Acórdão Nº 08221176920168205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 28-10-2020

Data de Julgamento28 Outubro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08221176920168205106
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0822117-69.2016.8.20.5106
Polo ativo
SUPERAUTO COMERCIO DE VEICULOS LTDA
Advogado(s): AIDIR COSTA DE OLIVEIRA, RODRIGO VIEGAS, BRUNO FOGIATO LENCINA, AUGUSTO BECKER
Polo passivo
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE - UERN e outros
Advogado(s):

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO COM PEDIDO DE PAGAMENTO DE CRÉDITO DECORRENTE DE CONTRATO DE FORNECIMENTO DE BENS E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. JULGAMENTO PARCIALMENTE PROCEDENTE NA ORIGME QUE AFASTOU A PARTE DA PRETENSÃO INICIAL DEDICADA À IMPOSIÇÃO DE MULTA CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. CONTRATO ADMINISTRATIVO QUE NÃO DISCIPLINOU TAIS ÔNUS PARA O ENTE PÚBLICO, MESMO NA HIPÓTESE DE INADIMPLEMENTO. IMPOSIÇÃO DOS TERMOS DOS ARTS. 77 E 78, XV, DA LEI FEDERAL N.º 8.666, DE 1993. O REGRAMENTO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO NÃO SE CONFUNDE COM A CONTRATUALÍSTICA CIVIL, NOTADAMENTE QUANTO AOS PRIVILÉGIOS LEGAIS QUE A ADMINISTRAÇÃO GOZA EM SUAS CONTRATAÇÕES. PRECEDENTES DO STJ. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE PARCIAL PROVIMENTO E CONSEQUENTE DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS RECURSAL ENTRE AS PARTES. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao Apelo, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Superauto Comércio de Veículos Ltda. em face da sentença proferida pelo Juízo da Primeira Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal que, nos autos da Ação de Rito Ordinário n.º 0822117-69.2016.8.20.5106, julgou parcialmente procedente a pretensão exordial para condenar a Fundação Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Fuern) a pagar “R$242.500,00 (duzentos e quarenta e dois mil e quinhentos reais), referente ao valor devido pela aquisição dos veículos em questão” (Num. 6102884 – Pág. 6).

Em suas razões (Num. 6102897), sustenta a Apelante que a sentença deve ser reformada para contemplar na condenação a multa contratual e indenização de perdas e danos e dirigir o ônus sucumbencial integralmente em desfavor do Ente Público.

Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso a fim de que seja reformada a sentença.

O Apelado ofereceu suas contrarrazões de Num. 6102903 pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

Sem parecer ministerial.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cinge-se a análise do cerne recursal na possibilidade jurídica de condenar a Entidade da Administração Indireta estadual por perdas e danos e impor multa contratual em razão da inadimplência quanto a suas obrigações com fornecedor, mesmo ausente disposição contratual para ambas as hipóteses pretendidas.

A não previsão de multa contratual e perdas e danos em desfavor da Fuern – contratante – foi a razão do julgamento parcial da pretensão exordial, porquanto o Magistrado sentenciante entendeu impossível impor tais sanções por inadimplemento sem a respectiva disciplina contratual.

Cumpre observar que, caso não fosse esse o entendimento do Juízo a quo, teria negado eficácia aos arts. 77 e 78, XV, da Lei Federal n.º 8.666, de 21 de junho de 1993, cujo teor estabelece para os casos em que não há previsão contratual apenas duas consequência jurídicas pelo atraso do adimplemento das obrigações contratadas: (i) rescisão do contrato; ou (ii) “suspensão do cumprimento de suas [contratado] obrigações.

A Administração goza de privilégios na contratação de bens e serviços, por esse motivo a legislação de regência cuida de defini-los, o que distingue a disciplina do contrato administrativo daquela aplicada aos particulares na contratualística civil.

A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) sedimentou sua jurisprudência pela impossibilidade de imposição de multa contratual ou outro reflexo por inadimplemento em desfavor da Administração, estranho ao contrato e ao Estatuto Licitatório. In verbis:

ADMINISTRATIVO - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - QUITAÇÃO - CORREÇÃO MONETÁRIA.

1. Sedimentou-se nesta Corte o entendimento de que só há quitação tácita quando se comporta o contratado de modo satisfativo com a avença.

2. Recebimento por depósito bancário não significa quitação.

3. Pagamento em atraso leva à atualização das parcelas recebidas com impontualidade.

4. Perdas e danos que, sem previsão no contrato, limitam-se aos juros de mora.

5. Recurso especial parcialmente provido.

(...)

De referência às perdas e danos, entendo que, inexistindo previsão no contrato, deve incidir, além da correção monetária, que é apenas atualização, juros de mora, que representam o custo do dinheiro que deveria chegar à empresa contratada e não chegou.

(...)

(REsp 535.858/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/10/2003, DJ 28/10/2003, p. 281)

Ainda segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a indenização por lucros cessantes só é admitida na hipótese de rescisão unilateral por parte da Administração contratante, sendo, mesmo assim, indispensável ao contratado que produza a prova de prejuízo suportado:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO ADMINISTRATIVO. RESCISÃO UNILATERAL PELA ADMINISTRAÇÃO. LUCROS CESSANTES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. SÚMULAS 5 E 7/STJ.

1. Cuida-se, na origem, de Ação Declaratória de Nulidade de Ato Administrativo com pedido de indenização por lucros cessantes proposta pela ora agravante, contra o Município de Aquidauana-MS, ora recorrido, objetivando "a) seja declarada a nulidade das rescisões contratuais levadas a efeito nos autos dos processos administrativos n. 122/2012 e 123/2012; b) seja determinado o prosseguimento dos contratos e que sejam sanados os defeitos pela Administração; c) caso não acolhido o pedido formulado no item b, que seja o requerido condenado a levantar as garantias prestadas e a pagar indenização por lucros cessantes à requerente, a ser apurado em liquidação de sentença." (fl. 480). O Juiz de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido. O Tribunal a quo deu parcial provimento à Apelação do Município de Aquidauana-MS, negou provimento ao Recurso Adesivo da ora agravante.

2. Preliminarmente, não se pode conhecer da irresignação contra a ofensa ao art. art. 402 do Código Civil, pois o referido dispositivo legal não foi analisado pela instância de origem. Ausente, portanto, o indispensável requisito do prequestionamento, o que atrai, por analogia, o óbice da Súmula 282/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada".

3. Pela leitura do Acórdão do Tribunal de origem verificamos que a rescisão unilateral do contrato administrativo ocorreu sem a prévia abertura de processo administrativo, afastando do acórdão o dever de indenizar em razão de não ter a parte agravante comprovado nos autos os prejuízos decorrentes do término do vínculo contratual.

4. O art. 79 da Lei 8.666/1993 autoriza a rescisão por ato unilateral e escrito da Administração, nos casos enumerados nos incisos I a XII e XVII do art. 78, ressalvando que "Quando a rescisão ocorrer com base nos incisos XII a XVII do artigo anterior, sem que haja culpa do contratado, será este ressarcido dos prejuízos regularmente comprovados que houver sofrido, tendo ainda direito a: I - devolução de garantia; II - pagamentos devidos pela execução do contrato até a data da rescisão; III - pagamento do custo da desmobilização".

5. A jurisprudência do STJ reconhece o direito à indenização quando comprovados os prejuízos decorrentes da rescisão prematura contratual por ato da Administração, aí compreendidos os danos emergentes e os lucros cessantes, quando a parte contratada não dá causa ao distrato. A propósito: REsp 928.400/SE, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 15/8/2013, DJe 22/8/2013; REsp 1.240.057/AC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 28/6/2011, DJe 21/9/2011; REsp 1.232.571/MA, Rel.

Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 22/3/2011, DJe de 31/3/2011; EREsp 737.741/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 12/11/2008, DJe 21/8/2009; EREsp 737.741/RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 12/11/2008, DJe 21/8/2009; REsp 737.741/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 3/10/2006, DJ 1/12/2006, p. 290.

6. Ocorre que o direito de indenizar pressupõe a comprovação nas instâncias ordinárias dos prejuízos efetivamente sofridos pela empresa contratada (parte agravante), o que não está demonstrado no Acórdão do Tribunal de origem.

7. Avaliar o acerto ou desacerto do acórdão quanto ao atendimento do princípio do contraditório e da ampla defesa, ou em relação ao pleito indenizatório pela rescisão unilateral do contrato, demanda reanálise do quadro probatório constante nos autos.

8. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido. Aplica-se, portanto, o óbice da Súmula 7/STJ (A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial).

9. Ademais, o acolhimento da tese apresentada no Recurso Especial exigirá a apreciação do contrato administrativo celebrado entre a agravante e o agravado, incindindo o óbice da Súmula 5/STJ (A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial). A propósito: AgInt no AREsp 166.617/DF, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 15/8/2017, DJe 19/9/2017; REsp 1417607/AC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/2/2017, DJe 7/3/2017; AgInt no AREsp 810.831/BA, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 16/2/2017, DJe 8/3/2017.

10. Agravo Interno conhecido em parte para, nessa parte, negar-lhe provimento.

(AgInt no REsp...

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