Acórdão Nº 08150175320178205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 10-09-2020

Data de Julgamento10 Setembro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08150175320178205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0815017-53.2017.8.20.5001
Polo ativo
MOURA DUBEUX ENGENHARIA E EMPREENDIMENTOS S/A e outros
Advogado(s): RONALD CASTRO DE ANDRADE, LARISSA SOARES FELISMINO
Polo passivo
GUSTAVO DE SOUZA TAVARES e outros
Advogado(s): THIAGO TAVARES DE QUEIROZ

Apelação Cível n° 0815017-53.2017.8.20.5001.

Apelante: Md RN Maria Bernadete Construções Ltda.

Advogados: Ronald Castro de Andrade (5978/RN) e outra.

Apelados: Gustavo de Souza Tavares e outros.

Advogado: Thiago Tavares de Queiroz (7226/RN).

Relatora: Desembargadora Maria Zeneide Bezerra.

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL RESIDENCIAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RESCISÃO DO AJUSTE POR VONTADE DO COMPRADOR. RESTITUIÇÃO DE 90% (NOVENTA POR CENTO) DA QUANTIA DESEMBOLSADA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA SUSCITADA PELO APELANTE. AUSÊNCIA FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. DESNECESSIDADE DE DISCUSSÃO EXAUSTIVA DE TODOS OS FUNDAMENTOS APRESENTADOS PELAS PARTES. MÉRITO. RETENÇÃO DE DESPESAS COM CORRETAGEM E PUBLICIDADE (3%) PREVISTA NO AJUSTE. ACOLHIMENTO. PRECEDENTES DO STJ. RESTITUIÇÃO DE IPTU E TAXAS DE CONDOMÍNIO. IMPOSSIBILIDADE. IMÓVEL QUE NÃO FOI ENTREGUE AOS ADQUIRENTES. JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível, à unanimidade de votos, em Turma, sem opinamento ministerial, em Turma, conhecer, mas rejeitar a preliminar de nulidade de sentença suscitada pelo recorrente; no mérito, pela mesma votação, dar parcial provimento ao apelo, para reduzir a devolução da quantia paga pelos demandantes ao percentual de 87% (oitenta e sete por cento), nos termos do voto da Relatora.

RELATÓRIO

Md RN Maria Bernadete Construções Ltda interpôs apelação cível em face da sentença proferida pela Juízo da 14ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (ID3451314), o qual julgou procedente o pedido formulado pelos autores, Gustavo de Souza Tavares, Maryjane Ferreira dos Santos Tavares, Jose Evilacio da Cunha Amaral Junior, declarando rescindido o contrato de promessa de compra e venda do apartamento nº 704 do Edifício Maria Bernardete,, e condenando a demandada ao ressarcimento de 90% (noventa por cento) dos valores pagos pela aquisição do imóvel.

Em suas razões recursais (ID6539527), sustenta haver nulidade da sentença, por não ter enfrentado todos os pontos elencados pela recorrente, especificamente a permissibilidade contratual expressa de conservar em seu poder a quantia equivalente a 3% (três por cento). No mérito, aduz que a deliberação questionada está em desacordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que admite a retenção de até 25% (vinte e cinco por cento) da quantia desembolsada pelos compradores.

Por estes motivos postula o reconhecimento da nulidade do julgado, ou, subsidiariamente, a da retenção do montante adimplido no percentual de 22% (vinte e dois por cento), em atendimento à cláusula 8ª, itens “a” e “b”, e dos gastos com IPTU/TX de condomínio.

Em sede de contrarrazões (ID6539532) os apelados pugnam pelo conhecimento e desprovimento dos recursos manejados.

O representante da 13ª Procuradoria de Justiça, Raimundo Sílvio Dantas Filho, declinou da intervenção no feito (ID6765617).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA SUSCITADA PELO APELANTE.

O requerido advoga que a sentença foi omissa em não analisar todos os argumentos por ele defendidos, e por este motivo é nula.

Sem razão, contudo, pois o julgador, ao apreciar a demanda, não está adstrito aos fundamentos jurídicos trazidos pelas partes, mais do que isso, não precisa enfrentar toda a argumentação exposta pelo litigante quando as razões expressadas resolvem a demanda satisfatoriamente, consoante precedente que colaciono:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGADA OMISSÃO. SUPOSTA AUSÊNCIA DE DEBATE ACERCA DA VALIDADE DA CUMULAÇÃO DA CONDENAÇÃO EM LUCROS CESSANTES COM O PAGAMENTO DA MULTA CONTRATUAL. TEMA 970 DO STJ. INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 1.022 DO CPC/2015. NOVA DISCUSSÃO DE MATÉRIA JÁ ANALISADA E DECIDIDA. PREQUESTIONAMENTO. INVIABILIDADE. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS. PRECEDENTES.

1. Consoante dicção emanada do Art. 1.022 do CPC/2015 os embargos de declaração visam esclarecer obscuridade ou eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, ou ainda, corrigir erro material.

2. Não comprovada qualquer dessas hipóteses, o recurso fica destituído de funcionalidade, restando somente a mera intenção de rediscutir a matéria, forçando ao julgador a adequar-se ao entendimento do recorrente.

3. Desnecessário o exame exaustivo de todos os argumentos e fundamentos apresentados pelas partes, que restaram afastados, de maneira implícita, por aqueles adotados na referida decisão, se com estes incompatíveis.

(TJRN. Embargos de Declaração na Apelação Cível n° 2018.001540-8. Relator: Juiz Convocado Eduardo Pinheiro. 3ª Câmara Cível. 03/03/2020). Destaques acrescentados.

Assim, afasto referida preliminar.

MÉRITO

O cerne do recurso cinge-se em saber o percentual de retenção da vendedora em razão de desistência da compradora, em contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel.

Pois bem. No contexto delineado, os precedentes do STJ autorizam a retenção de 10% (dez por cento) a 25% (vinte e cinco por cento) dos valores pagos pela compradora, consoante ementa que transcrevo:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. DESFAZIMENTO. 1. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ART. 273 DO CPC/1973. REQUISITOS. PREENCHIMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. 2. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. ABUSIVIDADE. CDC. SÚMULA 543/STJ. 3. DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. PERCENTUAL DE RETENÇÃO. REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL E MATÉRIA FÁTICA. SÚMULAS 7 E 83/STJ. 3. AGRAVO IMPROVIDO. 1. O Tribunal estadual concluiu, com base nos elementos de prova dos autos, pela possibilidade de concessão da antecipação da tutela requerida, ante a presença de demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora. No caso, rever tal entendimento demanda reexame do conjunto fático-probatório, a atrair o óbice das Súmulas n. 5 e 7 do STJ. 2. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido da possibilidade da devolução de todas as parcelas pagas, desde que a vendedora seja responsável pela rescisão do contrato. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 543 do STJ. 3. O percentual de retenção estabelecido pelo acórdão recorrido em 20% dos valores pagos, não destoa da atual jurisprudência desta Corte que, em caso de resolução do compromisso de compra e venda por culpa do promitente comprador, entende ser lícito ao vendedor reter entre 10% e 25% dos valores pagos, sendo que a fixação desse percentual foi analisada de acordo com as peculiaridades do caso concreto, não sendo viável a sua revisão nesta instância extraordinária, sob pena de afronta à Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno improvido.(AgInt no AREsp 952.241/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe 29/11/2016)

Bom referir a Súmula 543 também do Superior Tribunal de Justiça, que firmou compreensão quanto à regularidade da rescisão contratual na promessa de compra e venda:


"Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento".


Traçadas estas balizas, observo que a desistência adveio de vontade dos compradores, e que consta na cláusula oitava, específica da rescisão (ID6539294), a possibilidade das seguintes retenções: 1) 3% (três por cento) a título de despesas na realização do negócio, tais como corretagem e publicidade do empreendimento; 2) e 10% (dez por cento) como pena convencional.

As despesas referidas no primeiro item são passíveis de apropriação pela vendedora, consoante decisão do Superior Tribunal de Justiça (Resp nº 1786096 - SP. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão. 18/08/2020), na qual há uma explanação da jurisprudência sobre o tema, nos seguintes termos:


“Quanto à discussão a respeito do percentual de retenção aplicado no caso, registro que a Segunda Seção do STJ, em recente julgamento do REsp n. 1.723.519/SP (28.8.2019), de relatoria da Ministra ISABEL GALLOTTI, firmou o entendimento no sentido de que, nos contratos firmados antes da Lei n. 13.786/2018, deve prevalecer o percentual de 25% (vinte e cinco por cento) de retenção, definido anteriormente no julgamento dos EAg n. 1.138.183/PE, por ser adequado e suficiente para indenizar o construtor das despesas gerais e do rompimento unilateral do contrato.

Naquela oportunidade, foi enfatizado que tal percentual tem caráter indenizatório e cominatório, servindo como modo de desestimular o rompimento unilateral e imotivado de contratos, pois quem se obriga deve arcar com as consequências de sua conduta. Relembrou-se o voto do Ministro ARI PARGENDLER, no julgamento perante a Segunda Seção do EREsp 59.870/SP, no qual enfatizou que a devolução das prestações pagas deve ser feita após a retenção, não apenas das despesas incorridas pelo empreendedor, como custos com corretagem, publicidade, ocupação, manutenção, segurança, vigilância, mas também de "uma indenização adicional pelo rompimento do vínculo, porque, se assim não for, estaremos dizendo que a pessoa pode contratar sem se estar obrigando. Quem se obriga e rompe essa obrigação, sofre uma pena".

Seguindo esse norte, ficou...

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