - p. 01/06), deve sim ser preservado.

13. A despeito da ausência de vínculo específico da Instituição de Ensino (Escola de Cursos Online - ESCON) com a SEAP, vislumbro tratar-se de estabelecimento idôneo e em pleno funcionamento, sobretudo, reconhecido pela Associação Brasileira de Educação a Distância - ABED.

14. De mais a mais, como bem destacado no voto-vista, “[...] a única ‘falta’ se traduz na já multicitada ausência do convênio entre a instituição de ensino e o poder público e que foi satisfeita com a anuência da Unidade Prisional na realização do curso, responsabilizando-se formalmente pela disponibilização dos equipamentos de informática, acompanhamento e fiscalização da jornada do curso, devidamente certificado por instituição idônea. Por outro lado, todos os requisitos exigidos pela Resolução 391/2021-CNJ estão preenchidos, notadamente aqueles referentes à fiscalização da assiduidade – mormente porque, como assentado pelo Juízo da origem, era realizada também pelos policiais penais atuantes na unidade prisional em questão [...]”.

15. É preciso registrar, por derradeiro, a necessidade de uma análise caso a caso, no afã de evitar a banalização de instituto tão caro à execução penal (remição por estudo), ou seja, aferir, precipuamente, se o curso ofertado foi acompanhado pela administração penal e fiscalizado na sua inteireza (v.g. carga horária, plano de estudo, frequência e aproveitamento).

16. Frise-se, antes de qualquer instrumentalidade e apego à literalidade normativa, deve-se atentar para os preceitos da força normativa da constituição e da máxima efetividade das normas.

17. Destarte, em dissonância com a 2ª PJ, desprovejo o Recurso.

Natal, data da assinatura eletrônica.

Desembargador Saraiva Sobrinho

Relator


[1] Art. 2º O reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas considerará as atividades escolares, as práticas sociais educativas não-escolares e a leitura de obras literárias.

Parágrafo único. Para fins desta resolução, considera-se: (...)

II - práticas sociais educativas não-escolares: atividades de socialização e de educação não-escolar, de autoaprendizagem ou de aprendizagem coletiva, assim entendidas aquelas que ampliam as possibilidades de educação para além das disciplinas escolares, tais como as de natureza cultural, esportiva, de capacitação profissional, de saúde, dentre outras, de participação voluntária, integradas ao projeto político-pedagógico (PPP) da unidade ou do sistema prisional e executadas por iniciativas autônomas, instituições de ensino públicas ou privadas e pessoas e instituições autorizadas ou conveniadas com o poder público para esse fim.

Natal/RN, 20 de Janeiro de 2022.

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