Acórdão Nº 08153566720238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 19-12-2023

Data de Julgamento19 Dezembro 2023
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo08153566720238200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: HABEAS CORPUS CRIMINAL - 0815356-67.2023.8.20.0000
Polo ativo
ERICK ANDRE DO NASCIMENTO SILVA
Advogado(s): MARCIO JOSE MAIA DE LIMA
Polo passivo
JUÍZO DE DIREITO DO PLANTÃO JUDICIÁRIO DIURNO - REGIÃO II e outros
Advogado(s):

Habeas Corpus c/ liminar nº. 0815356-67.2023.8.20.0000

Impetrante: Márcio José Maia de Lima (OAB/RN 13.901).

Paciente: Erick Andre do Nascimento Silva.

Aut. Coat: Juízo de Direito do Plantão Diurno Criminal, Região II da Comarca de Natal /RN.

Relator: Desembargador Glauber Rêgo.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PRISÃO PREVENTIVA. PRETENSA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. POSSIBILIDADE. JUÍZO QUE DECRETOU A PRISÃO PREVENTIVA DE OFÍCIO. SISTEMA PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO QUE PRIVILEGIA O SISTEMA ACUSATÓRIO. ART. 3º-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NOS AUTOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. LIMINAR RATIFICADA. ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 3ª Procuradoria de Justiça, em conhecer e conceder a ordem do presente habeas corpus, ratificando a decisão liminar que determinou a revogação da prisão preventiva do paciente, sendo este colocado em liberdade, se por outro motivo não deva permanecer preso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus com pedido liminar formulado por Márcio José Maia de Lima em favor de Erick Andre do Nascimento, apontando como autoridade coatora o Juízo de Direito do Plantão Diurno Criminal, Região II, da Comarca de Natal /RN.

Extrai-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante em 01 de dezembro de 2023 e teve sua prisão convertida em preventiva em 03 de dezembro de 2023, suspeito de ter praticado crime previsto nos artigos 15 e 16, ambos da Lei 10.826/2003.

O impetrante argumenta, em síntese, que: i) o Juízo apontado como coator converteu a prisão em preventiva de ofício, sem que tenha sido para tanto concitado pela Autoridade Policial ou pelo Ministério Público; ii) o paciente encontra hospitalizado em razão dos ferimentos ocorridos no flagrante; iii) é primário e possui residência fixa, o que não denota o perigo da sua liberdade.

Com base nestas razões pugna, liminar e meritoriamente, pela concessão da ordem em favor do paciente, havendo a expedição do competente alvará de soltura e que seja revogada a prisão preventiva, com o compromisso de comparecer a todos os atos do processo.

Junta os documentos que entende pertinentes.

Liminar deferida (ID 22574239).

Informações da autoridade coatora prestadas (ID 22633509).

Parecer da 3ª Procuradoria de Justiça opinando pelo conhecimento e concessão da ordem (ID 22722952).

É o relatório.

VOTO


Verifico preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Inicialmente, impende destacar que, após a decisão de ID 22574239, não vieram aos autos quaisquer elementos novos capazes de modificar as razões ali consignadas. Desta forma, transcrevo os fundamentos utilizados na decisão monocrática para o deferimento da medida liminar, ratificando-os:

“Como consabido, a concessão de medida liminar em habeas corpus somente se mostra cabível nos casos em que a ilegalidade do ato atacado esteja provada de imediato.

No presente caso, observo, prima facie, constrangimento ilegal a ser sanado in limine, por vislumbrar a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, requisitos autorizadores à concessão da medida liminar.

Assim entendo ao constatar que a decisão que converteu o flagrante em preventiva se deu de ofício, sem manifestação neste sentido por parte da Autoridade Policial ou pelo Ministério Público, consoante se infere da busca feita de ofício por esta relatora ao PJE de 1º grau e de acordo com a própria decisão de ID 22567291, prática esta que se afigura, nos atuais contornos do direito processual penal, incabível.

A este propósito, valho-me das palavras do então decano do Supremo Tribunal Federal, Exmo. Min. Celso de Mello, em elucidativo trecho de voto proferido no Habeas Corpus n. 188.888/MG:

"A reforma introduzida pela Lei nº 13.964/2019 (“Lei Anticrime”) modificou a disciplina referente às medidas de índole cautelar, notadamente aquelas de caráter pessoal, estabelecendo um modelo mais consentâneo com as novas exigências definidas pelo moderno processo penal de perfil democrático e assim preservando, em consequência, de modo mais expressivo, as características essenciais inerentes à estrutura acusatória do processo penal brasileiro.A Lei nº 13.964/2019, ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311, todos do Código de Processo Penal, vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem o prévio “requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público” (grifei), não mais sendo lícita, portanto, com base no ordenamento jurídico vigente, a atuação “ex officio” do Juízo processante em tema de privação cautelar da liberdade.A interpretação do art. 310, II, do CPP deve ser realizada à luz dos arts. 282, §§ 2º e 4º, e 311, do mesmo estatuto processual penal, a significar que se tornou inviável, mesmo no contexto da audiência de custódia, a conversão, de ofício, da prisão em flagrante de qualquer pessoa em prisão preventiva, sendo necessária, por isso mesmo, para tal efeito, anterior e formal provocação do Ministério Público, da autoridade policial ou, quando for o caso, do querelante ou do assistente do MP. Magistério doutrinário. Jurisprudência." (HC 188888/MG - MINAS GERAIS. HABEAS CORPUS. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 06/10/2020. Publicação: 15/12/2020. Órgão julgador: Segunda Turma.).

Nesse sentido, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento “de que não é possível a decretação da prisão preventiva de ofício em face do que dispõe a Lei n. 13.964/2019, mesmo se decorrente de prisão em flagrante e se não tiver ocorrido audiência de custódia. Isso porque não existe diferença entre a conversão da prisão em flagrante em preventiva e a decretação da prisão preventiva como uma primeira prisão”. Confira-se:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO. CONVERSÃO EX OFFICIO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO PRÉVIO OU PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, OU PELO QUERELANTE, OU PELO ASSISTENTE, OU, POR FIM, MEDIANTE REPRESENTAÇÃO DA AUTORIDADE POLICIAL.

1. Em razão do advento da Lei n. 13.964/2019 não é mais possível a conversão ex officio da prisão em flagrante em prisão preventiva.Interpretação conjunta do disposto nos arts. 3º-A, 282, § 2º, e 311, caput, todos do CPP.

2. IMPOSSIBILIDADE, DE OUTRO LADO, DA DECRETAÇÃO "EX OFFICIO" DE PRISÃO PREVENTIVA EM QUALQUER SITUAÇÃO (EM JUÍZO OU NO CURSO DE INVESTIGAÇÃO PENAL) INCLUSIVE NO CONTEXTO DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA (OU DE APRESENTAÇÃO), SEM QUE SE REGISTRE, MESMO NA HIPÓTESE DA CONVERSÃO A QUE SE REFERE O ART. 310, II, DO CPP, PRÉVIA, NECESSÁRIA E INDISPENSÁVEL PROVOCAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO OU DA AUTORIDADE POLICIAL - RECENTE INOVAÇÃO LEGISLATIVA INTRODUZIDA PELA LEI N. 13.964/2019 ("LEI ANTICRIME"), QUE ALTEROU OS ARTS. 282, §§ 2º e 4º, E 311 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, SUPRIMINDO AO MAGISTRADO A POSSIBILIDADE DE ORDENAR, "SPONTE SUA", A IMPOSIÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA - NÃO REALIZAÇÃO, NO CASO, DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA (OU DE APRESENTAÇÃO) - INADMISSIBILIDADE DE PRESUMIR-SE IMPLÍCITA, NO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, A EXISTÊNCIA DE PEDIDO DE CONVERSÃO EM PRISÃO PREVENTIVA - CONVERSÃO, DE OFÍCIO, MESMO ASSIM, DA PRISÃO EM FLAGRANTE DO ORA PACIENTE EM PRISÃO PREVENTIVA - IMPOSSIBILIDADE DE TAL ATO, QUER EM FACE DA ILEGALIDADE DESSA DECISÃO. [...] - A reforma introduzida pela Lei n. 13.964/2019 ("Lei Anticrime") modificou a disciplina referente às medidas de índole cautelar, notadamente aquelas de caráter pessoal,...

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