Acórdão Nº 08176940820218205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 20-10-2023

Data de Julgamento20 Outubro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08176940820218205004
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0817694-08.2021.8.20.5004
Polo ativo
JAILMA MARIA DA SILVA
Advogado(s): CAMILA DE PAULA CUNHA
Polo passivo
AYMORE CREDITO- FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.
Advogado(s): DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

EMENTA: CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO. PLEITO DE REVISÃO DE CONTRATO. PRESCRIÇÃO DECENAL. DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. ABUSIVIDADE DA COBRANÇA DA TAXA DE REGISTRO DE CONTRATO. VALOR EXCESSIVAMENTE ONEROSO. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, POR OCASIÃO DO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1578553/SP (TEMA 958). SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE OPÇÃO AO CONSUMIDOR. EMPRESA DO MESMO GRUPO. IMPOSIÇÃO DE VENDA CASADA. COBRANÇA INDEVIDA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1639259/SP (TEMA 972). PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao apelo, e fixar os honorários recursais em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a serem arcados pela apelante, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por AYMORE CREDITO- FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., em face de sentença proferida pelo 11ª Vara Cível da Comarca de Natal, nos autos da Ação Revisional, proposta por JAILMA MARIA DA SILVA, nos seguintes termos:

“Ante o exposto, REJEITO AS PRELIMINARES, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral e, em decorrência, afasto a cobrança:

a) da Taxa de Registro de Contrato, porquanto realizada de forma abusiva; e,

b) de valores atinentes ao seguro de proteção financeira, desde a celebração do contrato.

Em face do encontro de contas, havendo constatação de pagamento a maior, deve o numerário excedente ser compensado com eventuais débitos da parte autora ou repetido na forma simples. Advirta-se que sobre o valor a ser repetido à parte autora também deverá incidir correção monetária (IGP-M a incidir a partir da data do efetivo pagamento declarado como indevido) e juros de mora (a contar da data da citação).

Por oportuno, declaro extinto o processo com julgamento do mérito, nos termos do art.487, I, do CPC.

Fixo os honorários advocatícios sucumbenciais em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º do CPC). Contudo, diante da sucumbência recíproca, condeno cada parte ao pagamento de 5% (cinco por cento) em favor do advogado da parte adversa.

Ainda em razão da sucumbência recíproca, condeno cada parte a arcar com 50% das custas processuais. Ressalte-se que, com arrimo no art. 98, §3º, do CPC, suspendo a cobrança/execução das verbas a serem suportadas pela parte autora”.

Nas razões suas razões, a apelante alega que a pretensão autoral foi atingida pela prescrição e pela decadência, vez que o contrato foi assinado em 18/05/2020 e a ação foi proposta em 19/11/2021.

Sustenta a legalidade da cobrança da tarifa de registro do contrato e do seguro de proteção financeira (prestamista).

Defende que não praticou qualquer conduta ilícita, e que a apelada não faz jus ao recebimento de valor pecuniário, sob pena de ocasionar seu enriquecimento ilícito.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do apelo.

A apelada apresentou as contrarrazões, pugnando, em suma, pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Insta analisar, inicialmente, a alegação da decadência e de prescrição de direito, suscitada pela apelante.

Sobre a prescrição, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se consolidou em considerar que “as ações de revisão de contrato bancário, cumuladas com pedido de repetição de indébito, possuem natureza pessoal e prescrevem no prazo de 10 (dez) anos, nos termos do art. 205 do Código Civil de 2002” (AgInt no REsp n. 1.632.888/MG, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 19/10/2020, DJe de 16/11/2020).

O início do prazo prescricional decenal nas ações de revisão de contrato bancário, em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, deve ser a data da assinatura do contrato (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.897.309/RS, Terceira Turma, DJe 18/3/202; AgInt no AREsp n. 1.234.635/SP, Quarta Turma, DJe 3/3/2021; AgInt no AREsp n. 1.444.255/MS, Quarta Turma, julgado em 20/4/2020, DJe 4/5/2020).

Considerando, que contrato foi assinado em 18/05/2020, o prazo prescricional decenal não restou ultrapassado.

Quanto à decadência, observa-se que o propósito da presente foi de provocar a revisão do contrato de financiamento firmado entre a consumidora e a instituição demandada. Não há pretensão de nulidade ou de anulabilidade do contrato a atrair a aplicação do art. 178 e 179 do Código Civil.

Desta feita, impõe-se a rejeição da prescrição e da decadência suscitadas.

Inicialmente, necessário destacar que por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1578553/SP – cuja matéria foi afetada sob o Tema 958 -, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento sobre cobrança de registro do contrato, fixando tese no sentido de considerar abusiva, em contratos bancários, a cláusula que prevê ressarcimento de serviços prestados por terceiros sem a especificação do serviço a ser efetivamente executado. Senão vejamos:

"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1.DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. (...) 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO". (STJ - REsp 1578553/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/11/2018, DJe 06/12/2018) (grifos acrescidos)


Neste norte, denota-se a validade da tarifa de registro do contrato nos "contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo” ressalvadas a abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado e a possibilidade de controle da onerosidade excessiva em cada caso concreto.

Assim, no tocante a esta tarifa, incumbe à instituição financeira comprovar a efetiva prestação dos serviços a elas referentes. E ao consumidor é permitida a alegação de onerosidade excessiva da cobrança, a ser apreciada pelo Julgador no caso concreto.

No caso dos autos, houve a cobrança de registro de contrato no montante de R$ 395,00 (trezentos e noventa e cinco reais). Entretanto, embora tenha anexado aos autos um documento identificado como “Controle de DUTS - Consulta”, não consta comprovação de que o registro tenha sido efetuado pelo demandado e que tenha efetivamente despendido o valor que consta no instrumento contratual, o qual se mostra bastante superior à taxa de Inserção do Gravame de Alienação Fiduciária ou Reserva de Domínio cobrada atualmente pelo DETRAN/RN (R$ 100,00).

Dessa forma, a cobrança da taxa de Registro do Contrato é abusiva, estando em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor, devendo ser expurgada da relação contratual.

No que concerne à cobrança do Seguro (R$ 758,10), as normas vigentes, especialmente aquelas que protegem o consumidor, vedam cobranças de itens contratuais impostos a título de "venda casada", ou não identificados ou relacionados específica e diretamente com os serviços prestados. Não basta à instituição financeira, assim, tentar identificar e justificar, apenas na demanda judicial, os serviços que no pacto se limitou a identificar de forma nitidamente genérica e abusiva.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1639259 SP – cuja matéria foi afetada sob o Tema 972 -, pacificou o entendimento de que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Vejamos:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 972/STJ. DIREITO BANCÁRIO. DESPESA DE PRÉ-GRAVAME. VALIDADE NOS CONTRATOS CELEBRADOS ATÉ 25/02/2011. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. VENDA CASADA. OCORRÊNCIA. RESTRIÇÃO À ESCOLHA DA SEGURADORA. ANALOGIA COM O ENTENDIMENTO DA SÚMULA 473/STJ. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO OCORRÊNCIA. ENCARGOS ACESSÓRIOS. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir...

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