Acórdão Nº 08150824020228200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 24-03-2023

Data de Julgamento24 Março 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08150824020228200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0815082-40.2022.8.20.0000
Polo ativo
BOA UNIAO PARTICIPACOES S/A
Advogado(s): FREDERICO ARAUJO SEABRA DE MOURA, RENATO DUARTE MELO
Polo passivo
MUNICIPIO DE SAO GONCALO DO AMARANTE
Advogado(s):

EMENTA: DIREITOS TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMÓVEL ADQUIRIDO POR USUCAPIÃO. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE. ALTERAÇÃO NO CADASTRO IMOBILIÁRIO DO MUNICÍPIO. IPTU. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO ADQUIRENTE. POSSE ANTERIOR. ART. 25 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 45/2007 (CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL). PRECEDENTE DO STJ. PROVIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em prover o agravo de instrumento, confirmar a medida liminar antes deferida e considerar prejudicado o agravo interno, nos termos do voto do relator.

Agravo de Instrumento interposto por BOA UNIÃO PARTICIPAÇÕES S/A, nos autos da ação declaratória ajuizada em desfavor do MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO DO AMARANTE (processo nº 0804514-98.2022.8.20.5129), objetivando reformar a decisão da Juíza de Direito da 3ª Vara de São Gonçalo do Amarante, que indeferiu o pedido de tutela provisória.

Alega que: “trata-se de Ação Declaratória promovida pela ora Agravante em desfavor do Agravado, objetivando, a declaração de existência de relação jurídica tributária entre a Autora e o Município de São Gonçalo do Amarante para fins de incidência do IPTU, em razão de sua condição de proprietária do Bem Imóvel de sequencial n.º 1042056.8, bem adquirido por Usucapião Extrajudicial”; “na ficha do referido imóvel, consta como proprietário a sociedade empresarial T & A CONSTRUÇÕES LTDA”; “não havendo tido sucesso nesse desiderato em diligências junto à Secretaria Municipal de Tributação, não lhe restou outro caminho senão adotar a providência de procurar um provimento judicial nesse sentido”; “a parte Agravada ao invés de contestar o pedido declaratório deduzido em juízo pelo particular, houve por bem criar uma fantasiosa (e especulativa) narrativa acerca da regularidade e higidez do próprio título aquisitivo de propriedade (a usucapião extrajudicial)”; “é imperioso haver a declaração formal da existência da relação jurídicotributária da Agravante com o imóvel, reconhecendo sua condição de titular e contribuinte do bem, o que é permitido segundo o art. 19 do Código de Processo Civil; “na forma dos artigos 32 e 34 do Código Tributário Nacional, bem como do artigo 25 do Código Tributário Municipal de São Gonçalo do Amarante, a responsabilidade pelos tributos que oneram o bem deve recair sobre seu real e atual proprietário”; “sendo inconteste que a propriedade do bem imóvel é da empresa BOA União Participações S/A, que o adquiriu por força da usucapião, é evidente a existência de uma relação jurídica que atrai a sua responsabilidade tributária, a qual deve ser declarada em sentença”; “a especulada nulidade do título não é objeto destes autos”; “o objeto da demanda estaria sendo delimitada pela parte Ré, o que é evidentemente impossível, visto tratar-se de prerrogativa da parte Autora”; “a alegação de intento fraudulento ou de sonegação fiscal deveria ser objeto de procedimento distinto”; “se o Município reputa que deixou de receber créditos tributários relativos ao ITBI, que realize os respectivos lançamentos tributários (o que nunca o fez)”.

Por fim, pugna pela antecipação da tutela recursal e, no mérito, pelo provimento do recurso para determinar que o município agravado retifique seus cadastros de modo a indicar a agravante como titular e contribuinte do IPTU, relativo ao imóvel de sequencial nº 1042056.8.

Deferido o pedido de antecipação da tutela recursal para determinar que o município agravado retifique seus cadastros de modo a indicar a agravante como contribuinte do IPTU, relativo ao imóvel de sequencial nº 1042056.8. Proposto agravo interno. Contrarrazões pelo desprovimento dos recursos.

Na dicção do art. 1.245 do Código Civil, a transmissão da propriedade de bem imóvel opera-se com o registro do título translativo no Registro de Imóveis, sem o qual o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. O art. 34 do CTN estabelece que contribuinte do IPTU “é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título”.

Acerca do sujeito passivo do IPTU, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu quando do julgamento do REsp 1.110.551/SP, submetido ao regime dos recursos repetitivos:

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO POSSUIDOR (PROMITENTE COMPRADOR) E DO PROPRIETÁRIO (PROMITENTE VENDEDOR). 1. Segundo o art. 34 do CTN, consideram-se contribuintes do IPTU o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. 2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU. Precedentes: RESP n.º 979.970/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 18.6.2008; AgRg no REsp 1022614 / SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJ de 17.4.2008; REsp 712.998/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ 8.2.2008 ; REsp 759.279/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 11.9.2007; REsp 868.826/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJ 1º.8.2007; REsp 793073/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJ 20.2.2006. 3. "Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito passivo do tributo, contemplando qualquer das situações previstas no CTN. Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título, pode a autoridade administrativa optar por um ou por outro visando a facilitar o procedimento de arrecadação" (REsp 475.078/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 27.9.2004). 4. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08. (REsp 1110551/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/06/2009, DJe 18/06/2009).

No âmbito do Município de São Gonçalo do Amarante, definido o sujeito passivo do tributo no art. 25 da Lei Complementar nº 45/2007 (Código Tributário Municipal):

Art. 25. O Imposto Sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município, independente de sua forma, estrutura ou destinação.

Na origem, o município contestou a pretensão autoral sob o argumento de que o registro da usucapião extraordinária decorreu de fraude, eis que tanto a antiga proprietária (T & A Construções Ltda) quanto a empresa usucapiente constituíam grupo econômico representado pelo mesmo sócio; ainda, que a agravante não possui sequer sede ou filial neste Estado, a evidenciar a simulação. Segundo o recorrido, a manobra teria por objetivo frustrar a satisfação de execuções fiscais existentes em desfavor da empresa T & A Construções Ltda.

O registro da aquisição de propriedade por usucapião extrajudicial está consumado na respectiva matrícula, no 1º Ofício de Registro de São Gonçalo do Amarante. Não há qualquer notícia de ação de anulação do registro público em foco, de sorte que permanece hígido e presumidamente válido. Perfectibilizada a transferência da titularidade do bem, não há óbice à alteração do cadastro perante a Secretaria de Tributação do Município, com vistas a retificar o contribuinte do IPTU.

A alteração no sistema da administração municipal não exerce qualquer influência sobre a titularidade do imóvel, eis que possui fins meramente administrativos. Não obsta eventual caracterização de fraude à execução fiscal, se ocorrente, a ser suscitada na via própria. A ação de origem apenas visa a adequar o cadastro administrativo da propriedade já consolidado no cartório imobiliário, sem haver pleito de retroatividade dessa alteração.

A retificação almejada não representa prejuízo ao município, eis que o adquirente também responde pela dívida de IPTU anterior ao registro, especialmente porque a usucapião pressupõe a posse anterior e antiga do bem pelo usucapiente, o que o torna sujeito passivo da obrigação juntamente com o proprietário legal, sendo o próprio imóvel a garantia natural da execução fiscal. Por tais razões, neste momento de cognição sumária vislumbro presente o direito buscado, a autorizar a concessão da tutela provisória requerida em primeiro grau.

Posto isso, voto por prover o agravo de instrumento, confirmar a medida liminar por mim antes deferida e considerar prejudicado o agravo interno.

Consideram-se prequestionados todos os dispositivos apontados pelas partes em suas respectivas razões. Será manifestamente protelatória eventual oposição de embargos de declaração com notória intenção de rediscutir a decisão (art. 1.026, § 2° do CPC).

Data de registro do sistema.

Des. Ibanez Monteiro

Relator

Natal/RN, 20 de Março de 2023.

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