Acórdão Nº 08245559220168205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 21-07-2020

Data de Julgamento21 Julho 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08245559220168205001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0824555-92.2016.8.20.5001
Polo ativo
EMBRACON ADMINISTRADORA DE CONSORCIO LTDA
Advogado(s): AMANDIO FERREIRA TERESO JUNIOR, MARIA LUCILIA GOMES
Polo passivo
MONIQUE DEGENS
Advogado(s): BRUNO TORRES MIRANDA


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Vivaldo Pinheiro na Câmara Cível


Apelação Cível nº: 0824555-92.2016.8.20.5001.

Apelante: Embracon Administradora de Consórcio Ltda.

Apelada: Monique Degens

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.

EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. PARTICIPAÇÃO EM CONSÓRCIO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO DE REAJUSTE DAS PARCELAS DE FORMA ABUSIVA. PRETENSÃO DE PAGAMENTO DAS PARCELAS NO VALOR INICIALMENTE PREVISTO. RECUSA INJUSTIFICADA. CONSIGNAÇÃO DE PARCELAS. CONSORCIADA QUE FOI INFORMADA SOBRE EXISTÊNCIA DE PARCELAS FIXAS. CONTRATO QUE NÃO FOI ASSINADO. OFERTA DE PUBLICIDADE QUE VINCULA O CONTRATO. ART. 30 DO CDC. CONDUTA ABUSIVA EVIDENCIADA. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. LIBERDADE DA ADMINISTRADORA. FUNDO DE RESERVA. DEVOLUÇÃO AO FINAL DO GRUPO. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS QUE DEVEM SER FIXADOS SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pela Embracon Administradora de Consórcio Ltda em face da sentença proferida pelo Juízo da 14ª Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da Ação de Consignação em Pagamento ajuizada por Monique Degens, julgou procedente a pretensão autoral para: i) declarar a validade dos depósitos efetuados pela parte autora, reconhecendo a liberação do devedor consignante do vínculo obrigacional contratado.

Após a oposição de embargos de declaração por autor e réu, a sentença foi modificada para acrescentar os seguintes termos: CONDENAR a parte ré restituir os valores pagos à título de juros e correção à parte autora, podendo ser em forma de abatimento do valor da dívida da autora no referido contrato de consórcio, se houver ainda parcelas em aberto; LIBERAR a demandante da obrigação até o limite do valor consignado”.

Em suas recursais, a parte apelante alega, em síntese, que carece a autora de interesse de agir, já que nenhum dos requisitos previstos na legislação processual foram verificados no ajuizamento da ação. Além disso, acrescenta que conforme já decidido pelos tribunais, não pode ser admitida a ação consignatória quando o devedor já está em mora.

Narra que a apelada sempre esteve ciente do valor que cumpriria pelo prazo estipulado, não podendo, neste momento, alegar que a quitação das parcelas é impraticável.

Informa que o contrato exerceu os exatos termos da sua função social, pois, colocou em circulação determinado importe monetário, não havendo motivos para maiores questionamentos a respeito do assunto.

Destaca que o contrato firmado é perfeito, válido e eficaz, uma vez que não houve nenhum fato capaz de macular seu aspecto formal e material.

Justifica que o contrato de consórcio possui características próprias e prevê expressamente os encargos devidos para o caso de inadimplência, razão pela qual não há abusividade.

Defende que o percentual da taxa de administração deve ser mantido.

Assevera que o fundo de reserva não pode ser restituído.

Questiona, ainda, o valor dos honorários advocatícios sucumbenciais.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso a fim de reformar a sentença recorrida.

As contrarrazões foram apresentadas pelo improvimento do recurso (Id. 5018417).

Desnecessária a remessa dos autos à Procuradoria de Justiça, por versarem eminentemente sobre interesses privados.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

A análise do recurso consiste em examinar se foi acertada, ou não, a sentença que julgou procedente o pleito autoral para reconhecer a validade dos depósitos efetuados pela parte demandante, tal como condenar a parte ré a restituir em favor da autora os valores pagos a título de juros e correção monetária.

Inicialmente, cumpre averiguar a preliminar de falta de interesse de agir suscitada pela parte apelante.

Adianto que a preliminar não merece ser acolhida, tendo em vista que a parte autora cumpriu os requisitos estabelecidos no art. 539 do Código de Processo Civil.

Dessa forma, rejeito a preliminar suscitada e avanço ao mérito da demanda.

Pois bem.

Os fatos apresentados permitem a caracterização de uma relação consumerista entre as partes, de modo que o presente feito deve ser regido pelos ditames do Código de Defesa do Consumidor.

Diante da relação de consumo, opera a inversão do ônus da prova em favor do consumidor, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC.

A ação trata sobre a alegação de cobranças abusivas em razão do aumento do valor das parcelas após o sorteio da concessão do crédito da parte autora.

Consta dos autos que a autora, em 22.05.2012, aderiu à proposta de participação em grupo de consórcio, ficando estabelecido o pagamento das cotas durante 100 (cem) meses. Na oportunidade, a consorciada foi contemplada após 03 (três) meses da assinatura da proposta.

Para tanto, comprou dois automóveis no valor de R$ 221.672,14 (duzentos e vinte um mil, seiscentos e setenta e dois reais e quatorze centavos) a fim de receber o montante objeto do consórcio.

Após a operação, a empresa de consórcio reajustou os valores das parcelas.

Ao procurá-la para realizar o pagamento da forma como foi convencionado, a apelada recebeu a informação de que o pagamento era inferior ao pactuado, pois foram aplicadas juros e correções monetárias nas parcelas do consórcio.

No cotejo do acervo probatório, noto que a parte autora, ora apelada anexou à cópia da proposta de participação do consórcio (Id. 5018308 - Pág. 3), além de uma imagem indicando que pagaria 100 (cem) parcelas mensais.

A primeira no valor de R$ 4.450,88 (quatro mil, quatrocentos e cinquenta reais e oitenta e oito centavos) e, as restantes, fixas, no montante de R$ 2.800,88 (dois mil e oitocentos reais e oitenta e oito centavos).

Em contrapartida, muito embora a parte apelante tenha trazido aos autos contrato detalhando as taxas de juros e correção monetária, vislumbro que o documento não era de conhecimento da consorciada, uma vez que o documento não contem a assinatura da parte autora.

Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor estabelece, em seu art. 30, o dever dos fornecedores de honrar as ofertas veiculadas, de modo que seu conteúdo obrigatoriamente deverá constar do futuro contrato celebrado, senão vejamos:

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.”

Dessarte, deve a parte ré vincular a oferta publicada ao contrato firmado com a autora, inexistindo, consequentemente, qualquer violação ao princípio do pacta sunt servanda.

Ressalto que mesmo tendo solicitado o contrato por diversas vezes, em momento algum a parte autora teve a oportunidade de assiná-lo, como demonstra os trechos das conversas no Id. 5018310 - Págs. 1/11.

Deste modo, não há como permitir que a empresa apelante cobre valores diversos do que divulgou, sobretudo porque a parte autora não tinha conhecimento da variação das parcelas.

Inclusive, como é sabido, pela natureza do consórcio, onde a compra do bem é feita com o recurso dos próprios consorciados, não é comum a cobrança de juros, existindo, na verdade, a exigência de taxas, as quais serão discutidas a seguir.

Sobre a taxa de administração, reputo que a tese defendida pela parte apelante não merece prosperar, porquanto a aludida taxa não foi sequer mencionada na sentença, isto é, a questão não foi objeto de exame pela Magistrada de Primeiro Grau.

E mesmo que tivesse sido, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre o tema argumentando que as administradoras de consórcio têm liberdade para fixar a respectiva taxa. Vejamos:

EMENTA: RECURSO ESPECIAL. RITO DO ART. 543-C DO CPC. CONSÓRCIO. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. FIXAÇÃO. LIMITE SUPERIOR A 10% (DEZ POR CENTO). AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE E ABUSIVIDADE. LIVRE PACTUAÇÃO PELAS ADMINISTRADORAS. POSSIBILIDADE. ANÁLISE DE OFENSA A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL - ARTIGO 22, INCISO XX. IMPOSSIBILIDADE. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ARTIGO 421 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA...

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