Acórdão Nº 08188879220208205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 27-07-2023

Data de Julgamento27 Julho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08188879220208205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0818887-92.2020.8.20.5004
Polo ativo
Banco do Brasil S/A
Advogado(s): EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA
Polo passivo
VERONICA DA COSTA MARTINS
Advogado(s): LAILSON PEREIRA DE AGUIAR

RECURSO CÍVEL INOMINADO Nº 0818887-92.2020.8.20.5004

oRIGEM: 13° JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

RECORRENTE(S): BANCO DO BRASIL S/A

ADVOGADOS: EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA

RECORRIDO(S): VERONICA DA COSTA MARTINS

ADVOGADO(S): LAILSON PEREIRA DE AGUIAR

JUIZ RELATOR: CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL – FIES. MUDANÇA NA FORMA DE PAGAMENTO. BOLETO BANCÁRIO. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE. REGISTRO DE INADIMPLÊNCIA DAS PARCELAS. VALOR UTILIZADO PARA QUITAÇÃO DE OUTROS DÉBITOS. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Juízes da Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.

Condenação do recorrente em custas e honorários advocatícios, estes no percentual de 20% (vinte por cento), sobre o valor da condenação.

Natal/RN, 14 de junho de 2023.

CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO

Juiz Relator

RELATÓRIO

SENTENÇA

Vistos etc.

Relatório dispensado, nos moldes do art. 38 da Lei Federal de nº 9.099/95.

Passo a decidir.

Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais, ajuizada com assistência técnica de advogado (a), em que a parte promovente sustenta:

“A requerente é fiadora do Contrato de Abertura de Crédito para Financiamento Estudantil - FIES n. 124.608.702 (cópia do instrumento anexa), concedido pelo BANCO DO BRASIL S/A, em que figura como afiançado (a) e devedor (a) principal o(a) Sr(a). LIDIANE DE AGUIAR RODRIGUES DO NASCIMENTO. A afiançada, Sra. Lidiane, ao longo dos últimos meses tem depositado as mensalidades do referido financiamento, contudo o Banco réu não dá quitação as parcelas que permanecem em aberto (comprovantes de depósitos em anexo). Para não ver seu nome negativado, a autora em várias oportunidades, teve que depositar na conta corrente da afiançada o valor da mensalidade vencida, de onde é descontado automaticamente a parcela do FIES. Ocorre, Excelência, que, por diversas vezes, mesmo a fiadora tendo feito o depósito da mensalidade, o seu nome permanece com restrição junto aos órgãos de proteção ao crédito. Sempre que procura o Banco do Brasil para saber a razão da continuidade da restrição, a requerente é informada de que o valor do seu depósito não foi suficiente para quitar a mensalidade do FIES, pois, parte dele, foi descontada para cobrir “saldo devedor” da movimentação bancária da afiançada em relação a um empréstimo. A autora solicitou que o banco emitisse então boletos da cobrança do financiamento que é fiadora. Porém a instituição financeira se negou a emitir o boleto bancário. Ocorre que se não for emitida a parcela por boleto bancário, o nome da autora entrará no Serasa, mesmo tendo depositado o valor da prestação na conta em que é descontado o valor da prestação. A autora/fiadora ao tentar financiar um imóvel pelo Programa Minha Casa Minha Vida teve seu financiamento negado, pois ela estava com restrição no CPF. Vale ressaltar que atualmente a autora está com seu nome nos cadastros de restrição ao crédito mesmo com as parcelas sendo depositas mensalmente. conforme documentos em anexo. Ora, a requerente é fiadora da Sra. Lidiane tão somente do contrato de FIES, e não do contrato de abertura de conta corrente que este mantém com o Banco. Portanto, a autora não pode, não deve, ser responsabilizada por encargos decorrentes da movimentação bancária ou qualquer outra dívida que a afiançada mantém com o réu. O problema é que o Banco do Brasil não oferece a autora/fiadora alternativa para quitar a mensalidade, senão mediante depósito do valor correspondente na conta corrente da afiançada. Só que, mesmo efetuando o depósito, a autora nunca tem a garantia de que a parcela do FIES em aberto será quitada, pois há sempre a possibilidade de a conta corrente da afiançada estar com “saldo devedor”, como já aconteceu em diversas ocasiões. E, quando isso sucede, a fiadora/requerente acaba pagando um débito pelo qual não se obrigou. E tem mais, Excelência: o Banco do Brasil, invocando o famigerado sigilo bancário, sempre se nega a informar a autora o quanto do seu depósito foi descontado para cobrir o saldo devedor da conta corrente do afiançado, obrigando a requerente/fiadora a fazer um segundo depósito no “escuro”, vale dizer, sem saber se será ou não suficiente para quitar a mensalidade pendente. É, deveras, uma situação insólita e inaceitável! O correto, o razoável, o mais racional, no caso em questão, seria o envio de um boleto para a quitação do débito pelo fiadorr, como acontece com todas as cobranças realizadas pelas empresas. É bom que se diga, para afastar eventuais equívocos, que o autor ao propor a presente ação não pretende se esquivar da sua condição de coobrigado pelo débito. Não, não. O que se busca nessa propositura é apenas obter um provimento judicial que lhe permita honrar o compromisso assumido na medida exata, isto é, paga apenas aquilo que deve em face do contrato de fiança, e não os débitos decorrentes do contrato de conta corrente que a Sra. Lidiane mantém com o Banco.”

Intimada para se manifestar a respeito da possibilidade de acordo, a parte promovida não realizou qualquer proposta, não sendo requerido a produção de outras provas nos autos, razão pela qual passo a julgar antecipadamente a lide, com base no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

No tocante à questão de fundo, entendo não haver qualquer impedimento legal ou jurídico para a mudança de forma de pagamento do financiamento estudantil.

Em sede de contestação, a instituição financeira promovida alega não ser possível a modificação da forma de pagamento e que deveria ser mantido a forma de pagamento pactuada, argumentando, em petição posterior, que “segundo IN 757, item 1.15.3, não é possível efetuar o pagamento do Fies por meio de boleto.”.

Por cautela, este Juízo determinou a apresentação da referida regulamentação que, sob a ótica da instituição promovida, impediria o pagamento do financiamento estudantil (FIES) através de boleto bancário, porém, apesar de devidamente intimada, permaneceu silente nos autos.

Na hipótese dos autos, convenci-me da inexistência de impedimento legal ou jurídico e a existência de motivos legítimos para a modificação da forma de pagamento do financiamento estudantil, já que a titular possui diversos débitos com a instituição promovida e os depósitos bancários feitos pela coobrigada / fiadora / promovente com a finalidade de pagamento do financiamento estão sendo direcionados para amortizar débitos de outros contratos pactuados pela titular.

Compreendo que a relação contratual existente com a promovente se restringe ao contrato de financiamento estudantil, logo, não pode ser obrigada a permanecer efetuando pagamentos direcionados a amortização de débitos do contrato ao qual é vinculada e o valor ser aproveitado para outros contratos dos quais não figura como parte ou interessada.

Analisando a situação dos autos, não há dúvidas de que a solução mais justa, razoável e viável é a modificação da forma de pagamento do financiamento estudantil para boleto bancário, preservando, assim, o direito da promovente ao adimplemento do contrato em que figura como coobrigada / fiadora.

Portanto, entendo ser procedente o pedido de obrigação de fazer, devendo ser confirmados os efeitos da medida liminar concedida.

No tocante ao pedido de indenização por danos morais, enxergo a presença dos requisitos necessários para a condenação da parte promovida (art. 186 e 927 do Código Civil c/c art. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor), porquanto houve um ato comissivo ou omissivo (falha na prestação dos serviços consubstanciada recusa de modificação da forma de pagamento do financiamento estudantil, mesmo após cientificada da situação e necessidade de solução para o caso, além de permanecer inerente mesmo após decisão judicial para emissão dos boletos vencidos e vincendos), efetivos danos à vítima (preocupações, aflições, aborrecimentos, revolta, sentimento de impotência diante da situação vivenciada, enfim, efetivos sentimentos íntimos que geram danos extrapatrimoniais), além de nexo de causalidade entre a conduta lesiva e o dano sofrido.

Compreendo que a maior dificuldade reside na estipulação do valor pecuniária para a compensação dos danos causados, em razão do caráter subjetivo que possui. Deve-se arbitrar o valor indenizatório de forma equitativa, consoante o art. 953, parágrafo único, do Código Civil. Para tanto, vários critérios são adotados, dentre os quais destacam-se a posição social do ofendido; a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela; a extensão do dano e a gravidade da conduta.

No caso em análise, diante dos elementos de convicção disponíveis, de acordo com a orientação jurisprudencial no sentido que deve haver moderação no arbitramento, de modo que não cause enriquecimento exagerado para a vítima e, por outro lado, desestimule a conduta, reputo ser razoável arbitrar o quantum indenizatório em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), que entendo ser apto a atender as finalidades do instituto, bem como aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade.

Por fim, indefiro o pedido de execução de multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), já que na decisão do ID 63555493 ficou estabelecido como penalidade para o descumprimento da ordem judicial a declaração de quitação de todos os débitos...

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