Acórdão Nº 08198411620218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 18-05-2023

Data de Julgamento18 Maio 2023
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo08198411620218205001
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0819841-16.2021.8.20.5001
Polo ativo
WALISSON LIMA SILVA
Advogado(s): REBECA CAMARA ALVES, ANIZ GOMES FREITAS JUNIOR
Polo passivo
MPRN - 75ª Promotoria Natal e outros
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa

Apelação Criminal n. 0819841-16.2021.8.20.5001

Apelante: Walisson Lima Silva

Advogado: Dr. Aniz Gomes Freitas Junior OAB/RN 15.255

Apelado: Ministério Público

Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco

Revisor: Desembargador Saraiva Sobrinho

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. (ART. 180, CAPUT, E ART. 311, CAPUT, E ART. 304, NA FORMA DO ART. 297, TODOS DO CP). APELAÇÃO DEFENSIVA. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA A RECEPTAÇÃO NA MODALIDADE CULPOSA, NOS TERMOS DO ART. 180, § 3º DO CP. POSSIBILIDADE. CONTEXTO DA COMPRA QUE IMPÕE A PRESUNÇÃO DE CONHECIMENTO DA ORIGEM ILÍCITA DO BEM. AUSÊNCIA DA CERTEZA. CONDUTA PRATICADA QUE MELHOR SE AMOLDA AO § 3º DO ART. 180 DO CP. DESCLASSIFICAÇÃO QUE SE IMPÕE. PRETENSA ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. POSSIBILIDADE. CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CAPAZ DE EVIDENCIAR A MATERIALIDADE, MAS INSUFICIENTE EM DEMONSTRAR A AUTORIA DOS DELITOS. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, em consonância com o parecer da 3ª Procuradoria de Justiça, conhecer e, no mérito, dar provimento ao apelo, desclassificando a imputação do crime de receptação dolosa, previsto no caput, art. 180 do Código Penal, para o de receptação culposa, nos termos do § 3º do mesmo artigo, fixando a pena concreta e definitiva em 01 (um) mês de detenção, além de 10 (dez) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime aberto, substituindo-a por uma restritiva de direitos, a ser definida pelo Juízo da Execução Penal, nos moldes do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Walisson Lima Silva contra sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN, que, nos autos da Ação Penal n. 0819841-16.2021.8.20.5001, o condenou pela prática dos crimes previstos no art. 180, caput, e art. 311, caput, e art. 304, na forma do art. 297, todos do Código Penal, à pena de 06 (seis) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, além de 30 (trinta) dias-multa, ID. 16630757.

Nas razões recursais, ID. 17389345, o apelante pugnou pela desclassificação da conduta imputada para o crime de receptação na modalidade culposa, nos termos do § 3º do art. 180 do Código Penal, bem como pela absolvição dos delitos previstos no art. 311, caput, e art. 304, na forma do art. 297, todos do CP.

Em contrarrazões, ID. 17789326, o Ministério Público requereu o conhecimento e provimento do recurso, a fim de que fosse desclassificado o delito de receptação simples para a modalidade culposa, bem como para que fosse o apelante absolvido dos delitos previstos no art. 311, caput, e art. 304, na forma do art. 297, todos do CP.

Instada a se pronunciar, ID. 17916491, a 3ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento, e, no mérito, pelo provimento do recurso, para conceder a desclassificação do delito de receptação simples para a modalidade culposa, bem como para que fosse o apelante absolvido dos delitos previstos no art. 311, caput, e art. 304, na forma do art. 297, todos do CP.

É o relatório.

VOTO

Ab initio, o apelante requereu a desclassificação para o delito de receptação culposa, nos termos do § 3º, art. 180 do CP.

O pleito merece acolhimento.

Narra a denúncia, que:

“Em 19 de abril de 2021, por volta das 22h30min, em via pública, na Rua das Seringueiras, s/n, Loteamento Vale Dourado, bairro Nossa Senhora da Apresentação, nesta Capital, o denunciado foi preso em flagrante delito por transportar, após ter adquirido em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime, qual seja, motocicleta Honda/XRE 300, cor azul, que ostentava as placas “NNZ 3951/RN” (originais “OJX-7439/RN”) e outros sinais identificadores adulterados – codificação do motor, chassi e lacre da placa.

Não bastasse, o denunciado ainda fez uso de documento público falsificado, qual seja, o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV) referente às placas falsas “NNZ-3951”, em nome de “Rondinelli Eufrásio da Silva”.

Exsurge dos autos que, na hora e local acima mencionados, uma viatura da Polícia Militar fazia patrulhamento de rotina pela região, quando visualizou dois indivíduos sentados na calçada, próximos ao citado veículo.

Na abordagem que se sucedeu, WALISSON se apresentou como proprietário da motocicleta e entregou o mencionado CRLV. De pronto, os agentes de segurança perceberam que o tido como proprietário naquele documento era um também policial militar, para o qual ligaram, tendo Rondinelli respondido que não havia vendido a sua motocicleta e que estava com ela em sua posse.

Ainda, os policiais perceberam que o veículo apresentava sinais de adulteração, ao que foi dada voz de prisão ao denunciado, que informou ter adquirido o bem no bairro de Felipe Camarão há uns dois meses.”

Como se sabe, o art. 180, caput, tipifica o crime de receptação simples:

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Do dispositivo legal acima transcrito depreende-se que, para a configuração do delito, faz-se necessária a comprovação da ciência do agente quanto à origem ilícita do objeto.

Nesse sentido, para caracterizar o delito tipificado no art. 180, caput, do CP, imprescindível que outras provas corroborem a evidência, apontando que o agente receptador tinha real ciência de que o objeto adquirido era produto de crime. Caso contrário, não há como firmar um decreto condenatório para o crime de receptação simples.

Por outro lado, o §3º descreve a receptação culposa:

§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas.

In casu, as provas coligidas aos autos apontam para a ocorrência do delito tipificado no §3º do art. 180, qual, seja a receptação culposa.

De início, oportuno mencionar que em sede de alegações finais, o Órgão acusador de 1º grau pugnou pela desclassificação para a modalidade culposa, ratificando por meio das contrarrazões recursais.

A materialidade delitiva restou devidamente comprovada, mais precisamente pelo Inquérito Policial n. 051/2021, Boletim de Ocorrência ID. 16630691 e Termo de Exibição e Apreensão, ID. 16630691.

Quanto à autoria, o autor, confessou a prática delitiva:

Interrogatório policial do réu: “Que adquiriu a motocicleta HONDA/XRE 300, placa NNZ-3951, pela quantia de cinco mil reais, a ima pessoa cujo endereço e telefone informará posteriormente, através de um anúncio pelo facebook, muito embora tivesse conhecimento de que seu valor atualmente seria dez mil reais; que recebeu do vendedor do facebook um CRLV; que não tinha conhecimento de que a motocicleta seria um clone da motocicleta do Sr. Rondinelli Eufrásio da Silva, cuja pessoa desconhecia; que também não sabia que a motocicleta adquirida teria um lacre de uma outra motocicleta roubada; [...]”.

Interrogatório do réu na instrução: “Que adquiriu a moto da pessoa de Alisson Gomes; que adquiriu há uns 2 meses; que Alisson anunciou a moto por 5 mil reais; que negociaram a moto; que essa moto conservada valia uns 10 mil reais; que a moto tinha quase 4 mil reais de dívida; que pagou Alisson em espécie; que conseguiu esse dinheiro vendendo uma moto dele antiga, por 5.500; que entrou em contato com Alisson para dizer o que tinha acontecido, mas ele disse que não podia fazer nada; que no dia dos fatos estava na granja tomando um café, quando a viatura fez a abordagem; que nunca foi atrás dessa pessoa no nome da qual estava a moto; que não conhecia Alisson, apenas viu o anúncio; que a moto estava sendo vendida pela metade do preço em razão da dívida; que era seu sonho ter uma moto dessa, por isso comprou; que nunca imaginou que uma negociação na internet poderia ser algo errado; que tinha vários amigos em comum com Alisson, por isso ficou mais confiante em fazer o negócio; [...]”.

Os depoimentos prestados na fase extrajudicial e na instrução demonstram que o apelante comprou o bem pela internet e por um valor bem abaixo do mercado. Era de se presumir, no contexto da negociação, que a moto seria produto de crime, como bem demonstraram as provas testemunhais. Neste sentido, o relato das testemunhas:

Depoimento da testemunha PM Williame Silva: Que o depoente é policial militar; que tinha uma denúncia tem um elemento assaltando lá nas fronteiras; que a viatura fez perseguição mas não conseguiu pegá-lo; que no patrulhamento no parque dos coqueiros, se deparou com essa moto e dois cidadãos; que finda a abordagem, foi verificado que a moto tinha alteração, e então levaram à DP de plantão e lá foi constatado que a moto era clonada; que já na hora da abordagem viu que o documento da moto era de um policial conhecido; que ligaram para esse policial para perguntar se ele havia vendido a moto e ele recusou, disse que sua moto estava na casa dele; que Rosenildo disse que tinha uma moto igual àquela, e por isso compareceu à DP; que não tomou conhecimento que a moto tinha registro de roubo ou furto, que não lembra dessa parte;...

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