Acórdão Nº 08143134020228205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 11-10-2023

Data de Julgamento11 Outubro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08143134020228205106
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0814313-40.2022.8.20.5106
Polo ativo
UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO
Advogado(s): MURILO MARIZ DE FARIA NETO
Polo passivo
JOSE JAIME VALE
Advogado(s): LUIZ CARLOS BATISTA FILHO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Desembargador Vivaldo Pinheiro - 3ª Câmara Cível


Apelação Cível n°: 0814313-40.2022.8.20.5106.

Apelante: Unimed Natal Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico.

Advogados: Murilo Mariz de Faria Neto e outros.

Apelado: José Jaime Vale.

Advogado: Luiz Carlos Batista Filho.

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.


EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DA UNIMED NATAL. MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. TESE DE QUE NÃO HOUVE ABUSIVIDADE NO REAJUSTE. INVIABILIDADE. ALTERAÇÃO NO VALOR DA MENSALIDADE QUE NÃO OBSERVOU O ENTENDIMENTO DO STJ. TEMA 952. AUSÊNCIA DE CRITÉRIOS PARA COMPROVAR O REAJUSTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.


Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


Trata-se de Apelação Cível interposta pela Unimed Natal Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico contra a sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Mossoró que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Pedido de Indenização por Danos Morais ajuizada por José Jaime Vale, julgou parcialmente procedente o pleito autoral nos seguintes termos:


“Posto isso, julgo parcialmente procedentes, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, os pedidos autorais para:

a) declarar a nulidade do reajuste aplicado no que se refere a elevação do valor da mensalidade em decorrência da mudança da faixa etária para 59 anos, que deverá ser realizado respeitando o limite de 6 vezes o valor da primeira faixa etária (de 0 a 18 anos), observando-se o teor do artigo 3º da Resolução Normativa nº 63/03 da ANS (vigente à época);

b) condenar a ré à restituição dos valores cobrados com incidência do reajuste decorrente da mudança de faixa etária, em dobro, acrescido de juros pela Taxa SELIC, sem cumulação com correção monetária, a partir da implementação do reajuste (janeiro de 2021), da data de cada cobrança.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85 do Código de Processo Civil.”


Em suas razões, a parte recorrente alega, em síntese, que a partir da edição da Lei nº 9.656/98, três tipos de plano passaram a coexistir: (i) os que existiam antes da referida lei; (ii) os que foram adaptados desde a vigência da Lei nº 9.656/98; (iii) os que foram celebrados após a entrada em vigor da legislação em comento.


Assevera que o contrato objeto dos autos foi firmado no ano de 1997, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656/98.


Defende que o autor, ora apelado, não exerceu a opção de adaptação das novas regras contratuais, consoante o art. 35 citada lei.


Cita as teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça (Temas 952 e 1.016).


Ressalta que o reajuste ocorreu em conformidade ao posicionamento do STJ.


Narra que o contrato prevê a possibilidade de dois tipos reajustes.


Ao final, pugna pelo provimento do recurso.


As contrarrazões foram apresentadas pelo desprovimento do apelo (Id. 19679621).


A 7ª Procuradoria de Justiça declinou de intervir no feito (Id. 19795350).


É o relatório.

VOTO


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.


O propósito recursal consiste em reformar a sentença, sob a justificativa de que a operadora de saúde não praticou qualquer conduta ilícita ao reajustar o valor da mensalidade do plano de saúde, tendo em vista a mudança de faixa etária do autor.


Os fatos apresentados permitem a caracterização de uma relação consumerista entre as partes, devendo ser analisado à luz dos princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor.


Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula 608: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.”


Sobre a matéria, cumpre mencionar o posicionamento do STJ, em julgamento de recursos repetitivos, Tema 952, acerca da legalidade, ou não, do aumento de mensalidade de plano de saúde com relação ao aumento de faixa etária do usuário.


Nesse sentido:


“EMENTA: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MODALIDADE INDIVIDUAL OU FAMILIAR. CLÁUSULA DE REAJUSTE DE MENSALIDADE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. LEGALIDADE. ÚLTIMO GRUPO DE RISCO. PERCENTUAL DE REAJUSTE. DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS. ABUSIVIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO-ATUARIAL DO CONTRATO.

1. A variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes, sob pena de não ser aplicada (arts. 15, caput, e 16, IV, da Lei nº 9.656/1998).

2. A cláusula de aumento de mensalidade de plano de saúde conforme a mudança de faixa etária do beneficiário encontra fundamento no mutualismo (regime de repartição simples) e na solidariedade intergeracional, além de ser regra atuarial e asseguradora de riscos.

3. Os gastos de tratamento médico-hospitalar de pessoas idosas são geralmente mais altos do que os de pessoas mais jovens, isto é, o risco assistencial varia consideravelmente em função da idade. Com vistas a obter maior equilíbrio financeiro ao plano de saúde, foram estabelecidos preços fracionados em grupos etários a fim de que tanto os jovens quanto os de idade mais avançada paguem um valor compatível com os seus perfis de utilização dos serviços de atenção à saúde.

4. Para que as contraprestações financeiras dos idosos não ficassem extremamente dispendiosas, o ordenamento jurídico pátrio acolheu o princípio da solidariedade intergeracional, a forçar que os de mais tenra idade suportassem parte dos custos gerados pelos mais velhos, originando, assim, subsídios cruzados (mecanismo do community rating modificado).

5. As mensalidades dos mais jovens, apesar de proporcionalmente mais caras, não podem ser majoradas demasiadamente, sob pena de o negócio perder a atratividade para eles, o que colocaria em colapso todo o sistema de saúde suplementar em virtude do fenômeno da seleção adversa (ou antisseleção).

6. A norma do art. 15, § 3º, da Lei nº 10.741/2003, que veda "a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade", apenas inibe o reajuste que consubstanciar discriminação desproporcional ao idoso, ou seja, aquele sem pertinência alguma com o incremento do risco assistencial acobertado pelo contrato.

7. Para evitar abusividades (Súmula nº 469/STJ) nos reajustes das contraprestações pecuniárias dos planos de saúde, alguns parâmetros devem ser observados, tais como (i) a expressa previsão contratual;

(ii) não serem aplicados índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o consumidor, em manifesto confronto com a equidade e as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da especial proteção ao idoso, dado que aumentos excessivamente elevados, sobretudo para esta última categoria, poderão, de forma discriminatória, impossibilitar a sua permanência no plano; e (iii) respeito às normas expedidas pelos órgãos governamentais: a) No tocante aos contratos antigos e não adaptados, isto é, aos seguros e planos de saúde firmados antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656/1998, deve-se seguir o que consta no contrato, respeitadas, quanto à abusividade dos percentuais de aumento, as normas da legislação consumerista e, quanto à validade formal da cláusula, as diretrizes da Súmula Normativa nº 3/2001 da ANS.

b) Em se tratando de contrato (novo) firmado ou adaptado entre 2/1/1999 e 31/12/2003, deverão ser cumpridas as regras constantes na Resolução CONSU nº 6/1998, a qual determina a observância de 7 (sete) faixas etárias e do limite de variação entre a primeira e a última (o reajuste dos maiores de 70 anos não poderá ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para os usuários entre 0 e 17 anos), não podendo também a variação de valor na contraprestação atingir o usuário idoso vinculado ao plano ou seguro saúde há mais de 10 (dez) anos.

c) Para os contratos (novos) firmados a partir de 1º/1/2004, incidem as regras da RN nº 63/2003 da ANS, que prescreve a observância (i) de 10 (dez) faixas etárias, a última aos 59 anos; (ii) do valor fixado para a última faixa etária não poder ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para a primeira; e (iii) da variação acumulada entre a sétima e décima faixas não poder ser superior à variação cumulada entre a primeira e sétima faixas.

8. A abusividade dos aumentos das mensalidades de plano de saúde por inserção do usuário em nova faixa de...

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