Acórdão Nº 08129138020228200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08129138020228200000
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0812913-80.2022.8.20.0000
Polo ativo
PREFEITURA MUNICIPAL SÃO BENTO DO TRAíRÍ - RN
Advogado(s): ANESIANO RAMOS DE OLIVEIRA
Polo passivo
EDINALVA VASCO DOS SANTOS
Advogado(s):

EMENTA: PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO QUE DEFERIU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DETERMINANDO AOS ENTES PÚBLICOS O CUSTEIO DE SESSÕES DE OXIGENOTERAPIA HIPERBÁRICA. ALEGADO PELO MUNICÍPIO AGRAVANTE A INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO EM CUSTEAR TAL TRATAMENTO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUE ESTABELECE SOLIDARIEDADE DOS ENTES POLÍTICOS – MUNICÍPIOS, ESTADOS E UNIÃO - NA PROMOÇÃO DA SAÚDE DA POPULAÇÃO. RISCO DE DANO INVERSO À AUTORA/AGRAVADA. CONSTATADA A INEFICÁCIA DO TRATAMENTO COM ANTIBIÓTICOS. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos relatados e discutidos estes autos, em que são partes acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao Agravo de Instrumento, nos termos do voto do Relator que integra o julgado

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo MUNICÍPIO DE SÃO BENTO DO TRAIRI/RN, por seu Procurador, em face de decisão interlocutória proferida pelo Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Santa Cruz/RN, que, nos autos da Ação Ordinária (processo nº 0801755-73.2022.8.20.5126) proposta contra si e o Estado do RN por EDINALVA VASCO DOS SANTOS, deferiu a antecipação de tutela pleiteada para que o ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e o MUNICÍPIO DE SÃO BENTO DO TRAIRI providenciasse, no prazo máximo de 05 (cinco) dias, a realização de 40 (quarenta) sessões de OXIGENOTERAPIA HIPERBÁRICA ou custeie sua aquisição em empresa da rede privada, depositando o valor correspondente ao orçamento indicado na exordial, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), sem prejuízo da aplicação de outras medidas coercitivas, nos termos do art. 297, do CPC.

Nas razões recursais (ID 16820049) , o ente Agravante afirmou, em suma, que “(...) embora a prestação da saúde seja uma obrigação solidária da União, dos Estados e dos Municípios, é cediço que diversos atos normativos, entre eles a Portaria nº 204/2007 e a Portaria nº 2.203/1996, ambas do Ministério da Saúde, bem como a Norma Operacional de Assistência à Saúde/SUS (NOAS-SUS 01/2002), estabelecem uma divisão entre os entes públicos no tocante a obrigação aqui discutida.”

Defendeu que a decisão impõe ônus excessivo a um dos entes, e que, visto que, devido ao elevado custo e complexidade do tratamento, o ônus seria do Estado ou da União.

Por fim, pugnou pela concessão do efeito suspensivo ao recurso. No mérito, requereu o seu conhecimento e provimento, com a reforma da decisão agravada.

Em decisão ID 16891172, este Relator indeferiu o pedido de efeito suspensivo ao recurso.

A parte agravada apresentou contrarrazões (ID 17422536) requerendo o desprovimento do recurso, com a manutenção da decisão agravada.

Com vista dos autos, a 15ª Procuradoria de Justiça (ID 17712202) opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

O presente Agravo de Instrumento objetiva a reforma da decisão agravada, alegando que não pode ser obrigada a realizar tal procedimento - 40 (quarenta) sessões de OXIGENOTERAPIA HIPERBÁRICA – ante o alto custo e complexidade do tratamento, cabendo ao Estado e da União seu custeio.

Inicialmente, cumpre destacar que "é obrigação do Estado (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação ou congênere necessário à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo as mais graves. Sendo o SUS composto pela União, Estados-membros e Municípios, é de reconhecer-se, em função da solidariedade, a legitimidade passiva de qualquer deles no pólo passivo da demanda" (RESP 719716/SC, DJ 05/09/2005, Min. Relator Castro Meira).

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento, como se constata do seguinte aresto:


"PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AÇÃO MOVIDA CONTRA O ESTADO. CHAMAMENTO DA UNIÃO AO PROCESSO. ART. 77, III, DO CPC. DESNECESSIDADE.

Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. O chamamento ao processo da União com base no art. 77, III, do CPC, nas demandas propostas contra os demais entes federativos responsáveis para o fornecimento de medicamentos ou prestação de serviços de saúde, não é impositivo, mostrando-se inadequado opor obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde. Precedentes do STJ.

2. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal entende que 'o recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios', e 'o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional', razão por que 'o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida' (RE 607.381 AgR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 17.6.2011). Caso concreto 3. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido negou o chamamento ao processo da União, o que está em sintonia com o entendimento aqui fixado.

4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008. (REsp 1203244/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/04/2014, DJe 17/06/2014).

Com efeito, ao estatuir, no artigo 196 da Constituição Federal de 1988, a solidariedade na promoção da saúde da população, em cada nível da Federação, o constituinte originário deixou claro que qualquer um deles era responsável pelo alcance das políticas sociais e econômicas que visassem ao acesso universal e igualitário das ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde.

Ressalte-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar recentemente o mérito do Recurso Extraordinário nº 855.178 ED/SE, de relatoria do Ministro Luiz Fux e relatoria para sendo redator do acórdão o Ministro Edson Fachin, em 23/05/2019, reafirmou a tese da responsabilidade solidária de entes federados para o fornecimento de medicamentos, tratamentos/exames e cirurgias de saúde.

Ainda sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, assim se manifestou:

"EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MEDICAMENTO. FORNECIMENTO. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA. ENTES FEDERATIVOS. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o fornecimento gratuito de tratamentos e medicamentos necessários à saúde de pessoas hipossuficientes é obrigação solidária de todos os entes federativos, podendo ser pleiteado de qualquer deles, União, Estados, Distrito Federal ou Municípios (Tema 793). 2. Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, fica majorado em 25% o valor da verba honorária fixada anteriormente, observados os limites legais do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015. 3. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015." (RE 953711 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 16/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-210 DIVULG 30-09-2016 PUBLIC 03-10-2016)

"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS PELO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA À SAÚDE. MATÉRIA EXAMINADA POR ESTE SUPREMO TRIBUNAL NA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 855.178-RG, TEMA N. 793). VERBA HONORÁRIA MAJORADA EM 1%, PERCENTUAL O QUAL SE SOMA AO FIXADO NA ORIGEM, OBEDECIDOS OS LIMITES DO ART. 85, § 2º, § 3º E § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015, COM A RESSALVA DE EVENTUAL CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA, E MULTA APLICADA NO PERCENTUAL DE 1%, CONFORME ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO." (ARE 980232 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 14/10/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-234 DIVULG 03-11-2016 PUBLIC 04-11-2016)

"Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. SISTEMÁTICA. APLICAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. ALTO CUSTO. AUSÊNCIA DE DISCUSSÃO. PENDÊNCIA DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO PARADIGMA. IRRELEVÂNCIA. JULGAMENTO IMEDIATO DA CAUSA. AUSÊNCIA DE MEDICAMENTO NA LISTA DO SUS. DESCONSIDERAÇÃO ANTE A AVALIAÇÃO MÉDICA. SÚMULA 279/STF. AGRAVO IMPROVIDO.

I - O custo dos medicamentos não foi objeto de discussão do acórdão recorrido, o que desautoriza a aplicação do Tema 6 da repercussão geral - RE 566.471-RG/RN, Rel. Min. Marco Aurélio, ante a ausência de identidade das premissas fáticas.

II - O acórdão recorrido está em consonância com o que foi decidido no Tema 793 da repercussão geral, RE 855.178-RG/SE, Rel. Min. Luiz Fux, decisão de mérito, no sentido de que “o tratamento médico adequado aos...

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