Acórdão Nº 08167577020228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 19-04-2023

Data de Julgamento19 Abril 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08167577020228205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0816757-70.2022.8.20.5001
Polo ativo
ITAU UNIBANCO S.A.
Advogado(s): MARCIO SANTANA BATISTA
Polo passivo
EDSON SILVA DA CRUZ
Advogado(s): LINCON VICENTE DA SILVA

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEVEDOR. ATO CONSTITUTIVO QUE PODE SER REALIZADO POR MEIO DE NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL A SER ENTREGUE NO DOMICÍLIO DO DEVEDOR, SENDO DISPENSADA A NOTIFICAÇÃO PESSOAL. AVISO DE RECEBIMENTO (AR) DEVOLVIDO COM A ANOTAÇÃO DE “AUSENTE”. AUSÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO EM MORA. TENTATIVA DE CONSTITUIÇÃO EM MORA PELA VIA DO PROTESTO DO TÍTULO. INEXISTÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, tudo nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Banco Itaú S/A em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da 13ª Vara Cível da Comarca de Natal que, nos da presente Ação de Busca e Apreensão ajuizada pelo apelante contra Edson Silva da Cruz, acolheu preliminar de ausência de interesse processual suscitada pelo demandado e extinguiu o processo sem resolução do mérito. Ao final, condenou o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.

Nas razões do apelo cível (Id 17216686), o banco sustenta que a mora do recorrido restou devidamente comprovada por meio do envio de notificação dirigida ao endereço constante do contrato de financiamento, sendo “irrelevante a forma de retorno do aviso de recebimento, uma vez que a lei sequer exige que a assinatura constante seja do Devedor. Ou seja, a mora se comprova pelo envio da carta registrada ao endereço informado, o que ocorreu no presente caso.”

Pede o provimento do recurso com a reforma integral da sentença, reconhecendo a comprovação da mora, com o recebimento da petição inicial, deferindo-se a liminar postulada.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (Id 17216702).

A 13ª Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito (Id 18426204).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Desde logo, cumpre mencionar que apesar da pendência de julgamento dos REsp’s 1.951.888/RS e 1.951.662/RS, referentes ao TEMA 1.132, cuja questão é “definir se, para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente, ou não, o envio de notificação extrajudicial ao endereço do devedor indicado no instrumento contratual, dispensando-se, por conseguinte, que a assinatura do aviso de recebimento seja do próprio destinatário”, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça em sede de Questão de Ordem nos REsp’s citados concluiu por afastar a determinação de suspensão/sobrestamento do processamento de todos os feitos e recursos atinentes à matéria afetada.

Logo, não há que se falar em sobrestamento deste recurso.

Cuida-se de Ação de Busca e Apreensão fundada nas disposições do Decreto-Lei nº 911/69, com as alterações introduzidas pela Lei nº 10.931/04, mediante a qual a parte autora requereu, de início, a concessão de medida liminar para retomar a posse direta sobre o veículo descrito na inicial e que é objeto do contrato de abertura de crédito para financiamento do bem, garantido pela alienação fiduciária, celebrado pelos litigantes. Ao final, postulou a procedência da ação consolidando a propriedade do bem em seu nome.

Para o ajuizamento de Ação de Busca e Apreensão a lei exige a constituição em mora do devedor, mediante carta registrada com aviso de recebimento, nos termos dos artigos 3º, caput, e 2º, §2º, do Decreto-Lei 911/69, conforme alteração do referido diploma legal pela Lei nº 13.043/2014, sendo imprescindível a comprovação da mora (Súmula 72 do STJ).

Transcrevo os dispositivos pertinentes ao tema e o teor do enunciado contido na Súmula 72 do Superior Tribunal de Justiça:

Art. 3º. O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2º do art. 2º, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário.

Art. 2º. (...)

§ 2º. A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.

A comprovação da mora e imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. (Súmula 72, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/04/1993, DJ 20/04/1993, p. 6769).

Assim, nas hipóteses de alienação fiduciária em garantia, a demonstração da constituição em mora, que pode ser realizada por meio de notificação extrajudicial a ser entregue no domicílio do devedor, sendo dispensada a notificação pessoal, é requisito essencial para a concessão da liminar de busca e apreensão, quiça para a própria admissibilidade da ação.

Ao exame dos autos, verifico que a Notificação Extrajudicial (Id 17216550) dirigida ao endereço do Sr. Edson Silva da Cruz constante do contrato firmado entre as partes foi devolvido, após três tentativas, com do Aviso de Recebimento (AR) a anotação “Ausente”.

Nesses casos, não basta que a Notificação seja dirigida ao endereço do devedor, sendo exigida a entrega da mesma, ainda que não recebida pela pessoa a ser notificada.

Cito julgado deste Tribunal de Justiça:

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO REQUERIDO. CARTA NÃO ENTREGUE NO DOMICÍLIO DO DEVEDOR. MORA NÃO CONSTITUÍDA. PRETENSÃO AO AFASTAMENTO DA DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA INICIAL. INVIABILIDADE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. ART. 3º DO DL Nº 911/1969. NECESSIDADE DE EFETIVA ENTREGA DA NOTIFICAÇÃO NO ENDEREÇO DO SUPOSTO DEVEDOR PARA EFEITO DE COMPROVAÇÃO DA MORA. DEVOLUÇÃO DO AVISO DE RECEBIMENTO. MOTIVO: ”AUSENTE”. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES. - O STJ consolidou a sua jurisprudência no sentido de que se faz necessária a comprovação do efetivo recebimento da notificação do suposto devedor no seu endereço, para constituí-lo na mora que embasa a medida de busca e apreensão, não se exigindo que a assinatura do aviso de recebimento seja a do próprio destinatário, mas que esta carta seja efetivamente entregue no endereço do devedor.

(TJRN, AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0810720-92.2022.8.20.0000, Des. João Rebouças, Terceira Câmara Cível, ASSINADO em 10/03/2023)

Lado outro, destaco que a lei de regência, acima parcialmente transcrita, ao indicar os requisitos para a configuração da mora, apontou a possibilidade, ainda que não exclusiva, de notificação por meio de cartório. Ou seja, “a necessidade de notificação via cartório, foi considerado, por própria opção do legislador, formalidade desnecessária" (REsp n. 1.292.182/SC, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 29/09/2016, DJe 16/11/2016)

Nesse sentido, colaciono julgado do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REALIZADA NO ENDEREÇO CONTRATUAL DO DEVEDOR. MORA COMPROVADA. SÚMULA 83/STJ. ALEGAÇÃO DE DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL. SÚMULA 284 DO STF. AGRAVO DESPROVIDO.

1. Conforme entendimento firmado no âmbito da Quarta Turma do STJ, "a demonstração da mora em alienação fiduciária ou leasing - para ensejar, respectivamente, o ajuizamento de ação de busca e apreensão ou de reintegração de posse - pode ser feita mediante protesto, por carta registrada expedida por intermédio do cartório de títulos ou documentos, ou por simples carta registrada com aviso de recebimento - em nenhuma hipótese, exige-se que a assinatura do aviso de recebimento seja do próprio destinatário" (REsp 1.292.182/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 29/09/2016, DJe de 16/11/2016).

2. A falta de indicação do dispositivo de lei federal supostamente violado, pertinente à temática abordada no recurso especial, impede a abertura da instância especial, nos termos da Súmula 284 do STF.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt nos EDcl no REsp 1859814/SC, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 11/10/2021, DJe 17/11/2021)

No caso concreto, frustradas as tentativas de notificação do devedor pelos Correios, não existe prova de tentativa de constituição em mora pela via do protesto de título efetivado pelo competente Ofício de Notas.

Portanto, correta a sentença apelada quando reconheceu a falta da prova da constituição em mora do devedor.

Isto posto, nego provimento ao recurso.

É como voto.

Natal, data da sessão.

Desembargador Amaury Moura Sobrinho

Relator

7

Natal/RN, 18 de Abril de 2023.

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