Acórdão Nº 08203900220218205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 29-07-2023

Data de Julgamento29 Julho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08203900220218205106
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0820390-02.2021.8.20.5106
Polo ativo
LUZINETE MIGUEL MORAIS DE FREITAS
Advogado(s): EDILSON GONZAGA DE SOUZA JUNIOR, VITOR ALMEIDA AMORIM, ANTONIO CLOVIS VIEIRA, JULIA MARIA ALVES DE AZEVEDO
Polo passivo
BANCO DAYCOVAL S/A
Advogado(s): MARINA BASTOS DA PORCIUNCULA BENGHI

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Desembargador Vivaldo Pinheiro
Terceira Câmara Cível


Apelação Cível nº: 0820390-02.2021.8.20.5106.

Apelante: Banco Daycoval S/A.

Advogada: Marina Bastos Da Porciuncula Benghi.



Apelada: Luzinete Miguel Morais de Freitas.

Advogados: Julia Maria Alves de Azevedo e outros.



Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.


EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APELAÇÃO CÍVEL. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL POSITIVO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURADA. PRAZO QUINQUENAL COM MARCO INICIAL DE CONTAGEM DO ULTIMO DESCONTOS REALIZADO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO CONSUMIDOR. PRECEDENTE STJ. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA. NÃO CONFIGURADA. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. PRECEDENTE STJ. PRELIMINAR DE DECISÃO ULTRA PETITA. NÃO CONFIGURADA. FUNDAMENTAÇÃO DA INICIAL QUE FOI ENFÁTICA AO CONTESTAR AMBAS AS DÍVIDAS QUE FORAM ALVO DA SENTENÇA. MÉRITO. DESCONTO DE VALORES REFERENTE À CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE CONTRATO. IMPOSSIBILIDADE. DOCUMENTO JUNTADO AOS AUTOS QUANDO DA INTERPOSIÇÃO DO APELO, QUE NÃO SE CARACTERIZA COMO NOVO. INADMISSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. ILEGALIDADE RECONHECIDA. RESSARCIMENTO EM DOBRO DOS DESCONTOS. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA 1.413.542. TEMA 929 STJ. RECONHECIMENTO DE DANO MORAL. DESCONTO DE VALORES SABIDAMENTE INDEVIDOS. DEVER DE INDENIZAR RECONHECIDO. QUANTUM DO DANO MORAL EM CONFORMIDADE COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. COMPENSAÇÃO DE VALORES A SER REALIZADA EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL DO APELO.



ACÓRDÃO



Acordam os Desembargadores da 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento parcial ao recurso, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO



Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Banco Daycoval S/A em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Mossoró/RN que julgou nos seguintes termos:


Posto isso, julgo parcialmente procedentes os pedidos autorais, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

a) declarar a inexistência do contrato e, consequentemente, do débito, que tem valor atual de R$ 176,13, correspondente ao “Desconto 726 Rubrica BANCO DAYCOVAL” constante na ficha financeira da autora, devendo a parte se abster de efetuar qualquer desconto;

b) Condenar a ré a restituir em dobro as parcelas descontadas desde julho/2012, correspondentes ao “Desconto 726 Rubrica BANCO DAYCOVAL”, acrescido de juros pela Taxa SELIC, sem cumulação com correção monetária, a partir da data dos descontos;

c) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de juros pela Taxa SELIC, sem cumulação com correção monetária, a partir dessa sentença (conforme REsp 1102552/CE, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 25/03/2009, DJe 06/04/2009).

Em face da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes em custas processuais, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada, além de honorários advocatícios sucumbenciais, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º do CPC.

Em face da gratuidade judiciária concedida, isento a parte autora do pagamento das custas, por força da isenção prevista no artigo 38, inciso I da Lei nº 9.278/2009-RN. Quanto aos honorários, a obrigação ficará suspensa, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC.”

Em suas razões recursais, o banco arguiu as preliminares de prescrição da dívida em razão de ter ultrapassado o prazo trienal, decadência pela superação do prazo de 4 anos para anulação do negócio jurídico e, por fim, alega que a decisão impugnada foi ultra petita por ter julgado aquém dos pedidos da inicial.


No mérito, alega, em síntese: (I) que não houve lesão a direito da personalidade, motivo pelo qual não há razões para condenação em indenização por danos morais; (II) que o valor atribuído à indenização por danos morais deve ser reduzido pois fere os princípios da proporcionalidade e razoabilidade; (III) que a restituição do valor deve ser na modalidade simples e não em dobro por ausência de má-fé; (IV) que deve ser realizada a compensação dos valores já recebidos pela apelada em razão dos empréstimos.


Requer, ao final, a reforma da sentença para que o pedido autoral seja julgado totalmente improcedente ou, caso contrário, a redução do dano moral fixado.


Contrarrazões pelo desprovimento do recurso.


Inexiste interesse do Ministério Público para intervir no feito.


É o relatório.

VOTO



Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação cível.


Preliminarmente, verifico que não está prescrita a pretensão autoral, uma vez que deve ser considerada a prescrição quinquenal e a contagem do prazo de prescrição deve se iniciar a partir do último desconto no benefício previdenciário.


Neste sentido:


"AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. ART. 27 DO CDC. PRECEDENTES. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. DATA DO ÚLTIMO DESCONTO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. A jurisprudência sedimentada nesta Corte Superior é no sentido de que, fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.

2. Em relação ao termo inicial, insta esclarecer que a jurisprudência desta Casa é firme no sentido de que o prazo prescricional para o exercício da referida pretensão flui a partir da data do último desconto no benefício previdenciário.

3. Agravo interno improvido." (AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 15/3/2021.)



A decadência do direito de ação, também não resta configurada, porquanto a demanda se trata de modalidade de empréstimo bancário contratado e a eventual abusividade, de maneira que a prestação do serviço tem natureza continuada.


Traz-se jurisprudência do STJ:


“EMENTA: (…). PRETENSÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA DE REAJUSTE. ALEGADO CARÁTER ABUSIVO. CUMULAÇÃO COM PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. EFEITO FINANCEIRO DO PROVIMENTO JUDICIAL. AÇÃO AJUIZADA AINDA NA VIGÊNCIA DO CONTRATO. NATUREZA CONTINUATIVA DA RELAÇÃO JURÍDICA. DECADÊNCIA. AFASTAMENTO. (…).

2. Nas relações jurídicas de trato sucessivo, quando não estiver sendo negado o próprio fundo de direito, pode o contratante, durante a vigência do contrato, a qualquer tempo, requerer a revisão de cláusula contratual que considere abusiva ou ilegal, seja com base em nulidade absoluta ou relativa. (…)”. (STJ - REsp 1361182/RS, Relator Ministro Marco Buzzi, Relator para o Acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 10.08.2016).



No que se refere a alegação de decisão ultra petita, entendo que também não merece prosperar.


Analisando os fundamentos da ação, constata-se que a apelada fez diversas menções ao débito “Desconto 726 Rubrica BANCO DAYCOVAL” (originado em 2012), sendo essa a principal dívida em questão. Logo, independente de se tratar de empréstimo consignado tradicional ou cartão de crédito consignado, sendo esse o ponto incontroverso da demanda, restou evidente que a contratação realizada entre as partes em julho de 2012 é objeto desta demanda.


Assim, uma vez que a apelada, ao ajuizar esta demanda, contesta ambos os descontos que vem sendo realizados em seu benefício previdenciário, não há o que se falar em decisão ultra petita por ter declarado a inexistência do contrato e, consequentemente, do débito, que tem valor atual de R$ 176,13, correspondente ao “Desconto 726 Rubrica BANCO DAYCOVAL”.


Passo ao mérito propriamente dito.


Como relatado, o recurso busca a total improcedência dos pedidos inicias, ou a redução do quantum indenizatório.


O caso em exame trata de relação consumerista, devendo ser analisado à luz dos princípios e regras do CDC.


Entendimento esse pacificado em jurisprudência, conforme Súmula 297 do STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.


Diante da relação de consumo, opera a inversão do ônus da prova em favor do consumidor, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC.


Cabia ao banco, em decorrência da aludida inversão, comprovar a legitimidade das cobranças contestadas pela apelada.


Todavia, a respeito dos descontos correspondentes ao “Desconto 726 Rubrica BANCO DAYCOVAL”, a instituição financeira não se desincumbiu desse ônus, pois se limitou a impugnar as alegações autorais, sem, contudo, demonstrar a origem dos descontos no benefício previdenciário da parte demandante, não juntando o contrato ou outro documento que autorizasse os descontos aqui questionados.


Ressalto que o momento oportuno para produção de provas é a fase de conhecimento, sendo a preclusão consumativa consequência direta da inércia na produção de prova.


No presente caso a apelante sustenta a tese de que os descontos realizados foram legítimos por estarem respaldados pelo contrato de adesão, que somente foi apresentado nos autos conjuntamente à interposição deste recurso de apelação.


É sabido que o art. 435 do CPC dispõe...

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