Acórdão Nº 08178806920238205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 18-12-2023

Data de Julgamento18 Dezembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08178806920238205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0817880-69.2023.8.20.5001
Polo ativo
FILIPPO SANTANA LEAL DE SOUZA
Advogado(s): ROSE MARY SANTANA CONCEICAO
Polo passivo
TAM LINHAS AEREAS S/A.
Advogado(s): FABIO RIVELLI

EMENTA: DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSPORTE AÉREO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. CANCELAMENTO DE VOO. FRUSTRAÇÃO DA EXPECTATIVA. ATRASO NA CHEGADA AO DESTINO FINAL POR CULPA EXCLUSIVA DA EMPRESA AÉREA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO SOBRE CASO FORTUITO. TRANSTORNOS QUE SUPERARAM O MERO DISSABOR. PREJUÍZO MATERIAL RELATIVO AO PAGAMENTO DE DIÁRIA EXTRA DE ESTACIONAMENTO. DANO MORAL E MATERIAL CARACTERIZADOS. ASSISTÊNCIA PELA COMPANHIA AÉREA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE PARA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.


ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso interposto, para condenar a apelada em indenização no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por danos morais e o valor de R$40,00 (quarenta reais) por danos materiais, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.


RELATÓRIO

FILIPPO SANTANA LEAL DE SOUZA interpôs apelação cível (ID 20677735) em face de sentença prolatada Juízo da 17ª Vara Cível da Comarca de Natal na Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais nº 0817880-69.2023.8.20.5001 proposta em face da TAM - LINHAS AÉREAS S/A.

Em suas razões, o apelante argui teses de nulidade da sentença por ausência de fundamentação adequada e inexistência do caso fortuito proveniente da alegada ausência de condições meteorológicas para o voo.

Sustenta ter adquirido em 05/01/2022 passagens aéreas da reclamada para os trechos de BELO HORIZONTE/MG - GUARULHOS/SP, direto com 1h20m de duração e GUARULHOS/SP - BELO HORIZONTE/MG, com 1h15m de duração, ida e volta.

Argumenta que ao realizar o trajeto de volta (GUARULHOS/SP - BELO HORIZONTE/MG), foi informado que o voo estaria atrasado e, pouco tempo depois, recebeu a informação do cancelamento da viagem em razão da tripulação ter extrapolado o número de horas-extras.

Destaca que a companhia aérea requerida o reacomodou em voo com embarque programado para o dia seguinte (06/01/2022) às 06h20m, tendo fornecido, ainda, voucher de hospedagem e traslado entre o hotel disponibilizado e as dependências do aeroporto.

Apesar da remarcação, ao chegar no hotel disponibilizado não foi devidamente atendido, uma vez que no local só haveria um recepcionista para realizar o check-in de todos os passageiros do voo cancelado, de modo que optou por retornar ao aeroporto de Guarulhos/SP sem utilizar o voucher ofertado pela ré.

Afirma que no dia 06/01/2022 conseguiu embarcar no seu destino, chegando em Belo Horizonte/MG às 08h20m, portanto, 09 (nove) horas após a data originalmente prevista, tendo que suportar o pagamento de diária extra no estacionamento do aeroporto e se atrasado para a sua jornada de trabalho.

Nesse contexto, requer a reforma da sentença, de modo que a apelada seja condenada ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.

Preparo pago (Id. 21435733).

Em contrarrazões a empresa apelada pugnou pelo desprovimento do apelo (Id. 18336864).

Não foi necessária a concessão de vista ao Ministério Público, considerando a ausência de interesse de incapazes e que a matéria não conflita a ordem pública.

É o relatório.

VOTO


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.


PREJUDICIAL DE NULIDADE SENTENCIA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO SUSCITADA PELO APELANTE


O Apelante suscitou prejudicial de nulidade da sentença por ausência de fundamentação adequada, eis que proferida à revelia de documentos acostados aos autos, sobretudo o VRA e REDEMET, juntados pelo recorrente.

Todavia, razão não assiste ao recorrente pois, nos termos dos artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil, é lícito ao juiz apreciar livremente os elementos de prova trazidos ao processo e, entendendo serem suficientes ao julgamento da causa, proferir sentença, desde que motive as razões de decidir, não necessitando de manifestação sobre todos os documentos que porventura tenham sido apresentados pelas partes.

Visto isso, não vislumbro o vício apontado pelo recorrente, uma vez que o magistrado enfrentou todos os pontos questionados nos autos, entendendo por bem julgar improcedente o pedido autoral, sob o fundamento de que o argumento de extrapolação do número de horas extra da tripulação não restou minimamente comprovado nos autos, ao passo que restou demonstrado, por meio de consulta ao sistema REDEMET, documento apresentado no feito pelo recorrido, que o local de embarque não contava com condições climáticas favoráveis à decolagem.

Neste contexto, resta claro que a sentença se encontra devidamente embasada, não havendo que se confundir, no caso concreto, o julgamento desfavorável devidamente justificado com a ausência de fundamentação, motivo pelo qual rejeito esta prejudicial e passo ao exame do mérito propriamente dito.


MÉRITO

DA INEXISTÊNCIA DO CASO FORTUITO PROVENIENTE DA ALEGADA AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS PARA O VOO E O DEVER DE INDENIZAR ALEGADO PELO APELANTE

Cinge-se o mérito recursal em examinar a razão para o cancelamento do voo adquirido pelo autor junto à companhia apelada, bem assim a existência do dever de indenizar.

Reconhecida a relação de consumo existente, convém a análise da configuração na falha da prestação do serviço capaz de justificar a responsabilização da empresa recorrida.

Pois bem, preceitua o art. 14 da Legislação Consumerista que o fornecedor possui responsabilidade objetiva pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços (fato do serviço).

Na hipótese, depreende-se dos autos que o apelante comprovou por meio dos documentos juntados ao processo que adquiriu as passagens aéreas junto à apelada, que houve atraso e posterior cancelamento do voo Guarulhos – Belo Horizonte, sendo necessário sua reacomodação com embarque programado para o dia seguinte (06/01/2022).

Nesse ponto, resta percebida a falha na prestação do serviço por parte da empresa ré, quando não forneceu o serviço de transporte no tempo inicialmente contratado.

Com efeito, embora a demandada tenha defendido a ocorrência de causa excludente de sua responsabilidade sobre o evento, é de se concluir, pela análise do caderno processual, não ter sido satisfatoriamente comprovado que o atraso do voo efetivamente decorreu de força maior, conforme alegado.

Em outras palavras, não há como considerar provada, ou mesmo notória, a justificativa de atraso por motivos de “restrições ao pouso ou à decolagem decorrentes de condições meteorológicas adversas” (art. 256, §3º, I do Código Brasileiro de Aeronáutica[1], haja vista que a Demandada limitou-se a juntar “prints” de telas produzidas unilateralmente, sem qualquer afirmação no sentido de que houve o cancelamento daquele voo por ausência de condições climáticas e que, portanto, não colaboram para a real compreensão dos fatos tal como alegados.

Necessário registrar que os fatos reportados exorbitaram meros aborrecimentos, porquanto o apelante teve a chegada ao destino final atrasada em nove horas por culpa exclusiva da companhia aérea apelada, de modo que a situação vivenciada afetou seu estado emocional, haja vista sua insegurança quanto à concretização da viagem.

De se argumentar, que a responsabilidade pelos eventuais danos ou prejuízos que possam surgir na explicação de atividade comercial é decorrente do risco do empreendimento, cujo ônus deve ser suportado por quem a desenvolve e usufrui dessa exploração.

Assim, se a empresa oferece seus serviços no mercado, deve arcar com os prejuízos, sejam eles previsíveis ou não, relacionados à atividade desempenhada.

Nesse passo, verifico estarem presentes os caracteres identificadores da responsabilidade civil na espécie, visto que houve o ato lesivo, configurado na falha da prestação de serviços pela apelada, o dano experimentado pelo consumidor, bem como o nexo de causalidade entre a conduta e o prejuízo sofrido.

Este entendimento tem contado com o beneplácito da jurisprudência desta Corte de Justiça, senão confira-se:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PRÉVIO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE REAPARELHAMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INVIABILIDADE EM SEDE RECURSAL. PRECEDENTES. ATRASO EM VOO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA AÉREA, NOS TERMOS DO ART. 14 DA LEI Nº 8.078/1990 (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR). DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. ESPERA DE APROXIMADAMENTE 12 (DOZE) HORAS, INCLUSIVE DURANTE A MADRUGADA. VÍTIMA CRIANÇA DE 11 (ONZE) ANOS À ÉPOCA, QUE INCLUSIVE NA REALOCAÇÃO FOI COLOCADA EM CADEIRA DISTANTE DOS PAIS. SITUAÇÃO INDUVIDOSAMENTE CAUSADORA DE AFLIÇÃO APTA A TRANSPOR A BARREIRA DO MERO ABORRECIMENTO. VALOR INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS). EXAGERO NÃO CARACTERIZADO. PATAMAR SUFICIENTE PARA AMENIZAR AS CONSEQUÊNCIAS DA CONDUTA E RESSALTAR OS ASPECTOS PUNITIVO E PEDAGÓGICO DA SANÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA, RESPECTIVAMENTE, A PARTIR DA CITAÇÃO (ART. 405/CC) E DO ARBITRAMENTO (SÚMULA 362/STJ). APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(APELAÇÃO CÍVEL, 0802743-91.2021.8.20.5106, Desª.
Maria Zeneide, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 14/10/2022, PUBLICADO em 20/10/2022)

No entanto, em que pese as nove horas de atraso, restou comprovado que a companhia aérea apelada buscou encontrar uma solução para o problema, bem como forneceu assistência ao apelante, independente da escolha do mesmo em usufruir do voucher.

No caso dos autos, não se buscando minimizar o desgosto de ter frustrado o plano de embarque e chegada ao destino como previsto, o episódio não alcançou a amplitude alegada e, se assim ocorreu, ressalta-se que o...

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