Acórdão Nº 08198391720198205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 27-08-2021

Data de Julgamento27 Agosto 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08198391720198205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0819839-17.2019.8.20.5001
Polo ativo
CASSIO SOARES RIBEIRO
Advogado(s):
Polo passivo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):

APELAÇÃO CÍVEL (198): 0819839-17.2019.8.20.5001

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E CIVIL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. APELAÇÃO CÍVEL. BEM USUCAPIENDO QUE PERTENCE À FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. PROVA DOCUMENTAL ANEXADA PELA PRÓPRIA PARTE AUTORA NESTE SENTIDO. PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. IMPOSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 183, § 3º DA CF E ART. 102 DO CÓDIGO CIVIL. APLICAÇÃO DA SÚMULA 340 DO STF. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por CASSIO SOARES RIBEIRO em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal que, nos autos da Ação de Usucapião Extraordinário proposta pelo ora apelante em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, julgou liminarmente improcedente a pretensão autoral, nos seguintes termos:

Ante o exposto, julgo liminarmente improcedente o pedido inicial, em face do reconhecimento, ex officio, da impossibilidade jurídica do pedido, em violação a Súmula nº 340, do STF, o que faço com fundamento no artigo 332, I, do Código de Processo Civil.

Sem condenação em custas e honorários advocatícios.

Com o trânsito em julgado, arquive-se os autos, com baixa na distribuição.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.



Nas razões de ID 8444812, alega o apelante, em síntese, que é possuidor há mais de dez anos do imóvel descrito na exordial e nele estabeleceu a sua residência com animus domini, de forma mansa, pacífica e ininterrupta, preenchendo os requisitos necessários ao usucapião.

Salienta que inobstante o imóvel esteja localizado em área de domínio do Estado do Rio Grande do Norte, é possível usucapir domínio útil de terreno foreiro.

Ao final, pede a concessão dos benefícios da justiça gratuita e pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, “para que seja reformada a R. sentença do juízo 'a quo' a fim de que seja julgado procedente o pedido inaugural”.

Intimado, o Estado não ofertou contrarrazões ao recurso.

Instado a se manifestar, o Ministério Público, por meio da 9º Procuradoria de Justiça, deixou de opinar por entender ausente o interesse público que justificaria a sua intervenção.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

O cerne da presente insurgência recursal consiste em verificar se merece reforma ou não a sentença vergastada que, reconhecendo a impossibilidade jurídica do pedido por se tratar de bem público, julgou liminarmente improcedente a pretensão autoral.

Conforme se observa dos autos, o autor, ora apelante, relata na sua peça inaugural que detêm a posse mansa, ininterrupta e pacífica, há mais de 10 anos, do imóvel localizado na Rua Bauru, nº 374, Redinha, nesta Capital.

Desde logo, registro que não assiste razão ao recorrente, uma vez que restou evidenciado no caderno processual que o bem objeto de usucapião pertence ao Estado do Rio Grande do Norte e, portanto, imprescritível.

Inicialmente, cumpre afirmar que a Constituição Federal veda expressamente a aquisição de bens públicos através da usucapião, conforme dispõe o art. 183, § 3°, da CF.

Outrossim, o Código Civil, no seu art. 102, aduz que: "os bens públicos não estão sujeitos a usucapião".

Destaco ainda que o Supremo Tribunal Federal possui entendimento consolidado acerca da matéria, estabelecido na Súmula nº 340, assim redigida: "Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião".

Da análise dos autos verifica-se, sobretudo pelo documento de ID 8444801 (certidão emitida pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo), que o imóvel alvo de usucapião localiza-se em área de domínio público pertencente ao Estado do Rio Grande do Norte, o que, inclusive, é informado pelo próprio demandante na exordial.

Registro que, apesar de o recorrente defender a possibilidade de usucapião do domínio útil do bem, consoante bem fundamentado pelo magistrado sentenciante, não se mostra possível, vez que não fora demonstrado que o imóvel se encontra sob o regime de enfiteuse, única hipótese que a jurisprudência admite que o domínio útil do bem seja usucapido, conforme se pode notar dos arestos que seguem:

AGRAVO REGIMENTAL. USUCAPIÃO DE DOMÍNIO ÚTIL DE BEM PÚBLICO (TERRENO DE MARINHA). VIOLAÇÃO AO ART. 183, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO. INOCORRÊNCIA. O ajuizamento de ação contra o foreiro, na qual se pretende usucapião do domínio útil do bem, não viola a regra de que os bens públicos não se adquirem por usucapião. Precedente: RE 82.106, RTJ 87/505. Agravo a que se nega provimento.

(RE 218324 AgR, Relator(a): JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 20/04/2010, DJe-096 DIVULG 27-05-2010 PUBLIC 28-05-2010 EMENT VOL-02403-04 PP-01228 RT v. 99, n. 899, 2010, p. 103-105)



Enfiteuse. Bem dominical de Prefeitura Municipal. Usucapião de domínio útil. - Em se tratando de bem público, o usucapião não é admissível para a constituição de enfiteuse que vai transformar o imóvel em foreiro. O mesmo não sucede, porém, quando - e este é o caso dos autos - o imóvel já era foreiro, e a constituição da enfiteuse em favor do usucapiente se faz contra o particular até então enfiteuta, e não contra a pessoa jurídica de direito público que continua na mesma situação em que se achava, ou seja, na de nua-proprietária. Recurso extraordinário não conhecido.

(STF - RE 82106, Relator(a): THOMPSON FLORES, Tribunal Pleno, julgado em 01/06/1977, DJ 07-10-1977 PP-06916 EMENT VOL-01073-02 PP-00768)

Destarte, como as provas carreadas aos autos evidenciam que o bem se trata de imóvel público, inviável a pretensão de usucapião, nos moldes preceituados pelo ordenamento jurídico pátrio.

Segue jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte no mesmo sentido:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. APRECIAÇÃO PELO STJ. IMPOSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE DESAFETAÇÃO DO IMÓVEL USUCAPIENDO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. USUCAPIÃO DE BEM PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO A FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA N. 182 DO STJ. PEDIDOS DE INDENIZAÇÃO DE BENFEITORIAS ERGUIDAS EM IMÓVEL PÚBLICO E DE RETENÇÃO DO BEM. DESCABIMENTO. SÚMULA N. 83/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. DECISÃO MANTIDA.

1. Ao Superior Tribunal de Justiça não cabe se manifestar sobre supostas violações de dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

2. A falta de enfrentamento da matéria pelo acórdão recorrido obsta o conhecimento do recurso especial pela ausência de prequestionamento, a teor das Súmulas n. 282 e 356 do STF.

3. Consoante entendimento desta Corte, ‘a Súmula 340/STF orienta que, desde a vigência do Código Civil de 1916, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’ (REsp n. 1.090.847/RS, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 23/4/2013, DJe 10/5/2013).

4. Estando o acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência do STJ, incide a Súmula n. 83/STJ, que se aplica a recursos interpostos com base tanto na alínea "a" quanto na alínea "c" do permissivo constitucional.

5. O...

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