Acórdão Nº 08130231020198205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 14-04-2023

Data de Julgamento14 Abril 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08130231020198205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0813023-10.2019.8.20.5004
Polo ativo
BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A
Advogado(s): LOURENÇO GOMES GADÊLHA DE MOURA
Polo passivo
MARIA DAS GRACAS DE OLIVEIRA CAVALCANTE
Advogado(s): CINTHIA MARIA DE CASTRO FERREIRA, REJANE CASTRO DA SILVEIRA FERREIRA, FRANCISCO POTIGUAR CAVALCANTI NETO

RECURSO INOMINADO CÍVEL N.º: 0813023-10.2019.8.20.5004

ORIGEM: 7º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

RECORRENTE: BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A

ADVOGADO(A): LOURENÇO GOMES GADÊLHA DE MOURA

RECORRIDO(A): MARIA DAS GRAÇAS DE OLIVEIRA CAVALCANTI

ADVOGADO(A): FRANCISCO POTIGUAR CAVALCANTI NETO

RELATOR: JUIZ JUSSIER BARBALHO CAMPOS

EMENTA: RECURSO INOMINADO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APLICABILIDADE DO CDC. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. CONTRATO ACOSTADO. CONTRATO QUE CONTÉM CLÁUSULAS CONTRATUAIS ACERCA DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. DUBIEDADE CONTRATUAL. AFRONTA AO DEVER DE INFORMAÇÃO. BOA-FÉ OBJETIVA. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. QUITAÇÃO DO CONTRATO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO COM RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes da Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso interposto, mantendo a sentença atacada pelos próprios fundamentos. Condenação do recorrente em custas e honorários advocatícios, estes no percentual de 10% (dez por cento), sobre o valor atribuído à condenação.

Obs.: Esta súmula servirá de acórdão nos termos do art. 46 da Lei 9.099/95.

Natal, 28 de março de 2023.

JUSSIER BARBALHO CAMPOS

Juiz de Direito

RELATÓRIO

Sentença proferida pela Juíza LUCIANA DE LIMA TEIXEIRA, cujo Relatório se adota:

Dispenso o relatório na forma do art. 38 da Lei nº 9.099/95.

Trata-se de Ação de Rescisão Contratual cumulada com Ação Indenizatória por Danos Materiais e Morais proposta por MARIA DAS GRAÇAS DE OLIVEIRA CAVACANTE em desfavor do BANCO BONSUCESSO S/A (Banco Olé Bonsucesso Consignado S/A), sob o fundamento de ter firmado contrato de empréstimo consignado com o banco demandado no ano de 2010, o qual seria pago mediante desconto da parcela R$ 88,79 mensalmente em seu contracheque. Todavia, além desse valor ter sido posteriormente majorado para R$ 102,28, obteve conhecimento que o empréstimo estaria vinculado a um cartão de crédito. Em vista disso, requer a rescisão do contrato em razão de haver sido induzida a erro essencial pela natureza do contrato ao qual aderiu e indenização pelos danos materiais e morais sofridos.

Preliminar de Incompetência dos Juizados Especiais.

O Banco demandado refutou as alegações autorais e suscitou, em sede preliminar, a incompetência deste Juizado Especial em razão da necessidade de perícia contábil haja vista que a questão de fundo a ser discutida será a de revisão de contrato com a análise da abusividade ou não dos juros aplicado ao capital utilizado pela autora.

Deixo de acolher a preliminar suscitada, uma vez que a parte autora busca tão somente a declaração da quitação do contrato de empréstimo, sem adentrar na discussão dos juros que foi aplicado sobre o capital emprestado. Portanto, tal pleito deverá ser analisado conforme o contexto probatório dos autos.

Prejudiciais de Mérito. Decadência e Prescrição.

Com esteio em posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça em acórdão de repetitivo (REsp nº 1.360.969/RS), rejeito a prejudicial de mérito de decadência suscitada pelo Banco demandado, pois tratando-se de contrato que ainda se encontra em vigor, assiste ao contratante o direito de pleitear anulação de cláusula nele contida, haja vista que o prazo decadencial não tem início enquanto em curso a relação contratual. Nessa mesma linha de pensamento, em ações fundadas em enriquecimento sem causa, o prazo prescreve em 03 anos. Assim, em havendo valores a serem restituídos à parte autora, a título de repetição de indébito, com esteio na orientação jurisprudencial, o prazo prescricional a ser aplicado será o trienal.

Decisão em acórdão de repetitivo (REsp nº 1.360.969/RS):

1. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CIVIL. CONTRATO DE PLANO OU SEGURO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. PRETENSÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA DE REAJUSTE. ALEGADO CARÁTER ABUSIVO. CUMULAÇÃO COM PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. EFEITO FINANCEIRO DO PROVIMENTO JUDICIAL. AÇÃO AJUIZADA AINDA NA VIGÊNCIA DO CONTRATO. NATUREZA CONTINUATIVA DA RELAÇÃO JURÍDICA. DECADÊNCIA.

AFASTAMENTO. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. ART. 206, § 3º, IV, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRETENSÃO FUNDADA NO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

2. CASO CONCRETO: ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL A QUO CONVERGE COM A TESE FIRMADA NO REPETITIVO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO ÂNUA PREVISTA NO ART. 206, § 1º, II DO CC/2002. AFASTAMENTO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Em se tratando de ação em que o autor, ainda durante a vigência do contrato, pretende, no âmbito de relação de trato sucessivo, o reconhecimento do caráter abusivo de cláusula contratual com a consequente restituição dos valores pagos indevidamente, torna-se despicienda a discussão acerca de ser caso de nulidade absoluta do negócio jurídico - com provimento jurisdicional de natureza declaratória pura, o que levaria à imprescritibilidade da pretensão - ou de nulidade relativa - com provimento jurisdicional de natureza constitutiva negativa, o que atrairia os prazos de decadência, cujo início da contagem, contudo, dependeria da conclusão do contrato (CC/2002, art. 179). Isso porque a pretensão última desse tipo de demanda, partindo-se da premissa de ser a cláusula contratual abusiva ou ilegal, é de natureza condenatória, fundada no ressarcimento de pagamento indevido, sendo, pois, alcançável pela prescrição. Então, estando o contrato ainda em curso, esta pretensão condenatória, prescritível, é que deve nortear a análise do prazo aplicável para a perseguição dos efeitos financeiros decorrentes da invalidade do contrato.

2. Nas relações jurídicas de trato sucessivo, quando não estiver sendo negado o próprio fundo de direito, pode o contratante, durante a vigência do contrato, a qualquer tempo, requerer a revisão de cláusula contratual que considere abusiva ou ilegal, seja com base em nulidade absoluta ou relativa. Porém, sua pretensão condenatória de repetição do indébito terá que se sujeitar à prescrição das parcelas vencidas no período anterior à data da propositura da ação, conforme o prazo prescricional aplicável.

3. Cuidando-se de pretensão de nulidade de cláusula de reajuste prevista em contrato de plano ou seguro de assistência à saúde ainda vigente, com a consequente repetição do indébito, a ação ajuizada está fundada no enriquecimento sem causa e, por isso, o prazo prescricional é o trienal de que trata o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002.

4. É da invalidade, no todo ou em parte, do negócio jurídico, que nasce para o contratante lesado o direito de obter a restituição dos valores pagos a maior, porquanto o reconhecimento do caráter ilegal ou abusivo do contrato tem como consequência lógica a perda da causa que legitimava o pagamento efetuado. A partir daí fica caracterizado o enriquecimento sem causa, derivado de pagamento indevido a gerar o direito à repetição do indébito (arts. 182, 876 e 884 do Código Civil de 2002).

5. A doutrina moderna aponta pelo menos três teorias para explicar o enriquecimento sem causa: a) a teoria unitária da deslocação patrimonial; b) a teoria da ilicitude; e c) a teoria da divisão do instituto. Nesta última, basicamente, reconhecidas as origens distintas das anteriores, a estruturação do instituto é apresentada de maneira mais bem elaborada, abarcando o termo causa de forma ampla, subdividido, porém, em categorias mais comuns (não exaustivas), a partir dos variados significados que o vocábulo poderia fornecer, tais como o enriquecimento por prestação, por intervenção, resultante de despesas efetuadas por outrem, por desconsideração de patrimônio ou por outras causas.

6. No Brasil, antes mesmo do advento do Código Civil de 2002, em que há expressa previsão do instituto (arts. 884 a 886), doutrina e jurisprudência já admitiam o enriquecimento sem causa como fonte de obrigação, diante da vedação do locupletamento ilícito.

7. O art. 884 do Código Civil de 2002 adota a doutrina da divisão do instituto, admitindo, com isso, interpretação mais ampla a albergar o termo causa tanto no sentido de atribuição patrimonial (simples deslocamento patrimonial), como no sentido negocial (de origem contratual, por exemplo), cuja ausência, na modalidade de enriquecimento por prestação, demandaria um exame subjetivo, a partir da não obtenção da finalidade almejada com a prestação, hipótese que mais se adequada à prestação decorrente de cláusula indigitada nula (ausência de causa jurídica lícita).

8. Tanto os atos unilaterais de vontade (promessa de recompensa, arts. 854 e ss.; gestão de negócios, arts. 861 e ss.; pagamento indevido, arts. 876 e ss.; e o próprio enriquecimento sem causa, art. 884 e ss.) como os negociais, conforme o caso, comportam o ajuizamento de ação fundada no enriquecimento sem causa, cuja pretensão está abarcada pelo prazo prescricional trienal previsto no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002.

9. A pretensão de repetição do indébito somente se refere às prestações pagas a maior no período de três anos compreendidos no interregno anterior à data do ajuizamento da ação (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002; art. 219, caput e § 1º, CPC/1973; art. 240, § 1º, do CPC/2015).

10. Para os efeitos do julgamento do recurso especial repetitivo, fixa-se a seguinte tese: Na vigência dos contratos de plano ou...

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