Acórdão Nº 08191665320218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 13-12-2023

Data de Julgamento13 Dezembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08191665320218205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0819166-53.2021.8.20.5001
Polo ativo
MUNICIPIO DE NATAL
Advogado(s):
Polo passivo
MARIA TERESA GONCALVES LEMOS DANTAS
Advogado(s): MUCIO ROBERTO DE MEDEIROS CAMARA registrado(a) civilmente como MUCIO ROBERTO DE MEDEIROS CAMARA, IGOR JEAN DE BARROS FREIRE registrado(a) civilmente como IGOR JEAN DE BARROS FREIRE

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDORA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE NATAL/RN. OCUPAÇÃO DE CARGO DE PROVIMENTO EFETIVO DE PROFESSORA DE EDUCAÇÃO INFANTIL. ATIVIDADE EXERCIDA NO ÂMBITO DA CLASSE HOSPITALAR DO HOSPITAL INFANTIL VARELA SANTIAGO. PRETENSÃO AO RECEBIMENTO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E DAS DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS PRETÉRITAS, ATÉ A DATA DE SUA IMPLANTAÇÃO EM SEUS VENCIMENTOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL. NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO POR LEGISLAÇÃO LOCAL ACERCA DAS ATIVIDADES INSALUBRES, PENOSAS E PERICULOSAS E AS ALÍQUOTAS A SEREM APLICADAS, BEM COMO NA NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE LAUDO PERICIAL POR COMISSÃO ESPECÍFICA. INTELIGÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 119/2010 E DO DECRETO MUNICIPAL Nº 9.321/2011. DIVERGÊNCIA ENTRE A PROVA EMPRESTADA E O LAUDO ANEXADO PELO MUNICÍPIO QUE ANALISOU GENERICAMENTE AS CONDIÇÕES DE TRABALHO DOS SERVIDORES MUNICIPAIS QUE EXERCEM A FUNÇÃO DE PROFESSOR HOSPITALAR. DOCUMENTOS INSUFICIENTES. NECESSIDADE DE PROVA PERICIAL IN LOCO. NULIDADE DE OFÍCIO DA SENTENÇA. RECURSO PREJUDICADO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em declarar a nulidade, de ofício, da sentença recorrida, determinar a baixa dos autos à origem, a fim de que seja produzida a nova prova pericial, e julgar prejudicada a apelação do município, nos termos do voto da relatora que integra o presente acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE NATAL/RN contra sentença proferida pelo Juiz de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN, que julgou procedente a pretensão formulada nos autos da ação ordinária promovida por MARIA TERESA GONÇALVES LEMOS DANTAS, nos seguintes termos:

Isto posto, julgo procedente o pedido inicial para condenar o Município de Natal a pagar à parte autora o adicional de insalubridade, no percentual do 20% (vinte por cento), sobre o vencimento básico do cargo, em parcelas vincendas e vencidas, estas últimas, com observância à prescrição quinquenal. À importância apurada, serão acrescidos juros de mora, a partir da citação válida, e correção monetária, de todo período devido, com base na taxa Selic.

Custas na forma da lei. Condeno a parte ré em honorários advocatícios sucumbenciais, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, o que o faço em atendimento aos critérios definidos na regra processual civil, especialmente nos incisos I a IV, do art. 85, §2º, do CPC.

Sentença que não se sujeita ao reexame necessário, a teor da determinação contida no art. 496, §3º, II, do CPC.

(...).

Natal/RN, 15 de agosto de 2023.

Em suas razões, insurge-se o município contra a sentença que julgou procedente a pretensão autoral com base em prova emprestada anexada aos autos pela parte apelada, em detrimento do laudo pericial emitido pela Comissão Permanente de Perícia Médica, Higiene e Segurança do Trabalho – CPMSHT, segundo a qual teria concluído que os servidores municipais que exercem a função de professor hospitalar não trabalham em condições de insalubridade, periculosidade ou sob acentuada condições de risco de morte.

Sustenta que “(...) a matéria em questão, foi analisada no procedimento administrativo nº 083300/2011-99, acostado em id. 67627720 (fls.10/11). Já o laudo de ID nº 96732392 trata-se de prova emprestada, ou seja, não analisou a matéria específica dos autos, tratando apenas de LAUDO GENÉRICO, uma vez que, o adicional de insalubridade pressupõe que as condições de trabalho devem ser analisadas pontualmente em cada caso” (destaque no original).

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, nos termos formulados nas suas razões.

Contrarrazões apresentadas nos autos.

Com vista dos autos, a Procuradoria de Justiça deixou de intervir no feito, por ausência de interesse público primário.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

O cerne meritório do presente recurso reside em analisar a sentença que, ao julgar procedente a pretensão autoral, determinou ao Município de Natal/RN que procedesse à implantação do adicional de insalubridade nos vencimentos da parte apelada, em grau médio, correspondente ao percentual do 20% (vinte por cento), sobre o vencimento básico do cargo, com a consequente condenação do ente público ao pagamento das diferenças remuneratórias vencidas e vincendas, com observância da prescrição quinquenal, acrescido de juros de mora, a partir da citação válida, e correção monetária, de todo período devido, com base na taxa Selic.

Conforme acima relatado, insurge-se o município contra a sentença que julgou procedente a pretensão autoral com base em prova emprestada anexada aos autos pela parte apelada, em detrimento do laudo pericial emitido pela Comissão Permanente de Perícia Médica, Higiene e Segurança do Trabalho – CPMSHT, segundo a qual teria concluído que os servidores municipais que exercem a função de professor hospitalar não trabalham em condições de insalubridade, periculosidade ou sob acentuada condições de risco de morte.

Como é cediço, o artigo 7º, inciso XXIII, da Constituição Federal reconhece o direito ao adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei, direito esse que, em um primeiro momento, por força da redação original do § 2º, do artigo 39, da Constituição Federal, era automaticamente estendido aos servidores públicos.

Ocorre, todavia, que com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 19/1998, referido adicional deixou de ser assegurado objetivamente aos servidores, nos termos do artigo 39, § 3º, da Constituição Federal:

Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

A propósito, conforme restou assentado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do RMS 34.564/RR, ocorrido em 27/11/2012, a regra constitucional que fixa o pagamento de adicionais de insalubridade (...) se aplica aos servidores da iniciativa privada, mas não é obrigatória para os servidores públicos, já que o art. 39, § 3º, da CF/88 não fez remissão ao inciso XXIII do art. 7º da CF/88.

Aliás, é relevante esclarecer, nesse momento, que os servidores municipais estão submetidos ao regime jurídico de seus municípios, em virtude da repartição de competências constitucionais, que em respeito ao princípio federativo, instituído pelo artigo 18 da Constituição Federal, confere autonomia política e administrativa a todos os entes federados, que serão administrados e regidos pela legislação que adotarem, desde que observados os preceitos constitucionais. Diante disso, infere-se que cada ente federado pode organizar seu serviço público, instituindo regime jurídico que irá reger suas relações com seus servidores.

Nesse contexto, para que a parte autora possa receber o adicional, não basta trabalhar em condições insalubres, é necessário também que o ordenamento jurídico municipal à qual está submetida contemple tal possibilidade.

Sobre o tema, Hely Lopes Meirelles elucida que:

Essa gratificação só pode ser instituída por lei, mas cabe ao Executivo especificar, por decreto, quais os serviços e os servidores que irão auferi-la. Não será o servidor, nem o Judiciário, que dirá se ocorre o risco gratificável, porque o conceito de risco, para fins de vantagem pecuniária, não é técnico, nem jurídico: é meramente administrativo. O risco só existe, para efeito de gratificação, onde a Administração o admitir, e cessará quando ela o considerar inexistente. Por esse motivo, a gratificação por risco de vida ou saúde pode ser suprimida, ampliada ou restringida a todo tempo, sem ofensa a direito dos que a estavam percebendo (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Editores, 31ª ed., p. 491-2).

Referida conclusão, pondere-se, encontra em harmonia com os precedentes do Supremo Tribunal Federal (ARE 803726, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 10/04/2014, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-074 DIVULG 14/04/2014 PUBLIC 15/04/2014; ARE 813785, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 30/05/2014, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-107 DIVULG 03/06/2014 PUBLIC 04/06/2014).

Outrossim, seguindo essa mesma linha de raciocínio, importa registrar que esta Corte Estadual julgou o Incidente de Assunção de Competência em Apelação Cível n° 2015.014008-7/0001.00, nos seguintes termos:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE AREZ. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. CARGO DE VIGILANTE. DIVERGÊNCIA DE INTERPRETAÇÃO DE REGRA JURÍDICA ENTRE A 2ª E A 3ª CÂMARAS CÍVEIS EVIDENCIADA. IMPOSSIBILIDADE DE IMPLANTAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA NATUREZA PERIGOSA DAS ATIVIDADES EXERCIDAS. AUSÊNCIA DE NORMA LOCAL LEGAL REGULAMENTADORA. ARTS. 69 e 71 DA LEI Nº 003/1997. LEI DE EFICÁCIA LIMITADA. NORMA REGULAMENTADORA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E DO EMPREGO QUE NÃO É LEI EM SENTIDO FORMAL. INAPLICABILIDADE. RESPEITO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ILEGALIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE À CATEGORIA DE VIGILANTES DO MUNICÍPIO DE AREZ. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES” (TJRN, Incidente de Assunção de Competência em Apelação Cível n° 2015.014008-7/0001.00, rel....

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT