Acórdão Nº 08133721220178205124 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 29-09-2023

Data de Julgamento29 Setembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08133721220178205124
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TRIBUNAL PLENO

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0813372-12.2017.8.20.5124
Polo ativo
MARCIO CEZAR DA SILVA PINHEIRO e outros
Advogado(s): RICARD ALEXSANDRO COSTA DE ARAUJO CAMARA, ABINIO ARRUDA JUNIOR
Polo passivo
MPRN - 01ª Promotoria Parnamirim e outros
Advogado(s):

EMENTA: AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. TEMA 1.199 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REPERCUSSÃO GERAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO DOLO PARA TIPIFICAÇÃO DOS ATOS DE IMPROBIDADE. ACÓRDÃO DESTA CORTE QUE ESTÁ ALINHADO AO JULGAMENTO DO PRECEDENTE QUALIFICADO. ART. 1.040, I, DO CPC. ARGUMENTAÇÃO DO AGRAVANTE INSUFICIENTE A ENSEJAR A MODIFICAÇÃO DA DECISÃO VERGASTADA. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. O acórdão que julgou o apelo cível se encontra alinhado com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1.199, razão pela qual deve ser mantida a decisão que, em juízo de admissibilidade, negou seguimento ao recurso especial, com fundamento na técnica de vinculação decisória prevista no art. 1.040, I, do CPC.

2. Inexistência de argumentos suficientes apresentados no recurso de agravo para infirmar a decisão anterior.

3. Conhecimento e desprovimento do agravo interno.


ACÓRDÃO

ACORDAM os Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em sessão plenária, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo interno (Id. 20933569) interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face da decisão (Id. 120448463) que negou seguimento ao recurso especial por si interposto, por aplicação do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1.199, sob a sistemática da repercussão geral.

Argumenta o agravante a inadequação do tema aplicado para a negativa de seguimento do apelo extremo pelo fato da tese firmada não apresentar “alusão alguma à necessidade do dolo específico do agente” e “as alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021 não retroagem”, pugnado pelo provimento do agravo para que seja determinado o regular prosseguimento do Recurso Especial.

Contrarrazões apresentadas (Id. 21020013).

É o relatório.

VOTO


Sem maiores transpirações argumentativas, realço que o agravo interno manejado preenche os requisitos de admissibilidade, devendo, portanto, ser conhecido (§ 2º do art. 1.030 do CPC).

No entanto, embora admitida a via recursal pretendida, verifico, desde já, que os fundamentos lançados não se revelam hábeis a autorizar a modificação da decisão que negou seguimento ao recurso especial, por aplicação do Tema 1.199 do STF.

Sem delongas, nos termos dos artigos 1.030, I e II, e 1.040, I, do Código de Processo Civil (CPC), recai sobre os tribunais de origem a obrigação de aplicar aos recursos especiais o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF) acerca de temas submetidos à sistemática dos recursos repetitivos ou da repercussão geral.

E essa atribuição constitui incumbência a ser exercida, senão, pelo Vice-Presidente do Tribunal de segunda instância, o qual deverá, quando julgado o mérito dos recursos com relação aos quais foi estabelecida a tese em paradigma, negar seguimento aos recursos interpostos contra decisões proferidas em conformidade com o pronunciamento do STJ ou do STF, ou encaminhar os recursos para juízo de retratação, se a decisão combatida estiver em confronto com o entendimento dos referidos tribunais.

Pois muito bem. Entendo que a decisão recorrida deve ser mantida.

Isto porque, no acórdão da Primeira Câmara Cível desta Corte, de relatoria do Des. Claudio Santos, restou motivadamente consignada a inexistência da figura do “DOLO”, como se verifica do seu ementário (Id. 16846259):

ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SECRETÁRIO CHEFE DO GABINETE CIVIL NO MUNICÍPIO DE PARNAMIRIM/RN. ALEGADO SUPERFATURAMENTO DE CONTRATO E IRREGULARIDADES FORMAIS NOS PROCESSOS DE PAGAMENTO. AUSÊNCIA DE ELEMENTO SUBJETIVO NECESSÁRIO PARA A CONFIGURAÇÃO DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXIGÊNCIA DO DOLO PARA A CONFIGURAÇÃO DO ATO ÌMPROBO. TESE FIRMADA EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL PELO STF. ADVENTO DA NOVA LEI 14.230/22021. APLICABILIDADE AOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CULPOSOS PRATICADOS AINDA NA VIGÊNCIA DO TEXTO ANTERIOR, PORÉM SEM CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. INOCORRÊNCIA DE DOLO, MÁ-FÉ OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. INAPLICABILIDADE DAS SANÇÕES PREVISTAS NO ARTIGO 12, INCISO III DA LEI Nº 8.429/92. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO.

Vejamos, ainda, excertos do julgado (Id. 16846259 - págs. 03/08):

“(...) Da análise dos autos, verifica-se que o ponto central do apelo diz respeito à averiguação de possível cometimento, pelo réu ora recorrente, de ato ilícito qualificado como ímprobo, capitulado no artigo 10, incisos I e V, e artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92). O magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o apelante às penalidades previstas no inciso II, do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa, por reconhecer caracterizado ato de improbidade administrativa, tendo em vista supostas irregularidades cometidas enquanto secretário chefe do gabinete civil da Prefeitura de Parnamirim/RN, concluindo que este concorreu para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa jurídica, de valores integrantes do acervo patrimonial Municipal e permitiu a aquisição de bem por preço superior ao de mercado. (...) De início vale registrar que apesar da acusação de irregularidades processuais e superfaturamento nos contratos, não há controvérsia nos autos sobre a efetiva prestação e execução dos serviços, além de que o Ministério Público não logrou êxito em comprovar a presença de dolo e má-fé praticado pelo apelante, de maneira que não vislumbro como suficientemente caracterizado o elemento subjetivo dolo, atualmente exigido pela nova Lei nº 14.230/2021, como pressuposto indispensável para a tipificação dos atos de improbidade administrativa. Nesse viés, como já dito, seguindo a tese da repercussão geral fixada pelo STF, com a nova Lei 14.230/22021, a regra agora é a responsabilidade pelo elemento subjetivo, destacando a exigência do dolo para a configuração da improbidade, deixando assim de existir a modalidade culposa. Dito isso, apesar das evidentes inconsistências nas formalidades dos processos de pagamento e aditivos contratuais, a irregularidade, por si só, não evidencia o elemento subjetivo dolo, que deve estar suficientemente comprovado através da vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado no dispositivo legal (...) acompanhando o posicionamento dos citados precedentes desta Corte, não observo na espécie, sequer a presença do dolo genérico, normalmente caracterizado pelo dano presumido ao erário, e apesar dos evidentes vícios formais suscitados, não há indícios de má-fé ou enriquecimento ilícito, deixando assim, de reconhecer, na hipótese, a prática de ato de improbidade administrativa, ainda que o ora apelante tenha agido de forma negligente. (...) ”.

Assim, o entendimento perfilhado no julgado do Colegiado fracionário se acha sim em confluência com o entendimento do STF, no julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199[1]), ao considerar essencial a presença do dolo para a tipificação dos atos ímprobos previsto nos arts. 9º, 10 e 11 da LIA, não se admitindo a "responsabilidade objetiva no âmbito de aplicação da lei de improbidade administrativa desde a edição da Lei 8.429/92".

Ora, no referido tema foi firmada a orientação que, mesmo antes da edição da Lei 14.230/21 (que revogou a modalidade de ato de improbidade administrativa culposo, prevista na redação originária do art. 10 da Lei 8.429/92 e incluiu, nos arts. 9º e 11, a imprescindibilidade do dolo), sempre foi EXIGIDA A PLENA COMPROVAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA por ato de improbidade administrativa - de natureza civil qualificada[2], consubstanciado na má-fé, com o intento de obtenção de vantagens materiais indevidas ou produção de prejuízos ao patrimônio público (finalidade ilícita com vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito).

Também, restou reverberado que a revogação da modalidade culposa do art. 10 da Lei 8.429/92 pela Lei 14.230/21 tem incidência sobre os processos SEM trânsito em julgado[3], raciocínio jurídico que se emprega identicamente para a conotação intelectiva trazida pela novel norma no respeitante ao elemento anímico do dolo “não bastando a voluntariedade do agente”, repercutindo, inclusive, em alteração dos precedentes jurisprudenciais de outrora de forma a não mais se permitir aos feitos não finalizados uma condenação por “uma conduta não mais tipificada legalmente”.

Aliás, o paradigma qualificado lastreou a orientação no sentido de impedir, reflexamente, a ultra-atividade da lei anterior, observando-se, ainda, o tempus regit actum, em que a pretensa tipificação se acha lastreada em comportamento expressamente revogado/modificado (voluntariedade não mais sancionável pelo sistema de improbidade).

Trago, no que interessa, trechos esclarecedores do voto prevalente:

“(...) Em que pese sua natureza civil, o ato de improbidade administrativa é um ato ilícito civil qualificado e exige, para a sua consumação, um desvio de conduta do agente público, devidamente tipificado em lei, e que, no exercício indevido de suas funções, afaste-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas (artigo 9º da LIA) ou gerar prejuízos ao patrimônio público (artigo 10 da LIA), mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, apesar de ferir os princípios...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT