Acórdão Nº 08127534920208205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 12-04-2022

Data de Julgamento12 Abril 2022
Número do processo08127534920208205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0812753-49.2020.8.20.5004
Polo ativo
HARABELLO PASSAGENS, TURISMO E EVENTOS LTDA - EPP e outros
Advogado(s): FABIO LUIZ LIMA SARAIVA, ANDRE LUIZ PINHEIRO SARAIVA, PAULO LOPO SARAIVA, MILTON DA SILVA MEDEIROS NETO, JOAO PAULO ARAUJO DE SOUZA, LAIS DE ANDRADE DINIZ, EVELYN FABRICIA DE ARRUDA
Polo passivo
FERNANDO DOS SANTOS LEMOS e outros
Advogado(s): MARCOS RAFAEL FREITAS LEMOS

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA – 2º GABINETE

RECURSO INOMINADO Nº 0812753-49.2020.8.20.5004

ORIGEM: 13º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

PARTE RECORRENTE: HARABELLO PASSAGENS E TURISMO LTDA e BEST WAY TRIPS AGENCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA

PARTE RECORRIDA: FERNANDOS DOS SANTOS LEMOS, ISABEL CRISTINA ARAÚJO DA NÓBREGA e ELIZABETH NÓBREGA DE LIMA

JUIZ RELATOR: GUILHERME MELO CORTEZ

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. AQUISIÇÃO DE PACOTE TURÍSTICOS. CANCELAMENTO PELOS CONSUMIDORES EM VIRTUDE DA PANDEMIA. SITUAÇÃO IMPREVISÍVEL. AUSÊNCIA DE CULPA. INFORMAÇÃO DO PREPOSTO DA EMPRESA DE QUE NÃO HAVERIA COBRANÇA DE MULTA. INTEGRAÇÃO AO CONTRATO. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DO VALOR PAGO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE GRATUIDADE JUDICIÁRIA FORMULADO PELA RECORRENTE HARABELLO PASSAGENS, TURISMO E EVENTOS LTDA., PORQUE NÃO DEMONSTROU A EFETIVA IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM AS DESPESAS DO PREPARO RECURSAL. DIFERENTEMENTE DA PESSOA NATURAL, NÃO SE PRESUME A HIPOSSUFICIÊNCIA DA PESSOA JURÍDICA COM A SIMPLES AFIRMAÇÃO DE QUE NÃO DISPÕE DE MEIOS PARA FAZER FRENTE ÀS DESPESAS DO PROCESSO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal Temporária do Sistema dos Juizados Especiais do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer dos recursos e negar-lhes provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.

Condenação das Rés em custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

Natal/RN, 29 de março de 2022.

GUILHERME MELO CORTEZ

Juiz Relator

RELATÓRIO

Recurso Inominado interposto por HARABELLO PASSAGENS E TURISMO LTDA e BEST WAY TRIPS AGENCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA contra sentença que julgou procedentes os pleitos formulados por FERNANDO DOS SANTOS LEMOS, ISABEL CRISTINA ARAÚJO DA NÓBREGA e ELIZABETH NÓBREGA DE LIMA, impondo às promovidas, solidariamente, a obrigação de pagar a cada promovente o valor de R$ 1.804,00 (um mil, oitocentos e quatro reais), totalizando o montante de R$ 5.412,00 (cinco mil, quatrocentos e doze reais).

Na sentença, o Magistrado registrou não haver dúvida a respeito da ocorrência de situação imprevisível relativa à pandemia do COVID-19, que gerou a necessidade de cancelamento da viagem. Anotou, entretanto, que não se mostra legítimo o comportamento de recusa de restituição do valor integral pago pelo consumidor, já que o cancelamento não se deu por sua culpa dele e não pode ser obrigado a permanecer vinculado à compra de novos pacotes de viagem apenas através das empresas promovidas. Ponderou que as fornecedoras de serviços atuantes no mercado de consumo devem assumir os riscos inerentes ao próprio desenvolvimento de suas atividades empresariais, se responsabilizando por eventuais ônus decorrentes de situações imprevisíveis supervenientes à celebração do contrato de adesão, principalmente quando o consumidor, parte hipossuficiente na relação, não contribui para a ocorrência dessas situações, como no caso ora tratado nos autos. Acrescentou que, antes da solicitação do cancelamento foi informado por preposto da empresa promovida que não haveria cobrança de multa, passando essa informação a integrar o contrato celebrado entre as partes e obrigar os fornecedores de serviços, nos moldes do art. 30 do Código de Defesa do Consumidor, não podendo, assim, ser aplicado o conteúdo do art. 2º, §7º, da Lei 14.046/20 no caso específico dos autos. Portanto, entendeu ser procedente o pedido de restituição do valor pago pelo pacote de viagem.

Em suas razões recursais, HARABELLO PASSAGENS, TURISMO E EVENTOS LTDA., inicialmente, pediu que lhe fosse concedido o benefício da assistência judiciária gratuita e arguiu as preliminares de falta de interesse de agir e ilegitimidade passiva. No mérito, sustentou não possuir qualquer gerência sobre a aplicação das multas, tendo em vista que a diferença de R$ 1.804,58 (mil oitocentos e quatro reais e cinquenta e oito centavos) refere-se ao agenciamento realizado pela Harabello equivalente a 7,74%, no valor de R$ 997,42 (novecentos e noventa e sete reais e quarenta e dois centavos), bem como à retenção da Best Way Trips, defendendo que o cancelamento da viagem fora realizado de maneira espontânea pelos consumidores, o que nada se aplica ao caso de força maior, uma vez que as fronteiras e aeroportos sequer foram fechados. Ao final, requereu o provimento do recurso.

BEST WAY TRIPS AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA, nas razões do recurso, suscitou a preliminar de violação ao princípio da especialidade por ausência de observância da legislação 14.046/2020. Em relação ao mérito, alegou a inexistência e danos materiais, afirmando que não houve nenhuma cobrança de multa como alegam os recorridos, mas tão somente de valores referentes aos gastos que tiveram os recorrentes, bem como os valores pelos serviços prestados. Sustentou a ausência de prática de ato ilícito e de nexo de causalidade, pleiteando pelo provimento integral do recurso.

A parte recorrida não apresentou contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Inicialmente, rejeito as preliminares arguidas, tendo em vista que a presente demanda mostra-se útil e adequada à pretensão autoral, sendo a Recorrente HARABELLO parte legítima a integrar o polo passivo, uma vez que foi indicada como devedora da relação contratual afirmada em petição inicial.

Igualmente, rejeito a preliminar de violação ao princípio da especialidade, haja vista as peculiaridades do caso concreto, as quais estão devidamente esclarecidas na fundamentação da sentença e deste voto.

Faz-se necessária, ainda, a apreciação do pedido de concessão do benefício da justiça gratuita, formulado por HARABELLO PASSAGENS, TURISMO E EVENTOS LTDA e não apreciado pelo juízo de primeiro grau.

A respeito da assistência judiciária gratuita, cabe esclarecer que corresponde à concretização do princípio do acesso à justiça, alçado à condição de direito fundamental pelo art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988, reflexo da primeira onda renovatória processual, a par da doutrina capitaneada por Cappelletti e Garth, na célebre obra "Acesso à justiça".

Com efeito, o Código de Processo Civil, no art. 99, § 3º, afirma que há presunção de veracidade da alegação de insuficiência formulada pela pessoa natural. É presunção iuris tantum da pobreza daquele que afirma encontrar-se sob tal condição.

Contudo, quando se trata de pessoa jurídica, a regra é modificada, uma vez que é indispensável a prova da impossibilidade de suportar as despesas processuais, consoante reza a Súmula nº 481 do Superior Tribunal de Justiça, cujo teor transcrevo: “Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais".

Portanto, para a concessão da gratuidade judiciária, é necessário que a pessoa jurídica, com ou sem fins lucrativos, demonstre sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais (STJ, AgRg no AREsp 141.322/PR, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, j. 25/06/2013; AgRg no AREsp 570.332/DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, j. 21/10/2014; AgRg no AREsp 341.016/SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 27/08/2013; e TJRN, AC n° 2013.015620-4, Rel. Des. Amaury Moura Sobrinho, 3ª Câmara Cível, j. 27/03/2014; AgI em AC nº 2014.018580-6/0001.00, Rel. Des. Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, j. 28/04/2015; Ag nº 2013.017390-1, Rel. Des. Amaury Moura Sobrinho, 3ª Câmara Cível, j. 26/11/2013).

A par dessas anotações, vislumbro que não restou demonstrada a impossibilidade de a empresa HARABELLO PASSAGENS, TURISMO E EVENTOS LTDA. arcar com as despesas com o preparo recursal, sendo adequado o indeferimento do pedido de assistência judiciária gratuita, conforme explicado a seguir.

É sabido que a empresa Recorrente atua mediante prestação de serviços de reservas e outros serviços de turismo, bem como de serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas, ou seja, exerce atividade comercial que foi alvo de suspensão pelos decretos governamentais que visavam ao enfrentamento à pandemia do Coronavírus (Covid-19).

Ocorre que, em seu recurso, quando deveria comprovar o preenchimento dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade judiciária, a referida empresa não juntou nenhuma prova que justifique o pedido de isenção do pagamento de custas no valor de R$ 472,96, mesmo diante da intimação, na parte final da sentença, para juntar a referida prova em caso de pedido de justiça gratuita.

Assim, embora não se ignore a existência de dificuldade financeira por parte de vários setores da economia durante a pandemia do Coronavírus (Covid-19), especialmente o de turismo, a condição de insuficiência financeira carece de comprovação e deve ser atestada pelos meios de prova disponíveis à parte que requereu a concessão da gratuidade judiciária, tendo em mira o enunciado da Súmula nº 481 do STJ.

Entretanto, a despeito das alegações de que foi impactada financeiramente em decorrência do COVID-19, a empresa recorrente não juntou aos...

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