Acórdão Nº 08241147220208205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 20-05-2022

Data de Julgamento20 Maio 2022
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08241147220208205001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0824114-72.2020.8.20.5001
Polo ativo
ADRIANA CARLA DA SILVA ROCHA
Advogado(s): THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE
Polo passivo
POLICARD SYSTEMS E SERVICOS S/A
Advogado(s): MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA

Apelação Cível nº 0824114-72.2020.8.20.5001

Apte/Apdo: Policard Systems e Serviços S/A

Advogada: Maria Emília Goncalves de Rueda (23748/PE)

Apdo/Apte: Adriana Carla da Silva Rocha

Advogado: Thiago Marques Calazans Duarte (8204/RN)

Relator: Eduardo Pinheiro (Juiz Convocado)

EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE A DEMANDA. RECURSO DA POLICARD SYSTEMS E SERVIÇOS S/A: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE CONFIGURADA, DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO À CONSUMIDORA. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A MESMA ESPÉCIE DE OPERAÇÃO. RAZOABILIDADE. SÚMULA Nº 530 DO STJ. MANUTENÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. DECAIMENTO MÍNIMO DO PEDIDO INICIAL. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. APELO DA PARTE AUTORA DA DEMANDA: ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. DEMANDA DECIDIDA NOS LIMITES DO PLEITO AUTORAL EM FACE DA POSSIBILIDADE DE HAVER COMPENSAÇÃO (STJ - AgRg no REsp 681.615/RS). VÍCIO NÃO CONFIGURADO. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS, PARA RECALCULAR AS OPERAÇÕES DISCUTIDAS NA LIDE. QUESTÃO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA QUE EXTRAPOLA O CAMPO JURÍDICO. AUSÊNCIA DE EXAME APROFUNDADO NA FASE DE CONHECIMENTO. NECESSIDADE DE SER DEFINIDA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. CABIMENTO. OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

I - "Em ações de revisão de contratos bancários, quando há a condenação da instituição financeira, a determinação de compensação ou de repetição do indébito é conseqüência lógica sem a qual não haverá efetividade no provimento jurisdicional. Possibilidade, assim, de determinação da compensação e da repetição do indébito, que não se confunde com a revisão de ofício de cláusulas contratuais” (AgRg no REsp 681.615/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/12/2010, DJe 02/02/2011).

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, ausente o parecer ministerial, em conhecer de ambos os recursos e, no mérito, negar provimento ao apelo da instituição financeira e, por sua vez, dar parcial provimento ao recurso da parte autora da demanda, tudo nos termos do voto do Relator, que integra o Acórdão.

R E L A T Ó R I O

Tratam os autos de Apelações Cíveis interpostas pelos dois polos da controvérsia, em face da sentença proferida pelo Juízo da Quarta Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Cláusula Expressa e Revisão Contratual c/c Pedido de Exibição de Documentos ajuizada por Adriana Carla da Silva Rocha em desfavor de Policard Systems e Serviços S/A, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, consoante dispositivo a seguir transcrito:

“(...) Isto posto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo procedente em parte a pretensão autoral, para fazer incidir nas operações financeiras contratadas entre ADRIANA CARLA DA SILVA ROCHA e POLICARD SYSTEMS E SERVICOS S/A a taxa média de juros mercado, divulgada pelo BCB, praticada nas operações da mesma espécie (Súmula nº 530 do STJ), declarando abusiva a capitalização composta de juros, diante da ausência de pactuação das taxas de juros mensal e anual (Súmulas nº 539 e 541 – STJ), e determinando o recálculo das parcelas com a incidência de juros simples.

Condeno a demandada a restituir, na forma simples, o valor pago a maior pelo demandante a título de juros compostos superiores à média de mercado, a ser definido em liquidação de sentença mediante a utilização do Sistema de Amortização Constante – SAC, condicionado o reembolso à ausência de saldo contratual em aberto.

(...)

Em face da sucumbência mínima do autor, condeno a demandada ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, os quais fixo no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC”.

Em suas razões recursais (ID Num. 11710714), a parte autora da demanda insurge-se quanto à metodologia de cálculo dos juros remuneratórios determinada pelo magistrado a quo, defendendo que o Método Linear Ponderado (GAUSS), “(...) por apresentar linearidade e parcelas constantes, é aquele que melhor atende à necessidade de substituir a Tabela Price, quando solicitado que sejam excluídos os juros compostos por juros simples”. Destaca que, por sua vez, “(...) o Sistema de Amortização Constante - SAC deve ser utilizado apenas para recalcular financiamentos imobiliários, vez que consiste num procedimento em que as parcelas não são constantes e tendem a reduzir”.

Assevera, adiante, que “(...) não houve pedido de quaisquer das partes de que houvesse compensação do crédito apurado em favor da parte autora com eventuais débitos vincendos”, configurando a sentença extra petita nesse ponto. Busca, também, a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente.

Requer, assim, o conhecimento e provimento do apelo, a fim de reformar a sentença nos termos impugnados.

Por sua vez, em seu recurso de ID Num. 11710716, a instituição financeira sustenta, em síntese, que: a) a taxa de juros aplicada no pacto firmado entre as partes foi previamente estabelecida no Decreto Estadual nº 21.860/2010, o qual foi publicado em Diário Oficial, sendo de conhecimento de todos os servidores públicos; b) a recorrida celebrou diversas transações, nas quais os juros remuneratórios aplicados aos contratos respeitaram o percentual máximo (4,99%) previsto na referida norma; c) "em nenhum momento houve apreciação do Decreto Estadual nº 21.860/2010, situação que implica em omissão do julgado, sem a devida fundamentação nos termos do inciso IV, do §1º, do art. 489, do CPC”; d) a apelada teve ciência de todas as condições do contrato, tendo anuído por livre e espontânea vontade, sendo descabida a limitação da taxa de juros pleiteada; e) subsidiariamente, os juros devem ser fixados na taxa média de mercado acrescida de 50% (cinquenta por cento); f) é desarrazoada sua condenação nas custas processuais e honorários advocatícios, em virtude de ter decaído em parte mínima do pedido.

Pugna, ao final, pelo conhecimento e provimento do apelo, a fim de julgar totalmente improcedente a pretensão autoral; e, subsidiariamente, que os juros remuneratórios sejam fixados na taxa média de mercado acrescida de 50% (cinquenta por cento).

Contrarrazões juntadas pela parte autora, nos termos do ID Num. 11711022; e pela demandada em ID Num. 11711024.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito.

Nos termos do Ato Ordinatório de ID Num. 12147497, foram os autos encaminhados ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos deste Tribunal de Justiça, restando, contudo, infrutífera a tentativa de realização de audiência (ID Num. 12655755).

É o relatório.

V O T O

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço de ambos os recursos.

I – DA APELAÇÃO CÍVEL APRESENTADA PELA POLICARD SYSTEMS E SERVIÇOS S/A:

Cumpre destacar, em exame prefacial, que conforme apregoa o diploma processual civil a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, de modo que deve o Tribunal decidir apenas o que lhe foi efetivamente devolvido, nos limites das razões de recurso, não cabendo insurgências vagas e genéricas.

Sendo assim, cinge-se o mérito recursal ao exame da existência de abusividade da taxa de juros remuneratórios aplicada ao contrato celerado entre as partes, bem como ao cabimento da condenação da recorrente ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência.

Cabe registrar, em contraponto necessário às argumentações recursais, que ainda que o magistrado de primeiro grau não tenha se pronunciado expressamente acerca da aplicação do Decreto Estadual nº 21.860/2010 ao caso em exame, é certo que a lide foi decidida de forma fundamentada, de acordo com as provas carreadas aos autos, não havendo que se falar em deficiência ou vício no julgado que enseje sua nulidade.

Quanto às razões da apelante no sentido de que houve a devida informação à consumidora, acerca dos dados contratuais, em função da edição do Decreto Estadual nº 21.860/2010, entendo que tal instrumento normativo apenas dispôs sobre o limite e não especificação de taxa única admitida em empréstimos. Assim, não se vislumbra possível aceitar que foi atendido o dever de informação, sendo certo que a mera alusão a um diploma legal genérico não afasta da fornecedora a obrigação de informar a consumidora, no caso concreto, a respeito dos itens contratuais aos quais está aderindo.

In casu, verifica-se que não há contrato formal escrito, apenas áudios nos quais a atendente da instituição financeira apresenta, de forma muito sumária, as condições do negócio, basicamente, o montante do empréstimo disponibilizado, a quantidade e o valor de cada parcela.

Desse modo, diante da ausência de provas relativas aos elementos essenciais do contrato, principalmente dos juros remuneratórios cobrados, não é possível sequer reconhecer válida a informação unilateral fornecida pela apelante sobre a taxa praticada.

Nesse diapasão, para resolver a discussão quanto aos juros remuneratórios, aplica-se a Súmula nº 530 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:

"Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT