Acórdão Nº 08228266020188205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 06-03-2020

Data de Julgamento06 Março 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08228266020188205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0822826-60.2018.8.20.5001
Polo ativo
MAGDA GURGEL MAGNO
Advogado(s): THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE
Polo passivo
BANCO BONSUCESSO S.A.
Advogado(s): CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS, DIEGO MONTEIRO BAPTISTA


EMENTA: CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARAÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO SUSCITADA PELO RELATOR. INOVAÇÃO RECURSAL. ACOLHIMENTO. MATÉRIAS NÃO DISCUTIDAS EM PRIMEIRO GRAU. MÉRITO. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE NÃO SOLICITAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO. AVENÇA CELEBRADA COM AS DEVIDAS INFORMAÇÕES À CONSUMIDORA. AUTORIZAÇÃO PARA EMISSÃO DO TÍTULO DEVIDAMENTE EXARADA PELA ADQUIRENTE. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO. OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA (ART. 6º, III, DO CDC). INEXISTÊNCIA DE ILICITUDE DA CONDUTA PERPETRADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA REQUERIDA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INEXISTÊNCIA DE DEVER DE RESTITUIR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. CONHECIMENTO PARCIAL E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, por maioria de votos, conhecer, em parte, do recurso, e, na parte conhecida, negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto do Relator. Vencido o Des. Dilermando Mota.


RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Magda Gurgel Magno em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN que, nos autos de Ação Declaratória de Nulidade Contratual c/c Pedido de Reparação por Danos Morais, promovida pela Apelante, em desfavor do Banco Olé Bonsucesso Consignado S.A., julgou improcedente a pretensão inaugural, condenando a Autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspendendo a exigibilidade em razão da gratuidade judiciária.

Nas razões recursais (ID nº 4924453), a Apelante aduziu que o contrato não possui informações mínimas exigidas, não tendo sido disponibilizado no momento da contratação.

Alegou que as taxas de juros não foram informadas.

Declarou que houve má-fé e abusividade por parte do banco, devendo haver restituição do indébito.

Alternativamente, pleiteou que os valores pagos a título de Reserva de Margem Consignável sejam considerados para amortização do débito originário.

Por fim, requereu o conhecimento e provimento do recurso, reformando-se a sentença atacada.

Contrarrazões apresentadas, alegando a prescrição da demanda (ID nº 4924458).

A 17ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (ID nº 5019524).

É o relatório.

VOTO

PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO, SUSCITADA PELO RELATOR

Inicialmente, a Apelante pede alternativamente que os valores pagos a título de Reserva de Margem Consignável sejam considerados para amortização do débito originário.

No entanto, observo que as referidas matérias não foram discutidas no trâmite do processo em primeiro grau, constituindo inovação recursal, o que inviabiliza a análise em segunda instância.

Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados:

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE OURO BRANCO/RN. ASG EXERCENDO ATIVIDADES NO MATADOURO PÚBLICO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO, POR INOVAÇÃO RECURSAL, SUSCITADA PELO RELATOR: FUNDAMENTO DO APELO ALHEIO À INICIAL. NECESSIDADE DE SUBMISSÃO AO JULGADOR DE PRIMEIRO GRAU. ACOLHIMENTO. MÉRITO: PRETENSA ALTERAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DA CORREÇÃO MONETÁRIA PELA TAXA REFERENCIAL – TR. IMPOSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO DA SENTENÇA DE OFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA QUE DEVERÁ OBSERVAR O IPCA-E E JUROS DE MORA DE ACORDO COM OS ÍNDICES DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA. DESPROVIMENTO DO APELO, NA PARTE CONHECIDA. SENTENÇA ALTERADA DE OFÍCIO. (TJRN, AC nº 2018.003512-5, 3ª Câmara Cível, Rel. Juíza Convocada Maria Neíze de Andrade Fernandes. J. 05/11/2019). (Grifos acrescidos).

PROCESSUAL CIVIL. POSSESSÓRIA. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL. COMODATO VERBAL. PLEITOS ALTERNATIVOS DE INDENIZAÇÃO DE BENFEITORIAS E MANUTENÇÃO DA POSSE EM PARTE DO IMÓVEL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO SUSCITADA PELO RELATOR. INOVAÇÃO RECURSAL. ACOLHIMENTO. MATÉRIAS NÃO DISCUTIDAS EM PRIMEIRO GRAU. MÉRITO. NÃO ESTIPULAÇÃO DE PRAZO PARA PERMANÊNCIA NO IMÓVEL. OCUPAÇÃO EM DECORRÊNCIA DE RELAÇÃO DE PARENTESCO ENTRE AS PARTES. ESBULHO EVIDENCIADO. REITEGRAÇÃO DE POSSE. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO PARCIAL E DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TJRN, AC nº 2015.018549-0, 1ª Câmara Cível, Rel. Des. Cornélio Alves. J. 16/08/2018). (Grifos acrescidos).

Desse modo, voto pelo não conhecimento desta parte do apelo.

MÉRITO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Pretende a Autora, a reforma do julgado sob o argumento de que firmou com a instituição financeira Ré contrato de empréstimo consignado, tendo sido surpreendido com a informação de que se trata de cartão de crédito consignado. Requerendo a restituição dos valores pagos a mais.

Inicialmente, é de se esclarecer que, no caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor – CDC, haja vista tratar-se de relação jurídico-material em que de um lado o Recorrido figura como fornecedor de serviços, e do outro o Recorrente se apresenta como seu destinatário.

Ademais, cumpre ressaltar que, mesmo existindo pacto contratual livremente celebrado entre as partes, é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação jurídica, de modo a devolver ao negócio o equilíbrio determinado pela lei e a função social a ele inerente, sem que isso signifique interferência ilegal na autonomia da vontade das partes, ainda mais quando o negócio se encontra regido pelo CDC.

Defende a Apelante que as partes ajustaram um empréstimo consignado, cujo pagamento se daria por meio de desconto em contracheque, em parcelas fixas de R$ 112,02 (cento e doze reais e dois centavos), sem nunca ter ocorrido a cessação dos descontos, já tendo efetuado o pagamento de 97 (noventa e sete) parcelas.

Analisando o contrato de adesão firmado (Ficha Cadastral e Proposta de Adesão à Consignação de Descontos para Pagamento de Empréstimos e Cartão de Crédito) (ID nº 4924442), constata-se que a parte postulante autorizou a emissão de cartão de crédito, bem como fez uso deste (faturas ID nº 4924443).

Com efeito, da leitura da avença celebrada, verifico constar a informação de que o cliente autoriza a emissão do cartão, motivo pelo qual entendo que a instituição financeira Apelada tenha apresentado a proposta de adesão à contratante com clareza, apresentando o nome "cartão de crédito", de forma bem destacada no título do contrato e em suas respectivas cláusulas, não se podendo inferir a ocorrência de qualquer propaganda enganosa em desfavor da consumidora.

Assim sendo, entendo que o Banco Demandado, ora Recorrido, cuidou de fornecer à parte Autora todas as informações referentes ao contrato entabulado, restando evidenciado tratar-se de um empréstimo consignado vinculado à utilização de um cartão de crédito, obedecendo ao princípio da transparência insculpido no art. 6º, III, do CDC:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

Oportuno trazer à colação os seguintes julgados desta Corte:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO REALIZADO COM CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. CONTRATO DEVIDAMENTE ASSINADO. PACTO QUE PREVÊ A POSSIBILIDADE DE SER DESCONTADO O VALOR MÍNIMO DEVIDO DIRETAMENTE DA FOLHA DE PAGAMENTO. CONSUMIDOR QUE SE BENEFICIOU DO CRÉDITO. EFETIVO USO DO CARTÃO DE CRÉDITO INCLUSIVE EM COMPRAS JUNTO A OUTROS ESTABELECIMENTOS. LEGITIMIDADE DOS DESCONTOS NA REMUNERAÇÃO DA PARTE AUTORA. INEXISTÊNCIA DA CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEVER DE INDENIZAR. ARTS. 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL. AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO DO BANCO DEMANDADO NA RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS MATERIAS E MORAIS RECLAMADOS. SENTENÇA MODIFICADA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.

- A obrigação de indenizar assenta-se na demonstração do fato ilícito, da existência do dano efetivo, do nexo de causalidade entre ambos e, ainda, quando subjetiva, da culpa ou dolo, pressupostos que, se não demonstrados, afastam a responsabilidade civil;

- Não caracterizada a ilicitude da conduta, resta afastado o dever de indenizar. (TJRN – AC nº 2017.018906-1 – Rel. Des. João Rebouças – 3ª Câmara Cível – Julg. 20/02/2018). (Grifos acrescidos).

DIREITO DO CONSUMIDOR. PRETENSÃO DE CONSIDERAR O CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INEXISTÊNCIA DE PROVAS OU INDÍCIOS DE ERRO NA CONTRATAÇÃO. CARTÃO DE CRÉDITO EFETIVAMENTE UTILIZADO PARA REALIZAR COMPRAS. NÃO DEMONSTRADA ILICITUDE OU MÁCULA À BOA-FÉ OBJETIVA. NATUREZA REGULAR DO CONTRATO. ATO LÍCITO DE COBRANÇA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. (TJRN – AC nº 2017.013887-5 – Rel. Des. Ibanez Monteiro – 2ª Câmara Cível – Julg. 30/01/2018). (Grifos acrescidos).

DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RECORRENTE QUE SUSTENTA A CONTRATAÇÃO APENAS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SITUAÇÃO NÃO DEMONSTRADA PELOS ELEMENTOS CONTIDOS NOS AUTOS, MESMO À LUZ DAS NORMAS CONSUMERISTAS....

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