Acórdão Nº 08193270520228205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 10-10-2023

Data de Julgamento10 Outubro 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08193270520228205106
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0819327-05.2022.8.20.5106
Polo ativo
DANIEL DA SILVA ALMEIDA
Advogado(s): JORGE RICARD JALES GOMES, GABRIEL FREIRE SINCLAIR
Polo passivo
APPLE COMPUTER BRASIL LTDA
Advogado(s): FABIO RIVELLI

RECURSO CÍVEL N.º 0819327-08.2022.8.20.5106

RECORRENTE: DANIEL DA SILVA ALMEIDA

ADVOGADOS: DR. JORGE RICARD JALES GOMES E DR. GABRIEL FREIRE SINCLAIR

RECORRIDA: APPLE COMPUTER BRASIL LTDA.

ADVOGADO: DR. FÁBIO RIVELLI

RELATOR: JUIZ RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AQUISIÇÃO DE APARELHO CELULAR DA MARCA “APPLE” DESACOMPANHADO DE ADAPTADOR DE TOMADA. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE VENDA CASADA (CDC, ART. 39, I). EQUIPAMENTO NÃO ESSENCIAL AO REGULAR FUNCIONAMENTO DO “IPHONE”. CONSUMIDOR QUE PODE OPTAR POR UTILIZAR OUTRO ADAPTADOR QUE JÁ POSSUA, ADQUIRIR ADAPTADOR DE OUTRA MARCA (QUE NÃO A “APPLE”), COMPRAR OUTROS DISPOSITIVOS MÓVEIS (COMO CARREGADORES PORTÁTEIS OU “CASES”) PARA CARREGAMENTO DE SEU APARELHO ETC. EXERCÍCIO DA LIVRE INICIATIVA (CF, ART. 1º, IV) E DA LIBERDADE ECONÔMICA CONTRATUAL (CC, ART. 421). UMA VEZ CUMPRIDO O DEVER DE INFORMAÇÃO (CDC, ART. 6º, III), O FORNECEDOR PODE SIMPLESMENTE OPTAR POR NÃO DISPONIBILIZAR ACESSÓRIOS NÃO ESSENCIAIS AO PRODUTO PRINCIPAL POR SI OFERTADO. O CONSUMIDOR DETÉM LIVRE ARBÍTRIO PARA, DIANTE DE INÚMERAS OFERTAS DE APARELHOS CELULARES NO MERCADO DE CONSUMO, ESCOLHER AQUELA QUE MELHOR LHE APROUVER. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Não procede a impugnação ao benefício da gratuidade da justiça, feita pela recorrida, porque não foram juntados aos autos elementos de convicção capazes de afastar a presunção de veracidade da alegação de insuficiência financeira da recorrente, pessoa natural (CPC, art. 99, § 3º).

2. A conduta da empresa ré, ora recorrente, não configura venda casada que, na forma do artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, se caracteriza pelo condicionamento do fornecimento de produto ou serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos. A rigor, ao adquirir o seu aparelho celular, o consumidor não foi obrigado, seja direta ou indiretamente, a adquirir outro produto ou serviço também fornecido pela empresa “Apple”.

3. Não se pode afirmar que o adaptador de tomada produzido pela empresa recorrente é um acessório essencial ao regular funcionamento do aparelho celular. Ao adquirir um aparelho celular da marca “Apple”, o consumidor dispõe, por exemplo, da opção de utilizar um outro adaptador que já possua, caso compatível com a entrada USB-C. Além disso, o comprador também tem a possibilidade de adquirir/utilizar um carregador por indução, sem fio, por meio da tecnologia de “comunicação por campo de proximidade” ou “near-field communication (NFC)”, que permite a troca de informações sem fio e de forma segura entre dispositivos compatíveis que estejam próximos um do outro. Essa tecnologia, aliás, já vem sendo aplicada nas próprias “cases” (“capinhas”), vendidas em inúmeros estabelecimentos e utilizadas tanto para proteção do aparelho quanto, agora, para a sua recarga.

4. No caso concreto, a consumidora, mesmo ciente da não disponibilização do adaptador de tomada, optou por efetivar a compra e continuar com o produto da forma adquirida. Ou seja, diante de um sem-número de ofertas de aparelhos celulares no mercado de consumo, “online” e presencial, alguns acompanhando carregadores, adaptadores, fones de ouvido e outros acessórios, o consumidor optou por adquirir um “iPhone” com um cabo “lightning” de saída USB-C.

5. A oferta de um aparelho celular sem um adaptador de energia, equipamento não essencial ao seu regular funcionamento, está amparada na livre iniciativa, fundamento da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, IV). Na verdade, estranho e contrário ao citado fundamento constitucional seria obstar o fornecedor de escolher a forma como agregará valor aos seus produtos.

6. Com efeito, num ambiente de liberdade econômica, não se afiguraria legítimo subtrair do fornecedor a opção de não incluir no “combo” do aparelho celular posto no mercado de consumo, por exemplo, um adaptador de tomada ou um fone de ouvido, notadamente se não essencial ao produto.

7. Logo, seja imbuído da intenção de preservação do meio ambiente, seja para reduzir o valor final do produto, seja simplesmente por opção/estratégia de mercado, o fato é que o fornecedor tem o direito de disponibilizar produtos sem acessórios que, embora incontestavelmente úteis, não sejam essenciais ao seu regular funcionamento.

ACÓRDÃO

Acordam os juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.

Condenação em custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ficando suspensa a exigibilidade em face do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.

Esta súmula de julgamento servirá de acórdão, nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/95.

Participaram do julgamento, além do Relator, o juiz Madson Ottoni de Almeida Rodrigues e o juiz Jessé de Andrade Alexandria.

Natal, data do sistema.

RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

Juiz Relator

I – RELATÓRIO

1. Recurso Inominado interposto por DANIEL DA SILVA ALMEIDA contra a sentença proferida pelo 3º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Mossoró/RN, que julgou improcedente a pretensão por si deduzida contra a APPLE COMPUTER BRASIL LTDA.

2. Na sentença, a MMª. Juíza, Dra. WELMA MARIA FERREIRA DE MENEZES, consignou que o caso não trata de disparidade de informações constantes em recipiente, embalagem ou qualquer outra forma de propaganda enganosa a ensejar a aplicação do artigo 18 do CDC.

3. Assinalou que o fato de o “iPhone”, a partir de certa versão, não mais vir com carregador, foi amplamente divulgado na imprensa, com opiniões divergentes a respeito.

4. Destacou que a fornecedora disponibilizou, junto ao aparelho, um cabo carregador tipo USB-C, não sendo fornecida apenas a fonte de alimentação, ou seja, o “plug” de tomada, não havendo que se falar em abusividade ou ilicitude, já que é possível realizar o carregamento ao se conectar tal acessório a um computador ou outros equipamentos.

5. Por fim, disse que não há nenhuma ilegalidade na atuação da demandada, tendo em vista que não restou configurada a ocorrência de venda casada e que, ao adquirir o aparelho celular, a autora tinha conhecimento a respeito da ausência da fonte de alimentação.

6. Em suas razões, o recorrente pediu o deferimento dos benefícios da gratuidade judiciária e alegou que o carregador é item obrigatório e efetivamente necessário para o regular funcionamento do aparelho celular. Disse que a requerida sempre comercializou aparelhos celulares acompanhados de carregadores. Além disso, afirmou que o uso de fontes comercializadas por terceiros pode ser prejudicial ao aparelho, limitando o uso somente a acessórios certificados pela própria empresa. Afirmou que o não fornecimento do carregador impõe ônus desproporcional ao consumidor e caracteriza ato ilícito que resulta na obrigação de indenizar os prejuízos suportados pelo recorrente. Requereu, portanto, o provimento do recurso para julgar procedente a pretensão autoral.

7. Contrarrazões sustentando a ausência de comprovação dos requisitos para a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça e pedindo o desprovimento do recurso.

8. É o relatório.

II – VOTO

9. Dispensado o voto, nos termos do art. 46 da Lei n.º 9.099/95, constando na ementa a sucinta fundamentação necessária à manutenção da sentença.

Natal, data do sistema.

RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

Juiz Relator

Natal/RN, 4 de Outubro de 2023.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT