Acórdão Nº 08176552020218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 20-05-2022

Data de Julgamento20 Maio 2022
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08176552020218205001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0817655-20.2021.8.20.5001
Polo ativo
KATIA REJANE DO NASCIMENTO e outros
Advogado(s): THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE, MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA
Polo passivo
PLANINVESTI - ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA. e outros
Advogado(s): MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA, THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE

Apelação Cível nº 0817655-20.2021.8.20.5001

Apte/Apdo: PLANINVESTI - Administração e Serviços Ltda.

Advogada: Maria Emília Goncalves de Rueda (23748/PE)

Apda/Apte: Katia Rejane do Nascimento

Advogado: Thiago Marques Calazans Duarte (8204/RN)

Relator: Eduardo Pinheiro (Juiz Convocado)


EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE A DEMANDA. RECURSO DA PLANINVESTI: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE CONFIGURADA, DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO À CONSUMIDORA. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A MESMA ESPÉCIE DE OPERAÇÃO. RAZOABILIDADE. SÚMULA Nº 530 DO STJ. MANUTENÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. DECAIMENTO MÍNIMO DO PEDIDO INICIAL. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. APELO DA PARTE AUTORA DA DEMANDA: PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS, PARA RECALCULAR AS OPERAÇÕES DISCUTIDAS NA LIDE. QUESTÃO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA QUE EXTRAPOLA O CAMPO JURÍDICO. AUSÊNCIA DE EXAME APROFUNDADO NA FASE DE CONHECIMENTO. NECESSIDADE DE SER DEFINIDA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. CABIMENTO. OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, ausente o parecer ministerial, em conhecer de ambos os recursos e, no mérito, negar provimento ao apelo da instituição financeira e, por sua vez, dar parcial provimento ao recurso da parte autora da demanda, nos termos do voto do Relator, que integra o Acórdão.

R E L A T Ó R I O

Tratam os autos de Apelações Cíveis interpostas pelos dois polos da controvérsia, em face da sentença proferida pelo Juízo da Décima Sexta Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Cláusula Expressa e Revisão Contratual c/c Pedido de Exibição de Documentos ajuizada por Katia Rejane do Nascimento em desfavor de PLANINVESTI - Administração e Serviços Ltda. (atual denominação da Policard Systems e Serviços S/A), julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, consoante dispositivo a seguir transcrito:

“(...) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos da inicial, para determinar a incidência no contrato estabelecido entre as partes dos juros remuneratórios pela taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, devendo estes serem calculados de forma simples, com a devolução à parte autora, pelo réu, dos valores pagos a maior pela cobrança de juros capitalizados e comissão de permanência, acrescidos de correção monetária, a partir de cada parcela, estes calculados na forma da Tabela I da Justiça Federal, e juros de 1% (hum por cento) ao mês, a partir da citação.

Condeno a parte ré, ante a sucumbência mínima da parte autora, em honorários advocatícios e custas, que arbitro aqueles em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação”. (vide Ids Num. 12313837 e Num. 12313857).

Em suas razões recursais (ID Num. 12313860), a parte autora da demanda discorre acerca da necessidade de fixação da metodologia de cálculo dos juros remuneratórios, defendendo que o Método Linear Ponderado (GAUSS), “(...) por apresentar linearidade e parcelas constantes, é aquele que melhor atende à necessidade de substituir a Tabela Price, quando solicitado que sejam excluídos os juros compostos por juros simples”. Busca, também, a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente.

Requer, assim, o conhecimento e provimento do apelo, a fim de reformar a sentença hostilizada nos termos impugnados.

Por sua vez, em seu recurso de ID Num. 12313865, a instituição financeira sustenta, em síntese, que: a) a taxa de juros aplicada no pacto firmado entre as partes foi previamente estabelecida no Decreto Estadual nº 21.860/2010, o qual foi publicado em Diário Oficial, sendo de conhecimento de todos os servidores públicos; b) a recorrida celebrou diversas transações, nas quais os juros remuneratórios aplicados aos contratos respeitaram o percentual máximo (4,99%) previsto na referida norma; c) "em nenhum momento houve apreciação do Decreto Estadual nº 21.860/2010, situação que implica em omissão do julgado, sem a devida fundamentação nos termos do inciso IV, do §1º, do art. 489, do CPC”; d) a apelada teve ciência de todas as condições do contrato, tendo anuído por livre e espontânea vontade, sendo descabida a limitação da taxa de juros pleiteada; e) subsidiariamente, os juros devem ser fixados na taxa média de mercado acrescida de 50% (cinquenta por cento); f) é desarrazoada sua condenação nas custas processuais e honorários advocatícios, em virtude de ter decaído em parte mínima do pedido.

Pugna, ao final, pelo conhecimento e provimento do apelo, a fim de julgar totalmente improcedente a pretensão autoral; e, subsidiariamente, que os juros remuneratórios sejam fixados na taxa média de mercado acrescida de 50% (cinquenta por cento).

Contrarrazões juntadas apenas pela parte autora, nos termos do ID Num. 12313871; deixando a demandada transcorrer in albis o prazo para sua manifestação (ID Num. 12313872).

Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito.

É o relatório.

V O T O

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço de ambos os recursos.

I – DA APELAÇÃO CÍVEL APRESENTADA PELA PLANINVESTI - ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA.:

Cumpre destacar, em seara prefacial, que conforme apregoa o diploma processual civil a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, de modo que deve o Tribunal decidir apenas o que lhe foi efetivamente devolvido, nos limites das razões de recurso, não cabendo insurgências vagas e genéricas.

Sendo assim, cinge-se o mérito recursal ao exame da existência de abusividade da taxa de juros remuneratórios aplicada ao contrato celerado entre as partes, bem como ao cabimento da condenação da recorrente ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência.

Cabe registrar, em contraponto necessário às argumentações recursais, que ainda que o magistrado de primeiro grau não tenha se pronunciado expressamente acerca da aplicação do Decreto Estadual nº 21.860/2010 ao caso em exame, é certo que a lide foi decidida de forma fundamentada, de acordo com as provas carreadas aos autos, não havendo que se falar em deficiência ou vício no julgado que enseje sua nulidade.

Quanto às razões da apelante, no sentido de que houve a devida informação à consumidora acerca dos dados contratuais, em função da edição do Decreto Estadual nº 21.860/2010, entendo que tal instrumento normativo apenas dispôs sobre o limite e não especificação de taxa única admitida em empréstimos. Assim, não se vislumbra possível aceitar que foi atendido o dever de informação, sendo certo que a mera alusão a um diploma legal genérico não afasta da fornecedora a obrigação de informar a consumidora, no caso concreto, a respeito dos itens contratuais aos quais está aderindo.

In casu, verifica-se que não há contrato formal escrito, apenas áudios nos quais a atendente da instituição financeira apresenta, de forma muito sumária, as condições do negócio, basicamente, o montante do empréstimo disponibilizado, a quantidade e o valor de cada parcela.

Desse modo, diante da ausência de provas relativas aos elementos essenciais do contrato, principalmente dos juros remuneratórios cobrados (o que não corresponde, inclusive, ao Custo Efetivo Total), não é possível sequer reconhecer válida a informação unilateral fornecida pela apelante sobre a taxa praticada.

Nesse diapasão, para resolver a discussão quanto aos juros remuneratórios, aplica-se a Súmula nº 530 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:

"Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada - por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor". (Súmula 530, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/05/2015, DJe 18/05/2015). (destaques acrescidos).

Por sua vez, em que pese o parâmetro da razoabilidade adotado por este órgão julgador (que admite a média de mercado acrescida de um percentual de até 50% como padrão razoável), cumpre afirmar que tal parâmetro foi definido para aferição da razoabilidade da taxa de juros efetivamente contratada pelo consumidor. Isso significa que as taxas convencionadas, caso estejam até 50% (cinquenta por cento) acima da média de mercado, devem ser consideradas regulares, não abusivas. Não obstante, a situação dos autos é distinta.

No caso, a abusividade verificada no negócio jurídico se deu por vício de informação à consumidora, razão pela qual se mantém a presunção de que a taxa de juros remuneratórios praticada no contrato é abusiva, devendo ser aplicado o parâmetro definido em sentença: a taxa média de mercado.

Outrossim, também não merece acolhimento a insurgência da apelante quanto ao afastamento da...

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